Riscos Financeiros Relacionados à Natureza no Brasil Pietro Calice, Federico Diaz Kalan e Faruk Miguel 1 Resumo A perda de biodiversidade e seus respectivos custos econômicos são cada vez mais reconhecidos como uma fonte de riscos financeiros. Este artigo explora como e em que medida os bancos brasileiros estão expostos à perda de biodiversidade por meio de seus empréstimos a empresas não financeiras. Os resultados sugerem que essa exposição é significativa. Quarenta e seis por cento da carteira de empréstimos corporativos não financeiros dos bancos brasileiros está concentrada em setores com dependência alta ou muito alta de um ou mais serviços ecossistêmicos. As perdas de produção associadas ao colapso dos serviços ecossistêmicos podem se traduzir em um aumento cumulativo de longo prazo em empréstimos corporativos inadimplentes de nove pontos percentuais. Além disso, 15 por cento da carteira de empréstimos corporativos dos bancos brasileiros vai para empresas que possivelmente operam em áreas protegidas, o que poderia aumentar para 25 por cento caso as lacunas de conservação fossem fechadas e 38 por cento caso todas as áreas prioritárias fossem protegidas. Por fim, sete por cento dos empréstimos corporativos são para empresas com registro de controvérsias ambientais. Embora preliminares, os resultados têm grandes implicações nas políticas tanto para os bancos brasileiros quanto para o Banco Central do Brasil. Classificação JEL: Q57, G21. Palavras-chave: Biodiversidade, Finanças.Endereço de e-mail dos autores: pcalice@worldbank.org, fdiazkalan@worldbank.org, fmiguelliriano@worldbank.org. 1 Esta é uma tradução do artigo original Calice, P., Diaz Kalan, F. A., & Miguel, F. 2021. Nature-Related Financial Risks in Brazil. Policy Research Working Paper no. WPS 9759. World Bank Group, Washington, D.C. Os autores são da equipe do Banco Mundial. Agradecemos a Diogo Nogueira e seus colegas do Banco Central do Brasil por compartilhar alguns dos dados utilizados neste trabalho e por apoiar o projeto. Também agradecemos a Paloma Casero, Yira Mascaró e Rafael Muñoz por sua orientação, e a Danijela Piljic, Martijn Regelink, Gianni Ruta, Romain Svartzman e Thomas Viegas por seus comentários. Por fim, agradecemos a Brian Blankespoor pelas excelentes contribuições. Os achados, interpretações e conclusões deste artigo são de inteira responsabilidade dos autores e não representam necessariamente a opinião do Banco Mundial, de seus Diretores Executivos ou dos países que representam. Quaisquer erros e omissões são de nossa responsabilidade. 1. Introdução A perda da biodiversidade é uma das maiores ameaças à humanidade (WEF 2021) Todas as sociedades dependem da natureza para sua sobrevivência, mas a natureza está enfraquecendo mais rápido do que em qualquer outro momento da história humana (IPBES 2019) O declínio das populações globais de vida selvagem, juntamente com a degradação maciça de oceanos, florestas, corpos de água doce e outros ecossistemas está prejudicando a capacidade da natureza de fornecer bens e serviços vitais (os chamados serviços ecossistêmicos) para que todas as sociedades prosperem. Isso tem um impacto negativo na resiliência e adaptabilidade da natureza, prejudicando sua produtividade e aumentando os riscos para seus bens e serviços (Dasgupta 2021) A pandemia de Covid-19 é um lembrete contundente de que a saúde do planeta e a saúde humana estão profundamente interligadas. Embora as origens específicas do surto de Covid-19 e sua via de transmissão ainda não tenham sido determinadas, a degradação ambiental pode muito bem ter desempenhado um papel crucial. Vários estudos (veja, por exemplo, Olivero e outros 2017; e Gibb e outros 2020) mostraram uma ligação entre a destruição do habitat natural e os riscos de doenças zoonóticas. O desmatamento e a conversão do uso da terra, em grande parte impulsionados pela expansão agrícola, aumentam significativamente o risco de zoonoses (Dobson e outros 2020), exacerbando a perda de biodiversidade (IPBES 2019) e acelerando as mudanças climáticas (IPCC 2018) O desmatamento, juntamente com a agricultura e outras mudanças no uso da terra, é responsável por cerca de um quarto das emissões globais de gases de efeito estufa (IPCC 2019). A perda de biodiversidade pode ter consequências significativas para a economia global. Mais da metade do PIB total mundial é moderada ou altamente dependente da natureza e de seus serviços, sendo os setores da construção, agricultura e alimentos e bebidas os mais dependentes (WEF 2020). Como as economias estão “embutidas” na natureza (Dasgupta 2021), a perda dos serviços ecossistêmicos, como solo fértil, proteção contra enchentes e controle da erosão, pode resultar em graves perdas e transtornos na atividade econômica. Se a perda de serviços ecossistêmicos continuar aumentando, os custos econômicos associados podem ser significativos. Por exemplo, no cenário usual de negócios, o declínio em quatro serviços ecossistêmicos - polinizadores, produção florestal, pesca marinha e sequestro de carbono pelas florestas - poderia levar a perdas reais no PIB global de US$ 90 bilhões até 2030, que podem se multiplicar por 2,5 se considerarmos os danos da mudança climática ligados à perda de ecossistemas. Em um cenário de baixa probabilidade e alto impacto do colapso nos serviços ecossistêmicos, o PIB real global poderia diminuir em US$ 2,7 trilhões ou menos 2,4 por cento em comparação com a base de referência (Banco Mundial, 2021)2 As economias de baixa renda, 2 As estimativas dos custos econômicos da perda de biodiversidade estão sujeitas a várias incertezas. Apesar do progresso, o conhecimento da interação entre os serviços ecossistêmicos e a economia permanece limitado, e é muito difícil quantificar o impacto da perda de biodiversidade no fornecimento de serviços ecossistêmicos devido aos inúmeros aspectos não lineares que estão em jogo. No entanto, o impacto econômico da perda de biodiversidade pode ser severo. 2 que são altamente dependentes dos serviços prestados pela natureza, são as mais afetadas com a perda da biodiversidade. A perda de biodiversidade e seus respectivos custos econômicos são uma fonte de riscos financeiros. A relação entre a biodiversidade e o setor financeiro pode ser caracterizada pela “dupla materialidade”. Por um lado, as mudanças no estoque e na condição do capital natural alteram sua capacidade de fornecer os bens e serviços dos quais as empresas dependem e, portanto, têm implicações na avaliação de risco de suas operações e na lucratividade. Por outro lado, as instituições financeiras podem ter impactos adversos sobre a biodiversidade e os serviços ecossistêmicos por meio de suas operações e decisões de investimento (OCDE 2019; DNB 2020)3 Tudo isso pode se traduzir em riscos de crédito tradicionais, riscos de mercado, riscos operacionais e riscos de liquidez para instituições financeiras, com ciclos de feedback negativo para a economia (Figura 1). O potencial para vários riscos ambientais também pode ter implicações sistêmicas devido à complexidade, interdependência e interconexão dentro do sistema financeiro (NGFS 2019; Bolton e outros 2020) A perda de biodiversidade pode impactar o sistema financeiro por meio de dois canais principais (NGFS-INSPIRE 2021). O primeiro são os riscos ambientais físicos, que se referem ao impacto financeiro das mudanças no capital natural. A perda e a degradação dos serviços ecossistêmicos podem prejudicar ativos fixos e infraestrutura, além de interromper as cadeias de abastecimento e as operações comerciais, causando prejuízos para as empresas e, em última instância, para as instituições financeiras. Os riscos físicos podem ser agudos, como transtornos por doenças infecciosas, ou crônicos, como a adequação reduzida de terra para cultivo. O segundo canal é dos riscos ambientais de transição, decorrentes do processo de ajuste para uma economia mais sustentável. As perdas se originam de mudanças sociais e podem ser desencadeadas, por exemplo, pela adoção de regulamentação e políticas relacionadas à biodiversidade, progresso tecnológico, mudanças no sentimento e nas preferências do mercado, litígios e danos à reputação. A transmissão desses riscos ao setor financeiro está sujeita a incertezas significativas. Apesar de ter havido algum progresso na medição do impacto do setor financeiro sobre a biodiversidade no nível conceitual (veja, por exemplo, Berger e outros 2018 e, para uma visão geral das melhores práticas, OCDE 2019b), a estimativa das exposições financeiras aos riscos de perda de biodiversidade permanecem amplamente inexploradas na literatura. Diante desse cenário, este artigo tem como objetivo oferecer evidências descritivas sobre a exposição do setor bancário brasileiro à perda de biodiversidade. O Brasil é o país com maior diversidade biológica do mundo.4 Estima-se que o país abrigue entre 15 e 20 por cento da diversidade biológica mundial, com o maior número de espécies endêmicas em escala global. A biodiversidade no Brasil está ameaçada, entre outros, pelo desmatamento e pelas mudanças climáticas. Apesar da influência significativa da região no clima global, a Bacia Amazônica 3 Este conceito de “dupla materialidade” foi utilizado pela Comissão Europeia em sua Diretiva de Relatórios Não Financeiros de 2014 para abranger tanto a materialidade financeira (impactos do mundo externo no valor financeiro de uma empresa) quanto a materialidade ambiental e social (impacto das atividades da empresa no mundo externo). 4 Veja https://www.cbd.int/. 