ANALYSIS OF SHARED STREETS Task B: Relatório dos Casos Parceiros: Novembro/2021 1 Centro de Inovação em Políticas Públicas – FGV Cidades Equipe do projeto: Coordenação geral: Pesquisadores: Ciro Biderman Bruna Pizzol Claudia Oshiro Coordenação executiva: David Escalante Sanchez Patrícia Alencar Silva Mello Diego Tomasiello Dustin Carlino Coordenadores de área: Gabriela Fischer Armani Claudia Acosta Gabriela Massuda Mariana Giannotti Gabriela Terentim Mariana Levy Gislene Pereira Frederico Roman Ramos Lucas Dias Cardoso German Freiberg Luiza Borges Robin Lovelace Taina Bittencourt Hannah Machado Taina Costa Sumi Mehta Tales Fontana Cunha Vitor Oliveira 1 Agradecimentos Agradecemos a Ana Waksberg Guerrini, Beatriz Moura dos Santos, Carlos Bellas Lamas, Gabriel Pereira Caldeira, Luca Di Biase, Maria Inês Garcia Lippe e Tais Fonseca de Medeiros pelos excelentes comentários e sugestões que aumentaram a qualidade do relatório de maneira substantiva. 2 SUMÁRIO Lista de Tabelas ............................................................................................................................................... 4 Lista de Figuras ................................................................................................................................................ 5 Lista de Quadros .............................................................................................................................................. 8 Introdução......................................................................................................................................................... 9 Rodízio, São Paulo – Brasil................................................................................................................. 12 Restricción Vehicular, Santiago – Chile ............................................................................................ 29 Zona Azul, São Paulo – Brasil ............................................................................................................ 43 Congestion Charge, Londres - Inglaterra ......................................................................................... 56 Ecopass e Area C, Milão – Itália......................................................................................................... 75 Pico y Placa e Tasa por Congestión, Santiago de Cali – Colômbia ............................................... 90 Superillas, Barcelona – Espanha ..................................................................................................... 104 Paris 15 minutes, Paris – França ..................................................................................................... 126 Metrominuto, Pontevedra – Espanha .............................................................................................. 141 Manual de Desenho de Ruas, Nova Iorque – Estados Unidos ...................................................... 154 Áreas de Velocidade Reduzida, São Paulo – Brasil ....................................................................... 169 Política do Espaço Público, Bogotá – Colômbia ............................................................................. 189 Projeto Cidade da Gente, Fortaleza – Brasil ................................................................................... 202 Walking Action Plan, Londres – Inglaterra ...................................................................................... 217 3 LISTA DE TABELAS Tabela 1. Lista de casos selecionados ........................................................................................................... 9 Tabela 2. Padrão de organização das fichas ............................................................................................... 10 Tabela 3. Disposições gerais Rodízio – São Paulo, Brasil .......................................................................... 24 Tabela 4. Resultados da restrição veicular (RV) de Santiago .................................................................... 34 Tabela 5. Disposições gerais Restricción Vehicular– Santiago, Chile....................................................... 37 Tabela 6. Disposições gerais - Zonal Azul - São Paulo, Brasil ................................................................... 52 Tabela 7. Comparação entre os sistemas de cobranças viárias de Londres ........................................... 61 Tabela 8. Receitas geradas a partir da Congestion Charge ...................................................................... 64 Tabela 9. Disposições gerais Congestion Charge, Londres - Inglaterra................................................... 70 Tabela 10. Receita anual referente ao programa Area C ........................................................................... 80 Tabela 11. Resultados do Ecopass............................................................................................................... 83 Tabela 12. Resultados da Área C ................................................................................................................. 84 Tabela 13. Disposições gerais Ecopass e Area C, Milão – Itália................................................................ 85 Tabela 14. Arrecadação com a Taxa de congestionamento – Cali, Colômbia 2017 – 2020................... 96 Tabela 15. Disposições gerais Tasa por congestión – Santiago de Cali, Colômbia .............................. 100 Tabela 16. Organização dos atores envolvidos no desenvolvimento do projeto piloto da Superilla de Poblenou. ...................................................................................................................................................... 108 Tabela 17. Organização das Superillas apresentadas pela prefeitura de Barcelona de acordo com sua data de início de projeto/lançamento da discussão, sua conclusão e situação atual. ........................... 116 Tabela 18. Disposições gerais Superillas – Barcelona, Espanha ............................................................ 121 Tabela 19. Disposições gerais Paris 15 minutes, Paris – França ............................................................ 137 Tabela 20. Disposições gerais Metrominuto, Pontevedra – Espanha ..................................................... 151 Tabela 21. Disposições gerais Manual de Desenho de Ruas, Nova Iorque – Estados Unidos ............. 166 Tabela 22. Resultados da área de velocidade reduzida Centro 1, inaugurado em 21/10/2013 ........... 180 Tabela 23. Resultados da área de velocidade reduzida Lapa 1, inaugurado em 01/09/2014 .............. 180 Tabela 24. Disposições gerais Áreas de Velocidade Reduzida, São Paulo – Brasil .............................. 185 Tabela 25. Distribuição do m² de espaço público por habitante entre 2016 – 2020 ............................. 196 Tabela 26. Disposições gerais Política do Espaço Público, Bogotá- Colômbia...................................... 198 Tabela 27. Atores envolvidos no BIGRS e respectivos recursos mobilizados. ...................................... 203 Tabela 28. Disposições gerais Projeto Cidade da Gente, Fortaleza – Brasil .......................................... 214 Tabela 29. Disposições gerais Walking Action Plan, Londres – Inglaterra ............................................. 229 4 LISTA DE FIGURAS Figura 1. Mini-anel viário ............................................................................................................................... 14 Figura 2. Folheto de divulgação ................................................................................................................... 18 Figura 3. Faixas informativas ........................................................................................................................ 18 Figura 4. Impacto do rodízio na extensão de lentidão na área interna ao Mini-Anel viário ..................... 19 Figura 5. Impacto do rodízio na extensão de lentidão na área interna ao Mini-Anel viário ..................... 20 Figura 6. Impacto do rodízio na extensão de lentidão na área interna ao Mini-Anel viário ..................... 21 Figura 7. Evolução da velocidade média anual no corredor Eusébio Matoso/ Rebouças/ Consolação 22 Figura 8. Anel viário Américo Vespúcio ....................................................................................................... 31 Figura 9. Distribuição das vias com Zona Azul............................................................................................ 43 Figura 10. Sinalização de vaga Zona Azul ................................................................................................... 48 Figura 11. Mapa da Greater London e seus 33 distritos ............................................................................ 56 Figura 12. Mapa da Região de Londres: Greater London (2) e City of London (1) ................................ 56 Figura 13. Mapa da Zona da Congestion Charge – Zona central de Londres. ........................................ 57 Figura 14. Mapa das zonas de cobrança de taxas sobre veículos de Londres ........................................ 59 Figura 15. Mapa da zona central de Londres para os limites da Taxa de Congestionamento, ULEZ e ampliação da ULEZ. ....................................................................................................................................... 62 Figura 16. Publicação em rede social do Prefeito de Londres sobre a campanha #CleanAir ................ 66 Figura 17. Viagens diárias pelos principais modais de transporte em Londres, entre 2001-2017, juntamente ao comparativo de crescimento populacional. ........................................................................ 68 Figura 18. Gráfico indicativo dos sinistros e o tipo de veículo/modal envolvido dentro da zona da Congestion Charge. ....................................................................................................................................... 69 Figura 19. Região Cerchia dei Bastione....................................................................................................... 77 Figura 20. Area C em Milão - Zona de Tráfego Limitado ........................................................................... 82 Figura 21. Quantidade de liquidações do imposto de taxa por congestionamento no período de janeiro a novembro de 2017 a 2020 ......................................................................................................................... 97 Figura 22. Mapa dos distritos de Barcelona. ............................................................................................. 105 Figura 23. Mapas do sistema viário dedicado aos carros: situação atual e cenário futuro das superquadras ............................................................................................................................................... 106 Figura 24. Hierarquia viária atual e futura (modelo Superilla) ................................................................. 106 Figura 25. Superilla Poblenou: Diálogos com os habitantes, 2016. ........................................................ 107 Figura 26. Legislação e planejamento com determinações na PMU Barcelona .................................... 111 Figura 27. Matéria em site internacional da cidade de Barcelona sobre a transformação da cidade em uma "grande superquadra". ........................................................................................................................ 114 Figura 28. Matéria no site da Bloomberg - CityLab: "Barcelona irá ampliar suas zonas de "zero-carros" - as Superillas". ............................................................................................................................................... 114 Figura 29. Matéria da revista Vox "Plano radical de Barcelona para tomar as ruas dos carros". ......... 115 Figura 30. Matéria no jornal britânico The Guardian: "Superillas ao resgate: Plano de Barcelona para devolver as ruas aos seus habitantes" (tradução livre). ........................................................................... 115 5 Figura 31. Manifestação contra a Superilla em 17 de março de 2017. .................................................. 116 Figura 32. Superillas Sant Antoní: antes e depois. ................................................................................... 118 Figura 33. Mortes prematuras evitadas por ano com a implementação do modelo das Superquadras. ....................................................................................................................................................................... 118 Figura 34. Mapa da atualização do projeto das Superillas de Barcelona ............................................... 120 Figura 35. Mapa indicador do tempo de deslocamento para acesso a pé aos serviços de abastecimento cotidianos, como farmácias, padarias e mercados (2021). ...................................................................... 129 Figura 36. A rua para convívio e lazer - Ilustrações “antes e depois” sobre as possibilidades projetuais para o programa Ville du Quart d'heure de Paris. .................................................................................... 132 Figura 37. Publicação durante a campanha eleitoral de Anne Hidalgo na rede social Twitter. ............ 133 Figura 38. Escola como centralidade do bairro - Ilustrações “antes e depois” sobre as possibilidades projetuais para o programa Ville du Quart d'heure minutos de Paris. .................................................... 133 Figura 39. Registros fotográficos feitos pela APUR em eixos viários importantes da cidade de Paris – Notre Dame e Rue de Rivoli. ....................................................................................................................... 134 Figura 40. Espaços de convívio e ampliação de calçadas promovidas durante o período de restrições causadas pela pandemia do Covid 19. ...................................................................................................... 135 Figura 41. Imagens de satélite extraídas do software Copernicus – cartografia da poluição do ar. Comparativo entre os registros de março de 2019 e março de 2020. ................................................... 136 Figura 42. Metrominuto de Pontevedra ..................................................................................................... 141 Figura 43. Transformação das ruas de Pontevedra (à esquerda anterior às renovações de 1999, e à direita foto mais atual, 2017). ...................................................................................................................... 143 Figura 44. Rede de estacionamentos de Pontevedra ............................................................................... 144 Figura 45. Metrominuto exposto em ponto de ônibus de Pontevedra .................................................... 148 Figura 46. A difusão do Metrominuto ......................................................................................................... 149 Figura 47. Divisão percentual da área de Nova Iorque por uso. ............................................................. 155 Figura 48. Transporte eficiente de pessoas, com priorização do pedestre. ........................................... 156 Figura 49. Diagrama do processo de desenvolvimento e revisão de projetos do Manual de Desenho de Ruas de Nova Iorque. .................................................................................................................................. 158 Figura 50. Diagrama ilustrativo das funções e papéis desempenhados pelas agências e entidades ligadas aos projetos urbanos da cidade de Nova Iorque. ........................................................................ 159 Figura 51. Publicação no site do AIA New York - Instituto de arquitetos de Nova Iorque, sobre o lançamento da terceira edição do Manual................................................................................................. 162 Figura 52. Mortes no trânsito por 100 mil habitantes em NYC, 2010 a 2018......................................... 163 Figura 53. Grand Course (Capital Project) - projeto de infraestrutura de calçadas, com o redesenho da travessia de pedestres................................................................................................................................. 164 Figura 54. Diversity Plaza (Capital Project) - projeto de redesenho de rua, com a criação de um eixo de praça e áreas caminháveis de lazer e comércio. ...................................................................................... 164 Figura 55. Fifth avenue Street Seat (Operational Project) - projeto de mobiliário urbano de pequena escala. ........................................................................................................................................................... 165 Figura 56. Delimitação das Áreas 40 ......................................................................................................... 170 Figura 57. Evolução das áreas de velocidade reduzidas ......................................................................... 171 6 Figura 58. Conjunto de sinalização horizontal e vertical que marca as entradas da Área 40............... 172 Figura 59. Antes e depois das intervenções com obras na área de velocidade reduzida de Santana - Rua Cruzeiro do Sul x Rua Olavo de Egídio .............................................................................................. 172 Figura 60. Resultados da intervenção temporária em São Miguel, realizada em novembro de 2016, na Praça Getúlio Vargas. .................................................................................................................................. 176 Figura 61. Resultados da intervenção temporária em Santana, realizada em setembro de 2017, no cruzamento da Rua Dr. César com a Rua Salete. ..................................................................................... 177 Figura 62. Resultados da intervenção temporária em Santana, realizada em setembro de 2017, no cruzamento da Rua Dr. César com a Rua Voluntários da Pátria ............................................................. 178 Figura 63. Fotos antes e durante a intervenção temporária em São Miguel, realizada em novembro de 2016, na Praça Getúlio Vargas. .................................................................................................................. 179 Figura 64. Evolução da implementação de áreas de velocidade reduzida em São Paulo .................... 182 Figura 65. Compartilhamento de responsabilidades sobre o viário ........................................................ 183 Figura 66. Resultados esperados da Política Pública Distrital de Espaço Público ................................. 191 Figura 67. Política Pública do Espaço Público: Implementação .............................................................. 194 Figura 68. Atores e interesses .................................................................................................................... 195 Figura 69. Provimento de espaços públicos: antes e depois ................................................................... 196 Figura 70. Recuperação de espaços públicos: antes e depois ............................................................... 197 Figura 71. Fortaleza, Bairro Cidade 2000: Audiência pública .................................................................. 204 Figura 72. Fortaleza, Bairro Cidade 2000: intervenção definitiva antes e depois .................................. 205 Figura 73. Intervenção “Caminhos da escola” Escola Cristo Redentor: Atividades de envolvimento comunitário ................................................................................................................................................... 205 Figura 74. Intervenção “Caminhos da escola” Escola Cristo Redentor: Ante s e depois ...................... 206 Figura 75. Intervenção “Caminhos da escola” Escola Cristo Redentor: Antes e depois na Praça ...... 206 Figura 76. Prefeitura divulga o projeto por meio de intervenções (antes-depois) ................................. 209 Figura 77. Mudança na distribuição no uso do espaço: Compartilhamento das ruas ........................... 210 Figura 78. Percepção de segurança dos pedestres antes e depois do projeto Cidade 2000 .............. 211 Figura 79. Resultados do projeto Cidade da Gente Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura ............ 211 Figura 80. Antes e depois ........................................................................................................................... 212 Figura 81. Antes e depois do Programa Calçada Vida Rua Barão do Rio Branco ................................. 213 Figura 82. Fluxo do tráfego de veículos por área em Londres, no período de 2008/09 à 2020/21. .... 218 Figura 83. Divisão modal de viagens por tipo de transporte (2000-2009).............................................. 218 Figura 84. Divisão modal das viagens diárias em Londres em 2019. ..................................................... 219 Figura 85. Divisão modal em 2015 e sua expectativa para 2041. ........................................................... 219 Figura 86. Publicações relacionadas à abordagem Healthy Streets. ...................................................... 223 Figura 87. Processo de implementação da Estratégia de Transportes de Londres. ............................. 224 Figura 88. Regiões da Grande Londres. .................................................................................................... 226 Figura 89. Publicação pela London Living Streets, principal entidade de divulgação da campanha. . 226 Figura 90. Publicação do TfL sobre os benefícios econômicos dos programas de caminhabilidade e ciclabilidade. ................................................................................................................................................. 227 Figura 91Principal canal para divulgação dos conteúdos produzidos pelo TfL. .................................... 227 7 LISTA DE QUADROS Quadro 1. Sistema de transporte público urbano de Santiago ................................................................. 34 Quadro 2. Sistema de transporte público urbano municipal de São Paulo.............................................. 49 Quadro 3. Financiamento do transporte público de Cali............................................................................ 98 Quadro 4. Entraves da implementação de Áreas de Velocidade Reduzida em São Paulo .................. 181 Quadro 5. Transmilênio ............................................................................................................................... 197 8 INTRODUÇÃO O Benchmark documenta diversas experiências selecionadas por sua orientação para mudar a distribuição dos modais no espaço urbano em favor de uma mobilidade mais sustentável social e ambientalmente, com priorização do transporte público e a mobilidade ativa, em especial bicicletas e a pé. Os casos são selecionados seguindo três critérios: 1. Os casos listados pelo proponente, 2. Aumento do foco em micro intervenções urbanísticas e em caminhabilidade (em certa medida incompletas na lista inicial), e 3. O interesse em cidades da região e do país para fins comparativos. O benchmark se concentrará em intervenções bem-sucedidas, uma vez que precisamos aprender com as melhores práticas em todo o mundo. Foram estudados os seguintes casos: Tabela 1. Lista de casos selecionados Caso Cidade Instrumentos Indicação Superillas Barcelona Planejamento e design urbano Proponente Paris 15 minutos Paris Planejamento e design urbano Proponente Walkability Londres Planejamento e design urbano Proponente Congestion charge Taxa Metrominuto Pontevedra Tecnologia avançada e nudges Proponente Guia de desenho de ruas Nova York Planejamento e design urbano Proponente Área C/Ecopass Milan Taxa Proponente Restricción Vehicular Santiago Taxa Proponente Pico y Placa e Tasa por Santiago de Cali Taxa FGV/VS congestión Plano de espaço público Bogotá Planejamento urbano e nudge FGV/VS Cidade da gente Fortaleza Planejamento e design urbano Proponente Rodízio São Paulo Taxa Proponente Zona Azul Taxa Área de velocidade reduzida Planejamento e design urbano Elaboração própria Os casos foram analisados de forma a dar respostas aos seguintes temas: • Mudança na distribuição/uso dos modos; • Mudança na condição/ocupação do espaço público viário; • Desafios, mecanismos inovadores e ganhos para a gestão pública; • Estratégias testadas, fortalezas e debilidades; • Contextos em que as mudanças aconteceram. Desta forma, as fichas foram organizadas seguindo o seguinte padrão: 9 Tabela 2. Padrão de organização das fichas Item do relatório Conteúdo Resumo Breve descrição sobre os casos. 1 Contexto Características urbanas (escala, localização, etc); contexto sobre a mobilidade; solo e infraestrutura; antecedentes. 2 Objetivos Modo alvo; equipamento alvo; grupos sociais alvo. 3 Instrumentos e implementação Arranjo e desafios institucionais; stakeholders; descrição da implementação e das ferramentas utilizadas. 4 Arranjo regulatório Ferramentas regulatórias; embasamento e mudanças normativas. 5 Recursos, atores e Custos, investimentos e receitas; financiamento investimentos público e privado. 6 Estratégia de comunicação Campanhas, imprensa, eventos, processos participativos, acesso à informação. 7 Resultados O que foi alcançado; produtos; mudanças (antes/depois no uso da rua); ganhos ambientais, de segurança, outros. 8 Considerações finais Resumo dos resultados, sejam financeiros, comportamentais, urbanísticos, de atividades no espaço. Sublinha o que deu certo e o que não deu. Elaboração própria. 10 11 Rodízio, São Paulo – Brasil O Programa de Restrição ao Trânsito de Veículos Automotores no Município de São Paulo (Rodízio), consiste na proibição da circulação de veículos no Centro Expandido da cidade nos horários de pico (das 7h às 10h e das 17h às 20h), com base no dígito final da placa do veículo. Cada veículo é proibido de circular nesses horários durante um dia por semana: às segundas- feiras, são os veículos com placas que terminam em 1 e 2 que não podem adentrar esse perímetro, nas terças são aqueles com finais 3 e 4, e assim por diante. Seu objetivo é diminuir o fluxo de automóveis particulares nestas vias, contribuindo para a diminuição dos congestionamentos. Contexto São Paulo é a cidade onde se concentra a maior população e maior produção econômica do Brasil, contando com 12,3 milhões de habitantes (IBGE, 2020) e respondendo isoladamente por 10,2% do PIB do país (IBGE, 2018). Diariamente, das 25,8 milhões de viagens realizadas na cidade, 30% têm como destino o Centro Expandido, região que concentra grande parte dos empregos da capital (Metrô, 2019). Destas viagens, mais da metade são realizadas por veículos automotores (carros, ônibus e motos), resultando em congestionamentos diários nas vias da região. Nos anos anteriores à implantação da restrição veicular no centro expandido, os principais corredores da cidade apresentaram aumentos expressivos nas extensões de lentidão. Se em 1992 as médias das lentidões máximas se encontravam em 28 km no período pico da manhã, esse número saltou para 80 km em 1996, um aumento de 186% (CETSP, 2005, p. 19). Com base nesse panorama, é que são discutidas políticas de racionalização do uso desse espaço público, sendo o rodízio uma delas. Objetivos O objetivo principal do rodízio era a redução do congestionamento nas vias urbanas do município. Na legislação municipal que instituiu o rodízio já se apresenta no primeiro parágrafo de seu primeiro artigo que “A medida autorizada objetivava a melhoria das condições do trânsito, através da redução do número de veículos em circulação nas vias públicas, de 2ª às 6ª feiras, exceto feriados” (Lei Nº 12.490, 1997, grifos nossos). Como objetivo secundário, o rodízio também foi apontado como uma forma de reduzir a poluição do ar causada pelos automóveis, como pode ser observado na exposição de motivos do Projeto de Lei Nº 747 (1997), que resultou na promulgação da legislação citada anteriormente: 12 “(...) Ressalte-se que a racionalização do uso do sistema viário nos moldes ora propostos ensejará significativa melhoria da qualidade de vida da população, eis que, ante a maior fluidez do trânsito de veículos, além da economia do combustível a ser auferida, também serão minimizados os efeitos da poluição atmosférica provocada pelos veículos automotores” (Projeto de Lei Nº 747, 1997, p. 7, grifos nossos). Instrumento e implementação Antes da implantação do rodízio veicular municipal em 1997, que segue até os dias de hoje, o município de São Paulo já havia experimentado uma política similar anos antes, que era capitaneada pelo Governo Estadual. Em 1995, a Secretaria de Estado do Meio Ambiente introduziu a Operação Rodízio na Região Metropolitana de São Paulo com a finalidade de diminuir a emissão de gases poluentes na atmosfera (Gouveia, 2006). A proibição da circulação de veículos em determinados dias de semana, conforme o dígito final de sua placa, foi adotado experimentalmente durante uma única semana do mês de agosto de 1995, cuja adesão era voluntária. Apesar da falta de obrigatoriedade, 38% dos motoristas apoiaram a iniciativa naquela semana (Jacobi, Segura e Kjellén, 1999). Nos anos seguintes de 1996, 1997 e 1998, a política foi adotada entre os meses de junho e agosto, mas de forma compulsória, rendendo penalidades para aqueles que a infringissem (Jacobi, Segura e Kjellén, 1999). Apesar da evolução da avaliação popular quanto a relação entre o rodízio e a redução da poluição do ar – antes de sua adoção 62% dos motoristas não acreditavam que a política surtiria efeito, e depois estes passaram a ser somente 27% – a política foi extinta pelo governo estadual em 1998 (Mahendra, 2008). Apesar da extinção do rodízio estadual, em 3 de outubro de 1997 foi instituído o rodízio na capital, com duração ao longo do ano todo, mas restrito somente às vias interiores ao Mini- Anel Viário, perímetro que delimita o Centro Expandido, elucidado na Figura 1. No rodízio municipal, a proibição de circulação de veículos vale de segunda a sexta-feira nos horários de pico da manhã (7h às 10h) e da tarde (17h às 20h), de maneira escalonada a partir da placa dos veículos. Os veículos com circulação restrita em cada dia da semana seguem a seguinte ordem (CETSP, s.d.): • Segundas-feiras: proibidos veículos com placas terminadas com o dígito 1 ou 2; • Terças-feiras: proibidos veículos com placas terminadas com o dígito 3 ou 4; • Quartas-feiras: proibidos veículos com placas terminadas com o dígito 5 ou 6; • Quintas-feiras: proibidos veículos com placas terminadas com o dígito 7 ou 8; • Sextas-feiras: proibidos veículos com placas terminadas com o dígito 9 ou 0. 13 Figura 1. Mini-anel viário Fonte: CETSP, s.d. A fiscalização do cumprimento do rodízio é de responsabilidade do Departamento de Operação do Sistema Viário (DSV) da Secretaria Municipal de Mobilidade e Transportes (SMT), que conta com a participação da Companhia de Engenharia de Tráfego (CETSP). Empresa de economia mista vinculada à Prefeitura de São Paulo, a CETSP é responsável pela gestão do trânsito na cidade de São Paulo de maneira geral. Apesar de sua atuação no rodízio municipal não ser objeto de contrato específico entre a empresa e prefeitura, ela encontra-se incluída nas atividades especificadas no contrato firmado com o DSV/SMT, como: monitoramento do trânsito, fiscalização de infrações de circulação nas vias, implantação de radares e câmeras fotográficas, elaboração de avaliações periódicas, entre outras (Contrato Nº 001/SMT, 2021). A penalidade relativa ao desrespeito ao rodízio vigente desde 1997 acarreta multa de R$ 130,16 e acréscimo de 4 pontos no prontuário, conforme dispõe o art. 6º do Decreto Municipal Nº 58.584 (2018) com menção à definição do Código de Trânsito Brasileiro (CTB). Dada a observância do rodízio nos períodos de pico da manhã e da tarde, a penalidade pelo seu infringimento pode ser aplicada no máximo duas vezes ao dia, uma para cada período. Com relação às exceções ao rodízio, a lei que instituiu a política definiu que os veículos que não estão sujeitos às restrições são: “I - de transporte coletivo e de lotação devidamente autorizados a operar o serviço; II - motocicletas e similares; III - táxis; IV - de transporte escolar; V - guinchos; VI - outros, 14 empregados em serviços essenciais e de emergência, conforme definido em regulamento” (Lei Nº 12.490, 1997). De maneira a delimitar quais exatamente são os veículos que se enquadram como empregados em serviços essenciais e de emergência, o artigo 3º do Decreto Municipal Nº 58.584 de 2018 discrimina cada um deles. Dentre eles, encontram-se os veículos das forças armadas, funerários, penitenciários, de coleta de lixo, dos Correios, entre outros. Para além destes, o decreto também discrimina os veículos com isenção decorrente de regime jurídico próprio, a saber: “a) os movidos por energia de propulsão elétrica, a hidrogênio ou híbridos; b) os pertencentes a médicos residentes no Município de São Paulo, quando utilizados no trabalho diário, conforme previsto na Lei Nº 12.632, de 6 de maio de 1998, e suas alterações; c) os pertencentes a Missões Diplomáticas, Delegações Especiais, Repartições Consulares de Carreira e de Representações de Organismos Internacionais, devidamente registrados e emplacados conforme disposições específicas; d) os conduzidos por pessoa com deficiência, com comprometimento de mobilidade ou por quem as transporte; e) os conduzidos por pessoa que realize tratamento continuado debilitante de doença grave ou portadora de doença crônica que comprometa sua mobilidade ou por quem as transporte.” (Decreto Municipal Nº 58.584, 2018). Dentre as dificuldades encontradas na implementação do rodízio, são destacados dois pontos principais. O primeiro deles refere-se à quantia de veículos que deixam de seguir a restrição imposta pelo rodízio, tendo-se observado no período entre 1998 e 2019 taxas de desobediência médias de 11% no pico da manhã e 18% no pico da tarde (CETSP, 2005). O segundo ponto de dificuldade se dá na definição de quais são os serviços considerados essenciais, e que, portanto, têm seus veículos isentos da restrição. Essa dificuldade torna-se evidente pela grande quantidade de decretos específicos voltados a estabelecer exceções ao rodízio, as quais foram sistematizadas pela atual redação do art. 3º do Decreto Municipal Nº 58.584 de 2018. Arranjo regulatório O rodízio municipal foi instituído no município de São Paulo através da Lei Nº 12.490 de 3 de outubro de 1997, que autorizou o Poder Executivo a implantar o Programa de Restrição ao Trânsito de Veículos Automotores no Município de São Paulo. A implantação da política foi delegada ao DSV da SMT, contando com o apoio da CETSP e do extinto Comando de Policiamento de Trânsito (CPTran). 15 Em 1998, foi aprovado projeto de lei de autoria do vereador Paulo Frange que excluiu os médicos residentes em São Paulo das restrições do rodízio (Lei Municipal Nº 12.632, 1998). Essa lei foi modificada pelo mesmo vereador em 2020 para abranger médicos de toda região metropolitana de São Paulo que atuem no serviço público de saúde na capital (Lei Municipal Nº 17.455, 2020). Após a instituição do programa, a primeira mudança regulatória substancial em seu conteúdo ocorreu 11 anos mais tarde, a partir da promulgação da Lei Nº 14.751 de 2008, de autoria dos vereadores Jooji Hato e Myryam Athie, que ampliou o rodízio para veículos automotores pesados, do tipo caminhão. Em seguida, todas as outras normas que regulamentam a política se reservaram a detalhar quais os tipos de veículos que são isentos das restrições impostas pelo rodízio, e quais as formas de cadastro que devem ser realizadas pelos veículos que se enquadram nessas exceções, por meio de decretos e portarias. As principais normas que desenvolveram tais pontos são: Lei Nº 16.813 de 2018, de autoria do vereador Zé Turin, e os Decretos Nº 58.584 de 2018 e Nº 58.604 de 2019. Assim, nota-se que as principais decisões a respeito da forma da política necessitaram da articulação do poder executivo junto ao legislativo, cabendo à Câmara Municipal a aprovação da lei criadora do rodízio, e das regulamentações importantes como a restrição de circulação de veículos pesados. Através de decretos, o executivo trouxe mais especificidades a respeito dos parâmetros a serem adotados, como por exemplo, quais são os serviços considerados essenciais que ficam isentos da restrição imposta pelo rodízio. Recursos, atores e investimentos Os recursos provenientes da política constituem-se basicamente das multas arrecadadas pelo desrespeito ao rodízio. Dados disponibilizados pelo Painel de Mobilidade Segura, da Prefeitura de São Paulo, indicam que em 2019 foram capturadas 2,4 milhões de infrações relacionadas ao desacato do rodízio, configurando 23% do total de infrações cometidas no município naquele ano (Observatório mobilidade segura, s.d.). Com base no valor de R $130,16 relativo a esse tipo de infração, é possível estimar uma arrecadação potencial do programa de aproximadamente R $314,5 milhões. Esse pode ser considerado o valor potencial, pois não se encontram disponíveis informações sobre o efetivo pagamento das multas específicas ao rodízio. Assim como outras multas de trânsito de São Paulo, 5% do valor arrecadado pelas multas relativas ao rodízio têm como destinação o Fundo Nacional de Segurança e Educação no Trânsito (Funset), por determinação do Código de Trânsito Brasileiro e 95% o Fundo Municipal de Desenvolvimento do Trânsito (FMDT). Criado pela Lei municipal Nº 14.488 de 2007, o 16 FMDT tem como objetivo financiar ações destinadas ao desenvolvimento do trânsito no Município de São Paulo. Gerido por um conselho diretor e outro fiscal, o fundo não apresenta participação social em nenhum destes, já que ambos são compostos exclusivamente por membros de secretarias do governo. No entanto, o FMDT possui iniciativas que visam promover sua transparência na página do fundo no site da prefeitura, como a publicação das atas de suas reuniões, deliberações e demonstrativos da receita arrecadada e sua destinação. Tomando o ano de 2020 como exemplo, dos R$ 1,2 bilhões de despesas realizadas com recursos do fundo, 71% foram destinado a Serviços de Engenharia de Tráfego, enquanto 5% foi destinado a melhorias no transporte público coletivo, como ampliação, manutenção, reforma e qualificação de terminais, faixas exclusivas e corredores de ônibus. Olhando para os demonstrativos dos últimos 5 anos, verifica-se um patamar semelhante de investimento em transporte público viabilizado pelo fundo (Prefeitura da capital, s.d.). Já em relação aos custos atribuídos à política, não foram encontrados dados específicos sobre os aportes realizados pelo poder público para a implementação do programa. Os valores que podem ser observados são somente os totais destinados pela SMT à CETSP para a realização de serviços de engenharia em geral, o que inclui uma grande variedade de aspectos relacionados à gestão e fiscalização do trânsito, dentre os quais encontra-se a operação do rodízio. No ano de 2020, por exemplo, o contrato firmado entre a SMT e a CETSP chegou ao valor de R$ 1,034 bilhão, considerando-se os aditivos realizados ao longo do ano (Prefeitura da capital, s.d.). Atentando-se às dotações vinculadas ao pagamento do contrato, nota-se que a maior parte dos recursos têm como origem o FMDT. Estratégias de comunicação Já desde a primeira experiência de implantação do rodízio pelo governo estadual, encontram- se registros de estratégias de comunicação adotadas a fim de obter o sucesso do programa. Jacobi, Segura e Kjellén (1999) destacam que no ano de 1996, quando o rodízio passou a ser obrigatório entre os meses de junho a agosto, várias atividades foram desenvolvidas nas semanas anteriores à implementação da política de maneira a conscientizar a população. Para além da realização de debates, conferências e apresentações do programa que buscavam esclarecer os objetivos ambientais da política, foram também utilizadas formas para se atingir diretamente os cidadãos, através de ligações telefônicas, outdoors, panfletos e anúncios em jornais. Em 1997, logo após a aprovação da lei que instituiu o rodízio, a prefeitura realizou inserções publicitárias em emissoras de TV e de rádio para conscientizar os motoristas a respeito da 17 política, utilizando o slogan “Você colabora algumas horas e o trânsito melhora todos os dias” (CETSP, 2005). Além disso, a CETSP distribuiu 1,85 milhão de folhetos informativos nos principais corredores da cidade (Figura 2), afixou faixas alertando os motoristas da vigência do programa (Figura 3), e disponibilizou uma linha telefônica para esclarecer as dúvidas da população a respeito do rodízio (CETSP, 2005). Figura 2. Folheto de divulgação Fonte: CETSP, 2005. Figura 3. Faixas informativas Fonte: CETSP, 2005. Atualmente, a principal forma de comunicação institucional a respeito do rodízio consiste no site da CETSP, onde se encontram reunidas as informações relativas à política (CETSP, s.d.). Nele, estão disponíveis os horários de vigência da restrição, as placas relativas a cada dia, as vias impactadas pelo programa, a legislação que rege o rodízio e uma seção de respostas às dúvidas mais frequentes. 18 Resultados A CETSP elaborou em 2005 um boletim técnico que apresenta as avaliações da implementação do rodízio realizadas tanto nos primeiros seis meses da operação, quanto após 2 anos de programa. Nos primeiros seis meses da política, a avaliação indica que na área interna ao Mini-Anel viário houve uma redução de 37% na extensão da lentidão média diária no período de pico da manhã, e de 26% no pico da tarde (Figura 4)1 . Como extensão de lentidão é considerado o “somatório das filas de veículos parados, nas aproximações dos semáforo s ou não, registradas diariamente nas principais vias do Município” (CETSP, 2005, p. 42). Figura 4. Impacto do rodízio na extensão de lentidão na área interna ao Mini-Anel viário Fonte: CETSP, 2005, pág. 45. Além dos efeitos observados na lentidão, são apresentados os resultados do programa nas velocidades médias de algumas vias selecionadas. Nos corredores dentro da área de intervenção (Eusébio Matoso, Rebouças e Consolação) foi registrado, em média, um aumento de 23% nas velocidades durante o pico da manhã e de 24% no pico da tarde. Nas avenidas fora dessa área (Francisco Morato, Interlagos, Vereador José Diniz e Conde de Frontin) também foram encontradas melhoras nas velocidades, de 19,8% no pico da manhã e de 18% no pico da tarde, em média. 1 Desconsidera-se o mês de janeiro na análise pois neste houve suspensão do programa devido às férias escolares. 19 O último resultado exposto na primeira avaliação que vale ser destacado é o relativo à mudança modal decorrente da implantação do rodízio. Com base em uma pesquisa realizada pelo jornal O Estado de São Paulo, publicada no dia 15 de março de 1998, recupera-se que dentre os entrevistados, 38% passaram a utilizar o ônibus no dia do rodízio de seus carros, 26% adotaram o metrô e 6% se deslocaram a pé. A parcela que recorreu a outro carro foi somente de 14,3%, indicando que a mudança de meio de transporte foi a alternativa mais adotada pelos motoristas como resposta à restrição. Com relação à segunda avaliação conduzida pela CETSP entre os anos de 1998 e 1999, os resultados do rodízio no congestionamento já indicam uma mudança de cenário. Na comparação da extensão da lentidão entre os anos de 1997 (sem rodízio) com os anos de 1998 e 1999 (com rodízio), nota-se a redução da lentidão no primeiro ano, mas já em 1999 um aumento que consegue alcançar os patamares observados antes da implantação da política. As figuras 5 e 6 mostram tais resultados para os meses de abril e maio, respectivamente. Figura 5. Impacto do rodízio na extensão de lentidão na área interna ao Mini-Anel viário Fonte: CETSP, 2005, pág. 55. 