3 continua ameaçada pelo desmatamento associado ao aumento dos assentamentos e expansão das operações agrícolas, pecuárias, madeireiras e mineradoras, que podem em breve atingir um "ponto de inflexão" se medidas não forem tomadas com urgência (Lapola e outros 2018)5 O Brasil foi um dos primeiros países sul-americanos a aprovar integralmente uma Estratégia Nacional de Biodiversidade em 2006 e, em 2013, adotou as metas de biodiversidade para 2020 alinhadas às Metas de Aichi de Biodiversidade da ONU, incluindo o estabelecimento de corredores ecológicos, mosaicos de áreas protegidas e gestão florestal sustentável. Apesar do progresso em algumas áreas (por exemplo, restauração da vegetação tropical), o Brasil está atrasado, por exemplo, em termos de subsídios para a produção de commodities ligadas à destruição de florestas (que excedem por um fator de 100 ou mais o valor gasto em medidas de combate ao desmatamento) e a taxa de desmatamento, com melhorias no bioma da Amazônia desfeitas nos últimos anos (CBD 2020) 6. Espera-se que haja compromisso com novas metas após a Convenção das Nações Unidas sobre Diversidade Biológica (CDB) em outubro de 2021 (COP15), que tem como objetivo aumentar a extensão das áreas protegidas, promovendo o uso sustentável dos ecossistemas e diminuindo as causas da perda de biodiversidade. Dadas as implicações macrofinanceiras potencialmente significativas da perda de biodiversidade no Brasil, é importante que os bancos e o Banco Central do Brasil (BC) desenvolvam a capacidade de compreender e gerenciar em tempo os riscos associados à perda de biodiversidade. Como observa a Análise Dasgupta sobre a economia da biodiversidade, o "sistema financeiro é fundamental para apoiar um envolvimento mais sustentável com a natureza" (Dasgupta 2021) O sistema financeiro do Brasil é baseado em bancos, com os ativos bancários respondendo por cerca de dois terços do total dos ativos do sistema financeiro. Portanto, os bancos podem desempenhar um papel fundamental na gestão e mitigação dos riscos e incertezas resultantes da utilização não sustentável da natureza. Ao mesmo tempo, o BC, encarregado de garantir um sistema financeiro sólido e eficiente, tem interesse que os bancos lidem com os riscos ambientais de forma adequada e proativa, aprendendo e tendo como base os avanços nos riscos financeiros relacionados ao clima. Aproveitando sua participação na Rede de Bancos Centrais e Supervisores para tornar o Sistema Financeiro Verde (NGFS), o BC está implementando uma agenda de sustentabilidade como parte de seu programa de trabalho institucional, que pode dar ênfase renovada aos riscos financeiros ambientais. 7 Este artigo explora como e em que medida os bancos brasileiros estão expostos à perda de biodiversidade por meio de seus empréstimos a empresas não financeiras. Em primeiro lugar, descrevemos até que ponto o setor bancário é indiretamente dependente dos serviços ecossistêmicos, que é o nosso proxy para riscos físicos. Usando o banco de dados ENCORE, que detalha e atribui uma pontuação para as dependências de 21 serviços ecossistêmicos para 86 5 “Pontos de inflexão” referem-se a limites críticos em um sistema ecológico que, quando excedidos, podem levar a uma mudança significativa no estado do sistema e impedir que ele retorne ao seu estado anterior. 6 De acordo com o instituto nacional de pesquisas espaciais, INPE, no primeiro semestre de 2020 o desmatamento aumentou 25 por cento, para um total de 3.066 quilômetros quadrados, em comparação com o mesmo período de 2019, em vias de ser o pior ano para o desmatamento em mais de uma década. Veja http://www.inpe.br. 7 Veja https://www.bcb.gov.br/en/financialstability/sustainability. 4 processos de negócios, vinculamos estes últimos aos setores econômicos e, em seguida, determinamos a exposição de crédito bancário a esses setores usando dados do BC. Isso nos dá evidências da exposição dos bancos brasileiros a setores com dependência alta ou muito alta de um ou mais serviços ecossistêmicos. Em segundo lugar, descrevemos até que ponto os bancos brasileiros financiam empresas que possivelmente operam em áreas protegidas e áreas prioritárias para conservação da biodiversidade, e que estão envolvidas em atividades controversas do ponto de vista ambiental. Este é o proxy que usamos para medir os riscos de transição. Baseado na Relação Anual de Informações Sociais (RAIS) e dados do BC, primeiro mapeamos a exposição de empréstimos bancários em nível municipal. Na etapa seguinte, juntamos essas exposições geográficas com informações do Banco de Dados Mundial sobre Áreas Protegidas e do Ministério do Meio Ambiente para determinar os empréstimos do setor bancário para empresas em áreas protegidas ou prioritárias, conforme determinado pelas autoridades brasileiras. Por fim, usamos o banco de dados MSCI ESG Controversies para identificar empresas brasileiras com registros de controvérsias ambientais e combinamos essas informações com os dados de empréstimos bancários a partir dos relatórios anuais dos bancos. Os principais resultados deste artigo são os seguintes. Os bancos brasileiros têm uma exposição de crédito pendente de R$ 811 bilhões a empresas não financeiras que operam em setores com dependência alta ou muito alta de um ou mais serviços ecossistêmicos. Esta quantidade representa 46 por cento do total da carteira de empréstimos corporativos não financeiros e 20 por cento da carteira de crédito total, e é ligeiramente inclinado para empresas que recebem recursos subsidiados pelo governo (denominado crédito vinculado). A maior dependência é dos ecossistemas que fornecem regulação do clima, águas subterrâneas e superficiais. Com base na sensibilidade histórica da qualidade dos ativos dos bancos brasileiros às condições macroeconômicas (veja Vazquez, Tabak e Souto 2012) e modelagem macroeconômica de serviços ecossistêmicos (Banco Mundial, 2021), as perdas do PIB associadas ao colapso dos serviços ecossistêmicos poderiam se traduzir em um aumento cumulativo de longo prazo nos empréstimos corporativos inadimplentes (NPLs) da ordem de 9 pontos percentuais, mantendo- se o restante constante. Os bancos brasileiros também têm uma exposição de empréstimos pendentes de R$ 254 bilhões ou 15 por cento de sua carteira corporativa para empresas que potencialmente operam em áreas protegidas. Essa exposição poderia aumentar para R$ 437 bilhões (25 por cento da carteira de crédito corporativo) se as lacunas de conservação fechassem, e para R$ 664 bilhões (38 por cento da carteira) se todas as áreas prioritárias fossem protegidas.8 Finalmente, para as 11 empresas brasileiras com registro de controvérsias ambientais, dentre as 143 listadas, em 31 de dezembro de 2019, os bancos tinham uma exposição de empréstimos pendentes de R$ 109 bilhões (7 por cento da carteira de crédito corporativo). Até onde sabemos, este artigo é o primeiro a tentar quantificar as exposições bancárias à perda de biodiversidade em um mercado emergente e o segundo a fazê-lo na literatura relevante. O único documento de que temos conhecimento que explora os riscos da biodiversidade para o setor financeiro é o trabalho pioneiro do De Nederlandsche Bank (DNB 2020), o banco central 8 Lacunas de conservação referem-se àquelas áreas que não estão protegidas atualmente e são classificadas como áreas de ações de alta prioridade para a conservação da biodiversidade. 5 holandês. O DNB (2020) estima a exposição de instituições financeiras holandesas - bancos, seguradoras e fundos de pensão - por meio de instrumentos de dívida e patrimônio a riscos resultantes da perda de biodiversidade, tanto doméstica quanto internacionalmente, e conclui que essas exposições são relevantes. As instituições financeiras holandesas investiram um total de € 510 bilhões (36 por cento do portfólio total) em empresas que têm dependência alta ou muito alta de um ou mais serviços ecossistêmicos e, portanto, estão expostas a riscos físicos se um ou mais desses serviços forem interrompidos ou perdidos. Além disso, o setor financeiro holandês está exposto a riscos de transição de € 28 bilhões em empresas que operam em áreas protegidas ou que podem vir a estar sob proteção e € 96 bilhões investidos em todo o mundo em empresas envolvidas em controvérsias ambientais. Este artigo se baseia no DNB (2020) e, embora se concentre mais nos bancos e em sua exposição doméstica à perda de biodiversidade por meio de atividades de empréstimo, ele amplia o DNB (2020) em duas direções. Em primeiro lugar, este artigo estima o impacto da perda de serviços ecossistêmicos sobre os NPLs de bancos brasileiros. Em segundo lugar, ele mede os riscos de transição com base nos planos do governo brasileiro com relação às áreas de conservação da biodiversidade, em oposição aos cenários de expansão de áreas protegidas. O último envolve um grau significativo de incerteza, uma vez que a designação de áreas protegidas geralmente resulta de extensa tomada de decisão envolvendo um amplo espectro de partes interessadas. Este artigo tem como objetivo contribuir para o crescente interesse entre bancos centrais e supervisores sobre o impacto da perda de biodiversidade no setor financeiro. Um progresso significativo foi feito na identificação e medição dos riscos financeiros decorrentes das mudanças climáticas (veja, por exemplo, Bank of England 2018; DNB 2019; Banque de France 2021), especialmente porque o NGFS liderou esses esforços. Porém, apenas recentemente os bancos centrais e supervisores reconheceram a necessidade de estender seu foco das mudanças climáticas aos desafios de abordar as implicações de riscos mais amplos relacionados à natureza e à conservação da natureza e da biodiversidade. Para tanto, a NGFS lançou um grupo de estudos sobre biodiversidade e estabilidade financeira, com o objetivo de melhorar nosso entendimento coletivo sobre o impacto das finanças no fornecimento de serviços ecossistêmicos essenciais, bem como as consequências da perda de biodiversidade para a estabilidade financeira. 9 Por fim, o objetivo é estabelecer uma abordagem baseada em evidências de como os bancos centrais e supervisores poderiam cumprir seu dever no contexto da perda de biodiversidade. Este artigo busca ser um passo nessa direção e aponta a importância de que bancos e o BC ampliem seu conhecimento sobre os riscos financeiros associados à perda de biodiversidade. O restante deste artigo está organizado da seguinte forma. A seção 2 apresenta a metodologia e os dados usados para a análise. A seção 3 discute os principais resultados, e a seção 4 é a conclusão. 9 Veja https://www.ngfs.net/en/communique-de-presse/ngfs-and-inspire-launch-joint-research-project- biodiversity-and-financial-stability. 6 2. Metodologia e dados Esta seção apresenta os métodos e os bancos de dados usados para estimar a exposição dos bancos brasileiros aos riscos físicos e de transição associados à perda de biodiversidade. Nossa metodologia de análise de riscos físicos abrange dois aspectos. Primeiro, avaliamos a extensão da exposição potencial do setor bancário à disponibilidade reduzida de serviços ecossistêmicos. Em seguida, oferecemos estimativas preliminares do impacto sobre os NPLs dos bancos em um cenário de colapso dos serviços ecossistêmicos. Também lidamos com os riscos de transição de dois ângulos diferentes. Primeiro, empregamos métodos espaciais para determinar a alocação de empréstimos em áreas protegidas e áreas prioritárias para a conservação da biodiversidade. Em seguida, avaliamos a exposição do sistema bancário a empresas com impacto negativo no meio ambiente. As informações de diferentes fontes são combinadas para dimensionar o impacto potencial dos riscos financeiros relacionados à natureza no Brasil. A restrição de dados restringe o escopo de nossa análise à exposição doméstica dos bancos à perda de biodiversidade por meio de atividades de empréstimo. Em vez de analisar todo o espectro de instituições financeiras, nos concentramos apenas no setor bancário, que representa cerca de dois terços do total de ativos do sistema financeiro no Brasil. A Tabela 1 apresenta um resumo dos dados empregados na análise. Riscos físicos Perda de serviços ecossistêmicos O setor bancário está indiretamente exposto a riscos físicos ao fornecer crédito a empresas cujo processo de produção depende de serviços ecossistêmicos. Para avaliar essa exposição, determinamos a quantidade de crédito que os bancos brasileiros alocam para empresas com processos de negócios que dependem de serviços ecossistêmicos. Contamos com o banco de dados ENCORE, que fornece uma lista de 86 processos de negócios diferentes que dependem diretamente de 21 serviços ecossistêmicos (veja Tabela 2). 