20 Figura 6. Impacto do rodízio na extensão de lentidão na área interna ao Mini-Anel viário Fonte: CETSP, 2005, pág. 55. Olhando novamente para as velocidades médias, a segunda avaliação não exibe os quantitativos referentes às velocidades observadas nas vias internas à área de restrição, destaca somente que para o período da manhã elas seguiram aumentando, enquanto para o período da tarde os ganhos obtidos nos primeiros 6 meses já haviam sido consumidos. Já para as avenidas fora da área de restrição, os dados apontam que na maioria das vias analisadas as velocidades médias permanecem maiores que as observadas no período sem restrição, mas apresentaram crescimentos muito menores que os observados na avaliação anterior. Por fim, a avaliação também apresenta novos dados sobre a mudança modal provocada pelo programa. Em pesquisa conduzida pela CETSP em maio de 1999 com 745 motoristas, encontrou-se que no último dia do rodízio de seus veículos 35% dos condutores utilizaram o transporte coletivo, 27% mudaram o horário do compromisso, 25% usaram outro carro, 8% usaram o próprio carro e 5% não saíram ou utilizaram outro meio. Apesar do expressivo número de pessoas que migraram para o transporte coletivo, o número de respondentes que utilizaram outro carro cresceu bastante em comparação à última pesquisa analisada. Ademais, foi registrado que 15% dos entrevistados compraram outro carro para ser utilizado nos dias de rodízio, reforçando a ideia de uma possível readequação da resposta dos condutores ao rodízio, ao longo do tempo. Para além do boletim publicado em 2005 pela CETSP abordado acima, a lei que instituiu o rodízio municipal estabeleceu a necessidade da elaboração de uma avaliação anual a respeito da política. Em 2012, último ano em que se encontra uma maior exposição dos resultados 21 avaliados pela companhia, são exibidas as velocidades médias aferidas no corredor Eusébio Matoso/Rebouças/Consolação, trecho para o qual existem medições desde o início da operação do rodízio (Portaria Municipal SMT/DSV Nº 75, 2017). É possível observar através da Figura 7 que apesar da pequena melhora observada nos primeiros anos posteriores à implantação do programa, os anos seguintes não sustentaram essa evolução. No período pico da tarde, as velocidades apresentam uma queda vertiginosa, inclusive, sendo a velocidade média de 1997 inalcançada desde 2002. Figura 7. Evolução da velocidade média anual no corredor Eusébio Matoso/ Rebouças/ Consolação Velocidade média anual (km/h) 25 20 15 10 5 0 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 7h - 10h 17h - 20h Fonte: Portaria Municipal SMT/DSV Nº 75, 2012. Elaboração própria. Com relação aos dados de extensão de lentidão, o relatório apresenta as medições realizadas somente a partir de 2007, por conta de uma mudança na extensão das vias monitoradas, impossibilitando a comparação com o período anterior à implementação da política. Na literatura acadêmica, também não foram identificados trabalhos que efetivamente avaliaram os impactos do rodízio nos índices de congestionamento da cidade. Já em relação aos impactos ambientais da política, estudos que examinaram os primeiros anos de adoção do rodízio identificaram reduções significativas de gases poluentes provocadas pela restrição (Gouveia, 2006; Martins et al., 2001). Os principais poluentes que sofreram redução em seus níveis diários foram CO, PM10, NO2 e SO2. Nos dois estudos que encontraram tais resultados, também foi destacado que a redução dos poluentes não impactou diretamente a saúde dos habitantes do município, visto a falta de efeito na ocorrência de doenças respiratórias. 22 Apesar dos resultados ambientais positivos encontrados, Gouveia (2006) destaca que esses impactos podem não ser consistentes nos médio e longo prazos, pois após o curto período de análise que o estudo foi conduzido tanto a frota automotiva quanto os níveis de congestionamento na cidade aumentaram. De fato, a realização de estudos mais atualizados seria desejável inclusive para avaliar os potenciais efeitos de aumento da motorização derivados do incentivo que o rodízio pode provocar para obtenção de um “segundo veículo” em domicílios com suficiente poder aquisitivo, e a respectiva contribuição para a perda gradual de efetividade do rodízio no longo prazo. Considerações finais Criado como uma política que objetiva a redução dos congestionamentos na cidade de São Paulo, o rodízio apresentou resultados positivos no curto prazo. A redução da lentidão nas principais vias da cidade, a diminuição da emissão de gases poluentes e a migração modal para o transporte coletivo foram de fato observados nas avaliações conduzidas nos primeiros meses de implantação do programa. No entanto, com o passar dos anos, nota-se que a medida tem se mostrado insuficiente para a manutenção desses impactos, principalmente ante ao crescimento do número de veículos particulares. Na perspectiva de gestão da demanda, este tipo de medida possui limitações como política de longo prazo para o desestímulo ao uso do automóvel, sendo alguns dos principais motivos os seguintes (Ríos, Vicentini, Acevedo- Daunas, 2013): • Compra de segundo ou terceiro veículo particular, geralmente mais poluente; • Deslocamento de parte da demanda para o entre pico ou alargamento dos períodos pico, sem necessariamente atingir a redução esperada de quilometragem percorrida; • Maior uso de carros aos finais de semana em função da maior disponibilidade de frota por domicílio e da restrição nos dias úteis. A falta de monitoramento e avaliação contínua dos efeitos da medida junto com os potenciais efeitos contraproducentes mencionados acima, colocam um interrogante importante para sua situação atual. A política sofreu pouquíssimas modificações ao longo de mais de duas décadas de implementação e contínua baseada unicamente na restrição focada no número final da placa dos carros. Percebe-se como uma medida estática sem ajustes incrementais relevantes nem orientações e uso estratégico desde a ótica de gestão de demanda em favor do transporte público e modais ativos. 23 Tabela 3. Disposições gerais Rodízio – São Paulo, Brasil Item Valor Objetivo Redução do congestionamento e da poluição atmosférica Localização São Paulo, Brasil. Centro expandido Área de abrangência 165 km² (11% do território do município) Infraestrutura 3 mil km de vias (15% das vias do município) Contexto da área na cidade Região com maior concentração de empregos do município Público-alvo Motoristas de automóvel particular Modal alvo Automóvel privado Despesas Não encontrado Receitas R$ 314,5 milhões (2019) - Estimado Composição do Público financiamento Redução na Emissão de Redução nos níveis diários de CO, PM10, NO2 e SO2 no CO2 curto prazo Impacto central Redução do congestionamento e emissões no curto prazo Elaboração própria. Referências CETSP, Companhia de Engenharia de Tráfego de São Paulo (s.d.) Como Funciona. Disponível em: http://www.cetsp.com.br/consultas/rodizio-municipal/como-funciona.aspx. Acesso em 29/07/2021 CETSP, Companhia de Engenharia de Tráfego de São Paulo. (2005). Boletim Técnico Nº 37: Operação Horário de Pico. Disponível em: http://www.cetsp.com.br/media/65268/bt37- %20operacao%20horario%20de%20pico.pdf. Acesso em: 9 agosto 2021. CETSP, Companhia de Engenharia de Tráfego de São Paulo. (2021). Site da Companhia de Engenharia de Tráfego. Disponível em: http://www.cetsp.com.br/consultas/rodizio- municipal/como-funciona.aspx. Acesso em: 29 julho 2021. Conceição, L., M., Dias, M., do R., de O., L., Hilário, P., P., N., S., & Luís, A., F., B. (2001). Relação entre poluição atmosférica e atendimentos por infecção de vias aéreas superiores no município de São Paulo: avaliação do rodízio de veículos. Rev. Bras. Epidemiol. Vol. 4, Nº 3, 2001. 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Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), Despacio, Instituto de Políticas de Transporte e Desenvolvimento (ITDP). 27 28 Restricción Vehicular, Santiago – Chile A política de restrição veicular de Santiago do Chile foi implementada em 1986 e têm sofrido sucessivas adaptações ao longo do tempo. Com o objetivo de melhorar a qualidade do ar da capital chilena, a política impõe a proibição da circulação de veículos em grande parte da cidade (43% do território) das 7h30 às 21h de segunda a sexta, de acordo com o dígito final da placa do veículo. A medida vigora no inverno anualmente entre os meses de maio e agosto, podendo se intensificar (mais placas restritas e incluindo fim de semana) neste período caso se registrem elevados níveis de poluição do ar e sejam decretados estados de pré-emergência ou emergência ambiental. Contexto A Região Metropolitana de Santiago, no Chile, tinha uma população total de 7,1 milhões de habitantes e uma área de 15,4 mil km² em 2017. Administrativamente, a região é composta por 6 províncias (Chacabuco, Cordillera, Maipo, Melipilla, Santiago e Talagante), que estão divididas em 52 distritos onde 96.3% vivem em área urbana. A capital da região é a cidade de Santiago, maior cidade e também capital do Chile. A cidade é conhecida pelos seus problemas recorrentes de poluição, agravados pelas condições geográficas. De relevo plano, a região é circundada pela cordilheira dos Andes a leste, a cordilheira de Chacabuco a norte, os morros de Angostura e Chada ao sul, e a cordilheira de la Costa a oeste. As colinas que circundam a planície central impõem fortes restrições à circulação dos ventos e, portanto, à renovação do ar na bacia aérea de Santiago. Assim, em tempos de estabilidade atmosférica, os poluentes emitidos na região ficam abrigados nesta bacia. Por conta dos altos impostos para importação e compra de automóveis, e das dificuldades econômicas que o Chile atravessou, as taxas de motorização na região de Santiago encontravam-se em patamares baixos até a década de 1970, com 60 carros por mil habitantes em 1977. No final dos anos 70, no entanto, com a eliminação das restrições para importação de veículos, as taxas na região cresceram rapidamente (Mahendra, 2008). Em vinte anos, de 1977 a 1997, a taxa de motorização dobrou, passando para 120 carros por mil habitantes. A crescente presença dos automóveis, aliada às características topográficas da região, fez com que a poluição do ar se tornasse um problema frequente e necessário de ser enfrentado. 29 Objetivos O principal objetivo da política de restrição veicular de Santiago é o de combater a contaminação do ar provocada pelo uso de automóveis na cidade. Desde a sua criação em 1986 até sua configuração atual, o programa procura desincentivar o uso de veículos classificados como mais poluidores. No início, a proibição de circulação valia somente por um dia na semana para os automóveis sem selo verde, que são aqueles que não possuem dispositivo catalisador para reduzir a toxicidade de suas emissões. Depois, a proibição se estendeu para dois dias na semana para estes veículos. Em seguida, veículos com selo verde, mas registrados antes de 2011, também passaram a ser afetados pelo programa. Instrumentos e implementação A restrição veicular surge em 1986 como uma medida para lidar com o problema das emergências de poluição do ar por PM10 2 (Del Favero, Katz & Solari, 2000). A restrição foi aplicada em várias ocasiões durante a década de 1990, porém, sem mostrar efetividade pretendida. Desta forma, em 1996, Santiago é declarada zona saturada de PM10, O3, PTS e CO e zona latente de CO2 (Decreto Supremo Nº 131/1996). Por esta razão em 1998, é criado o Plano de Prevenção e Descontaminação Atmosférica - PPDA da Região Metropolitana de Santiago que, além de prever a restrição veicular como um dos principais instrumentos para lidar com o problema ambiental, também contempla medidas como restrição de emissões ou operação de indústrias, e a proibição do uso de lenha como combustível. O PPDA foi atualizado em algumas ocasiões e modificações foram estabelecidas em geral tornando as regras mais restritivas (Witt, 2017). Atualmente, a política de restrição veicular de Santiago estabelece que entre os meses de maio a agosto (chamado de período de Gestão de Episódios Críticos) fica proibida a circulação de automóveis no perímetro interno do anel Américo Vespúcio (Figura 8), de segunda a sexta- feira entre as 7h30 e 21h, conforme a classificação do veículo. Veículos sem o selo verde (que não possuem catalisadores) são proibidos de adentrarem à região todos os dias da semana nos horários de vigência da medida. Os automóveis que possuem o selo verde e foram inscritos no Registro Nacional de Veículos Motorizados antes 2012, não podem circular por um dia da semana conforme o dígito final da sua placa. Motos, caminhões e ônibus de transporte privado também estão sujeitos à medida. Já os automóveis que possuem o selo 2 Material particulado para partículas com diâmetro equivalente inferior a 10 μm. 30 verde e foram registrados depois de 2012 estão isentos da restrição (Ministério dos transportes, 2021a). Para além do período e regras permanentes de aplicação do programa, outras regras se aplicam quando os níveis de poluição observados no município ultrapassam o teto estabelecido é decretado estado de pré emergência ou emergência durante o inverno. Nestes casos, além da adesão imediata ao programa, aumentam-se os dias de restrição para cada dígito de placa e amplia-se a validade da medida aos finais de semana e feriados (Ministério dos transportes, 2021b). Com relação às exceções do programa, é permitida a entrada no anel aos veículos com motor elétrico puro ou híbridos, uma série de veículos prestadores de serviços, como táxis, vans escolares, ambulâncias, entre outros. A restrição também não atinge os veículos que cruzam o perímetro de abrangência por meio das rodovias que cortam a cidade. A fiscalização da medida é realizada principalmente por captura de imagens de veículos em circulação por meio de câmeras instaladas em vias públicas (cerca de 400 aparelhos) nos eixos determinados pela SEREMI. Adicionalmente, em dias de pré-emergência e emergência ambiental, as inspeções contam com o apoio dos fiscais do Programa de Fiscalização em vias que não possuem câmeras. A polícia chilena (carabineros) também atua na fiscalização. Atualmente, a inobservância das normas resulta na aplicação de uma multa que pode variar entre 50 e 75 mil pesos chilenos (equivalente a US$ 64 a U$ 96). Figura 8. Anel viário Américo Vespúcio Fonte: Ministério de Transportes e Telecomunicações do Chile, 2021c. 31 Arranjo regulatório A Lei de Trânsito de 1984 (Lei Nº 18290) dá atribuições ao Ministério de Transportes e Telecomunicações do Chile para proibir, por causa justificada, a circulação de veículos de todos os tipos ou de tipos específicos. Esta atribuição é usada pela primeira vez em 1986 e resoluções com o mesmo objetivo se repetiram ao longo da década de 1990. A medida em seu formato original foi aplicada com frequência, até ser modificada em 1991. Com o objetivo de promover a renovação tecnológica da frota automotiva, a partir de 1991 fica dispensada a restrição aos veículos com selo verde, concedida aos veículos com conversor catalítico (Witt, 2017). Apesar dessas medidas, em 1996, mediante o Decreto Supremo 131, se declara a Região Metropolitana de Santiago saturada por Material Particulado (PM10), Partículas Suspensas, Ozônio e Monóxido de Carbono; e Zona Latente de Dióxido de Nitrogênio. Em 1998, se cria o Plano de Prevenção e Descontaminação Atmosférica (PPDA) da Região Metropolitana de Santiago que estabelece instrumentos de gestão ambiental, por meio de definição e implementação de ações específicas com vistas a reduzir os níveis de poluição do ar. O PDDA foi reformulado desde então por algumas ocasiões e a restrição veicular em seu formato atual foi determinada pelo PPDA estabelecida pelo Decreto 31 de 11 de outubro de 2016 do Ministério do Meio Ambiente. O PPDA tem como objetivo o cumprimento das Normas Primárias de Qualidade do Ar Ambiental em vigor, associado com poluentes Material particulado respirável PM10 (com diâmetro inferior a 10 μm), Material particulado respirável fino PM2.5 (com diâmetro inferior a 2,5 μm), Ozônio (O3), Monóxido de carbono (CO). Entre outras medidas, ele atribui ao Ministério de Transportes e Telecomunicações (MTT) a implementação da restrição veicular de caráter permanente durante o período de Gestão de Episódios Críticos (GEC) compreendido entre os dias 1 de maio e 31 de agosto. O Ministério de Transportes e Telecomunicações, através da Secretaria Regional Ministerial de Transportes e Telecomunicações da Região Metropolitana define as datas, horários, zonas, perímetros especiais e exceções para a aplicação da medida. As regras atuais de circulação de veículos foram estabelecidas pela Resolução 893 de 28 de abril de 2021 da Secretaria Regional Ministerial (SEREMI) de Transportes e Telecomunicações e divulgadas – assim como ocorre anualmente – no Plano de Gestão de Episódios Críticos. 32 Recursos, atores e investimentos Apesar de ser uma política custeada pelo poder público, sendo implementada pelo Ministério de Transporte e Telecomunicações, não foram encontradas informações relativas, por exemplo, à arrecadação por infrações, nem de investimentos necessários para sua implementação. No entanto, a partir da estrutura necessária para a operação do programa, é possível inferir que os principais custos se encontram nos sistemas de monitoramento e gestão de informações. A manutenção das quatrocentas câmeras de vigilância e a necessidade constante de cruzamento de dados sobre os veículos que circulam nas vias da cidade certamente representam as maiores despesas da política. Estratégias de comunicação As informações sobre a restrição veicular e das condições ambientais que informam sobre a aplicação de medidas emergenciais são divulgadas nas páginas oficiais dos ministérios de Transporte e Telecomunicações e do Meio Ambiente, das comunas, em suas redes sociais e por meio da imprensa. A previsão diária da qualidade do ar é atualizada diariamente durante o período de Gestão de Episódios Críticos (GEC) e atualizada através dos canais tradicionais e digitais (Facebook, Twitter e Instagram) da Secretaria Regional Ministerial de Meio Ambiente e Santiago Recicla. É possível acessar a página www.airesantiago.cl ou acessar pelo aplicativo ‘Air Santiago’ e encontrar informações sobre as condições ambientais, os dígitos diários da restrição e se estão sendo aplicadas medidas emergenciais. Resultados A política de restrição veicular foi investigada por alguns estudos e os resultados referentes à circulação de automóveis e de contaminação do ar estão expostos na Tabela 2.1. De um modo geral verificou-se diminuição do fluxo de automóveis, mas não houve resultados significativos para o ônibus e um discreto acréscimo no número de passageiros de metrô. Com relação ao principal objetivo da política, em geral, reportou-se melhora da qualidade do ar. Contudo, é necessário um olhar parcimonioso para os resultados encontrados, já que muitos fatores e resultados inesperados da própria política podem afetar as condições atmosféricas. Por exemplo, alguns estudos apontam que para além do incentivo à renovação da frota de automóveis por veículos com catalisadores houve um incentivo para aquisição de um segundo veículo (Sepúlveda Witt, 2017; de Grande & Troncoso, 2011). Outro fator importante foi a implementação em 2007 do Transantiago, o sistema integrado de transporte (Box 1) que além 33 de ter levado à integração do ônibus com o metrô, aumentando o acesso a esse modal, retirou de circulação 3 mil ônibus. Tabela 4. Resultados da restrição veicular (RV) de Santiago Avaliação Resultado Período Fonte analisado Restrição permanente e - Restrição permanente: sem impacto no fluxo de 2008 Grange & Restrição de veículos de carros Troncoso dois dígitos (pré- - Restrição adicional pré emergencial: diminuição emergência ambiental) de 5,5% no fluxo veicular nas ruas principais da (2011) cidade e aumento de 3% no fluxo de passageiros de metrô (resultado não significativo para fluxo de passageiros de ônibus) A declaração de um episódio crítico somada a 1997 Mullins & Efeito da RV antes do todas as medidas que isso acarreta leva a uma Bharadwaj PPDA de 1998 redução na concentração de PM10 de 17% em relação ao nível esperado sem a declaração do (2013) episódio crítico. Restrição veicular em RV de 1998 (PDDA - RM) contribuiu para diminuir 1998 e 2007 Witt (2017) 1998 e 2007 nos níveis os níveis de CO e PM10. de CO e PM10 A atualização da medida de 2007 não conseguiu melhorar os resultados de contaminação do ar, ao contrário, estaria associada a um incremento dos níveis de PM10. Impacto das restrições Transporte público: não significativo; 2015 Troncoso & veiculares impostas a Fluxo de automóveis: -13%; de Grange quase 20% dos veículos Fluxo de bicicletas: -9% (nos dias de restrição, (patente de dois dígitos) aviso público para evitar atividade física) (2017) durante os dias em que há projeção de alta poluição ambiental. Episódios de pré Diminuição nos fluxos veiculares na RM de 6,05% 2015 Antunez emergência ambiental durante a aplicação da medida. Retamal. decretados em 2015 (2018) Elaboração própria. Quadro 1. Sistema de transporte público urbano de Santiago Sistema de transporte público urbano de Santiago Red Metropolitana de Movilidad (Red) é o sistema de transporte público de Santiago no Chile que substituiu, em março de 2019, o Transantiago. Iniciada em 2007, o Transantiago trazia uma proposta ambiciosa e surgiu com a intenção de solucionar problemas de desintegração da oferta de transporte de Santiago, sobretudo as rotas longas e ineficientes, a ausência de integração tarifária com outros serviços e o metrô, a má qualidade do serviço, o alto índice de sinistros e o elevado nível de poluição do ar e sonora. 34 O Transantiago proporcionou a integração completa do sistema de transporte da região metropolitana de Santiago formado pelas linhas de ônibus locais, principais e o metrô. Os três componentes principais eram o desenvolvimento de um BRT, a expansão do sistema de metrô existente e a integração em todos os modos de transporte da cidade. A estrutura inicial, estimada em US $250 milhões, foi posteriormente revisada para incorporar uma extensa expansão da rede de metrô com custos de capital totais de quase US $2,5 bilhões. (Global Mass Transit Report, 2011) Enquanto o modelo geral estava bem conceitualizado, problemas de desenho, implementação e operação levaram a um difícil início da política. O sistema foi implementado prematuramente com fornecimento insuficiente de serviço no BRT e infraestrutura inacabada, o que levou a longas filas de espera e superlotação. Depois de um início desastroso, o sistema foi melhorado, porém, a qualidade de serviços prestados ainda gera um grande descontentamento do público. Os principais desafios são: a baixa regularidade e confiabilidade operacional; a priorização de investimento em metrô e não em infraestrutura para remoção de automóveis particulares e para impedir invasão das faixas exclusivas de ônibus; a má comunicação e falta de informação ao público; a necessidade de subsídio para manter o sistema funcionando; o envolvimento de muitas agências e a falta de uma autoridade única para simplificar a tomada de decisão e um número muito reduzido de empresas operando na cidade. (Muñoz, J. C., Batarce, M., & Hidalgo 2014, Benitez, 2016). Entre os motivos que levaram às dificuldades do Transantiago destacam-se: a implementação completa ao invés de etapas sucessivas para um sistema de grande escala representou sérias dificuldades de gestão, o foco da política na redução de custos e de impactos ambientais, mas não na qualidade do serviço. Apesar dos desafios, impactos positivos foram alcançados principalmente em termos de poluição do ar e segurança no trânsito, e a integração de tarifas com o metrô aumentou a acessibilidade neste modal (Muñoz, J. C., Batarce, M., & Hidalgo 2014). Em março de 2019, o governo chileno anunciou a substituição do Transantiago pela Red. A principal mudança anunciada foi a de melhoria dos padrões de serviços aos passageiros, renovação da frota de veículos composta por ônibus elétricos e Euro VI, e maior infraestrutura e tecnologia. A Red compreenderia também a construção de novas linhas de metrô integrando aos ônibus e ao Metrotren. Também foi anunciada abertura a outros modos de transporte, como o teleférico e bicicletas e a inclusão de múltiplos meios de pagamentos, mais modernos e flexíveis. Além disso, foram anunciadas novas formas de licitação. A previsão para as mudanças é progressiva em função da terminação sucessiva de contratos atualmente vigentes. Contudo, na visão de críticos, a mudança se baseia mais num plano de comunicação e imagem e há dúvidas quanto a sua capacidade de efetiva mudança (Fuentes, R, 2019). 35 Considerações finais Implementada desde 1986 e continuamente aprimorada, a política de restrição veicular de Santiago tem alcançado seu objetivo de melhorar a qualidade do ar na cidade. Ao incorporar gradualmente regras cada vez mais restritivas, o programa resultou em redução na circulação de automóveis em sua área de abrangência e, consequentemente, na redução da emissão de poluentes. No entanto, ao isentar veículos que utilizam combustíveis fósseis, mas que são mais novos, perde-se a oportunidade de se estimular uma maior migração modal para modos ativos e coletivos. O incentivo é de renovação da frota de automóveis e não da utilização de modos mais sus*tentáveis. Apesar de ser uma política que perdura por mais de três décadas em diferentes configurações, existe pouca transparência a respeito dos recursos arrecadados por ela e sua destinação. Diversos portais governamentais trazem informações sobre os períodos e normas de vigência da restrição, mas estes carecem de seções reservadas aos dados financeiros e de efetividade da medida. É importante destacar que a medida não ocorre de forma isolada, pois o PPDA também inclui instrumentos para minimizar as emissões das indústrias e a proibição do uso de lenha como combustível. Além disso, desde 2007 o Transantiago passou a operar e apesar de todos os desafios apresentados pelo sistema (Box 1), houve redução da antiga frota de ônibus, o que tende a ter impacto positivo na qualidade do ar. A Red que substituiu o Transantiago em 2019 tem como um dos seus principais objetivos a substituição da frota de ônibus por ônibus elétricos e Euro VI. No tema da mobilidade ativa, a cidade elaborou em 2015, o primeiro Plano Integral de Mobilidade (PIM) da Comuna de Santiago fundamentadas na priorização dos modais ativos (caminhada e bicicleta) e do transporte público e no desestímulo do uso de veículos motorizados particulares. Mais recentemente, um novo plano para o período de 2019-2029 foi publicado, no qual se reafirma as prioridades do primeiro documento e reporta-se os projetos executados até então: melhorias para a caminhabilidade com projetos de abertura de vias para uso exclusivo de pedestres, especialmente no centro histórico, fechamento parcial em alguns horários e dias da semana de algumas vias, alargamento de calçadas, intervenções para acalmamento do trânsito, construção de 22,7 km de ciclovias e instalação de bicicletários e transformação do leito do rio Mapocho no trecho canalizado em espaço público e corredor de mobilidade ativa (Mapocho Pedaleable). Sobre estratégias relacionadas ao tema deste caso, o PIM mais recente cita sutilmente a questão da cobrança de tarifa de congestionamento. O assunto já foi abordado em estudo 36 técnico de 2009 e desde 2015 tramita um projeto de lei (Projeto de Lei Nº 10184/2015) para regular a circulação de veículos motorizados por causa do congestionamento veicular ou de contaminação atmosférica, que permitiria a permissão da compra de um passe diário para a circulação nos dias de restrição veicular. Contudo ainda se encontra no primeiro trâmite constitucional no Senado e não há extensa discussão sobre o assunto na mídia, de modo que a restrição veicular vigente deve seguir como uma das principais medidas de gestão de demanda de transporte em Santiago. Tabela 5. Disposições gerais Restricción Vehicular– Santiago, Chile Item Valor Objetivo Melhoria da qualidade do ar Localização Região Metropolitana de Santiago (Perímetro do Anel Américo Vespúcio) Área de abrangência 279 km² Infraestrutura Câmeras instaladas nas vias públicas Contexto da área na cidade Área central Público-alvo Motoristas de automóvel particular Modal alvo Transporte motorizado Relevo Vale Despesas Não informado Receitas Não informado Composição do financiamento Público Redução na Emissão de CO2 Redução nos níveis de CO e PM10 Impacto central Redução da poluição do ar e diminuição da circulação de automóveis Elaboração própria. Referências 24 horas (2019) Nuevo sistema de transporte público: las diferencias entre "Red" y el "Transantiago". Disponível em: https://www.24horas.cl/nacional/nuevo-sistema-de- transporte-publico-las-diferencias-entre-red-y-el-transantiago-3159732 Autopistas Urbanas, Restrição veicular 2021 (2021). Ministério dos Transportes e Telecomunicações, Governo do Chile. Disponível em: https://www.mtt.gob.cl/wp- content/uploads/2021/04/AUTOPISTAS_Y_ANILLO.pdf. Acesso em 29/08/2021. 37 Benitez, F. (2016). Using the Logical Framework to Analyze Transantiago. Disponível em: https://wp.nyu.edu/mariafranciscabenitezbeas/wp- content/uploads/sites/3428/2016/06/Benitez_Transantiago.pdf Datos Geográficos. (2017). Gobierno Regional Metropolitano de Santiago. Disponível em: https://www.gobiernosantiago.cl/datos-geograficos/ Del Favero, G., Katz, R., & Solari, J. (2000). Restricción a la Circulación de Vehículos Catalíticos. Puntos de Referencia, editado por el Centro de Estudios Públicos, 225, 8. Disponível em: https://www.cepchile.cl/cep/site/docs/20160303/20160303185016/225delfavero_pm.p df Decreto 31 del 11 de octubre de 2016. (2016). Estabelece Plan de Prevención y Descontaminación Atmosférica para la Región Metropolitana de Santiago. Ministerio del Medio Ambiente de Chile, Govierno de Chile. 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Com a cobrança pelo estacionamento nas vagas localizadas no meio-fio, a política institui que o uso temporário de parte do espaço público pelos automóveis deve ser concedido perante uma outorga onerosa por parte daqueles que obtêm o benefício. Contexto Contando com uma população de 12,3 milhões de habitantes (IBGE, 2020) e respondendo isoladamente por 10,2% do PIB do país (IBGE, 2018), São Paulo é a cidade mais populosa do Brasil, e o seu principal polo econômico. Em seu território de 1.521 km (IBGE, 2020), encontra- se uma malha viária composta por aproximadamente 19,5 mil quilômetros de vias (Geosampa, s.d.) e em 2% destas que se aplica a Zona Azul, com especial concentração no Centro Expandido, região de destino de grande parte das viagens realizadas por automóvel na capital (Metrô, 2019). Em julho de 2019 o sistema contava com 43.521 vagas oferecidas, sendo 38.522 convencionais (carros), 1.844 destinadas a caminhões, 913 reservadas para pessoas portadoras de deficiência, 2.159 reservadas para idosos e 83 para fretamento. A figura 3.1 apresenta a distribuição das vagas na cidade. Figura 9. Distribuição das vias com Zona Azul Fonte: São Paulo/Geosampa, 2021. 43 Objetivos O objetivo da Zona Azul é promover um uso mais eficiente no uso do espaço público destinado a vagas de estacionamento nas vias públicas da cidade, fazendo com que cada espaço seja aproveitado por um número maior de pessoas. Dá-se, assim, preferência ao uso das vagas para a realização de um maior número de atividades de curta duração em detrimento de sua utilização por um único indivíduo em áreas com alta demanda de viagens e concentração de oportunidades de serviço, comércio e emprego. Para tal, foi estabelecido o estacionamento rotativo por meio de cobrança aos automóveis privados/particulares pela utilização do espaço viário para vagas de estacionamento localizadas no meio-fio das vias públicas da cidade. Instrumentos e implementação O instrumento utilizado para a implementação do estacionamento rotativo foi a adoção do Cartão Zona Azul. Desde a criação do serviço em 1975 até 2016, os cartões de estacionamento foram comercializados em forma de talões de papel, cujas folhas afixadas nos para-brisas dos veículos indicavam o período de permanência desejado (Contrato de concessão Nº 008/SMT, 2020). No ano de 2016, por conta da evasão relativa à comercialização ilegal de folhas de Zona Azul – que chegou aos R$ 53 milhões em 2015 – a CETSP passou a permitir que empresas credenciadas vendessem o Cartões Azul Digital (CAD) por meio de aplicativos de celular. Até 2017, os usuários do serviço puderam optar por comprar o cartão de estacionamento via talão de papel ou via CAD, coexistindo os dois sistemas. Já de 2017 em diante, a comercialização de cartões foi restringida ao serviço eletrônico via CAD, vendidos via aplicativo ou em pontos de venda físicos licenciados. Com a concessão da Zona Azul em 2020 para uma única empresa, a comercialização do CAD se tornou de exclusividade desta. Todos os créditos já adquiridos em outros aplicativos foram então transferidos para a plataforma disponibilizada pela concessionária única. Desde as folhas de papel até o CAD, a lógica e o funcionamento da Zona Azul se mantiveram praticamente os mesmos. Em todas as vagas destinadas ao estacionamento rotativo há uma placa de sinalização próxima que indica o tipo da vaga, os dias e horas em que a Zona Azul se aplica, e os detalhes de cobrança quando necessário. De maneira geral, a Zona Azul tem vigência de segunda a sexta das 7h às 19h e aos sábados das 7h às 13h, sendo permitido o uso de 1 CAD para 1 hora de permanência e 2 CADs para 2 horas, no máximo. Em vagas especiais essa relação é alterada, se nos bolsões de caminhões, por exemplo, cada CAD equivale a 30 minutos, nas áreas externas a parques um CAD permite o estacionamento por 2 horas. Já o seu valor é uniforme independentemente do tipo de vaga ou de localidade, 1 44 CAD possui o valor de R$ 5,00. O sistema não apresenta, portanto, tarifa dinâmica ou progressiva no tempo. A fiscalização do uso correto das vagas é de responsabilidade do poder público, sendo exercida pela equipe de agentes de trânsito da CETSP. A utilização irregular das vagas é considerada infração grave, com multa de R$ 195,23 e mais cinco pontos no prontuário (CETSP, s.d). Atualmente, a definição do montante de vagas oferecidas pelo sistema rotativo pago é de responsabilidade da prefeitura, sendo necessário informar mensalmente a inclusão ou supressão de vagas à empresa concessionária. A partir da diferença do total de vagas é calculado o valor de desequilíbrio do contrato, visto que há uma alteração na base de arrecadação do serviço. Se o valor de desequilíbrio ultrapassar, para mais ou para menos, o limite de R$ 576,5 mil, se faz necessário o reequilíbrio econômico-financeiro do contrato, alterando-se os valores relativos de outorga. Com relação às dificuldades encontradas na implementação da política, o mercado clandestino de folhas de estacionamento representou um grande entrave para sua operação. Tanto a falsificação de cartões, como a venda dos cartões originais a preços maiores que os oficiais resultaram em grandes ineficiências no serviço, tanto para o poder público quanto para os usuários. A digitalização do pagamento pelo estacionamento veio superar tal situação. Arranjo regulatório Em 1975, a partir do Decreto Municipal Nº 11.661 (1974), a Prefeitura de São Paulo autorizou à Empresa Municipal de Urbanização (EMURB) a exploração econômica de estacionamento em vias e logradouros públicos do município, instituindo o estacionamento rotativo. No ano de 1981, por meio do Decreto Municipal Nº 17.115 (1981), é transferida a permissão da exploração do serviço da EMURB para a CETSP, que se torna então a responsável pela demarcação de vagas, comercialização de cartões de estacionamento e fiscalização da utilização do serviço. Os recursos obtidos nessa operação passam a compor as receitas próprias da companhia, uma empresa de economia mista vinculada à Prefeitura de São Paulo. Em novembro de 1997, autorizada pelo Código Brasileiro de Trânsito (Lei Federal Nº 9.503/97), a Câmara Municipal aprova o projeto de lei encaminhado pelo executivo que visa autorizar a outorga onerosa, mediante concessão, da exploração de estacionamento em vias e logradouros públicos do Município. Nesta legislação (Lei municipal Nº 12.523/97), determina- se que o prazo desta concessão não poderá ser superior a 30 anos e que a empresa concessionária ficará responsável por fornecer, instalar e conservar os equipamentos 45 empregados no sistema, além de realizar as obras necessárias para a operação (como instalação de sinalização viária). O poder público, em contrapartida, ficará encarregado da definição da tarifa do estacionamento, da delimitação das vagas e da fiscalização do cumprimento das normas de estacionamento. Apesar da regulamentação da possibilidade de concessão da Zona Azul, o serviço seguiu sob responsabilidade da CETSP até 2020. Neste ínterim, uma alteração regulatória que cabe destaque foi a provocada pelo Decreto Municipal Nº 57.115 (2016), o qual autorizou a venda digital do cartão Zona Azul por empresas privadas. Se antes a comercialização dos cartões de estacionamento se dava de forma física em talões de papel, o decreto possibilitou que diversas empresas credenciadas pudessem disponibilizar o CAD via aplicativos de celular. Essa forma de funcionamento do serviço se deu até 2020, quando a operação da Zona Azul foi concedida à iniciativa privada. A concessão do estacionamento rotativo passa a integrar o plano municipal de desestatização e, em 2019, parte das regras de licitação, pagamento e remuneração da concessionária estabelecidas pela Lei municipal Nº 12.523/97 são revogadas (Lei municipal Nº 16.703/17; Lei municipal Nº 17.068/19). O sistema de estacionamento rotativo pago é então regulamentado por decreto e são estabelecidas regras para a política tarifária, competências para organização e fiscalização do serviço (Decreto Municipal Nº 58.605/19). Este decreto foi alterado posteriormente e passou a definir também o número máximo de vagas e a necessidade de comunicação do Tribunal de Contas do Município sobre a implantação ou supressão de vagas para o serviço de estacionamento rotativo durante a vigência do contrato de concessão (Decreto Municipal Nº 58.956/19). Com a concessão do estacionamento rotativo firmada pelo Contrato de Concessão N.º 008/SMT/2020, a empresa Z.A. Digital de São Paulo Sistema de Estacionamento Rotativo S.A. obteve a exclusividade da venda dos CADs no município. Nesta nova configuração do serviço, a empresa concessionária fica responsável pela manutenção, conservação e requalificação das vagas e dos equipamentos de sinalização, pelo desenvolvimento e operação do aplicativo de comercialização dos CADs, pela implantação do Centro de Controle Operacional (CCO) e de mecanismos de apoio à fiscalização das vagas, para além da infraestrutura de tecnologia de informação necessária para a execução do serviço. Por parte do poder público, este ainda se responsabiliza pela fiscalização do uso correto das vagas e autuação caso existam irregularidades, seja por meio das imagens e informações advindas do CCO ou pela atuação em campo de agentes de trânsito. Além do mais, permanece a cargo da prefeitura a definição da localização e quantidade de vagas disponíveis no sistema rotativo pago. 46 Recursos, atores e investimentos Visto que o serviço de estacionamento rotativo foi objeto de concessão pública, com contrato firmado em 19 de maio de 2020, encontram-se disponíveis as informações financeiras apresentadas pela empresa vencedora da concorrência a respeito dos custos e receitas estimados para a oferta do serviço. O contrato, assinado entre a Prefeitura do Município de São Paulo e a empresa Z.A. Digital de São Paulo Sistema de Estacionamento Rotativo S.A., com um prazo de concessão de 15 anos, apresentou valor total de R$ 2.327.763.021,67 (Contrato de Concessão N.º 008/SMT, 2020). Na composição desse valor, de mais de 2 bilhões de reais, constam os valores relativos aos investimentos, despesas e custos previstos para a execução das obrigações do contrato, além das outorgas a serem pagas à prefeitura. Com relação às outorgas, o edital de licitação estipulou o pagamento de 3 tipos de outorga. A primeira é chamada de Parcela 1 de Outorga Fixa, que é um valor fixo a ser pago para a prefeitura mensalmente pela exploração do serviço a partir do primeiro mês subsequente à assinatura do contrato. Com valor mínimo proposto de 1 milhão de reais, a proposta comercial da concessionária estabeleceu o valor a ser pago por essa outorga em R $4 milhões por mês. A segunda outorga, chamada de Parcela 2 de Outorga Fixa, consiste em um valor de R $595,4 milhões a ser pago à vista no ato da assinatura do contrato ou de maneira parcelada, com última parcela vencendo em dezembro de 2020. Já a terceira outorga é a Outorga Variável, que é atrelada à receita bruta da operação do estacionamento rotativo, para a qual se estima um valor mensal médio de aproximadamente R$ 21 milhões. Estes valores arrecadados pelo poder público através das outorgas têm como destinação o Fundo Municipal de Desenvolvimento Social (FMD), que foi criado pela Lei Municipal Nº 16.651/2017 para receber os recursos advindos dos projetos de desestatização de bens e serviços da Prefeitura (Prefeitura da capital, 2020). Como especificado no art. 6º da lei que o institui, o fundo tem como finalidade investir nas áreas de saúde, educação, segurança, habitação, transporte, mobilidade urbana e assistência social do município. Sendo assim, os recursos arrecadados através das outorgas da concessão da Zona Azul não se encontram vinculados diretamente ao desenvolvimento de alternativas ao transporte individual. Com relação aos custos projetados para a operação da Zona Azul, a concessionária apresentou em seu contrato o montante de 35,5 milhões de reais em média por ano a ser destinado para o pagamento de mão de obra, seguros, manutenção de veículos, entre outros gastos. Já como investimentos, foram contabilizados R$ 4,3 milhões por ano, em média, que serão destinados para itens como sinalização vertical e horizontal, estrutura de TI, desenvolvimento de pontos de venda etc. Pelo lado das receitas, o contrato apresenta que a concessionária estima obter uma receita bruta anual de, em média, R$ 220,8 milhões, advinda da cobrança do estacionamento rotativo. 47 Apesar da concessão da operação da Zona Azul ser operada à iniciativa privada, o poder público preserva a responsabilidade de fiscalizar a correta utilização do serviço. Contratada pela Secretaria SMT para realizar a gestão do trânsito na cidade, a CETSP incorpora também a fiscalização da Zona Azul em seu rol de atividades. No entanto, no contrato firmado entre as partes, não se encontram especificados os valores dispostos exatamente para essa função. O que é possível recuperar, por outro lado, é a origem das dotações vinculadas à execução do contrato. No contrato vigente para o ano de 2021, a maior parte das dotações tem como origem o Fundo Municipal de Desenvolvimento do Trânsito (FMDT), fundo composto principalmente pelos valores arrecadados pelas multas de trânsito (Prefeitura da capital, 2021). Estratégias de comunicação A principal forma de comunicação da Zona Azul é a utilização de sinalização horizontal (faixas) e vertical (placas) nas vias públicas do município (Figura 3.2). O provimento de tais infraestruturas, inclusive, é o item com maior participação nas estimativas de investimento apresentadas no edital de concessão do serviço, somando um montante de R $24,4 milhões a cargo do concessionário. Outras ferramentas de comunicação utilizadas são a disponibilização de informações relativas ao serviço através de sites e aplicativos, tanto por parte da CETSP quanto da empresa concessionária. Por se tratar de uma medida vigente por mais de quatro décadas, encontra- se instalada dentro da cultura da cidade e seus motoristas. Figura 10. Sinalização de vaga Zona Azul Fonte: Imagem do autor, 2021 48 Resultados Desde a implantação da política em São Paulo, o número de vagas destinadas ao estacionamento rotativo passou de 5 mil em 1975 para mais de 43 mil em 2019 (Concorrência internacional Nº 01/SMT, 2019). Dados levantados pela CETSP indicam que no ano de 2018 foram arrecadados R$8.166.525 em média por mês, através da comercialização de CADs (CETSP, 2019). Neste mesmo período, o número de CADs vendidos mensalmente foi de aproximadamente 2 milhões de cartões, em média. Não foram identificados estudos orientados ao monitoramento e avaliação da medida do ponto de vista de gestão de demanda e distribuição do espaço público entre modais. Quadro 2. Sistema de transporte público urbano municipal de São Paulo Sistema de transporte público urbano municipal de São Paulo O sistema de transporte público coletivo municipal por ônibus de São Paulo passou por uma forte transformação a partir da implementação do Sistema Interligado quase 20 anos atrás, que reestruturou o modelo operacional e institucional e desde então continuou evoluindo em diversos aspectos. Essa reestruturação articulou componentes de operação, infraestrutura, tecnologia e financeiro-institucional que resultaram em uma verdadeira rede de ônibus, incluindo: ampla abrangência dentro de um mesmo sistema (desde a cobertura local até os corredores estruturais), integração tarifária e operacional que brinda versatilidade nas escolhas de viagem aos usuários, e infraestrutura de priorização dos ônibus para ganhar velocidade e eficiência na operação e reduzir tempos de viagem dos passageiros. O bilhete único (2004) permitiu a integração por meio de uma tarifa única em uma janela de tempo sem cobrança por transbordos, dando muito mais versatilidade e racionalidade para os usuários na escolha de caminhos e combinações de rotas. Os passageiros passaram a poder escolher a combinação de linhas mais conveniente, deixando de ter de pagar pelas arbitrariedades do desenho da rede em todas os pares de origem-destino que não contavam com linhas diretas (ou de escolher trajetos mais longos e indiretos para evitar transbordos anteriormente pagos). O desenho e capacidade da rede ganhou abrangência na totalidade do município a partir da reorganização e formalização dos antigos "perueiros". O sistema se divide em 8 regiões operacionais cada uma das quais com uma concessão do serviço estrutural e uma permissão para o serviço local. Adicionalmente, um perímetro central é atendido por todos os operadores. A rede integra cobertura local (capilaridade da rede nos bairros) e conexões estruturais. Novos corredores, em especial aqueles com faixas exclusivas ao centro da via, têm incrementado a capacidade dos eixos de transporte. O modelo oferece alta versatilidade e 49 alternativas de escolhas de rotas para os passageiros, ao tempo que evita transbordos desnecessários típicos em sistemas estritamente tronco-alimentados. A SPTrans, autarquia municipal, é responsável pelo sistema municipal de transporte público o qual conta com 1339 linhas de ônibus (337 do Estrutural; 445 do Local de Articulação Regional; 521 de Distribuição (SPTrans, 2021a)) e uma frota contratada de 13.899 veículos (4316 do Estrutural; 3534 do Local de Articulação Regional; 6049 de Distribuição (Sptrans, 2021b)). Previamente à pandemia de COVID-19, o sistema transportava acima de 200 milhões de passageiros por mês. Entre março de 2020 e julho de 2021 os níveis de demanda oscilaram entre 70 e 140 milhões de passageiros. Em agosto de 2021 o sistema voltou a transportar 150 milhões de passageiros. O sistema lida atualmente com importantes incertezas sobre o potencial de recuperação de demanda ao tempo que tem se intensificado as necessidades de fortalecimento do serviço de transporte público. Mesmo com a priorização para o ônibus no viário, ainda há partes muito significativas da rede onde seria desejável implementar corredores, incluindo as propostas do PDE e do PlanMob e também a possibilidade de sistemas exclusivos completamente segregados em eixos de alta demanda. As regiões Leste 1 3 e Leste 2 4 , por exemplo, possuem uma cobertura entre 10 e 20 vezes menor em termos de extensão de corredores por habitante do que o Centro, enquanto em outras regiões predominantemente residenciais como a Oeste5 , Sul 16 e Sul 27 essa relação é de apenas 0,8, 1,1 e 2,1. Já na região Norte 1, sequer constam corredores. Segundo a Nota Técnica Nº 2 do Centro de Estudos da Metrópole, se fossem implementados os corredores previstos no PDE, essas desigualdades seriam drasticamente reduzidas. Um dos desafios para essa ampliação de capacidade é conseguir realocar espaço urbano que viabilize a introdução de corredores de alta capacidade. Para isso um fator crítico é conseguir introduzir corredores com faixas de ultrapassagem e estações modulares. Os corredores de ônibus potencializam sinergias na perspectiva da gestão da demanda de viagens. A priorização dos ônibus contribui simultaneamente a criar melhores condições para o transporte público, tornando-o mais atrativo para os usuários, e desincentivar o uso do automóvel em função da redução da capacidade viária e, em consequência, da redução da velocidade nesses trechos. Melhorar a qualidade de serviço dos ônibus e a eficiência operacional implica benefícios: 3 Inclui, entre outros, Brás, Mooca, Penha, Aricanduva, Sapopemba. 