10 Seguimos a metodologia estabelecida no DNB (2020) para vincular nossos dados sobre a carteira de crédito bancário por setor econômico (por exemplo, agricultura) com seus processos de produção associados (por exemplo, culturas arvenses de sequeiro). 11 Além disso, para determinar quais serviços ecossistêmicos podem ser mais críticos para os processos de produção e quais impactos potenciais podem ser de maior preocupação para os bancos, aproveitamos a avaliação de materialidade de dependência do ENCORE. Usando pesquisas do setor e entrevistas com 10 A lista completa de processos de negócios e serviços ecossistêmicos está disponível em: https://encore.naturalcapital.finance/en/data-and-methodology/services. 11 O DNB (2020) vinculou os processos de produção da ENCORE (com base no GICS) à NACE Rev 2. Usamos isso como ponto de partida para facilitar a vinculação com a norma de classificação do setor econômico brasileiro, CNAE 2.0. A ligação não é unívoca, pois vários processos de negócios podem ser atribuídos a setores individuais ou vice-versa. Portanto, combinar processos diversos de negócios em um setor exigia suposições de como esses processos são usados no setor econômico. 7 especialistas, a avaliação de materialidade do ENCORE se traduz em uma classificação que varia de muito baixa a muito alta, refletindo como uma interrupção no fornecimento de serviços ecossistêmicos pode afetar materialmente o desempenho dos negócios e se refletir em perdas financeiras (veja Figura 2 para um exemplo ilustrativo). 12 Com base no crédito setorial em aberto dos bancos brasileiros, a materialidade das dependências e impactos potenciais dos serviços ecossistêmicos oferecem uma estimativa preliminar da exposição dos bancos ao risco físico de perda de biodiversidade. Mostramos o valor total de crédito que, em março de 2021, está exposto a cada serviço ecossistêmico por classificação de materialidade de dependência. Por exemplo, considere uma empresa dependente de dois serviços ecossistêmicos (por exemplo, proteção contra enchentes e controle de doenças). Cada real que esta empresa pegava emprestado contaria como um ao medir a exposição a cada serviço. Essa métrica fornece um relato completo da exposição do sistema financeiro a cada serviço ecossistêmico individual, embora os processos de negócios frequentemente dependam de vários serviços ecossistêmicos, portanto, os primeiros devem ser analisados individualmente e não podem ser somados. Uma segunda métrica é calculada contabilizando apenas os serviços ecossistêmicos com dependências altas ou muito altas para lidar com a questão da adicionalidade. Suponha que uma empresa que tomou emprestado um real dependa de três serviços ecossistêmicos, dois dos quais com alta materialidade e o terceiro com média materialidade. Em seguida, o real emprestado será distribuído igualmente aos dois serviços ecossistêmicos com alta materialidade. Esse método permitiria medir a exposição geral dos bancos a um ou mais serviços ecossistêmicos, sob o risco de subestimar a exposição de empresas dependentes de serviços ecossistêmicos com classificações de materialidade mais baixas. Além disso, dividimos essa exposição por fonte de financiamento (vinculado x não vinculado), tamanho dos bancos, 13 tamanho dos mutuários e qualidade do empréstimo. Em geral, nossa avaliação de risco físico deve ser considerada como um limite inferior, pois considera apenas as dependências de primeira ordem de um setor econômico dos serviços ecossistêmicos. Conforme observado pelo DNB (2020), no banco de dados ENCORE um processo de produção, como o cultivo de safras, é diretamente dependente da polinização animal. No entanto, o processamento de alimentos, uma indústria secundária, depende indiretamente da polinização animal, mas isso não é capturado pelo banco de dados. 12 Os dados de dependências em serviços ecossistêmicos do ENCORE são baseados em revisões de literatura realizadas para cada classe de serviço ecossistêmico e uma combinação de processos de produção usando Web of Science, Google e pesquisas de documentos importantes (por exemplo: TEEB for Business, empresas líderes no setor e iniciativas da indústria). Foram realizadas entrevistas com especialistas do setor para validar informações ou para abordar lacunas de dados para alguns setores ou processos de produção. Veja https://encore.naturalcapital.finance/en/data-and-methodology/methodology. 13 Seguimos a classificação do BC para o tamanho dos bancos. Particularmente, grandes bancos são aqueles com uma exposição total ao índice do PIB maior que 10 por cento ou aqueles com ativos estrangeiros maiores que US$ 10 bilhões. 8 Perda de biodiversidade e qualidade de empréstimos bancários A perda de serviços ecossistêmicos impacta potencialmente o balanço dos bancos. Para oferecer um exercício ilustrativo desses efeitos, usamos a literatura existente. Primeiramente, buscamos estimativas de tendências em serviços ecossistêmicos e indicadores econômicos até 2030 em um cenário de colapso do ecossistema, ou seja, um cenário em que a pressão sobre os ecossistemas os leva ao ponto de inflexão, resultando em um colapso no fornecimento de serviços ecossistêmicos. Em seguida, é determinada a variação do NPLs dos bancos associados às condições macroeconômicas após o colapso nos serviços ecossistêmicos.14 Ao incorporar serviços ecossistêmicos selecionados em um modelo de equilíbrio geral computável, um novo estudo do Banco Mundial tenta quantificar o nexo entre as economias e a natureza (Banco Mundial, 2021) O estudo fornece estimativas específicas de cada país do declínio no crescimento do PIB até 2030 (usando 2021 como base de referência) devido a um colapso em uma seleção de quatro serviços ecossistêmicos: polinização de safras por polinizadores selvagens, regulação do clima por armazenamento e sequestro de carbono, fornecimento de alimentos provenientes da pesca marinha e fornecimento de madeira. O colapso dos serviços ecossistêmicos é comparado a um cenário habitual de negócios, onde não se alcança nenhum ponto de inflexão ecológico. 15 Limitações, incluindo a incorporação não completa de ciclos de feedback e a consideração de um número limitado de serviços ecossistêmicos, sugerem que este exercício fornece apenas estimativas das implicações econômicas do colapso dos serviços ecossistêmicos. Choques de estabilidade financeira tendem a ser mais severos se eles são abruptos e inesperados, enquanto perdas graduais permitem que os bancos administrem e ajustem melhor suas carteiras. No entanto, o estudo do Banco Mundial não fornece a distribuição do impacto econômico ao longo do período de projeção, um dado importante para estimar o impacto potencial no setor bancário. Para lidar com essa limitação, realizamos dois exercícios. No primeiro cenário, partimos do princípio de que o impacto total sobre o crescimento do PIB de um colapso nos serviços ecossistêmicos ocorre no final do período de projeção. No segundo exercício, partimos do princípio que metade do impacto ocorre no final do período de projeção. 14 Devido à falta de dados sobre perda devido a inadimplência, só podemos considerar informações sobre frequência/probabilidade de inadimplência e não podemos estender para um quadro de perda esperada. 15 A modelagem ecossistema-economia do Banco Mundial combina um modelo de equilíbrio geral com um conjunto de modelos de serviços ecossistêmicos que cobrem polinização, fornecimento de madeira, pesca e sequestro de carbono, cujas interações com a economia são projetadas para o ano 2030. Para tanto, o modelo se baseia em três bases: (i) um modelo econômico de equilíbrio geral (CGE) que permite modelar as mudanças no uso do solo e incorporar a noção de que os setores competem apenas por terras adequadas ao uso; (ii) um conjunto de modelos de serviços ecossistêmicos espacialmente explícitos para refletir o fato de que a economia está inserida na biosfera; e (iii) um simulador que permite converter os resultados do modelo econômico em variáveis espacialmente explícitas que servem como insumos para os modelos de ecossistema. O modelo executa cada uma das bases de forma sequencial. 9 Esses exercícios baseiam-se no pressuposto de mudanças abruptas no ecossistema devido à degradação da biodiversidade. Essas suposições estão de acordo com Lovejoy e Nobre (2018), que apontam que uma perda de apenas 20-25 por cento do bioma remanescente na bacia amazônica poderia desencadear uma mudança no regime do ecossistema. 