4 Inclui, entre outros, Guaianazes, Itaquera, Cidade Tiradentes, São Miguel, São Mateus. 5 Inclui, entre outros, Rio Pequeno, Butantã, Jaguaré, Lapa, Pinheiros, Perdizes. 6 Inclui, entre outros, Jabaquara, Ipiranga, Sacomã, Heliópolis, Vila Mariana, Saúde, Moema. 7 Inclui, entre outros, Santo Amaro, Grajaú, Parelheiros, Jardim Ângela, Capão Redondo, Campo Limpo. 50 • Na perspectiva dos usuários: redução dos tempos de viagem, melhoria da confiabilidade do serviço e dependendo do caso, redução dos níveis de ocupação veicular (caso o aumento das velocidades operacionais seja usado para aumentar a frequência nos corredores). • Na perspectiva dos gestores e prestadores de serviço: maior produtividade da frota em função do aumento da velocidade operacional, maior controle sobre a operação pela eliminação de interferências do tráfego, melhorando a regularidade, a previsibilidade e o poder de ação e capacidade de resposta frente a contingências e ocorrências na operação. Desincentivar o uso do transporte privado individual decorrente da redução de capacidade viária para o tráfego misto tem os seguintes efeitos: • Criar maior impedância para os automóveis, fazendo o transporte privado individual menos competitivo frente às alternativas mais sustentáveis. • Sinalizar de forma clara e direta para a população em geral a mudança de prioridades na alocação do espaço viário, contribuindo para mudanças de percepção sobre a mobilidade urbana que podem reforçar as mudanças de hábitos de viagem desejadas. Considerações finais Implementada há mais de quarenta anos no município de São Paulo, a Zona Azul tem contribuído com a regulação do estacionamento nas vias públicas da cidade, principalmente na região central. Assim, é possível compreender que os benefícios advindos da implementação dessa política se deram pela instituição da cobrança do uso de parte do espaço público pelos automóveis, gerando novas receitas para o poder público. No entanto, apesar de ter passado por transformações neste período, como a ampliação do número de vagas disponibilizadas e a substituição dos talões em papel para o cartão de estacionamento digital, a dinâmica da política permanece orientada basicamente para fins de exploração econômica, sem aparente exploração do seu enorme potencial para desincentivar o uso do automóvel em favor de outros modais. Em igual sentido caberia a reflexão em relação à distribuição do espaço público destinado ao viário e, dentro desse, o espaço destinado ao automóvel em relação ao destinado a calçadas, ciclovias e faixas de ônibus. Apesar de ser justificável a reserva de vagas para o estacionamento de automóveis em algumas áreas, cabem observações em relação à precificação do serviço e a distribuição do espaço público. A dinamização do preço pelo uso da vaga poderia acompanhar as flutuações da demanda por vagas nas diversas regiões da cidade, cobrando-se um valor maior onde e quando há mais procura e ao vice-versa; a tarifa dinâmica favorece também a orientação de 51 comportamentos e decisões individuais em relação à escolha do modal. A distribuição da oferta poderia também desincentivar o uso do automóvel, principalmente em áreas bem servidas de transporte público, realocando o meio-fio para outras finalidades como ampliação de calçadas, implantação de ciclovias e faixas de ônibus ou requalificação de espaços públicos. Outro elemento que poderia fortalecer a conexão da política com o incentivo a outros modos de transporte mais sustentáveis seria a vinculação dos recursos arrecadados por ela ao financiamento desses modais. Atualmente, os valores arrecadados pela outorga da concessão da Zona Azul são destinados ao Fundo Municipal de Desenvolvimento Social, que não possui condicionantes específicas para o investimento em transporte público coletivo nem em mobilidade ativa. A Zona Azul, ferramenta implantada na cultura da mobilidade da cidade, tem enorme potencial para um uso social e ambientalmente mais eficiente, sustentável e equitativo do espaço urbano. Tabela 6. Disposições gerais - Zonal Azul - São Paulo, Brasil Item Valor Objetivo Cobrança pelo uso das vagas públicas de estacionamento no meio- fio Localização São Paulo, Brasil. Regiões de comércio e serviços Área de abrangência 372,4 km de vias (2% das vias do município) Infraestrutura 43.521 vagas (julho/2019) Contexto da área na cidade Áreas comerciais e de serviços, principalmente no centro expandido Público alvo Motoristas de automóvel particular Modal alvo Transporte individual motorizado Relevo Diverso Despesas R$ 40 milhões (2020) – Concessionária Receitas R$ 220 milhões (2020) Composição do Majoritariamente privado financiamento Redução na Emissão de Não encontrado CO2 Impacto central Arrecadação de R$ 8,1 milhões por mês, em média (2018) Elaboração própria. 52 Referências CETSP. (s.d.). Tudo sobre Zona Azul Digital: Regras para estacionar em áreas de Zona Azul. Disponível em: http://www.cetsp.com.br/consultas/zona-azul/tudo-sobre-zona-azul- digital/regras-para-estacionar-em-areas-de-zona-azul.aspx Acesso em 30/07/2021. CETSP (2019) Levantamento mensal: Comercialização, autuação e vagas da Zona Azul. Disponível em: https://drive.google.com/file/d/13tvopRyT- uJYtyunQx3dGRIVO9yuVtZl/view Acesso em 30/07/2021. Concorrência internacional Nº 01/SMT/2019 (2019) Concessão onerosa para exploração, por particulares, do serviço de estacionamento rotativo em vias e logradouros públicos no município de São Paulo. Disponível em: https://drive.google.com/file/d/1LwESIDNT4- KP8VayVHShaSBmZ-wMk-ac/view Acesso em 30/07/2021. Contrato de concessão Nº 008/SMT/2020. (2020). Concessão onerosa para exploração, por particulares, do serviço de estacionamento rotativo em vias e logradouros públicos no município de São Paulo. Disponível em: https://drive.google.com/file/d/1VTLVXIik2XV0- 6mSab7T7QXSOXVS-zFw/view Acesso em 30/07/2021. Decreto Municipal Nº 11.661, de 30 de dezembro de 1974. (1974). Dispõe sobre permissão de exploração de estacionamento em vias e logradouros públicos do Município e dá outras providências. São Paulo. Decreto Municipal Nº 17.115, de 5 de janeiro de 1981. (1981). Dispõe sobre a transferência, para a Companhia de Engenharia de Tráfego - CET, da permissão para exploração de estacionamento em vias e logradouros públicos do Município, e dá outras providências. São Paulo. Decreto Municipal Nº 57.115, de 7 de julho de 2016. (2016). Autoriza a cobrança do preço pela utilização de vagas do sistema de estacionamento rotativo pago - Zona Azul por meio de tecnologia digital. São Paulo. Decreto Municipal Nº 58.605 de 17 de janeiro de 2019. (2019) Regulamenta o sistema de estacionamento rotativo pago no Município de São Paulo e dá outras providências. Disponível em: http://legislacao.prefeitura.sp.gov.br/leis/decreto-58605-de-17-de- janeiro-de-2019 Acesso em 30/07/2021. Diego Tomasiello, Steffano de Vasconcelos, Fernando Gomes, German Freiberg, Tainá Bittencourt, Bruna Pizzol e Mariana Giannotti (2021). Priorizar o transporte público e desestimular o carro? Nota Técnica Nº 2 - 12 Julho de 2021. 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Disponível em: https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/mobilidade/institucional/sptrans/ac esso_a_informacao/index.php?p=245214 Acesso em 28/07/2021. 54 55 Congestion Charge, Londres - Inglaterra A Congestion Charge, traduzida como taxa de congestionamento, se destaca como uma ferramenta legal e política para a redução do tráfego e congestionamento, além de ser fonte de arrecadação para a administração pública da cidade de Londres. A taxa foi implantada em 2003 junto com melhorias no sistema de transporte público, com o aumento de linhas de ônibus e frota, e da infraestrutura para a mobilidade ativa, com a ampliação da rede cicloviária e o incentivo ao deslocamento a pé (Plano de Caminhabilidade de Londres, Walkability Plan). Os avanços na agenda de mobilidade foram fomentados e implementados pela agência de transportes de Londres, a Transport for London (TfL), com o objetivo de melhorar a qualidade das ruas, reduzindo sinistros de trânsito e propiciando a ativação dos espaços públicos. Contexto Londres tem seu território composto por 33 regiões administrativas (próxima do que entendemos por subprefeituras no Brasil), divididas em 32 distritos (London boroughs) e pelo distrito central, a City of London, que juntas conformam a Grande Londres (Greater London)8, que abrange geograficamente todo o município (Figura 11). A Congestion Charge aplica-se no distrito Central (City of London) onde residem 7.700 habitantes (City of London, s.d.), numa área de 2.90km2, que representa menos de 1% do município todo, ou seja, da Grande Londres (com uma área de 1.569 km2). A proporção da área de vigência da Congestion Charge em relação ao resto da cidade pode ser observada na Figura 12 Figura 11. Mapa da Greater London e seus Figura 12. Mapa da Região de Londres: 33 distritos Greater London (2) e City of London (1) Fonte: Wikipedia, 2021. 8 O distrito central City of London recebe destaque entre os outros por sua importância histórica. 56 O debate político sobre as questões do tráfego urbano, congestionamento e os impactos de tempo/deslocamento e ambientais causados pela circulação de veículos no centro de Londres datavam desde a década de 1960, portanto foram quase quarenta anos de análises e debates na escala local e governamental para a criação de uma política de cobrança aos veículos privados para a cidade. O Programa Congestion Charge foi introduzido no ano de 2003, com o intuito de reduzir o tráfego e o congestionamento no centro de Londres. A zona de cobrança é composta pelos 19 distritos centrais à Grande Londres, tal como mostra o mapa abaixo (Figura 4.3). Antes da implementação do programa, o congestionamento e o tempo perdido no trânsito geravam uma perda de £2-4 milhões/semana à economia (Kaparias, I. & Bell, M. G. H.,2012). A medida foi implementada através da cobrança de uma taxa aos motoristas que adentrassem a zona estabelecida pelo plano (CCZ zone - Zona da Congestion Charge), incentivando-os a utilizarem outros modais de transporte. O programa de cobrança juntamente às políticas de incentivo ao uso de outros modais, transformaram o transporte da cidade de Londres desde então. Figura 13. Mapa da Zona da Congestion Charge – Zona central de Londres. Fonte: Congestion Charge Zone, s/d. A Congestion Charge por si só não resolveu questões relacionadas à qualidade do ar - uma premissa que acompanhou as políticas e estratégias para a saúde pública de Londres (London Health Strategy) juntamente à TfL (Mindell J, Sheridan L, Joffe M, et al.,2004), pois a medida 57 não altera a circulação de veículos de carga e utilitários, além de resultar no aumento da circulação de ônibus - em torno de 27% de aumento (entre 2002 e 2003) na entrada e saída de ônibus no período e na zona definida pela Congestion Charge (Transport of London, 2004). Por essa razão, em 2008, foi criada de forma complementar a Zona de Baixa Emissão (Low Emission Zone - LEZ), que restringe a circulação de todos os veículos pesados e vans que desejam circular dentro da zona, numa área que abrange a quase totalidade da Greater London. A Zona de Baixa Emissão também não mostrou-se suficiente para atingir os patamares desejados de redução da poluição no centro de Londres, sendo criada em 2019 a Zona de Ultra Baixa Emissão (Ultra-Low Emission Zone – ULEZ), no perímetro coincidente à Congestion Charge, mas com a restrição adicional na qual é cobrada uma taxa extra para todos os carros e vans a diesel que não atingem os parâmetros Euro 6, aos carros e vans a gasolina que não atingem os parâmetros Euro 4 e motocicletas que não atingem os padrões Euro 3. A ULEZ é uma atualização da extinta cobrança de toxidade (T-Charge), uma cobrança extra (além da Congestion Charge) para carros que não se enquadravam aos parâmetros de toxicidade permitidos nas zonas definidas (padrões Euro)9. O mapa da figura 14 indica espacialmente as áreas de abrangência de cada medida de cobrança viária. A Congestion Charge Zone (CCZ, em vermelho na Figura 14), implantada em 2003, abrange uma área de 22 quilômetros quadrados (8,49 milhas quadradas) e compreende 1,4% da área total de Londres. A ULEZ abrange a mesma área da CCZ, com futura expansão para outubro de 2021 (em verde na Figura 14). A LEZ (em azul na Figura 14) abrange a quase totalidade do território da Greater London (aprox. 1.569 km2). 9 Os padrões Euro são uma série de controles de emissões, baseados em diretrizes europeias que estabelecem limites para os poluentes gerados por motores a gasolina, gás e diesel. Mais informações: http://content.tfl.gov.uk/health-impact-assessment.pdf 58 Figura 14. Mapa das zonas de cobrança de taxas sobre veículos de Londres Fonte: Maproom, s/d. Objetivos A Congestion Charge faz parte do plano maior de estratégias de transportes (Mayor’s Transport Strategy MTS) desenvolvido pela agência de transportes de Londres (Transport for London TfL) desde sua primeira edição, em 2001, quando já incluía propostas para a implementação da cobrança (City of Westminster, 2001). Seu objetivo é a redução do congestionamento na área central de Londres como mecanismo para atingir diversos objetivos, dentre os quais se destacam: • realizar melhorias radicais nos serviços de ônibus; • melhorar a confiabilidade do tempo de viagem para usuários de automóveis; • tornar a distribuição de bens e serviços mais eficiente. Além disso, ao reduzir os níveis de tráfego e congestionamento, foi possível ampliar o sistema de transporte público, principalmente da rede de ônibus (maior oferta, menor tempo de espera e melhor distribuição modal), melhorar a segurança e a qualidade ambiental para o centro de Londres. De forma mais geral, também produz receitas líquidas para apoiar a Estratégia de Transporte da Prefeitura. 59 Instrumentos e implementação O sistema de cobrança da Congestion Charge é automatizado através do reconhecimento numérico das placas veiculares e câmeras de monitoramento que registram todas as entradas e saídas em pontos específicos da delimitação da zona de cobrança. Os horários aplicados são das 7:00 às 22:00, todos os dias do ano. Os motoristas pagam uma taxa de £15 por dia para acessar a zona. Quando as regras estabelecidas não são respeitadas, é aplicada uma multa de £160 (com uma redução para £80, caso o infrator pague dentro de 14 dias). A cobrança é aplicada a todos os veículos que acessam a zona central de Londres, com exceção para os seguintes casos10: • Habitantes que residem internamente à zona da Congestion Charge, recebendo um desconto de 90% sobre o valor da taxa; • Veículos pouco poluentes (elétricos ou movidos à hidrogênio); • Veículos com mais de 9 lugares; • Situações de emergência e ambulâncias; • Veículos militares; • Triciclos motorizados. • Guinchos habilitados. Para uma compreensão maior do funcionamento dos sistemas de cobranças viárias adotadas em Londres, vale ressaltar a existência das outras zonas LEZ e ULEZ e suas áreas de influência e funcionamento. Resumo do sistema de cobranças (UNEP, 2019): • Congestion Charge: Opera entre 07:00-22:00 todos os dias do ano, com exceção ao feriado de Natal (25 dezembro); • ULEZ: Opera 24 horas por dia, todos os dias do ano, com exceção ao feriado de Natal (25 dezembro) – limitando a entrada de veículos a diesel e a gasolina (de acordo com os parâmetros Euro), sendo cobrada uma taxa de £12.50/dia (carros, vans e motocicletas) e £100/dia (caminhões e ônibus); • LEZ: Opera 24 horas por dia, todos os dias do ano – limitando a entrada de veículos pesados (caminhões e utilitários) movidos a diesel. É cobrada uma taxa de £100 para vans, veículos diesel (1.2 a 3.5ton) ou mini-ônibus (mais de 5 ton), que não atingem o parâmetro Euro 3 (padrões de emissão de poluentes pelo tipo do motor); caminhões, vans e veículos pesados (mais de 3.5 ton), ônibus/mini-ônibus (mais de 5 ton) que não atingem o padrão Euro 6 mas atingem o padrão Euro 4. E para caminhões, vans e 10 Transport of London, s.d. Discounts and exemptions. 60 veículos pesados (mais de 3.5 ton) , ônibus/mini-ônibus (mais de 5 ton) que não atingem o padrão Euro 4, é cobrada uma taxa de £300. Tabela 7. Comparação entre os sistemas de cobranças viárias de Londres Nome Objetivo Área de Quem é cobrado*? Mudanças a partir de cobertura 2021 Congestion Reduzir Centro de Basicamente todos os Veículos híbridos não charge (início congestiona- Londres veículos serão mais isentos a em 2003) mento partir de out/2021 Low emission Diminuir Quase toda Veículos pesados e utilitários Os parâmetros Euro de zone (início poluição a Grande antigos e mais poluentes emissões foram em 2008) Londres (caminhões, ônibus e alguns modificados para tipos de vans) aqueles adotados pela ULEZ, a partir de março/2021. Ultra-low Diminuir Igual Veículos antigos e mais O limite da zona será emission poluição Congestion poluentes, movidos a expandido para as zone (início Charge gasolina (abaixo do padrão rodovias circulares ao em 2019) Zone. Euro 4) e diesel (abaixo do norte e ao sul a partir de padrão Euro 6), motocicletas out/2021. (abaixo do padrão Euro 3) Fonte: https://www.london.gov.uk/what-we-do/environment/pollution-and-air-quality/mayors-ultra-low- emission-zone-london *Para todas as cobranças existem alguns casos de isenção da taxa, a depender da regra específica para cada zona, tal como residentes, pessoas com limitações físicas, alguns taxis registrados, veículos militares, etc. A Congestion Charge é continuamente monitorada e os resultados são publicados em relatórios elaborados pela agência de transportes TfL. O conteúdo desses relatórios reflete o programa abrangente de monitoramento que acompanha os sistemas de cobrança implementados em Londres. Esse monitoramento cobre não apenas os impactos mais imediatos da cobrança no tráfego e transporte, mas também os impactos sociais, econômicos e ambientais mais amplos. Desde a implementação da Congestion charge em 2003, foram realizados seis relatórios, sendo o último lançado em 2008 (Tfl, s/d. Congestion Charge). Além desses relatórios de monitoramento, são publicados anualmente no site da prefeitura (TfL, s/d. Annual Report) todos os dados referentes à cobrança da taxa, e das outras medidas de cobranças viárias, como número total de cobranças, receitas recolhidas e performance das medidas adotadas – seus impactos e benefícios. 61 Figura 15. Mapa da zona central de Londres para os limites da Taxa de Congestionamento, ULEZ e ampliação da ULEZ. Fonte: Transport of London, s/d. ULEZ overwiew map. Arranjo regulatório Segundo a publicação New York City Global Partners (2012), os estudos sobre a viabilização da taxa de congestionamento em Londres datam dos anos 1960. Em 2000, foi publicado o relatório técnico para opções de cobranças viárias para a cidade de Londres ( Technical Assessment Report on the Road Charging Options for London - ROCOL), constituindo a principal fonte de argumentos técnicos para a implementação da medida (Mindell J, Sheridan L, Joffe M, et al., 2004). O marco regulatório emitido pelas autoridades do governo do Reino Unido (UK Legislation) para viabilização do programa - Greater London Authority Act, de 1999, deu ao prefeito (Ken Livingstone, 2000-2008) autoridade para fornecer orientações e diretrizes para a entidade de transporte de Londres, a Transport for London (TfL). O segundo marco regulatório para a consolidação da Congestion Charge, chamado de Greater London (Central Zone) Congestion Charging Order of 2004 , determina onde e como o plano iria operar na cidade, quem seria taxado pela cobrança, também, como os recursos recolhidos 62 através da cobrança seriam gastos, ou seja, sua destinação (New York City Global Partners, 2012). Mesmo que a prefeitura tivesse autoridade para introduzir cobranças viárias através da implementação da Congestion Charge, Livingstone à época obteve sucesso pois conseguiu conciliar os interesses tanto das governanças locais como também do setor privado, pautando- se num discurso apoiado pelas evidências econômicas e técnicas fornecidas pela pesquisa ROCOL. A medida foi acompanhada por ações também efetivas na provisão de infraestrutura e alternativas reais à população afetada pela zona de restrição, de modo que no mesmo dia em que entrou em vigor, foram disponibilizados 300 novos ônibus, novos itinerários e 8500 novas rotas cicláveis. Portanto as contínuas melhorias no sistema de transporte de Londres (metrô, ônibus, bicicletas e pedestres) e um esforço para realização de consultas públicas contribuíram para a aprovação da medida pela população (WRI, 2021). Em resumo, segundo o panorama fornecido pelo Center of Public Impacts (2016), o engajamento das partes interessadas foi feito da seguinte forma: • Houve um bom envolvimento das partes interessadas, incluindo o prefeito de Londres, TfL, a Assembleia de Londres, o governo nacional e as autoridades locais. • A iniciativa foi planejada por Ken Livingstone em colaboração com ROCOL, TfL e a Assembleia de Londres. A TfL usou seu Fundo Geral para as despesas incorridas no plano (Mindell J, Sheridan L, Joffe M, et al. 2004). • O governo do Reino Unido forneceu parte do financiamento por meio do Ministério dos Transportes. • As autoridades locais na zona de cobrança de congestionamento instalaram uma rede de câmeras de vídeo para registrar os números das placas; • O Departamento de Transporte, as autoridades rodoviárias locais e a Agência de Rodovias trabalharam em estreita colaboração com a TfL na instalação de sinalização para o esquema indicando, por exemplo, onde os limites da zona de cobrança estavam localizados. Recursos, atores e investimentos As receitas provenientes da Congestion Charge são por lei direcionadas às melhorias no transporte público, alinhadas ao Plano de Estratégias para o Transporte de Londres (Mayor's Transport Strategy, 2018). A cobrança faz parte da totalidade de receitas do TfL, ou seja, não são dirigidas a um projeto específico, mas para todas as operações e investimentos para a 63 manutenção da rede de transportes da cidade. Segundo dados extraídos dos relatórios de avaliação e monitoramento da Congestion Charge, no ano de 2007/08, as receitas líquidas foram de £137 milhões, das quais grande parte foi destinada para a melhoria nas operações dos ônibus da Grande Londres (Sixth Annual Report, 2008). Segundo a prefeitura de Londres 11 , o custo de implementação da medida foi de £161.7 milhões, considerando as infraestruturas operacionais (sistema de monitoramento, câmeras, etc.) para seu funcionamento. Nos 3 primeiros anos de operação, o custo foi de £288.6 milhões, com uma receita de £591.7 milhões, portanto a receita operacional líquida foi de £303.1 milhões. De acordo com o relatório anual de julho 2021 a receita anual arrecadada pela Congestion Charge aumentou de £247 milhões em 2019/20 para £316 milhões em 2020/21 (Annual Report, 2021).Vale ressaltar que o período da Covid-19 não afetou a arrecadação anual da medida, inclusive, houve um aumento. Tabela 8. Receitas geradas a partir da Congestion Charge Milhões de libras (£m) 2013-14 2014-15 2015-16 2016-17 2017-18 Receita direta proveniente da 151.0 169.9 167.4 160.8 150.8 cobrança da taxa Receita proveniente das multas 83.6 87.5 91.0 88.8 79.0 cobradas pelo não pagamento da taxa Receita Bruta 234.6 257.4 258.4 249.6 229.8 Fonte: Annual Report and Statement of Accounts referenciado no site do TfL – seguindo as leis de acesso à informação FOI Freedom of Information Act 2000, disponível em: https://tfl.gov.uk/corporate/transparency/freedom-of-information/foi-request-detail?referenceId=FOI- 1438-1819. A composição dos fundos para o funcionamento e implementação da Congestion Charge são públicos, provenientes da agência de transportes de Londres – Transport of London (TfL) e Greater London Authority. Estratégias de comunicação As estratégias utilizadas pela prefeitura de Londres para a adesão da população à implementação da Congestion Charge foram baseadas em consultas públicas e pesquisas de opinião12 e resultaram em uma ampla campanha de informação sobre o funcionamento da 11 Resposta obtida pelo sistema de comunicação da prefeitura de Londres: https://www.london.gov.uk/questions/2006/1997 (acesso em ago/2021) 12 Resposta obtida pelo sistema de comunicação da prefeitura de Londres: https://www.london.gov.uk/questions/2004/0496 (acesso em ago/2021). 64 medida, além de campanhas de sensibilização e conscientização lançadas mais tarde devido à necessidade de aprimorar a política. Para a agência de transportes TfL, o principal objetivo da campanha de implementação da Congestion Charge era fornecer à população informações claras quanto aos custos, horários de funcionamento e a localização dos limites da zona. Segundo a diretora do programa da Congestion Charge no período de sua inauguração, a TfL aprendeu com outras experiências mal-sucedidas internacionalmente (ex. caso de Melbourne) e resolveu se antecipar, de forma que a campanha londrina foi amplamente divulgada em anúncios publicitários pela TV e posters, desde 2002 (Campaign, 2004). A primeira onda de campanha de TV e posters, de outubro de 2002, informava a população que a cobrança estava chegando. No mês seguinte, a campanha detalhou as informações como custo, horário e localização da área de incidência. Em paralelo, havia uma campanha direcionada a pessoas com deficiência e residentes da área para que eles se registrassem por descontos. A TfL também promoveu um Journey Planner no seu site, apresentando várias opções de transporte a quem se deslocava pela capital. Nas semanas que antecederam o início da cobrança, a TfL instalou faixas e placas de sinalização nas vias ao redor da zona. Como não havia cabines de cobrança, era importante que as pessoas soubessem como efetuar o pagamento. A TfL queria que os motoristas realizassem um pré cadastro e que os pagamentos fossem realizados por internet, mensagem de texto e lojas para minimizar a pressão nas linhas telefônicas (Campaign, 2004). A estratégia de comunicação se focou, criativamente, na necessidade de fazer algo em relação ao congestionamento na cidade, já que 90% da população concordava que era um problema, informação apontada no relatório ROCOL (U.S. Department of Transportation, 2008). Assim, a campanha visou fazer com que as pessoas percebessem que a cobrança era inevitável. A ampla campanha de TV, correspondências diretas (cartas), outdoor, rádio, internet e eventos ao vivo foram executados tendo em vista os diferentes públicos-alvo (Campaign, 2004). Como resultado, trezentas mil pessoas realizaram o pré-cadastro, 50.000 a mais do que a TfL estava esperando (Campaign, 2004). Os objetivos de pagamento também foram alcançados, com um terço da população realizando o pagamento via telefone em 2004. A administração da cobrança foi introduzida de forma suave, principalmente porque a população já sabia como seria afetada e o que deveria ser feito em relação a isso. 65 Figura 16. Publicação em rede social do Prefeito de Londres sobre a campanha #CleanAir13 Fonte: Twitter, 2017 Em 2017, uma nova campanha foi lançada para sensibilizar a população acerca da necessidade de aumentar a cobrança para veículos velhos e mais poluidores que adentram a zona da Congestion Charge (Figura 16). Por meio desses esforços, o Prefeito conquistou o apoio da opinião pública: mais de 80% dos londrinos consideram a poluição do ar um problema e enfrentá-lo é tido pela população como uma das principais prioridades 14. Resultados No primeiro ano de operação da Congestion Charge (2003-2004), a cidade de Londres teve uma redução de 30% no congestionamento, um aumento de 30% da velocidade média no trânsito, além de um aumento de 38% dos passageiros de ônibus (C40 Knowledge, 2019). A redução do congestionamento se manteve estável desde então, em torno de 27% abaixo das condições de congestionamento anteriores à implementação da taxa em 2003. Isto significa que aproximadamente 80.000 menos carros circulam na zona de cobrança por dia (TfL, s.d. Congestion Charge Factsheet). 13 Lançada em 2017, acerca de cobrança da Congestion Charge 14 Matéria C40 Cities: https://www.c40knowledgehub.org/s/article/How-road-pricing-is-transforming- London-and-what-your-city-can-learn?language=en_US (acesso em setembro/2021). 66 Com uma média de £150 milhões de arrecadação ao ano através da implementação da taxa, são direcionados investimentos para a melhoria do sistema de transportes, tal como a frota de 300 ônibus introduzida em 2003 quando a medida foi lançada, além dos novos itinerários e rotas para a rede de ônibus. De acordo com o Central London Congestion Charging Impacts - Monitoring Sixth Annual Report (TfL, 2008) - que traz um panorama comparativo desde a implementação da medida em 2003, após a introdução da CC houve um aumento significativo tanto na capacidade da rede de ônibus como nos padrões de uso, ou seja, aumento do número de passageiros por dia, relacionados principalmente pela transição de condutores de veículos individuais motorizados ao uso de ônibus, à redução dos tempos de espera e aumento da velocidade dos ônibus. Sendo considerada uma das prioridades para a estratégia de transportes da prefeitura de Londres, a maior parte da receita líquida proveniente da cobrança foi realocada para a operação da rede de ônibus. A estimativa dada pela TfL aponta para o fato de que a Congestion Charge foi responsável por um aumento de mais de 50% no uso do sistema de ônibus no centro de Londres, no período monitorado de 2002 a 2003 (Sixth Annual Report, 2008). Esses padrões não foram identificados para outros sistemas de transporte público monitorados, como o metrô, por exemplo. Apesar de a cidade de Londres não ser isenta de congestionamento, desde a implementação da Congestion Charge a cidade viu uma mudança gradual nos modos de deslocamento, sendo que, no período entre 2001 e 2017, as viagens feitas por carro reduziram de 46% para 36%, houve também um aumento de 29% para 37% no uso do transporte público, além de um aumento de 27% nos trajetos realizados a pé ou de bicicleta (Figura 17). Segundo dados emitidos pelo TfL em 2019, dentro da zona CC os níveis de deslocamentos em bicicleta aumentaram em 66% desde a implementação da medida (TfL, s.d. Congestion Charge Factsheet). 67 Figura 17. Viagens diárias pelos principais modais de transporte em Londres, entre 2001- 2017, juntamente ao comparativo de crescimento populacional. Fonte: Transport for London (2018). Com a redução do volume do tráfego de veículos e a mudança na composição dos meios de transporte, as zonas de restrição de circulação de carros se beneficiaram com a redução significativa na emissão dos principais poluentes. De acordo com o Central London Congestion Charging Impacts - Monitoring Sixth Annual Report (TfL, 2008), os dados comparativos entre o primeiro relatório lançado e o de 2008, as emissões de dióxido de carbono (CO2) reduziram em 16%, óxidos de nitrogênio (NOx) em 8% e partículas PM10 em 6%, após a implementação da medida em 2003, em relação ao ano anterior (Sixth Annual Report, 2008). Outro resultado considerável após a implementação da Congestion Charge, foi a redução substancial no número reportado de lesões causadas pelo tráfego no centro de Londres, tanto entre veículos versus veículos quanto veículos versus pedestres. Os padrões de sinistros que não reduziram no ano de monitoramento de 2005, foram os envolvendo bicicletas, e também entre os táxis, devido ao aumento no uso desses modais após a introdução da Congestion Charge. Abaixo segue o gráfico indicativo do número de sinistros dentro da Congestion Charge Zone, envolvendo os tipos de veículos/modais, conforme demonstra a Figura 18. Dentre os resultados, obtidos vale ressaltar a importância da ULEZ, implementada em 2019, para a melhoria da qualidade do ar em Londres e para a divisão mais igualitária do espaço público com outros modais mais sustentáveis. A zona de ultrabaixa emissão foi uma medida complementar de grande impacto para a cidade de Londres. Ela é fruto da continuidade das 68 políticas de cobranças viárias implementadas ao longo dos últimos quase 20 anos desde a Congestion Charge. Através das restrições estabelecidas pela ULEZ à circulação de veículos altamente poluentes (como caminhões, ônibus e vans), juntamente à uma renovação da frota dos ônibus movidos à combustível fóssil para elétricos15 , houve uma melhora significativa para a qualidade do ar e da saúde dos habitantes das zonas centrais de Londres. Um estudo realizado 10 meses após a introdução da ULEZ constatou uma redução de 49% na entrada de veículos poluentes ao centro de Londres diariamente - o equivalente a 44.100 veículos - enquanto as emissões de CO2 do transporte rodoviário caíram 6% e as concentrações de NO2 caíram 44%16. Figura 18. Gráfico indicativo dos sinistros e o tipo de veículo/modal envolvido dentro da zona da Congestion Charge. Fonte: Fifth Annual Report, 2007. Considerações finais A Congestion Charge configura-se como uma política robusta e efetiva para a redução do congestionamento e tráfego de veículos nos centros urbanos. O caso de Londres obteve sucesso por meio da articulação administrativa, do apoio da população, do monitoramento da 15 A receita da ULEZ e outras políticas também ajudaram a Greater London Authority (GLA) a investir US $ 105 milhões na renovação e compra de novos ônibus públicos - que agora atendem aos padrões da ULEZ - tornando Londres a proprietária da maior frota de ônibus elétricos da Europa. 16 Matéria divulgada pela WRI Ross Center for Sustainable Cities, em junho de 2021. https://www.wri.org/insights/london-road-fees-address-pollution-and-inequality. (acesso em ago/2021) 69 medida ao longo dos anos, bem como do apoio legal à introdução da cobrança. Mesmo que desde 2008 não foram publicados novos relatórios de monitoramento para a medida, ela continua a integrar as estratégias de transportes de Londres, inclusive em sua última versão de 2018, fomentando os objetivos de uma cidade em que 80% das viagens sejam realizadas a pé, de bicicleta ou de transporte público até 2041 (TfL, 2018). A liderança governamental para os incentivos ao programa e seu trabalho em colaboração com a comunidade científica e atores locais foram peças chave para o apoio à implementação da taxa. O consenso popular e a transparência de dados fornecidos pela agência de transportes anualmente, permitem que a medida se mantenha a longo prazo, independentemente das mudanças na gestão. Mesmo que, a princípio, a receita proveniente da Congestion Charge não tenha sido o principal impulsionador da medida, esta se mostrou uma eficiente fonte de financiamento para melhorias no sistema de transporte público como, por exemplo, a ampliação e renovação da frota de ônibus. Além disso, houve mudança significativa na distribuição modal da cidade, com a redução do uso de automóveis e o aumento no uso do transporte público e nos deslocamentos por modos ativos (a pé e bicicleta), gerando evidente impacto na qualidade do ar e na saúde dos habitantes da região central de Londres. Tabela 9. Disposições gerais Congestion Charge, Londres - Inglaterra Item Valor Objetivo Redução do congestionamento e tráfego de veículos Localização Londres Área de abrangência 22 Km² (1,4% da área total de Londres) Infraestrutura Câmeras instaladas nos limites da zona restritiva, sistema de identificação de veículos. Contexto da área na cidade Zona central de Londres Público-alvo Motorista de veículos motorizados. Modal alvo Veículos motorizados. Relevo Majoritariamente plano. Despesas £288.6 milhões (de 2003-2006) Receitas £316 milhões (em 2021) Composição do Investimento público financiamento Redução na Emissão de redução de 16% de CO2, 8% de óxidos de nitrogênio (NOx) e 6% CO2 de partículas PM10 (entre 2002 e 2003) Impacto central Redução de viagens de veículos individuais motorizados, aumento de viagens de transporte público coletivo e ativo, redução da emissão de gases de efeito estufa e melhoria da qualidade do ar. Elaboração própria. 70 Referências AEA Energy & Environment (2006). London Low Emission Zone Health Impact Assessment Final report. Disponível em: http://content.tfl.gov.uk/health-impact-assessment.pdf Campaign (2004). Campaign Casebook: London Congestion Charge. Disponível em: https://www.campaignlive.co.uk/article/campaign-casebook-london-congestion- charge/222347. Acesso em: 19/08/2021. City of Westminster, 2001. Central London Congestion Charging Scheme Order. 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A partir do nível de poluição emitido pelo tipo de veículo, passou a ser cobrada uma taxa -variável- para que estes pudessem adentrar à região central da cidade, conhecida como Cerchia dei Bastioni. Com o tempo, o programa acabou incentivando a renovação da frota por veículos menos poluidores, que tinham acesso gratuito para a entrada na área. Isso levou a um aumento do tráfego e reduziu as receitas arrecadadas pelo programa. Assim, em 2011 a política foi desativada e substituída pelo programa Área C, em 2012. A nova medida corresponde a uma tarifa de congestionamento de aplicação geral para todos os veículos no mesmo perímetro em que vigorou o Ecopass. Contexto Milão é a segunda maior cidade da Itália e capital da Região da Lombardia, uma das regiões mais ricas e produtivas do país. A cidade tem uma população de cerca de 1,3 milhão, enquanto sua grande área metropolitana é a maior da Itália, com uma população estimada em cerca de 5,2 milhões. A densidade populacional é de 7200 habitantes/km², o dobro da área metropolitana de Roma e está entre as dez maiores densidades populacionais da região europeia. (ICLEI, 2013) A atividade econômica pulsante, o alto índice de motorização, condições geográficas - cercada pelos Alpes e Apeninos - e, meteorológicas -caracterizada por pouco vento-, favorecem a concentração de poluentes atmosféricos especialmente no período de inverno. Apesar de ter logrado em reduzir a concentração média anual de material particulado (PM10) de 59 μg/m³ em 2002 para 50 μg/m³ em 2007, a cidade permaneceu acima do limite estabelecido pela União Europeia (UE), de 40 μg/m³ (Diretiva 2008/50/CE). Além do m ais, embora a legislação da UE estabeleça que uma concentração média diária de 50 μg/m3 de PM10 não deve ser excedida em mais de 35 dias por ano, esse limite foi excedido em 125 dias no ano de 2007, na cidade (Cornago, Dimitropoulos & Oueslati 2019). Objetivos Com relação ao Ecopass, o objetivo central da política se concentrava na redução da poluição do ar do município, sendo a diminuição do trânsito um objetivo secundário (Massiani et al., 2012). Essa ordem de prioridade pode ser observada pela definição da taxação de acordo 75 com o nível de emissão de poluentes dos automóveis, estando os menos poluidores livres para circularem na área de cobertura do programa. O programa Area C, por sua vez, ao cobrar de todos os veículos pelo acesso ao seu interior, independentemente do seu nível de poluição, apresenta objetivos mais amplos. No entanto, automóveis altamente poluentes são proibidos de circular e os veículos elétricos, híbridos, motocicletas e patinetes e veículos de alguns serviços públicos são isentos. Ozer (2012) destaca como objetivos da política: • Reduzir o trânsito e a presença de veículos no centro, determinar as condições de implementação de regeneração, proteção e desenvolvimento de redes de transporte públicos e serviços de “soft mobility” (pedestre, ciclistas, velocidade moderada de tráfego) e consequentemente aumento de acessibilidade e uso da área; • Melhorar a qualidade de vida urbana e promover sua atratividade reduzindo o número de sinistros, o barulho, poluição, e degradação ligadas ao número excessivo de carros estacionados ilegalmente, garantindo uma melhoria na percepção de segurança e na qualidade das áreas para pedestres; • Aumentar a receita derivada da cobrança das externalidades produzidas pelos carros privados, com sua alocação em intervenções e implementação de políticas para desenvolvimento de mobilidade sustentável. Instrumentos e implementação O processo de implementação de uma política de redução da emissão de poluentes em Milão tem como contexto a piora da qualidade do ar da cidade, o estabelecimento de limites de emissões pela União Europeia, e a delegação para que o tema fosse tratado em nível regional e local. Assim, em 2001 inicia-se no município a discussão sobre a implantação de um pacote de políticas na área de transportes para combater esse problema. O Ecopass era parte de um conjunto mais amplo de políticas de transporte de curto e médio prazos como medidas de acalmamento do tráfego, construção de novas faixas de ônibus, melhora da frequência dos ônibus e aumento da cobrança por estacionamentos. (Massiani et al., 2012). Após a realização de um estudo de viabilidade sobre sua implantação, e um longo período de debate público, o Ecopass é regulamentado em 2008. O Ecopass pode ser entendido como uma “taxa de contaminação”, pois instituiu uma cobrança aplicada aos veículos poluentes que entram na região de Cerchia dei Bastioni de segunda a sexta-feira das 07h30 às 19h30. O valor cobrado depende da classe de emissão do motor dos veículos, com suas taxas variando 76 entre 2 e 10 Euros. Veículos menos poluentes, que utilizam combustíveis alternativos (elétricos ou hidrogênio, por exemplo) e que possuem motores de classes Euro 3 ou superior, tinham acesso gratuito. Com o passar do tempo, a medida incentivou a aquisição de automóveis menos poluentes que tinham permissão para circular na área restrita, o que não resolveu a questão do congestionamento naquela área central. Figura 19. Região Cerchia dei Bastione Fonte: Comune di Milano O Ecopass esteve vigente por pouco mais de dois anos em caráter principalmente experimental. Em 2011, após uma enorme adesão popular num referendo, a população se manifestou favorável (com 79% de aprovação) à adoção de uma política mais abrangente e geral para reduzir poluição e congestionamento, assim nasceu o programa Area C. 77 Implementada no início de 2012, o Area C substituiu a taxa de contaminação adotada anteriormente por uma taxa de congestionamento. Ou