16 A ligação com o setor bancário é feita pela relação histórica entre a qualidade dos empréstimos bancários e o crescimento do PIB. A capacidade de pagamento dos mutuários tende a se deteriorar em condições macroeconômicas mais fracas. A evidência empírica documenta uma relação negativa entre os NPLs e o crescimento do PIB (veja, por exemplo, Balgova, Plekhanov e Skrzypinska 2017; Ghosh 2015; e Beck e Jakubik 2013). Para o Brasil, o crescimento do PIB também se destaca como um impulsionador relevante dos NPLs, conforme documentado, entre outros, por Vazquez, Tabak e Souto (2012) e Chang e outros (2008). Com base na sensibilidade histórica dos NPLs ao crescimento do PIB no Brasil, fornecemos estimativas indicativas sobre a variação nos NPLs associados às quedas no PIB como resultado de um colapso nos serviços ecossistêmicos. Dado o conhecimento limitado sobre todos os potenciais canais que podem causar um impacto no setor bancário, nossa estimativa deve ser considerada conservadora. Riscos de transição Atividades em pontos críticos de biodiversidade Os bancos correm riscos de transição quando fornecem financiamento a empresas que tendem a precisar de um ajuste oneroso para uma economia mais sustentável. Um bom exemplo é o daquelas empresas que operam em áreas protegidas ou valiosas. De acordo com Dasgupta (2021), grande parte da biodiversidade global está fora das áreas protegidas atualmente. A materialização desses riscos implicaria para o governo designar novas unidades de conservação e/ou tornar as regulamentações ambientais mais rigorosas, o que obrigaria as empresas que operam na área a se adaptarem ou mesmo a se realocarem, impondo custos às empresas envolvidas. Portanto, o ponto de partida desta análise está na identificação das áreas atualmente protegidas. Em seguida, identificamos áreas valiosas que poderiam ser protegidas em um futuro próximo com base, entre outras coisas, em sua riqueza de biodiversidade. Terceiro, estimamos a alocação de empréstimos bancários para todas as empresas formais brasileiras e seus estabelecimentos, também levando em consideração as informações geográficas. Como uma etapa final, resumimos todas as informações obtidas para estimar a alocação potencial de empréstimos em pontos críticos de biodiversidade em nível municipal. Para identificar as áreas protegidas, usamos a Base de Dados Mundial de Áreas Protegidas (UNEP- WCMC e IUCN 2019) Nossa definição de áreas protegidas abrange todas as seis categorias da 16 De acordo com as estimativas atuais do WWF, cerca de 17 por cento da floresta amazônica foi perdida nos últimos 50 anos. Veja https://www.worldwildlife.org/threats/deforestation-and-forest-degradation. 10 União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN 2016) 17 Reconhecemos que nem todas as atividades financiadas com empréstimos bancários são ou podem ser proibidas em áreas protegidas. Por exemplo, as áreas protegidas catalogadas no IUCN VI (áreas protegidas com uso sustentável de recursos naturais) são designadas para uso não industrial e de baixo nível de recursos naturais compatíveis com a conservação da natureza. Mesmo assim, decidimos contabilizar essas áreas como protegidas. Por causa de seus ecossistemas e habitats conservados, eles poderiam potencialmente “fazer a transição” para níveis de proteção mais rígidos no futuro. Para detectar áreas que podem ser protegidas nos próximos anos, utilizamos o Planejamento Sistemático da Conservação (PSC), iniciativa do governo brasileiro lançada no início dos anos 2000 e liderada pelo Ministério do Meio Ambiente.18 O PSC coleta e processa informações espaciais sobre a abundância de espécies, pontos críticos de biodiversidade, custos e oportunidades de conservação. Essas informações são complementadas e validadas por meio de uma série de oficinas participativas com especialistas e representantes de diversos setores. Esse processo ocorre a cada cinco anos e resulta no mapeamento de áreas de ações prioritárias para a conservação da biodiversidade em todos os principais biomas e zonas costeiras e marinhas.19 As ações são classificadas como extremamente altas, muito altas e altas. Utilizamos métodos espaciais para determinar as áreas prioritárias que não se sobrepõem às áreas protegidas existentes e sua localização nas divisões político-administrativas brasileiras. Nossa metodologia para realizar essa identificação segue de perto Fonseca e Venticinque (2018). Em primeiro lugar, estimamos as lacunas de conservação da biodiversidade no Brasil como as áreas prioritárias mais rigorosas atualmente não protegidas. Em outras palavras, são áreas com ações de extrema prioridade para a conservação da biodiversidade que excluem as áreas protegidas existentes. Além disso, as áreas prioritárias marcadas como muito altas e altas que não se sobrepõem às áreas protegidas também são identificadas. O tamanho dessas áreas e sua localização são apresentados na Figura 3, juntamente com as linhas das unidades federativas. O desenho das divisões político-administrativas foi possível mesclando as informações espaciais obtidas nas etapas anteriores com as informações do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE 2019) Estimamos o endividamento e a localização geográfica das empresas combinando informações granulares de crédito em aberto por unidade federativa e setor econômico, com informações não financeiras detalhadas de todas as empresas brasileiras formais. Por um lado, nossos dados de crédito em aberto (em março de 2021) fornecem uma desagregação das 27 unidades federativas brasileiras e mais de 1.300 subclasses categorizadas de acordo com a Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE 2.0). Por outro lado, o último censo do mercado de trabalho formal brasileiro, Relação Anual de Informações Sociais (RAIS 2019), fornece 17 As categorias da IUCN são: (Ia) Reserva Natural Estrita, (Ib) Área de Vida Selvagem, (II) Parque Nacional, (III) Monumento Natural, (IV) Área de Gestão de Espécies e Habitat, (V) Paisagens Protegidas Terrestres e Marinhas (VI) Área protegida de utilização sustentável dos recursos naturais. 18 Para uma discussão sobre o PSC, consulte Fonseca e Venticinque (2018), Sarkar e Illoldi-Rangel (2010), e Margules e Pressey (2000). 19 Veja http://areasprioritarias.mma.gov.br/2-atualizacao-das-areas-prioritarias. 11 informações sobre 3,9 milhões de estabelecimentos comerciais localizados nos 5.659 municípios brasileiros.20 A caracterização das empresas na RAIS inclui sua atividade econômica (CNAE 2.0) e o município onde operam. Uma vez que ambos os conjuntos de dados identificam divisões administrativas e usam a mesma classificação para classificar os setores econômicos das empresas, poderíamos combiná-los. Presumimos que estabelecimentos com tamanho semelhante dentro do mesmo setor econômico e divisão administrativa apresentam endividamento bancário semelhante. Portanto, distribuímos o crédito em aberto dentro das unidades federativas e setores econômicos de acordo com a participação setorial dos estabelecimentos de empregados ativos. 21 Finalmente, resumimos as informações geográficas e financeiras no nível municipal. Nossa restrição obrigatória para realizar uma análise específica de localização geográfica é a disponibilidade de informações georreferenciadas abrangentes sobre empresas (e estabelecimentos) em todo o território brasileiro e seus créditos pendentes com o setor bancário.22 Portanto, ao agregar o crédito em aberto dos estabelecimentos, podemos estimar o valor dos empréstimos que os bancos alocam a cada município. Em seguida, pesamos a alocação de empréstimos dos municípios pela proporção da superfície dos municípios coberta por áreas protegidas e áreas prioritárias que não se sobrepõem às áreas protegidas. Isso nos oferece uma estimativa da exposição dos bancos aos riscos de transição por meio de empresas que podem já estar operando em áreas protegidas ou em áreas com biodiversidade que podem se tornar protegidas nos próximos anos. Por exemplo, suponha que 5 por cento da superfície do município “A” seja coberta por áreas protegidas e que os bancos tenham uma carteira de crédito em aberto de R$ 100 alocados no município “A”. Então, a exposição de crédito dos bancos brasileiros aos riscos de transição no município “A” é de R$ 5. Ter os municípios como nossa unidade de análise acarreta ressalvas inevitáveis, pois o tamanho dos municípios varia consideravelmente em todo o país. Por exemplo, o município de Altamira (Pará) é o maior do Brasil, com 159.533 quilômetros quadrados ou 45 mil vezes maior que o menor, Santa Cruz de Minas (Minas Gerais). Quanto maior o município, maior a probabilidade de nosso erro de estimativa. 20 O RAIS 2019 contém um universo de 7,9 milhões de unidades. Excluímos de nossa amostra as unidades do setor financeiro e aquelas que não tinham funcionários ou mantiveram suas atividades inativas durante 2019. Após a limpeza dos dados, chegamos a 3,9 milhões de estabelecimentos, empregando um total de 46,5 milhões de funcionários ativos. 21 Em outras palavras: = ∗ � �, onde denota o crédito pendente do ∑=1 estabelecimento que atua no setor e unidade federativa . 22 Estudos como o DNB (2020) ou outros relacionados a riscos climáticos (por exemplo, NGFS 2020a) usam dados do Four Twenty Seven para identificar a localização da empresa. No entanto, sua cobertura para o Brasil é muito limitada. 12 Controvérsias ambientais Os bancos enfrentam riscos de reputação ao financiar projetos que têm um impacto negativo sobre o meio ambiente, especialmente quando estes últimos estão envolvidos em controvérsias públicas, como derramamentos de óleo ou extenso desmatamento. O impacto na reputação é considerado maior quando as empresas apresentam sistemas inadequados para gerenciar a pegada ambiental de suas operações. Esse risco está sendo cada vez mais reconhecido por bancos e instituições financeiras, à medida que informações sobre degradação ambiental de alto perfil passam a fazer parte da tomada de decisão de investidores globais. Grandes empresas brasileiras têm enfrentado pressão de investidores e de bancos para lidar com os riscos de desmatamento e apresentar planos de ação. Por exemplo, a maior empresa de processamento de carne do país enfrentou recentemente a exclusão de suas ações dos fundos de uma grande gestora de ativos, bem como advertências de bancos contra investimentos na empresa devido a preocupações com o desmatamento na Amazônia. 23,24 Em linha com o DNB (2020), o crédito fornecido a empresas envolvidas em controvérsias ambientais é nossa proxy para os riscos de reputação dos bancos. O banco de dados MSCI ESG mantém um registro das controvérsias das empresas listadas e avalia a gravidade de seu impacto no meio ambiente por uma combinação da escala dos impactos (sua disseminação) e sua natureza (de mínimo a notório).25 O MSCI define controvérsias como eventos únicos ou situações contínuas em que as operações ou produtos da empresa supostamente têm um impacto ambiental negativo. A base de dados leva em consideração o fato de que o impacto de alguns eventos é indireto ou de difícil determinação, portanto, com menor impacto na pontuação final. Em contraste, outros eventos podem afetar um ecossistema particularmente vulnerável, ou encontram-se evidências de que a empresa deliberadamente agiu em desrespeito à lei ou ao meio ambiente, exacerbando a relevância da controvérsia negativa. Após a identificação das empresas com controvérsias ambientais, as informações de seus relatórios anuais permitem determinar o volume de empréstimos que essas empresas receberam de bancos brasileiros. 