seja, a partir de então, uma taxa de 5 euros passou a ser cobrada de todos os veículos que desejam adentrar à região de Cerchia dei Bastioni de segunda a sexta-feira das 07h30 às 19h30, independentemente de sua classe de emissão. Os veículos altamente poluentes (com motor Euro 3 ou inferior), inclusive, passaram a ser proibidos de circular na região. Os motoristas que quiserem trafegar na região podem comprar passes de entrada por vários meios, incluindo cupons de jornais, máquinas de pagamento e exibição, débito direto e online. Após a compra do ingresso, os usuários devem ativá-lo, associando o código do bilhete à placa do carro. Para além da forma de ingresso, a tag de pagamento de pedágios italiana “Telepass” também oferece o serviço de pagamento, permitindo que os motoristas entrem na zona e recebam a cobrança diretamente na sua conta bancária. Com relação às isenções, veículos elétricos, híbridos, motocicletas, patinetes, veículos de utilidade pública, veículos policiais e de emergência, ônibus e táxis não são sujeitos à cobrança da taxa de congestionamento. Aos residentes da região são concedidos 40 acessos gratuitos ao ano, sendo cobrado € 2,00 para cada acesso adicional. A fiscalização da política se dá por meio de câmeras que captam as placas dos veículos que adentram a área de influência do programa, verificando a conformidade de cada automóvel às regras. Esse processo é facilitado pelo fato de a região de Cerchia dei Bastioni ser delimitada por 43 portões dispostos de câmeras. Arranjo regulatório O tema da poluição na Itália é tratado em nível regional ou local. A legislação italiana exige que os prefeitos intervenham drasticamente para conter a poluição (mesmo com uma proibição temporária do tráfego de veículos particulares) (Massiani et al., 2012). Devido ao aumento da poluição, o governo central delegou ao prefeito de Milão a tarefa de lidar com a emergência do trânsito e garantir a mobilidade na cidade no ano de 2001 (delegado pela Portaria Ministerial de 28 de dezembro de 2001 no. 3171; emergência declarada pelo Decreto de 15 de novembro de 2001). (Lapsley e Giordano, 2010). O contexto normativo no nível da União Europeia também é um elemento crucial para entender o surgimento da cobrança de congestionamento de Milão. Na política da UE sobre a qualidade do ar, a diretiva 1999/30/CE (posteriormente integrada na diretiva 2008/50/EC) estabeleceu valores-limite para a emissão de matéria particulada PM10, que os estados membros tiveram que cumprir até 2005. A diretiva estabelece dois níveis de concentração: um valor diário de 78 50 µg/m³, que deve ser excedido por um período não superior a 35 dias por ano civil; e uma média do ano civil de 40 µg/m³. A diretiva foi transposta para a lei italiana três anos depois, com um decreto ministerial (Decreto Ministeriale Nº 60/2002). Em novembro de 2006, o governo da cidade de Milão lançou a Estratégia para Mobilidade Sustentável para o período de 2006 a 2011, que define intervenções estratégicas com relação ao setor de transportes e incluiu a introdução da cobrança de congestionamento. (OCDE, 2013). A fim de melhorar a qualidade do ambiente urbano, a prefeitura de Milão introduziu, a partir de janeiro de 2008, um pacote de políticas de transporte. Neste pacote, incluiu-se o Ecopass, que vigorou entre 2008 e 2011. Em 2012 se implementa experimentalmente a Area C, no mesmo perímetro de atuação do Ecopass (Ordinanza Nº 67222, 2011). E em 2013 a política é adotada de forma definitiva (Ordinanza Nº 69317, 2013). Recursos, atores e investimentos A definição de área do Ecopass como a mesma área de Zona de Tráfego Limitado (ZTL) que limitava desde 1985 a entrada de veículos com mais de 7,5 metros das 7h30 às 19h30 já existente aproveitou a estrutura de câmeras já implantada para controle de tráfego e, segundo Rotaris et al. (2010), tornou a implementação relativamente fácil e barata. O orçamento planejado da operação do Ecopass previa uma receita anual de € $24 milhões e um orçamento de € $7 milhões por ano para operar o sistema de gestão de trânsito (Lapsley, 2010). Ao fim de 2008, observou-se que as receitas do ano chegaram a 12,06 milhões de euros e o custo de gestão foi de € $6,5 milhões, segundo o relatório de monitoramento do Ecopass de 2008 Segundo o mesmo relatório o total de receitas estaria vinculado às intervenções para o desenvolvimento da mobilidade sustentável. Em 2008, as principais destinações seriam: • Melhoria do serviço de transporte público: €14.450.000 • Radiobus 20h00 às 2h00 (serviço de ônibus sob agendamento): €200.000 • Intervenções de gestão de mobilidade: incentivos ao uso transporte público (passes anuais a um preço facilitado) dirigido a funcionários de empresas e organizações com sede em Milão: €500.000 • Compartilhamento de bicicletas: €5.000.000 • Total: €20.150.000 79 Já em relação ao programa Area C, em seu primeiro ano de implementação, foram arrecadados mais de 20 milhões de euros. A forma de pagamento pela taxa de congestionamento consistiu essencialmente da compra de ingressos (48%) e via o sistema Telepass (30,4%), comumente utilizado para o pagamento de pedágios sem a necessidade de parada. A finalidade desses recursos se dividiu entre a manutenção dos custos de gestão da política (€ 7 milhões) e uma série de investimentos no transporte público municipal (€ 13 milhões). Com 10 milhões de euros, foi possível atualizar 15 linhas de ônibus e bondes em toda a cidade, com mais de 250 viagens por dia, e aumentar o número de viagens para todos os metrôs (32 viagens a mais por dia). Os outros € 3 milhões destinados ao transporte público, foram utilizados na expansão do sistema de compartilhamento de bicicletas municipal, BikeMi. De 2012 a 2020, as receitas referentes à implantação do programa Area C somam aproximadamente 263 milhões de euros, segundo balanço consolidado da prefeitura de Milão. Tabela 10. Receita anual referente ao programa Area C Receita da Área C (milhões €) 2012 20,67 2013 29,90 2014 21,43 2015 28,31 2016 32,28 2017 29,77 2018 32,72 2019 34,25 2020 34,00 Fonte: Balancio Consolidato del Comune di Milano de 2012 a 2019 e Milano Today, 2020. Estratégias de comunicação O debate público acerca da implementação da cobrança de acesso de veículos nas vias de Milão iniciou-se por volta do ano 2001, sob a gestão do prefeito Albertini. A discussão ocorreu durante três mandatos, tendo sido debatido até entrar em vigor definitivamente em 2013. Tema bastante polêmico, a comunicação envolveu consulta, negociação, notificação, pesquisas e um referendo popular (Wang et al, 2018). Tema pouco levantado pelos candidatos na campanha eleitoral de 2006, o Ecopass passou a vigorar em caráter experimental durante o mandato da prefeita Letizia Moratti, que enfrentou uma grande oposição para conseguir aprovar a medida, considerada polêmica. Para tal, houve 80 um esforço de comunicação que incluiu envio de cartas às famílias (760 mil cartas) lembrando às pessoas sobre os danos que a poluição causa à saúde, já que a cobrança tinha sobretudo o objetivo de diminuir a poluição. O slogan adotado para a divulgação do Ecopass foi: “meno traffico = aria più pulita” (menos tráfego = ar mais limpo). O foco na redução da poluição do ar não apenas sinaliza o interesse das autoridades locais pelas questões ambientais, mas também representa uma estratégia para superar a relutância dos contribuintes em introduzir mais uma cobrança (Massiani et al., 2012). Diferentemente do ocorrido em outras cidades europeias como Edimburgo e Manchester, a mídia local em Milão apoiou o Ecopass, até mesmo ao ponto de fazer críticas ao número excessivo de isenção de veículos para a circulação e de pedir uma atualização do regime de tarifação. Durante a campanha eleitoral de 2011 a cobrança tornou-se um tópico importante e amplamente discutido. Em junho de 2011, Letizia Moratti é derrotada nas urnas e Giuliano Pisapia é eleito novo prefeito de Milão. A atuação da associação ´Milano si muove´ também foi extremamente relevante. O grupo liderou uma petição que levou a um referendo em junho de 2011 em que os cidadãos responderam à seguinte pergunta: “Você apoiaria o plano da cidade de Milão para melhorar o transporte público e a mobilidade e alternativas limpas para carros através da cobrança de uma taxa de acesso para todos os veículos (com exceção daqueles com zero emissão) na zona que seria aumentada para a linha circular do metrô, com o objetivo de reduzir o trânsito e a poluição em 50%?” (Mattioli, Boffi & Colleoni, 2012; Wang et al., 2018) Embora de natureza puramente consultiva, o referendo propôs expandir a área de tarifação de vias e mudar de tarifação de poluição para congestionamento, a fim de reduzir ambos: congestionamento e poluição. Também propôs uma série de medidas políticas e de infraestrutura destinadas a apoiar a mudança para a mobilidade verde 17 . Os eleitores elegíveis eram residentes no município de Milão: 49% dos cidadãos com direito a voto foram às urnas e cerca de 79% dos eleitores votaram a favor desta proposta. O resultado positivo do referendo consultivo foi fundamental para verificar o apoio público à evolução do regime de tarifação rodoviária: em janeiro de 2012, a taxa de poluição foi substituída pela taxa de congestionamento denominada Área C (Cornago, Dimitropoulos & Oueslati, 2019). O principal esforço de implantação da Área C foi a comunicação com os cidadãos e a gestão da iniciativa. A comunicação com os cidadãos foi conduzida por dois caminhos distintos. Em 17 Mobilidade verde ou green mobility refere-se a mobilidade que visa reduzir a poluição do ar e sonora do transporte, que lide com as mudanças climáticas no setor de transporte por meio de mitigação e adaptação (Holger et al, 2017) 81 primeiro lugar, os cidadãos foram informados sobre o estado de desenvolvimento da iniciativa através de reuniões públicas e do fornecimento constante de informações. Isso incluiu o desenvolvimento de associações e fortes conexões com ativistas ambientais. Também foram feitos esforços para implementar a iniciativa da forma mais harmoniosa possível, o que significava fazer os pagamentos na entrada da Área C da forma mais simplificada possível (Monfardini & Ruggiero, 2019). A comunicação pública para o programa Área C foi baseada em: distribuição de materiais e panfletos; envio de cartas para famílias; anúncios no rádio, TV e internet; e reuniões de informação ao público. Atualmente o site da Prefeitura de Milão (Comune di Milano, s.d) é o principal meio de comunicação pública relacionado ao programa Área C. (Wang et al., 2018) Figura 20. Area C em Milão - Zona de Tráfego Limitado Fonte: https://www.oguiademilao.com/area-c-em-milao-zona-de-trafego-limitado/ Resultados Os dados dos estudos indicam que a política Ecopass certamente contribuiu para a melhoria da qualidade do ar na cidade de Milão, ainda que a qualidade do ar ainda não tenha atingido nível satisfatório de acordo com a Diretiva da União Europeia para o nível de alguns poluentes. Por exemplo, o limite do material particulado PM10 mostra redução após a implementação do programa, mas ainda excede o número recomendado de dias que ultrapassa o limite de 50μg/m³ (86 dias contra um número máximo recomendado de 35 dias em 2010). (Massiani et al., 2012) Outro efeito do Ecopass foi que os usuários de automóveis e veículos de carga compraram veículos novos que podiam circular na área restrita. O resultado foi que, após o primeiro ano de redução drástica, o número de veículos que entraram na área voltou a aumentar. 82 Foi inesperado o elevado número de multas pelo não pagamento da tarifa justificadas por falta de informação sobre os detalhes do funcionamento do programa e também por falta de vontade de pagar a taxa (Massiani et al., 2012). Em relação aos resultados do programa Área C, estes também mostram melhoras em indicadores de poluição, diminuição da circulação de veículos, aumento da velocidade média dos ônibus e redução de sinistros na cidade. As tabelas abaixo trazem uma compilação dos resultados apontados pela literatura acadêmica a respeito da implementação do Ecopass e do programa Área C. Cabe ressaltar aqui que os valores da tabela, em sua maioria, representam apenas uma reprodução de análise descritiva de dados dos estudos em questão. Muitos dos resultados, portanto, não podem ser interpretados como um efeito do programa pois não representam uma relação causal da política implementada e podem ser resultado de outros fatores e políticas que ocorreram simultaneamente aos programas. Tabela 11. Resultados do Ecopass Objeto Dado Fonte Poluição -23% de PM10 Rotaris et al (2010) -17% de NOx -14% de CO2 -15% de PM10 por dia Bedogni, Pulpito & Tosi (2011). -8,6% de NOx no primeiro trimestre Cerruti (2015) Circulação -14,2% de veículos em 9 meses Rotaris et al (2010) -16,2% de tráfego de veículos Bedogni, Pulpito & Tosi (2011). -21% no primeiro ano Massiani et al. (2012) -4,7% de congestionamento nos 1ºs 11 meses Rotaris et al (2010) Transporte público +7,8% velocidade dos ônibus Rotaris et al (2010) +8,1% passageiros de transporte público Martino & Territorio (2011) Sinistros -12,8% Martino & Territorio (2011) Elaboração própria. 83 Tabela 12. Resultados da Área C Objeto Dado Fonte Poluição -5,1% a -8% de NOx no primeiro trimestre Cerruti (2015) -18% PM10 no primeiro ano Croci (2016) -42% Amônia no primeiro ano Cascade (s.d.) -35% CO2 no primeiro ano Circulação -38,5% no primeiro ano Croci (2016) -37,6% no segundo ano (ante 2011) -36,8% no terceiro ano (ante 2011) +4,5% veículos limpos no primeiro ano Cascade (s.d.) Transporte público +5% uso de bicicletas compartilhadas Cornago, Dimitropoulos & Oueslati (2019) +3,5% velocidade dos ônibus no primeiro ano Cascade (s.d.) +4% velocidade do bonde no primeiro ano Sinistros -26% sinistros no primeiro ano Cascade (s.d.) Elaboração própria. Considerações finais A aposta de Milão em restringir a circulação de veículos na região central da cidade tem apresentado resultados expressivos ao longo dos anos. Inicialmente, com a instituição do Ecopass, em 2008, o município conseguiu reduzir significativamente a emissão de gases poluentes ao cobrar pela circulação dos automóveis muito poluidores. Como a reação dos motoristas à política instituída foi a troca de seus veículos para deixarem de pagar a taxa de contaminação, os ganhos marginais do programa se reduziram rapidamente conforme a circulação de veículos aumentava novamente. Com o esgotamento dos benefícios do Ecopass, a municipalidade ajustou o programa para avançar nos resultados que vinham sendo alcançados anteriormente ao aumento da frota de novos veículos. Com apoio de grande parcela da população milanesa, a instituição de um programa ainda mais restritivo (Area C) logrou em manter a contínua redução de poluentes, diminuição da circulação de automóveis e dos sinistros causados por eles, além de favorecer a velocidade no transporte público. Além do anterior, os recursos arrecadados pela política foram investidos na melhoria dos serviços de ônibus, bondes, metrô e de bicicletas compartilhadas. A experiência de Milão mostra que a instituição de taxas diretamente sobre a circulação dos veículos motorizados é um processo que leva tempo e demanda grande empenho por parte do setor público. No entanto, seus resultados demonstram o potencial que esse tipo de política 84 tem em promover um uso mais democrático e sustentável das vias públicas. O exemplo de progressão gradual das restrições impostas, conforme a população compreende e apoia os objetivos do programa, também serve como um modelo de inspiração para outros municípios. Ainda assim, a cidade em algumas ocasiões não conseguiu cumprir as determinações de nível de qualidade de ar da União Europeia. Em 2018, o Tribunal Europeu abriu um processo contra o país devido à ultrapassagem dos limites de emissão de PM10 estabelecidos pela UE. Esse evento motivou a cidade a adotar em 2019 o programa Area B (Agenzia Monilità Ambiente Territorio, s.d.), também uma zona de tráfego limitado que prevê a proibição de acesso e circulação aos veículos mais poluentes e com mais de 12 metros e dos que transportam mercadorias perigosas. O perímetro cobre cerca de 72% de toda a área municipal de Milão e foi criado para introduzir um modelo de limitação progressiva de veículos antigos e poluentes, melhorar a qualidade do ar respirado pelos milaneses e reduzir os efeitos negativos do ar na saúde pública poluentes (PM10, NO2), bem como regulamentados pela União Europeia. Tabela 13. Disposições gerais Ecopass e Area C, Milão – Itália Item Valor Objetivo Redução de emissões e redução de trânsito Localização Cerchia dei Bastioni, Milão, Itália Área de abrangência 8 Km² Infraestrutura Câmeras nas entradas da área restrita Contexto da área na cidade Área central Público-alvo Motoristas de automóvel particular Modal alvo Transporte individual motorizado Relevo Região de vale Despesas € 7 milhões (2012) Receitas € 20 milhões (2012) Composição do financiamento Público, municipal Redução na Emissão de CO2 Redução nos níveis de CO2, NOx, PM10 e Amônia Impacto central Redução da poluição do ar e diminuição da circulação de automóveis Elaboração própria. Referências Agenzia Monilità Ambiente Territorio. (s.d.). Area B. Disponível em https://www.amat- mi.it/it/progetti/area-b/ Acesso em 01 de 10 de 2021. 85 Bedogni, M., Pulpito, A., & Tosi, L. (2011). Valutazione nuovi scenari di regolamentazione degli accessi alla ZTL Cerchia dei Bastioni. 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Contexto O município de Santiago de Cali está localizado no sudoeste da Colômbia, a uma altitude de 1.079 metros acima do nível do mar, na parte plana do Vale do Cauca, no lado oeste da Cordilheira dos Andes. (Moller, 2003). É a terceira cidade mais populosa do país, depois de Bogotá e Medellín, com 2.222.642 habitantes segundo estimativa populacional Censo Nacional de Población y Vivienda 2018. O município possui uma área de 561,7 Km2, sendo 120,4 Km2 (21,4%) de perímetro urbano (Caicedo, 2020). Nas últimas duas décadas, houve uma tendência nacional de motorização da população por meio do uso de veículos particulares em detrimento do transporte público, o que provoca e revela o fenômeno do congestionamento em contextos urbanos. Assim como Bogotá e Medellín, Cali é uma cidade importante na região e recebe muitos veículos das cidades vizinhas, piorando a questão do congestionamento (Varela, Calderón & Vásquez, 2020). A restrição veicular se aplica na totalidade do perímetro urbano da cidade, e não unicamente para uma parte central ou reduzida, tanto para veículos de pessoas residentes na cidade como veículos de outros municípios da região metropolitana. Objetivos A restrição veicular Pico y Placa na cidade de Santiago de Cali surgiu em 2005 da necessidade de se ter medidas que ajudassem a regular o uso das vias e otimizar a capacidade veicular para lidar com os problemas gerados pelo excesso de veículos no perímetro urbano como congestionamentos, contaminação ambiental e elevado tempo de viagem. A regra recai sobre o número da placa de veículos particulares, a fim de reduzir e administrar a demanda pelo viário por esse modal. 90 O desequilíbrio entre o número de viagens diárias que realizam os habitantes, o meio de transporte em veículos particulares e a infraestrutura viária existente faz com que o transporte particular ocupe as vias de forma predominante com uma velocidade média baixa. Para 2005, época de início do Pico y Placa, circulavam em Santiago de Cali 200 mil veículos particulares, 61 mil motos, 2,9 mil veículos oficiais e 32 mil públicos. A taxa de crescimento de registro de veículos particulares era de 4,7% anual, representando um incremento mensal aproximado de mil veículos ativos à frota da cidade. Nas horas de pico (das 06h às 10h e das 16h às 20h) se intensificaram a ocorrência de sinistros de trânsito e apresentavam os maiores níveis de contaminação ambiental. Além disso, congestionamentos incidiam negativamente na mobilidade urbana e na produtividade da cidade (Decreto 0722 de 2005). O Pico y Placa persiste desde 2005 mantendo os objetivos de melhora do tráfego na cidade, com ajustes incrementais cada vez mais voltados para as questões ambientais e de segurança viária. Em 2009, a cidade começou a implementação do Massivo Integrado do Ocidente (MIO)18 , um sistema de transporte massivo integrado de tipo BRT. Ainda que tenha sido uma iniciativa de melhoria do transporte na cidade, esse sistema tem apresentado múltiplos problemas ao longo da sua existência, em especial de tipo financeiro (ver box). A estrutura geral de financiamento do BRT de Cali, o MIO, foi definida da seguinte forma: as despesas de capital (CAPEX) eram 70% financiadas pelo governo nacional e 30% pelo município; as despesas de operação (OPEX) não previam subsídios públicos - nem nacionais nem municipais-; pelo contrário existia uma proibição explícita. Em 2015, por conta dos grandes problemas financeiros que apresentavam vários projetos de BRT no país, se retirou a proibição. A Lei Nacional Nº 1753 de 2015 permitiu que os subsídios fossem destinados diretamente aos concessionários de transporte a fim de reduzir o déficit econômico da operação. A lei também estabeleceu diversos mecanismos de financiamento, entre eles as taxas por congestionamento e os cobros por estacionamentos em via pública e em locais privados com alta oferta de vagas. Em 2016 a cidade de Cali, aprova a cobrança da taxa por congestionamento, que é implementada em 2017, articulada em sua operação ao ‘Pico y Placa’. Mediante o pagamento de uma taxa, um veículo pode circular no perímetro urbano em seu dia de restrição de placa. Dentre os objetivos dessa medida está a complementação de fontes de financiamento do sistema de transporte massivo SITM-MIO. 18 Masivo Integrado de Occidente (MIO) é o sistema integrado de transporte coletivo (SITM) de Santiago de Cali. É composto por corredores troncais com faixas segregadas e preferenciais destinadas exclusivamente à operação de ônibus de alta e média capacidade. Esta rede de corredores troncais está integrada às redes de corredores pré-troncal e complementares onde operam serviços com veículos de menor capacidade. Para saber mais, acesse: http://www.mio.com.co/ 91 Instrumentos e implementação Em 2005, a Secretaria de mobilidade da cidade realizou estudo técnico sobre o fluxo veicular e recomendou que fossem adotadas medidas de restrição à circulação de automóveis particulares em períodos de pico de congestionamento. Foi adotado em outubro de 2005 o Pico y Placa com abrangência no perímetro urbano da cidade de Santiago de Cali (Decreto Nº 0722 de 