3. Estimando os riscos financeiros da perda de biodiversidade Riscos físicos Perda de serviços ecossistêmicos Os bancos brasileiros emprestam R$ 811 bilhões para empresas cujos processos de negócios têm dependência alta ou muito alta de um ou mais serviços ecossistêmicos. Este montante representa 46 por cento da carteira de crédito corporativo e 20 por cento da carteira de crédito total (Figura 23 Veja https://www.reuters.com/article/us-brazil-jbs-nordea/nordea-drops-jbs-shares-over-environment-covid- 19-response-idUSKBN24X3VD 24 Veja https://www.theguardian.com/environment/2020/aug/12/hsbc-sounds-alarm-over-investment-in-meat- giant-jbs-due-to-deforestation-inaction 25 Reconhecemos que podemos estar incorrendo em uma subestimação significativa, visto que contabilizamos apenas empresas listadas. No entanto, até onde sabemos, o banco de dados MSCI ESG tem a cobertura mais abrangente das controvérsias ambientais das empresas no Brasil. 13 4). Em outras palavras, 46 por cento dos empréstimos que os bancos alocam às empresas estão sujeitos a perdas financeiras potenciais devido a perturbações nos serviços ecossistêmicos. Ao analisar separadamente essa estimativa agregada pela fonte de recursos (vinculados x não vinculados), porte dos bancos, porte dos tomadores de empréstimo e qualidade do empréstimo, encontramos evidências de heterogeneidade na exposição a riscos físicos. O crédito vinculado está marginalmente mais exposto ao risco de perda de biodiversidade. O mercado de crédito brasileiro é historicamente caracterizado por pesadas intervenções governamentais para fins de alocação. Recursos vinculados são créditos concedidos por instituições financeiras com subsídios implícitos ou explícitos do governo. 26 Em março de 2021, os recursos vinculados representavam 38 por cento do crédito total a empresas não financeiras. A exposição de risco relativa dessa modalidade de crédito em relação ao crédito não-vinculado é um pouco diferente. Considerando que 45 por cento do crédito não-vinculado é para empresas com processos de negócios com dependência alta ou muito alta de um ou mais serviços ecossistêmicos, esse número é 3,5 pontos percentuais maior no caso de recursos vinculados (Figura 5). Essa descoberta pode ter implicações importantes para o desenho de esquemas de crédito subsidiado. O crédito concedido por bancos menores e o crédito bancário a pequenas e médias empresas (PMEs) são proporcionalmente mais suscetíveis a perdas financeiras potenciais devido a perturbações nos serviços ecossistêmicos. Em detalhe, 49,8 por cento do crédito fornecido por bancos menores a empresas não financeiras é para aquelas com processos de negócios com dependência alta ou muito alta de um ou mais serviços ecossistêmicos, um número que é 6,5 pontos percentuais maior do que no caso de grandes bancos. Além disso, 48,6 (43,9) por cento do crédito bancário para PMEs (grandes empresas) é concedido àquelas com processos de negócios com dependência alta ou muito alta de um ou mais serviços ecossistêmicos. O crédito concedido a empresas com processos de negócios com dependência alta ou muito alta de um ou mais serviços ecossistêmicos já apresenta sinais de estresse. Particularmente, descobrimos que a carteira de NPLs dos bancos exibe uma parcela maior de empréstimos inclinados a processos de negócios vulneráveis a perturbações nos serviços ecossistêmicos (47,8 por cento) em comparação com sua carteira com bom desempenho (45,9 por cento). No caso de degradação da biodiversidade, os efeitos no setor bancário podem ser mais significativos se as empresas já estiverem financeiramente estressadas anteriormente. O número de serviços ecossistêmicos que apoiam processos de produção específicos varia consideravelmente. Processos como culturas arvenses irrigadas de grande e pequena escala são os que têm dependência alta ou muito alta de um grande número de serviços ecossistêmicos com 13 e 12, respectivamente. Por outro lado, processos como o transporte ferroviário dependem criticamente de apenas um serviço ecossistêmico, a saber, o controle de erosão por estabilização de massa. 26 Para uma discussão sobre crédito vinculado no Brasil, veja, por exemplo, Byskov (2019). 14 Em termos de dependência de serviços ecossistêmicos específicos, descobrimos que os setores econômicos para os quais os bancos brasileiros emprestaram dinheiro são consideravelmente dependentes de serviços ecossistêmicos que fornecem regulação do clima, águas superficiais e subterrâneas. Em detalhes, de cada real que os bancos emprestam para empresas, 23, 20 e 17 centavos, respectivamente, têm dependência alta ou muito alta desses serviços ecossistêmicos (Figura 6). Dentre eles, as águas superficiais são o serviço ecossistêmico com maior participação de materialidade de dependência muito alta. Em termos dos setores econômicos ligados a serviços ecossistêmicos mais substancialmente expostos, os mais expostos são serviços públicos, manufatura de produtos alimentícios e construção civil (Figura 7). Juntos, esses setores representam 18 por cento do total da carteira de crédito a empresas não financeiras. Perda de proteção contra inundações e tempestades, estabilização de massa e controle de erosão e manutenção do fluxo de água também apresentam riscos físicos relevantes. Os bancos brasileiros alocam 8 por cento de sua carteira de crédito corporativo a setores econômicos com dependência alta ou muito alta de serviços ecossistêmicos que fornecem proteção contra enchentes e tempestades. Contabilizando a classificação de materialidade média, este serviço ecossistêmico apresenta a maior dependência em todos os serviços avaliados, com 59 por cento (Figura 6). A seguir, em relevância, de cada real que os bancos emprestam para empresas, 6 e 5 centavos têm dependência alta ou muito alta na estabilização de massa e no controle da erosão e na manutenção do fluxo de água. Perda de biodiversidade e qualidade de empréstimos bancários Em um cenário usual de negócios, projeta-se que o Brasil perderá 6,5 milhões de hectares de terras naturais entre 2021 e 2030, o maior para um único país (Banco Mundial, 2021)27 A conversão em pastagens e áreas agrícolas impulsiona as mudanças no uso da terra no Brasil. Essa perda do uso natural da terra causa impactos negativos sobre a disponibilidade de serviços ecossistêmicos (ou seja, polinização, fornecimento de madeira, pesca marinha e sequestro de carbono), afetando significativamente as perspectivas de crescimento econômico. Em nível global, o PIB real poderia diminuir em US$ 90 bilhões até 2030, o que poderia aumentar para US$ 225 bilhões se os danos da mudança climática associados à perda de ecossistemas forem levados em consideração. 28 Comparando o cenário usual com um cenário em que os principais serviços ecossistêmicos entram em colapso, o crescimento real do PIB global de 2021 a 2030 poderia diminuir em US$ 2,7 trilhões (-2,4%). Isso equivale a um declínio no crescimento real do PIB global em 10 por cento. O Brasil é um dos países com o maior declínio projetado em termos monetários de US$ 150 bilhões, equivalente a um crescimento do PIB 20 por cento menor (ou 5,5 pontos percentuais) de 2021 a 2030 (Figura 8 e Figura 9). O Banco Mundial (2021) destaca ainda o efeito adverso no 27 Esta comparação cobre 223 países e territórios, incluindo África Subsaariana (44), Resto do Sul da Ásia (5), Resto do Sudeste Asiático (7), América Central (32), América do Sul (11), Ásia Central (21) , Oriente Médio e Norte da África (17), Europa Outros (4), Resto da Ásia Oriental (3), Oceania (24) e UE (29). 28 Conforme indicado na seção de metodologia, essas estimativas são um limite inferior. 15 setor de oleaginosas do Brasil da perda de polinização a partir colapso do ecossistema, onde sua produtividade cairia 6 por cento. As condições macroeconômicas influenciam fortemente a qualidade dos empréstimos dos bancos no Brasil. Usando técnicas econométricas de painel dinâmico cobrindo as operações de 78 bancos brasileiros, Vazquez, Tabak e Souto (2012) mostram que uma queda de 2 pontos percentuais no crescimento anual do PIB está associada a um aumento de longo prazo nos NPLs de 3,3 pontos percentuais. Este parâmetro foi estimado com base em dados trimestrais entre o primeiro trimestre de 2003 e o primeiro trimestre de 2009 e focado nos empréstimos concedidos com recursos não-vinculados. A proporção média de NPL durante o período estudado de 7 anos (3,6 por cento) é amplamente semelhante ao que foi observado antes da pandemia de Covid-19 (3,2 por cento). Além disso, ambos os períodos excluem episódios de crise, reduzindo os problemas de comparabilidade do parâmetro. Isso é particularmente relevante, pois os NPLs são geralmente menores e menos voláteis durante tempos normais do que durante as crises bancárias (Ari e outros 2019). Com base nesses coeficientes estimados, estimamos que, em um cenário de baixa probabilidade e alto impacto, em que os serviços ecossistêmicos entram em colapso, o sistema bancário poderia ter um aumento de longo prazo nos NPLs corporativos da ordem de 9 pontos percentuais. Este exercício pressupõe que o impacto total no crescimento do PIB ocorra no final do período de projeção, ou seja, em 2030. Presumindo um impacto menos abrupto da perda de biodiversidade no crescimento do PIB, onde metade da queda do crescimento do PIB ocorre até 2029 (assim, os bancos são capazes de ajustar suas carteiras ao longo do tempo) e a outra metade se concentra em 2030, o aumento de longo prazo nos empréstimos corporativos poderia ser 4,5 por cento. Nossa análise de sensibilidade da qualidade dos empréstimos bancários é preliminar e ilustrativa apenas, mas fornece uma ordem de magnitude dos efeitos potenciais que uma deterioração nos serviços ecossistêmicos pode ter nos balanços dos bancos. Além disso, essa estimativa é baseada em dados agregados, ocultando efeitos heterogêneos ao nível setorial. Alguns setores deverão ser consideravelmente mais afetados do que outros em um cenário de contração da atividade econômica. Por exemplo, Vazquez, Tabak e Souto (2012) mostram uma maior sensibilidade das variações do PIB para crédito aos setores agrícola, sucroalcooleiro, pecuário e têxtil. Como efeito combinado, esses setores também são altamente dependentes da provisão de serviços ecossistêmicos. Riscos de transição Atividades em pontos críticos de biodiversidade Globalmente, as áreas protegidas aumentaram significativamente nos últimos anos, e espera-se que essa tendência continue à medida que os países concordam com metas mais ambiciosas sob os auspícios das Nações Unidas. O tamanho das áreas protegidas em todo o mundo quase dobrou para 15 por cento das terras e águas interiores em todo o mundo desde 1990 (UNEP-WCMC, IUCN e NGS 2018) Em 2010, as Partes da Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB), da qual 16 o Brasil é membro, adotaram o Plano Estratégico para a Biodiversidade 2011-2020 com a missão de conter a perda de biodiversidade e aumentar os benefícios que a biodiversidade proporciona às pessoas. Especificamente, a CDB estabeleceu a Meta Aichi 11, um compromisso de proteger pelo menos 17 por cento das áreas terrestres e de águas interiores até 2020. Prevê-se que na reunião da CDB de outubro de 2021, os países membros possam decidir aumentar seus compromissos de proteger a terra e as águas interiores em até 30 por cento. Tal expansão com base em critérios ecológicos teria um grande impacto sobre a situação de vastas regiões do Brasil. 29 No Brasil, a atual área total protegida de terra e águas interiores é de mais de 1,5 milhão de quilômetros quadrados, aproximadamente 18 por cento de sua superfície. O Brasil alcançou a Meta Aichi 11 de 2020 bem antes do tempo; em 2015, as áreas protegidas já cobriam 17,2 por cento (OCDE 2015). Hoje em dia, todas as unidades federativas têm áreas protegidas de 208 a mais de 500.000 quilômetros quadrados, representando cerca de 1 por cento a mais de 90 por cento da superfície de cada estado. 30 Por exemplo, Sergipe é um dos estados com menor proporção de áreas protegidas, 0,95 por cento, principalmente devido ao Parque Nacional da Serra de Itabaiana. Por outro lado, 90 por cento do Distrito Federal e 64 por cento do estado do Amapá, na Amazônia, estão protegidos (ver Figura 3 e Painel A da Figura 10). No Amapá, quase metade da área protegida é explicada por um dos maiores parques nacionais de floresta tropical do mundo, o Parque Nacional da Serra do Tumucumaque. Em termos absolutos, os estados com as maiores áreas protegidas são Amazonas e Pará, com mais de 500.000 e 400.000 quilômetros quadrados, respectivamente. As áreas prioritárias para a conservação da biodiversidade que não se sobrepõem às áreas protegidas atualmente cobrem 28 por cento do território brasileiro. O pipeline do governo brasileiro para a implementação de medidas para a conservação, recuperação e uso sustentável de ecossistemas tem Mato Grosso como o estado com a maior superfície de áreas prioritárias (40 por cento). Os estados de Tocantins e Bahia também têm uma parcela significativa de áreas prioritárias, com 36 e 34 por cento, respectivamente. No entanto, nossa definição de lacunas de conservação, uma medida mais conservadora que considera o nível de área de prioridade mais estrito (extremamente alto), mostra um quadro diferente. As lacunas de conservação são mais relevantes no Espírito Santo, Rio Grande do Sul e Rio de Janeiro, em torno de 10 por cento nos três estados. Cerca de um terço da carteira de empréstimos bancários para empresas é alocado para empresas em 10 municípios dos mais de 5.600 de todo o país (Figura 11). O Índice Herfindahl-Hirschman (IHH), uma medida quantitativa de concentração em um determinado mercado mostra um baixo 29 A mera designação de área protegida não é suficiente em termos de seu papel na conservação e restauração do capital natural. De acordo com Dasgupta (2021), apenas 20 por cento das áreas protegidas em todo o mundo estão sendo bem administradas. 30 Ao longo do artigo, consideramos o Distrito Federal como um estado para simplificação. 17 nível de conservação, de 233.31 No agregado estadual, a concentração ainda é relativamente baixa, com IHH de 1.299. A concentração geográfica das carteiras de empréstimos bancários no Brasil é a mais baixa da região da América Latina e Caribe (Calice e Miguel 2021). A região Sudeste concentra 51 por cento dos ativos do sistema bancário, sendo os estados de São Paulo e Rio de Janeiro os mais relevantes, com 30 e 11 por cento dos ativos do sistema, respectivamente. Em contraste, embora a Região Norte seja a mais extensa geograficamente, abrangendo 45 por cento do território brasileiro, seus 7 estados recebem apenas 4 por cento dos ativos bancários. Descobrimos que em 31 de março de 2020, os bancos brasileiros tinham R$ 254 bilhões em exposição de crédito a estabelecimentos que poderiam estar operando em áreas protegidas. Esse montante equivale a 15 por cento da carteira de crédito das empresas. A exposição poderia aumentar para R$ 437 bilhões (25 por cento da carteira de crédito corporativo) se as lacunas de conservação se fechassem, e para R$ 664 bilhões (38 por cento da carteira de crédito corporativo) se todas as áreas prioritárias fossem protegidas. A Figura 10, Painel B, apresenta mais detalhes. Controvérsias ambientais As empresas brasileiras com registro de controvérsias ambientais e que têm dados do balanço patrimonial disponíveis detinham R$ 109 bilhões em dívidas financeiras com instituições de crédito em 31 de dezembro de 2019. De 143 empresas brasileiras, 11 têm registro de incidentes ambientais. As empresas envolvidas em controvérsias graves ou muito graves tinham passivos de dívida de R$ 65 bilhões, enquanto as empresas com controvérsias moderadas estavam expostas em R$ 44 bilhões. Um exemplo conhecido de controvérsia ambiental muito grave foi a inundação e danos ambientais generalizados devido ao rompimento da barragem de rejeitos do Fundão, que causou inundações e danos ambientais generalizados no estado de Minas Gerais em 2015. Em um acordo com as autoridades brasileiras, a empresa concordou em pagar pelo menos R$ 20 bilhões em danos ambientais, sociais e econômicos em um período de 15 anos. Mais recentemente, o governo brasileiro multou outra empresa no valor de R$ 24 milhões por supostamente comprar gado criado em terras desmatadas ilegalmente. Este caso é catalogado como grave em nossa análise (ver Tabela 2). 4. Considerações finais A perda de biodiversidade pode ter consequências significativas para a economia e o setor financeiro no Brasil. Os resultados apresentados neste artigo, até onde sabemos, o primeiro a tentar quantificar a exposição dos bancos à perda de biodiversidade em um mercado emergente, 31 O IHH é calculado como uma soma dos quadrados das quotas de mercado (medidas como uma parcela da carteira de crédito total do setor bancário) de cada banco em um mercado. Um IHH inferior a 1.500 normalmente identifica baixa concentração, um IHH entre 1.500 a 2.500 identifica um mercado moderadamente concentrado, enquanto um IHH acima de 2.500 sugere um mercado altamente concentrado. 18 sugerem que os bancos brasileiros têm exposições materiais a riscos decorrentes da perda de biodiversidade. Os bancos brasileiros emprestam para empresas que dependem, pelo menos em parte, dos serviços ecossistêmicos para a produção de seus bens e serviços. A perda e a degradação dos serviços ecossistêmicos podem levar à interrupção substancial dos processos de negócios e perdas financeiras. Descobrimos que, em março de 2021 os bancos brasileiros tinham uma exposição de crédito doméstico pendente de R$ 811 bilhões a empresas não financeiras que operam em setores dependentes ou altamente dependentes de um ou mais serviços ecossistêmicos. Isso representou 46 por cento do total da carteira de empréstimos corporativos e 20 por cento da carteira de crédito total, e é ligeiramente inclinado para empresas que recebem recursos subsidiados pelo governo através de instituições financeiras. Em comparação, a exposição mundial total a riscos físicos de instituições financeiras holandesas no final de 2019 era de 36 por cento de sua carteira total (DNB 2020). A maior dependência das empresas brasileiras é dos ecossistemas que fornecem regulação do clima, águas subterrâneas e superficiais. Com base na sensibilidade histórica da qualidade do crédito dos bancos brasileiros às condições macroeconômicas (veja Vazquez, Tabak e Souto 2012) e na modelagem macroeconômica de serviços ecossistêmicos (Banco Mundial, 2021), estimamos que as perdas do PIB associadas ao colapso dos serviços ecossistêmicos poderiam se traduzir em um aumento cumulativo de longo prazo nos NPLs corporativos da ordem de 9 pontos percentuais, mantendo- se o restante constante. Os bancos brasileiros também emprestam para empresas que podem ter um impacto adverso na biodiversidade porque atuam em áreas protegidas e prioritárias para a conservação da biodiversidade e/ou estão envolvidas em atividades ambientalmente controversas. A adoção de regulamentos e políticas relacionados à biodiversidade, progresso tecnológico, mudanças no sentimento e nas preferências do mercado, litígios e danos à reputação podem gerar perdas para empresas e, em última instância, para os bancos. Descobrimos que no final de março de 2021 os bancos brasileiros tinham uma exposição de empréstimos pendentes de R$ 254 bilhões ou 15 por cento de sua carteira corporativa para empresas que potencialmente operam em áreas protegidas. Em comparação, a exposição global dos bancos holandeses a empresas que operam em áreas protegidas era de 7 por cento no final de 2019 (DNB 2020). A exposição dos bancos brasileiros poderia aumentar para R$ 437 bilhões (25 por cento da carteira de crédito corporativo) se as lacunas de conservação fechassem, e para R$ 664 bilhões (38 por cento da carteira) se todas as áreas prioritárias fossem protegidas. Também descobrimos que, em 31 de dezembro de 2019, os bancos brasileiros tinham uma exposição de empréstimo em aberto de R$ 109 bilhões para 11 das 143 empresas brasileiras listadas que têm registro de controvérsias ambientais. Em contraste, a exposição mundial das instituições financeiras holandesas a empresas envolvidas em incidentes era de € 96 bilhões no final de 2019 (DNB 2020) ou cerca de R$ 608 bilhões na taxa de câmbio atual. Nossos resultados, impulsionados pelas abordagens e dados disponíveis, estão sujeitos a várias ressalvas importantes. Elas sugerem que nossas estimativas erram por cautela, apresentando um limite inferior e, presumivelmente, subestimando as exposições totais ao risco físico. Uma 19 primeira ressalva refere-se ao conhecimento limitado da interação entre ecossistemas e entre os serviços ecossistêmicos e a economia. Isso sugere, entre outras coisas, que é difícil avaliar a materialidade das dependências dos processos de negócios, dos setores econômicos e das empresas nos serviços ecossistêmicos. Para isso contamos com estudos e abordagens existentes, que consideram apenas dependências de primeira ordem. Uma segunda ressalva relacionada é que omitimos em nossa análise a interação entre a perda de biodiversidade e as mudanças climáticas, que são fenômenos que se reforçam mutuamente, um agravando o outro (IPBES 2019). Isso sugere que os bancos brasileiros, que já estão significativamente expostos aos riscos físicos e de transição relacionados ao clima (Calice e Miguel 2021), podem enfrentar os impactos combinados decorrentes da interação entre a perda de biodiversidade e as mudanças climáticas e desastres naturais. Outra ressalva é que nossa análise se concentra apenas nas exposições domésticas de bancos brasileiros por meio de empréstimos. Embora representem a maior parte de seus ativos de risco, os bancos brasileiros podem estar expostos à perda de biodiversidade por meio de outras formas de investimento (isto é, investimento de capital). Eles também podem estar expostos a impactos regionais de perda de biodiversidade por meio de suas operações internacionais. Outras instituições financeiras, a saber, seguradoras, fundos de pensões e gestores de ativos, também podem ter exposição à perda de biodiversidade através das suas carteiras de investimento. Pesquisas adicionais podem abordar essas e outras imperfeições, inclusive aproveitando o trabalho da NGFS. Apesar de suas limitações, os resultados deste artigo destacam a materialidade da exposição dos bancos brasileiros aos riscos de perda de biodiversidade. Isso tem implicações tanto para os bancos quanto para o BC. Os bancos poderiam começar a tomar medidas para identificar e medir sua exposição à perda de biodiversidade com o objetivo de monitorar e mitigar quaisquer riscos materiais decorrentes de suas atividades de empréstimo e investimento. Os bancos também poderiam tomar medidas para divulgar o impacto de seus investimentos sobre a biodiversidade e exigir o mesmo das empresas em suas carteiras. A esse respeito, a recém-criada Força-Tarefa sobre Divulgações Financeiras Relacionadas à Natureza (TNFD) poderia oferecer a estrutura apropriada.32 Algumas instituições financeiras brasileiras já se juntaram ao Grupo de Trabalho Informal encarregado de desenvolver o escopo e o plano de trabalho da TNFD, e outras podem aderir. Os bancos brasileiros têm historicamente estado na vanguarda das iniciativas lideradas pela indústria para promover finanças sustentáveis e mitigar riscos sociais e ambientais. Eles também poderiam assumir a liderança na frente da biodiversidade. O BC, que em 2014 foi um dos primeiros bancos centrais a exigir que as entidades supervisionadas mensurassem os riscos socioambientais, recentemente acrescentou uma dimensão de sustentabilidade à sua estratégia institucional. O BC poderia explicitamente adicionar riscos relacionados à natureza à sua agenda de supervisão. O pilar sustentabilidade de 32 Com base no trabalho da Força-Tarefa sobre Divulgações Financeiras Relacionadas ao Clima, o TNFD foi estabelecido em julho de 2020 por um grupo de organizações internacionais e ONGs com o objetivo de fornecer uma estrutura para que as instituições financeiras e corporativas avaliem, gerenciem e relatem suas dependências e impactos na natureza. O objetivo é lançar o TNFD em 2021 e entregar uma estrutura de relatório relevante até 2023. Veja https://tnfd.info/. 20 seu programa de trabalho já inclui iniciativas que podem ter efeitos positivos na conservação e restauração da biodiversidade. Por exemplo, o BC planeja criar regulamentação para divulgação obrigatória de riscos sociais, ambientais e climáticos por parte das instituições financeiras. 33 O BC também planeja estabelecer um Escritório de Crédito Rural Sustentável que incorporaria critérios de sustentabilidade definidos tanto por regulamentos estatutários como não estatutários. 34 Essas ações podem ser complementadas por esforços que visem melhor compreender os canais de transmissão por meio dos quais a perda da biodiversidade pode se traduzir em riscos financeiros. Em uma extensão natural deste artigo, o BC poderia coletar e analisar dados mais granulares no nível da empresa. Com o tempo, o BC também poderia projetar e implementar testes de estresse relacionados à natureza, de acordo com a orientação internacional fornecida pela NGFS. O objetivo seria avaliar como e em que medida os fatores de biodiversidade podem ser incorporados em políticas microprudenciais e macroprudenciais relevantes. Para que o BC atinja o objetivo final de incorporar as considerações sobre a biodiversidade nas operações do sistema financeiro local, será necessário envolver as principais partes interessadas, como o Ministério da Fazenda, o Ministério da Agricultura e o setor financeiro como um todo. Uma melhor gestão dos riscos financeiros relacionados à natureza contribuiria não apenas para a segurança e solidez de bancos individuais e do sistema financeiro como um todo, mas também poderia ajudar a reduzir o fluxo de capital para atividades econômicas que prejudicam a natureza, reduzindo assim a necessidade de financiamento para conservar e restaurar a biodiversidade e os serviços ecossistêmicos. Globalmente, a lacuna estimada de financiamento da biodiversidade - a diferença entre o fluxo atual de recursos públicos e privados para a proteção da biodiversidade e o financiamento anual estimado necessário para interromper o declínio da biodiversidade global entre agora e 2030 - é em média US$ 711 bilhões por ano (Deutz e outros 2020) Embora novas fontes de financiamento sejam necessárias, incluindo mecanismos que aumentem o fluxo de capital privado para a conservação (Banco Mundial 2020), grande parte do financiamento pode vir de ações realizadas por instituições financeiras para compreender e gerenciar os riscos para a biodiversidade decorrentes de seus investimentos. Dada a quantidade significativa de dinheiro emprestado pelos bancos brasileiros para projetos potencialmente prejudiciais, a integração das práticas de gestão de riscos relacionados à biodiversidade no setor bancário apresenta uma enorme oportunidade de prevenir impactos negativos à biodiversidade. 33 Consulta Pública do BC nº 86/2021 - Regulamento sobre a divulgação de riscos socioambientais e climáticos pelas instituições financeiras. Disponível em https://www.bcb.gov.br/content/financialstability/ruralcreditdocs/BCB_Public_Consultation_86.pdf. 34 O Escritório de Crédito Rural Sustentável aplicará uma segunda camada de verificações automatizadas para verificar a conformidade ambiental das operações de crédito. A primeira camada de verificação, conforme definido pelo Conselho Monetário Nacional, será executada pelas instituições financeiras. 21 Referências Ari, M. A., Chen, S., and Ratnovski, M. L. 2019. The dynamics of non-performing loans during banking crises: a new database. 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Geneva, Switzerland: World Economic Forum. 24 Apêndice A. Figuras Figura 1: Relação Entre Biodiversidade e Estabilidade Financeira Fonte: NGFS INSPIRE 25 Figura 2 - Exemplo de Materialidade ENCORE de Dependências do Processo de Produção em Ecossistemas, Culturas Arvenses irrigadas em larga escala Água subterrânea Bio-remediação Estabilização de massa Diluição pela atmosfera e controle de erosão e ecossistemas Proteção contra Fibras e outros inundações e materiais Processo de tempestades produção ENCORE Controle de pragas Filtração Culturas arvenses irrigadas em pequena escala Qualidade da água Genetic materials Pecuária em grande escala (carne e Divisão CNAE 2.0 laticínios) Águas superficiais Ventilação Serviços ecossistêmicos Culturas arvenses de sequeiro em grande escala Agricultura, pecuária e Buffer e atenuação em Energia baseada em serviços relacionados massa de fluxos animais Culturas arvenses irrigadas em pequena escala Manter habitats de Regulação do clima berçário Pecuária de pequena escala (carne e laticínios) Seção CNAE 2.0 Manutenção do fluxo Mediação de impactos de água sensoriais Culturas arvenses de sequeiro em pequena escala Agricultura, pecuária, Polinização produção florestal, pesca e aquicultura Silvicultura em grande escala Produção florestal Controle de Doenças Silvicultura em pequena escala Qualidade do solo Peixes selvagens de água salgada Peixes selvagens Pesca e aquicultura capturados em água doce Aquicultura Fonte: elaboração própria com base no ENCORE e BC. Nota: Vermelho, dependência muito alta; laranja, dependência alta; amarelo, dependência média (com tons mais claros para baixa e muito baixa), cinza, não apresenta dependência. 26 Figura 3 - Áreas Protegidas e Prioritárias Fonte: elaboração própria baseada em UNEP-WCMC & IUCN (2019) e MMA 27 Figura 4 - Processos com Materialidade de Dependência Alta/Muito Alta Painel A - Exposição de Crédito a Processos com Materialidade de Painel B - Número de Processos de Produção com Materialidade de Dependência Alta/Muito Alta (em milhões de R$) Dependência Alta/Muito Alta (em número) produção de energia hidrelétrica Safras arvenses de sequeiro em gde escala; Pecuária Peq. escala Petróleo e Gás Int.; Mineração; Pecuária larg. escala; Serv. água 500 500 R$ Sem dependência A/MA de serviços ecossistêmicos 40 BRL 937.8 B (53.6% da carteira de NFC do sistema bancário 37 937.8 937.8 450 450 414.5 Produção de Tabaco; Pesca Selvagem água Salgada 414.5 Mínimo 1 dependência A/MA 35 dependências dedependências 400 400 BRL 811 B (46.4%) Prod. Hidrelétrica; Pesca selvagem água doce 30 Números de Processos de Produção 350 Safras arvenses irrigadas de larga escala 350 Safras arvenses irrigadas de peq. escala 301.4 no.de 301.4 300 300 25 mesmono. Silvicultura peq./larga escala c/mesmo 250 250 20 17 Grupoc/ 200 200 Bilhões--Grupo 15 17 150 150 Aquicultura BRLBilhões 10 100 100 BRL 55.5 55.5 4 50 5 50 2 2 2 2 11.0 11.0 9.7 4.9 1.9 4.9 4.9 9.7 1 1 1 1 1.9 1.9 0.1 0.1 4.9 1.9 4.9 4.9 0 0 0 0 0 1 1 2 2 3 3 4 4 5 5 6 6 99 10 10 11 11 12 12 13 13 0 1 2 3 4 5 6 9 10 11 12 13 de Serviços Número de Número Eco relacionados Serviços Eco com Classificação relacionados com Classificação de de Número de Serviços Eco relacionados com Classificação de Materialidade A/MA Materialidade A/MA Materialidade A/MA Fonte: elaboração própria com base no ENCORE e BC. 28 Figura 5 - Exposição de Crédito a Processos com Materialidade de Dependência Alta/Muito Alta 50 49.8 48.5 48.6 47.8 48 46.4 45.9 46 45.0 43.9 44 43.3 42 40 38 Performing loans Large Large Non-perf. loans Non-earmarked Earmarked SMEs Rest Source Size of banks Size of NFCs Quality Fonte: elaboração própria com base no ENCORE e BC. Nota: A linha horizontal tracejada representa a exposição de crédito agregada a processos com classificação de materialidade de dependência alta/muito alta (Figura 4a). Os grandes bancos correspondem à classificação S1 do BC: Bancos múltiplos, bancos comerciais, bancos de investimento, bancos de câmbio e bancos de poupança que apresentam uma razão de exposição total ao PIB maior que 10 por cento ou aqueles com ativos estrangeiros maiores que US$ 10 bilhões. 29 Figura 6 - Crédito para Empresas Não Financeiras: Dependência da Carteira do Sistema Bancário aos Serviços Ecossistêmicos Individuais (em porcentagem) Mass stabilisation and erosion control Flood and storm protection Climate regulation Bio-remediation Ground water Surface water Water flow maintenance Filtration Water quality Dilution by atmosphere and ecosystems Ventilation Mediation of sensory impacts Soil quality Pest control Fibres and other materials Buffering and attenuation of mass flows Genetic materials Disease control Pollination Animal-based energy Maintain nursery habitats 0% 10% 20% 30% 40% 50% 60% Share of Total Credit to Non-financial Corporates Very High High Medium Low Very Low No Dependency Fonte: elaboração própria com base no ENCORE e BC. 30 Figura 7 - Setores Econômicos Vinculados a Serviços Ecossistêmicos mais Substancialmente Expostos, março de 2021 Manufacture of metal Others, 12.1 products, 2.8 Manufacture of rubber products and plastic material, 2.9 Manufacture of cellulose, paper and Electricity, gas and paper products, 3.4 other utilities, 28.2 Water transportation, 4.2 Manufacture of chemicals, 4.2 Manufacture of food Non-real state products, 17.9 rentals, 4.7 Agriculture, livestock Building and related services, construction, 4.7 7.9 Trade and repair of motor vehicles and motorcycles, 6.9 Fonte: elaboração própria com base no ENCORE e BC. 31 Figura 8 - Mudança no Crescimento Real do PIB, 2021-2030, Sob o Cenário de Colapso do Ecossistema em Comparação com o Cenário Usual de Negócios Fonte: Banco Mundial, 2021. Figura 9 - Mudança no PIB real de 2030 sob o Cenário de Colapso do Ecossistema em Comparação com o Cenário sem Ponto de Inflexão Fonte: Banco Mundial, 2021. 32 Figura 10 - Estimativas de riscos de transição Painel A - Parcela de Áreas Protegidas e Prioritárias Painel B - Parcela da Carteira de Crédito por Unidade Federativa (em porcentagem) Corporativa Não Financeira de Bancos em Áreas Protegidas ou Prioritárias por Unidade Federativa, março de 2021 (em porcentagem) Fonte: elaboração própria. Nota: Nossa identificação é no nível municipal. Para fins de apresentação, agregamos por unidade da federação. 33 Figura 11 - Crédito Bancário em Aberto a Empresas Não Financeiras, Distribuição entre Municípios, março de 2021 (em porcentagem) Fonte: elaboração própria Nota: A participação dos municípios na distribuição é uma ligeira modificação dos parâmetros típicos do diagrama de caixa. As seis classes são definidas da seguinte forma: [min, p25], (p25, p50], (p50, p75], (p75, p75 + 1,5 * iiq], (p75 + 1,5 * iiq, top 100], (top 100], onde iiq é o intervalo interquartil. 34 B. Tabelas Tabela 1 - Fontes de dados Tipo de risco Dados Fonte Descrição Crédito pendente Banco Central do Brasil Saldo em final de período das operações de crédito em aberto no Sistema Financeiro Nacional, de seguindo a classificação CNAE (Classificação Nacional de Atividades Econômicas) no nível de subclasse (7 dígitos). Dados de março de 2021. Riscos físicos Classificação de ENCORE - Desenvolvido pela Aliança Materialidade das dependências dos Materialidade de Financeira para o Capital Natural em processos de produção em relação aos Dependência cooperação com UNEP-WCMC; serviços da biodiversidade. Os padrões de UNEP-WCMC e NCFA classificação são GICS (para processos de produção) e CICES (para serviços ecossistêmicos). 35 Crédito pendente Banco Central do Brasil Saldo em final de período das operações de crédito em aberto no Sistema Financeiro Nacional, de seguindo a classificação CNAE (Classificação Nacional de Atividades Econômicas) no nível de subclasse (7 dígitos). Dados de março de 2021. Localização geográfica Relação Anual de Informações Conjunto de dados comparados das unidades Sociais (RAIS) - Ministério da empregador-empregado reunido Economia do Brasil anualmente que fornece o censo do mercado de trabalho formal brasileiro. 36 Áreas protegidas Base de Dados Mundial de Áreas Base de dados global de áreas protegidas Riscos de transição Protegidas (WDPA). marinhas e terrestres. 37 Áreas prioritárias Ministério do Meio Ambiente Mapeamento de áreas de ações prioritárias (MMA) para a conservação da biodiversidade em todos os principais biomas e em zonas costeiras e marinhas. Malha municipal Instituto Brasileiro de Geografia e Malha digital municipal das divisões político- Estatística (IBGE) administrativas brasileiras 38 Controvérsias MSCI - Banco de Dados de Pontuação de controvérsia ambiental do Ambientais Controvérsia Ambiental MSCI Empréstimos bancários Relatórios anuais das empresas Consolidado em dezembro de 2019. para empresas 35 https://encore.naturalcapital.finance/en/data-and-methodology/data 36 http://www.rais.gov.br/sitio/index.jsf 37 https://www.protectedplanet.net/en/thematic-areas/wdpa?tab=WDPA 38 https://www.ibge.gov.br/en/geosciences/territorial-organization/territorial-organization/18890-municipal- mesh.html?edicao=27766&t=sobre 35 Tabela 2 - Mapeamento de Dependências do Processo de Produção e Serviços Ecossistêmico ENCORE ENCORE Dependency Materiality Rating Dilution by atmosphere and ecosystems Buffering and attenuation of mass flows Mass stabilisation and erosion control Mediation of sensory impacts Flood and storm protection Fibres and other materials Maintain nursery habitats Water flow maintenance ENCORE Production process Animal-based energy Climate regulation Genetic materials Bio-remediation Disease control Ground water Surface water Water quality Pest control Soil quality Ventilation Pollination Filtration Airport services Alcoholic fermentation and distilling Alumina refining Aquaculture Biomass energy production Cable and satellite installations on land Catalytic cracking, fractional distillation and crystallization Construction Construction materials production Cruise line provision Cryogenic air separation Distribution Electric/nuclear power transmission and distribution Electronics and hardware production Environmental and facilities services Fibre-optic cable installation (marine) Financial services Footwear production Freshwater wild-caught fish Gas adsorption Gas distribution Gas retail Geothermal energy production Glass making Hotels and resorts provision Houseware and specialities production Hydropower production Incomplete combustion Infrastructure builds Infrastructure holdings Infrastructure maintenance contracts Integrated oil and gas Iron extraction Iron metal production Jewellery production Large-scale forestry Large-scale irrigated arable crops Large-scale livestock (beef and dairy) Large-scale rainfed arable crops Leisure facility provision Life science, pharma and biotech manufacture Life science, pharma and biotech tools and services Managed health care Manufacture of machinery, parts and equipment Manufacture of semiconductor equipment Marine ports and services Marine transportation Membrane technology Metal processing Mining Natural fibre production Natural gas combustion Nuclear and thermal power stations Oil and gas drilling Oil and gas exploration surveys Oil and gas refining Oil and gas services Oil and gas storage Oil and gas transportation Paper packaging production Polymerization Processed food and drink production Production of forest and wood-based products Production of leisure or personal products Production of paper products Provision of health care Railway transportation Real estate activities Recovery and separation of carbon dioxide Restaurant provision Saltwater wild-caught fish Small-scale forestry Small-scale irrigated arable crops Small-scale livestock (beef and dairy) Small-scale rainfed arable crops Solar energy provision Solids processing Steel production Synthetic fertilizer production Synthetic fibre production Telecommunication and wireless services Tobacco production Tyre and rubber production Vulcanisation Water services (e.g. waste water, treatment and distribution) Wind energy provision Fonte: ENCORE. Nota: As cores indicam a classificação de materialidade: ● Muito alta, ● Alta, ● Média, ● Baixa e ●Muito baixa. 36 Tabela 2 - Exemplo de Controvérsias Ambientais Moderadas, Graves e Muito Graves Escala de Natureza Gravidade Indicadores Tipo Descrição Impacto do Dano Inundações graves e danos ambientais generalizados devido ao rompimento da barragem de rejeitos do Fundão. Em novembro de 2015, a barragem de rejeitos do Fundão rompeu, causando graves enchentes e danos ambientais generalizados no estado de Minas Gerais. A empresa operava a barragem de rejeitos, que armazenava rejeitos de minério de ferro de Muito Emissões e Extremamente Sério Estrutural uma mina da empresa. Lama, rejeitos de mina e águas residuais da barragem contaminaram Grave Lixo Tóxico Difundido gravemente o Rio Doce e seus afluentes e viajaram mais de 500 quilômetros até o Oceano Atlântico. Em um acordo com as autoridades brasileiras, a empresa concordou em pagar pelo menos R$ 20 bilhões em danos ambientais, sociais e econômicos em um período de 15 anos. Pena por suposta compra de gado de terras desmatadas ilegalmente. O IBAMA, órgão de proteção ambiental do Brasil, ordenou que a empresa pagasse uma multa de R$ 24 milhões por supostamente comprar gado criado em terras desmatadas ilegalmente. A empresa foi Gestão da Extremamente acusada de comprar intencionalmente 49 mil cabeças de gado de áreas restritas e por meio Grave Cadeia de Muito Sério Estrutural Difundido de transações de 'lavagem' que visavam ocultar as fontes de gado entre 2013 e 2016. O Abastecimento IBAMA afirmou que de todos os animais criados em áreas desmatadas, 84% foram fornecidos para essa empresa. Além da multa, o órgão suspendeu a operação de duas unidades frigoríficas e outras 13 unidades no estado do Pará. Multa e ordem para evacuação de residentes potencialmente expostos a resíduos cancerígenos no Estado do Rio de Janeiro. A empresa enfrentou uma multa de R$ 35 milhões e vários processos judiciais relacionados à contaminação ambiental de seu aterro de resíduos industriais na cidade de Volta Redonda, estado do Rio de Janeiro. De acordo com o Emissões e órgão regulador estadual de meio ambiente, o INEA, a empresa não divulgou aos moradores Moderado Limitado Sério Estrutural Lixo Tóxico que a área estava contaminada com resíduos perigosos, inclusive substâncias cancerígenas. A promotoria do meio ambiente do estado ordenou que a empresa retirasse os resíduos e evacuasse 750 famílias que moravam nas proximidades do local de descarte. O INEA e o Ministério Público Federal do Meio Ambiente entraram com ações judiciais distintas para obrigar a empresa a cumprir as exigências do Ministério Público Estadual do Meio Ambiente. Nota: Escala do impacto - A escala do impacto, em uma escala que varia de extremamente ampla a baixa; Natureza do dano - A natureza do impacto em uma escala que varia de dano grave a dano mínimo; Tipo - Problemas estruturais que podem representar riscos materiais futuros para a empresa. Fonte: Elaboração própria baseada em MSCI. 37