2005), restringindo a circulação de veículos particulares e oficiais das 07h às 09h e das 17h30 e 19h00 de segunda a sexta exceto feriados, um dia da semana por grupo de veículos segundo o último número de sua placa. Assim, em cada dia da semana ficam restritos 2 dígitos (finais 1-2, 3-4, 5-6, 7-8, 9-0). A cada semestre, os dias da semana correspondentes ao dígito final são alterados. A medida vale para veículos particulares registrados fora da cidade de Santiago de Cali da mesma forma. O número de horas de restrição aumentou desde o início do programa, passando de 2 horas no período da manhã e 1,5 no da tarde em 2005, para atuais 4 horas no período da manhã e 4 horas no período da tarde. As exceções são veículos para transportes de pessoas com deficiência, de emergência, de serviços essenciais, oficiais do governo da força pública, de transporte escolar, meios de comunicação, e veículos de carga com capacidade igual ou superior a 5 toneladas e motocicletas. Como penalidade a motoristas que transitarem em locais restringidos ou em horas proibidas pela autoridade competente é aplicada multa equivalente a 15 salários mínimos legais diários vigentes, além do impedimento de circulação do veículo infrator até o término do horário do rodízio. Nos primeiros anos, a política se manteve na perseguição dos objetivos de melhoria de mobilidade e tráfego na cidade e foi mantida uma vez que as medidas levaram a melhores condições de operação durante os períodos de restrição. Ao mesmo tempo, o crescimento constante da frota de veículos particulares e de motocicletas somado à afetação viária decorrente das obras de infraestrutura do SITM durante vários anos dificultaram identificar melhorias no tráfego. Como mencionado, a política foi mantida desde então mantendo os objetivos de melhora do tráfego na cidade, mas cada vez mais se voltando para as questões ambientais e de segurança viária segundo se nota nos textos dos decretos. Pico y Placa A cada começo de ano o município decreta as datas e horários da rotação de Pico y Placa para os dois semestres do ano e os tipos e automóveis que estão sujeitos à restrição dentro do perímetro urbano, bem como os valores das multas aplicadas. O não cumprimento da 92 medida tem uma penalidade econômica de 15 SMDLV (Salário-Mínimo Diário Vigente), o que equivale a COP 454.260 (USD 116,19)19 (Alcadía de Santiago de Cali, 2021). Os veículos particulares estão sujeitos a 1 dia de restrição de segunda a sexta-feira (exceto feriados) de acordo com o último dígito da sua placa. Não devem circular 2 dígitos por dia. Para o primeiro semestre de 2021, por exemplo, não devem circular no pico da manhã (das 06h às 10h) nem no pico da tarde (das 16h às 20h) os veículos com dígito final conforme a tabela abaixo: Tabela 6.1: Restrição de circulação na semana de acordo com último dígito da placa do veículo Dia Segunda Terça Quarta Quinta Sexta Último dígito da placa 1e2 3e4 5e6 7e8 9e0 Fonte: Alcadía de Santiago de Cali (2021) Podem circular na área as motocicletas, os veículos híbridos e elétricos (elétrico, gasolina/elétrico, diesel/elétrico, os veículos de carga com capacidade maior do que 5 toneladas segundo sua licença de trânsito, as ambulâncias e outros tipos de veículos como aqueles registrados para transporte de pessoas com deficiência, de emergência, de serviços essenciais, alguns veículos oficiais do governo e da força pública, de transporte escolar, meios de comunicação e outros (Decreto Municipal no. 4112.010.20.1833 de setembro de 2020). Também podem circular aqueles veículos que pagam a taxa de congestionamento. Com algumas variações, a restrição veicular e o pagamento de taxa por congestionamento operam também para táxis. O monitoramento é realizado através de sistema de câmeras e apoio da polícia de trânsito e de pessoal da secretaria de mobilidade da cidade Taxa de congestionamento A partir do Acordo Nº 0401 de 2016, se estabelece a taxa de congestionamento ou contaminação que passa a vigorar em 2017 a partir do Decreto Nº 4112.010.0001 que regulamentou o pagamento de “taxa de congestionamento” para transitar nas vias públicas nos horários de restrição estabelecidos pelo município. O decreto estabelece a taxa para todos os veículos, exceto para os de carga superiores a 5 toneladas e aos de transporte público individual e coletivo de passageiros, que circulam na área do perímetro urbano de Santiago de Cali e também atribui as responsabilidades sobre a Base de Dados de arrecadação. O principal objetivo desta política é dar sustentabilidade financeira ao Sistema Integrado de Transporte Massivo - MÍO. Essa política se ampara na Lei Nº 1753 de 2015 que se refere ao 19 1 COP = USD 0.00026 (05/08/2021) 93 Plano Nacional de Desenvolvimento 2014-2018 e que estabelece a cobrança de taxa de congestionamento ou contaminação como fontes de financiamentos para os sistemas de transporte massivo em municípios com mais de 300 mil habitantes (Lei Nº 1753 de 2015, art. 33, item 3). A taxa de congestionamento começou a funcionar em 2017 e consiste na cobrança de um valor para que os veículos particulares possam circular nos dias e horários de sua restrição. Atualmente, o valor pode ser pago por mês (pode ser mais de um mês) ou inclusive por ano. O valor estabelecido para 2021 é de $1.791.504 anual ou $149.292 mensal (em pesos colombianos). Operacionalmente, a pessoa interessada realiza o trâmite de solicitação de pagamento da taxa e paga o valor liquidado, podendo fazer de forma presencial (ir a um posto oficial) ou virtual pelo site oficial (www.cali.gov.co). Uma vez feito o pagamento, o veículo entra de forma automática no grupo dos isentos e pode circular livremente durante o período adquirido pelo interessado (Decreto Nº 34, 2020). A taxa de congestionamento é definida com base na tarifa de bilhete individual de transporte no MIO e é reajustada de acordo com o valor em vigor da SITM. O Decreto Nº 4112.010.20.0805 de 2018 estabeleceu a seguinte fórmula: Taxa de congestionamento = Base X Tarifa Onde Base = 5 X valor da passagem SITM Tarifa = fator X (meses, dias e horas de uso) Tarifa = fator (0,87) Calculo Taxa∕ hora = [(5*(2200)) * (0,87)] = [(11000) * (0,87)] = [$9.570] Liquidación conforme lo dispuesto por el parágrafo 1º del art. 7º del Acuerdo 0401 de 2016: Taxa por congestionamento/ ano = Taxa/hora X horas dia X total dias pico y placa ao ano Taxa por congestionamento/ ano = 9.570 * 6 * 52 Taxa anula de congestionamento 2020 =$2.985.840 sin aplicar la reducion 94 Ainda que na prática o Pico y Placa restrinja a circulação do veículo por mais do que seis horas por dia, a fórmula assume seis horas como base para o pagamento por dia para ter isenção da restrição. A regulamentação da tarifa define também critérios socioeconômicos que podem ser utilizados para estabelecer tarifas diferenciadas para grupos específicos (capacidade contributiva / disposição a pagar), que podem diminuir o valor da taxa de congestionamento ou contaminação até em 40%. Arranjo regulatório Pico y Placa A Prefeitura de Santiago de Cali é responsável por adotar medidas necessárias para racionalizar o uso das vias e garantir a acessibilidade, segurança e comodidade dos usuários das vias, segundo suas faculdades constitucionais e legais conferidas pelo Código Nacional de Trânsito Terrestre (Lei Nº 769 de 2002). A cidade adota em 31 de outubro de 2005 o sistema de restrição veicular por dia e horário, chamado de Pico y Placa, dentro do perímetro urbano de Cali (Decreto Nº 0722 de 2005). Taxa de congestionamento A Câmara de vereadores da cidade adota o Acordo Nº 0401 de 2016 que estabelece a taxa de congestionamento ou contaminação. O executivo municipal emite o Decreto Nº 4112.010.0001 de 2017 que regulamenta o pagamento da “taxa de congestionamento” para transitar nas vias públicas nos horários de restrição estabelecidos pelo município no Pico y Placa. A medida tem suporte na Lei nacional Nº 1753 de 2015 (Plan Nacional de Desarrollo, período 2014-2018) que estabeleceu mecanismos de financiamento para apoiar os sistemas de transporte (em especial BRTs) no país, os quais apresentavam situações financeiras delicadas em várias cidades. A lei nacional estabeleceu que as entidades territoriais (municípios, distritos, e áreas metropolitanas) poderiam estabelecer fontes complementares às receitas tarifárias para dar sustento aos sistemas de transporte. De acordo com o artigo 33 da citada lei, poderiam utilizar-se: recursos próprios, contribuições por estacionamento no viário, preços públicos diferenciados pelo uso de infraestrutura nova para minimizar congestão veicular e estabelecer áreas sujeitas a restrição veicular e contraprestações ou preços públicos pelo acesso durante a restrição. Cali se apoiou nessa disposição para criar a taxa por 95 congestionamento para apoiar o financiamento do sistema de transporte massivo assim como para estabelecer outros mecanismos (2018). Recursos, atores e investimentos Os recursos recebidos pelo Município de Santiago de Cali da taxa de congestionamento são utilizados para financiar a sustentabilidade econômica do SITM-MIO. Além da taxa de congestionamento, o Acordo Nº 0452 de 2018 permite que o sistema de transporte seja financiado por contribuições provenientes do serviço de garagens e da zona de estacionamento de uso público, da exploração econômica em via públicas, da sobretaxa da gasolina comum e Premium, além de outras rendas como os serviços prestados pela Secretaria de Mobilidade, tais como os pátios de trânsito e impostos. Em conformidade com o Acordo Nº 0401 de 2016, até 5% dos recursos gerados pela taxa podem ser destinados para o desenvolvimento dos meios técnicos, tecnológicos e humanos necessários para a arrecadação, vigilância e controle para a aplicação correta desta taxa. Segundo os relatórios da Secretaria de Mobilidade, em 4 anos a arrecadação proveniente da taxa de congestionamento quase dobrou, tendo atingido 4,6 bilhões de pesos colombianos (Tabela 14). Tabela 14. Arrecadação com a Taxa de congestionamento – Cali, Colômbia 2017 – 2020 Ano Valor arrecadado (COP) Variação 2017 2.350.681.710 - 2018 2.645.510.790 12,5% 2019 4.103.494.200 55,1% 2020 4.624.698.311 12,7% Fonte: Secretaria de Movilidad de Santiago de Cali O pagamento da taxa por congestionamento se realiza a partir de um trâmite simples que culmina com a emissão de um valor a pagar. A quantidade de valores a pagar varia conforme as escolhas dos cidadãos de pagamento da taxa, que vai desde uma diária até anualidade. Por isso, a variação mais importante nesse dado foi a mudança de 2018 para 2019, um sinal de afirmação do instrumento. Não se observaram informações relativas a investimentos adicionais, sejam públicos ou privados, para a implementação do instrumento. Vale lembrar que a taxa por congestionamento permite aos veículos particulares circular no dia da restrição (no dia do Pico y Placa), o qual é monitorado por um sistema de câmeras e apoio da polícia de trânsito e de pessoal da secretaria de mobilidade da cidade. 96 Figura 21. Quantidade de liquidações do imposto de taxa por congestionamento no período de janeiro a novembro de 2017 a 2020 Fonte: Secretaria de Mobilidade de Santiago de Cali Estratégias de comunicação O site oficial e as redes sociais da prefeitura apresentam as informações sobre o funcionamento do Pico y Placa vigente durante o semestre em vigor, também informam sobre pagamento de multas e orientações para o pagamento da taxa por congestionamento ou contaminação. Além disso, a população se mantém informada através dos meios tradicionais de comunicação. No caso do Pico y Placa, por ser uma medida muito antiga, encontra-se instalada dentro da cultura da mobilidade na cidade. Durante sua implantação foram realizadas campanhas de sensibilização para a aplicação da medida (Decreto Nº 0722, 2005). No caso da taxa por congestionamento observou-se que sua implementação apresentou falhas de comunicação. Informações em jornais dão conta da falta de uma campanha de comunicação mais adequada e informativa para os usuários sobre a taxa por congestionamento. Contudo, têm sido implementadas melhorias nos meios de pagamento e opções de adesão à medida para os cidadãos. Resultados O ‘Pico y Placa’ apresentou medições no começo de sua implementação. Em 2008, o Decreto Nº 0742 emitido pela Secretaria de Trânsito e Transporte Municipal reportou os seguintes benefícios durante os períodos de restrição veicular: • Redução de 40% na média de atrasos de veículos nos cruzamentos • Redução de 20% nos cruzamentos de semáforos com nível de serviço F (capacidade) 97 • Aumento de 15% nos cruzamentos de semáforos com nível de serviço B (condições ótimas) • Maior velocidade de deslocamento em corredores rodoviários de 17% para 20% • Redução de conflitos e risco de sinistros em 20% • Redução de 20% no tempo de viagem em veículos particulares • Redução de 20% nas emissões de poluentes e níveis de ruído Em 2015, a secretaria informou que ainda se observaram melhores condições de operação nos períodos de restrição. Contudo, um aspecto que tem dificultado a avaliação de impacto no trânsito do Pico y Placa na rede viária principal é a presença constante de obras públicas vinculadas ao Sistema Integrado de Transporte Coletivo, obras das Empresas Municipais de Cali e da Secretaria de Infraestrutura e Recuperação Rodoviária, as quais afetam a capacidade viária dos corredores em construção e os da área de influência das obras. Além disso, mesmo com o Pico y Placa, a cidade de Cali manteve uma tendência ascendente de crescimento da frota veicular. Em relação à taxa por congestionamento, além dos resultados em arrecadação, tem se observado incremento de adesão à medida por usuários de veículos particulares, os quais preferem pagar a taxa e usar o veículo sem restrições, do que usar transporte público no dia de restrição veicular. Ainda, não foram identificados estudos específicos comportamentais ou de outro tipo associados à medida. A cidade também reporta em suas justificativas para a implementação das medidas de Pico y Placa a questão de sinistros de trânsito. Esta motivação e seu seguimento são acompanhados pelo Observatório de Movilidad Sostenible y Seguridad Vial (Observatório de Mobilidade Sustentável e Segurança Viária), o que mostra a preocupação em torno deste tema. Quadro 3. Financiamento do transporte público de Cali Financiamento do transporte público de Cali Inaugurado em 2009, o sistema integrado de transporte massivo (SITM), Masivo Integrado de Occidente (MIO) de Santiago de Cali nasce com o objetivo de dar resposta aos problemas do sistema de transporte desregulado e ineficiente de ônibus da cidade. A principal característica da proposta do SITM-MIO para a cidade foi a criação de uma extensa rede de BRT integrada para melhorar a eficiência dos serviços, reduzir o trânsito, a poluição e o número de sinistros ao mesmo tempo em que proporciona uma melhora do acesso da parcela de mais baixa renda ao sistema. Contudo, problemas como a capacidade de gestão de projeto com este nível de complexidade provocou atraso na conclusão da infraestrutura e no custo final do projeto. Ademais, a 98 implementação do sistema enfrentou problemas de sustentabilidade financeira. A demora da retirada dos ônibus antigos da operação e a não integração dos antigos operadores continuou a gerar competição no sistema, o que contribuiu para que a previsão de demanda não fosse atingida. A fragmentação da autoridade de transporte na municipalidade também se mostrou um desafio. O desempenho do sistema passou a melhorar depois da intervenção do governo nacional, em 2013. Diante de um sistema desfinanciado, a Lei 1753 de 2015 vem a contribuir para a sustentabilidade dos sistemas de transporte colombiano e permite que outras fontes sejam utilizadas para financiar o SITM por meio de novos mecanismos como os fundos de estabilização e subsídio da demanda, a contribuição por serviço de garagem ou zonas de estacionamento de uso público, as cobranças de taxas de congestionamento ou contaminação, cofinanciamento de projetos de PPP para desenvolvimento do sistema de transporte de passageiros. É neste contexto que se insere a cobrança da taxa de congestionamento ou contaminação que passou a vigorar em 2017 em Cali. Além deste, outros instrumentos adotados na cidade são: a contribuição pelo serviço de garagem ou zonas de estacionamento de uso público; a exploração econômica do estacionamento em via pública; a sobretaxa da gasolina e algumas rendas orientadas (serviços prestados pela Secretaria de Mobilidade, impostos de circulação de veículos automotores e trânsito, participação de Santiago de Cali nos impostos sobre veículos automotores e serviços de pátios de trânsito), apresentado no Acordo 0452 de 2018. Os instrumentos de financiamentos são parte de um plano de ações mais amplo no qual destacamos o papel do Plano Integral de Mobilidade Urbana -PIMU20 que, além de ser chave no estabelecimento das zonas de gestão de estacionamento e na regulação das tarifas, traz diretrizes de planejamento urbano sustentável. O plano traz um enfoque na promoção de um modelo de mobilidade multimodal e intermodal baseado em critérios de sustentabilidade ambiental, social e econômica com a prioridade dos modos de transportes ativos e do transporte público. Em seus objetivos específicos estão: a acessibilidade universal de pedestres e população com mobilidade reduzida, o aumento da participação do transporte público no sistema, o aumento da participação de bicicletas, a redução do número de vítimas fatais em sinistros de trânsito e a redução de emissões de CO2 de fontes móveis. 20 https://www.cali.gov.co/planeacion/publicaciones/103061/actualizacion_pimu_vision/ 99 Considerações finais A medida de Pico y Placa de Santiago de Cali persiste desde 2005 mantendo os objetivos de melhora do tráfego na cidade, com ajustes incrementais cada vez mais voltados para as questões ambientais e de segurança viária. Alguns dados da secretaria de mobilidade apontam melhoras em termos de tempo de viagem, aumento de velocidade e redução da emissão de poluentes nos primeiros anos da política. Contudo, o acompanhamento de dados de mobilidade é esparso e não foram encontradas investigações acadêmicas que tenham apurado impacto desta política. Ao mesmo tempo que se manteve a tendência de aumento da frota de veículos particulares na cidade, o novo sistema de transportes (SITM-MIO) teve dificuldades em sua fase de infraestrutura e implementação, que pesou negativamente para a melhoria do tráfego na cidade. Assim, a cidade não logrou em obter melhoras satisfatórias para a questão da mobilidade ao mesmo tempo em que as necessidades de lidar com temas de contaminação do ar e de sinistros de trânsito eram crescentes. Em meio a um problema de falta de financiamento para o sistema de transporte, em 2017, amparada em novas leis que permitiam buscar novas fontes de financiamento, é implementada a cobrança de taxa de congestionamento ou contaminação que permitiam que veículos circulem em seus dias de restrição. Este recurso juntamente com outras medidas estabelecidas, como a gestão de estacionamentos da cidade, seria revertido para o financiamento do SITM-MIO. Os dados mostram aumento da arrecadação referentes à taxa de congestionamento nos três primeiros anos de implementação. Contudo, até o momento, não existem comprovações de que a política tenha sido efetiva em seus objetivos de melhoria da mobilidade, cujos efeitos devem ser potencializados na medida em que os transporte público apresente também avanço na qualidade de serviço gerando mais incentivos para a migração modal. Tabela 15. Disposições gerais Tasa por congestión – Santiago de Cali, Colômbia Item Valor Objetivo Redução do congestionamento e financiamento do transporte público massivo Localização Santiago de Cali Área de abrangência Totalidade do perímetro urbano da cidade Infraestrutura Câmeras instaladas nas vias públicas Contexto da área na cidade N/a Público-alvo Usuários de veículos particulares (inclui táxis) Modal alvo Veículos particulares Relevo Plano 100 Despesas Não encontrado Receitas Não encontrado Composição do Público financiamento Redução na Emissão de -- CO2 Impacto central Redução do trânsito, do nível de poluentes e financiamento do transporte público massivo Elaboração própria. Referências Acuerdo 0401 del 25 de noviembre de 2016. Concejo de Santiago de Cali. Boletín Oficial Nº 183. del 29 de noviembre de 2016. Acuerdo 0452 del 7 de diciembre de 2018. Concejo de Santiago de Cali. Boletín Oficial Nº 196 del 11 de diciembre de 2018. Alcadía de Santiago de Calí (s.d.) 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Congestión urbana en Santiago de Cali, un estudio de caso de política pública. territorios, (42), 146- 174. 102 103 Superillas, Barcelona – Espanha O projeto das Superillas (Supermanzana em catalão) de Barcelona 21 , traduzido como superquadras, se destaca por ser uma proposta de combate aos impactos à saúde causados pelo tráfego de veículos e congestionamento no meio urbano, como a poluição do ar e sonora. As superquadras têm a intenção de reverter a lógica de um urbanismo voltado à circulação de veículos motorizados, dando prioridade aos deslocamentos a pé e em bicicleta. Para além disso, a transformação das quadras urbanas através deste projeto é decidida de forma participativa com a população local e outros atores (públicos e privados). A estratégia central é mostrar os benefícios das ruas compartilhadas aos habitantes locais através do urbanismo tático, com mobiliário urbano, demarcação de áreas através de pinturas de piso e paisagismo, para serem consolidadas ao longo do tempo e em função da disponibilidade de recursos. Contexto A cidade de Barcelona, uma das cidades mais adensadas da Europa, possui uma malha urbana característica que acabou configurando um cenário pouco favorável às novas perspectivas climáticas definidas por acordos internacionais de redução de emissões de poluentes e manutenção da temperatura global. Dados de 2017 do Instituto de Saúde Global de Barcelona mostram que 45% dos residentes de Barcelona estão expostos a níveis de poluição do ar e de poluição sonora acima dos índices recomendados pela OMS (Barcelona Institute for Global Health, 2019). O atual modelo urbano, combinado às construções em concreto, espaços verdes escassos e alta circulação de carros, pode contribuir para três mil mortes prematuras por ano. Segundo o mesmo estudo, o projeto das Superillas de Barcelona pode evitar 667 mortes prematuras por ano. A alta densidade da cidade, que acomoda mais de 1,6 milhão de pessoas em 100km², deixa pouco espaço disponível para áreas verdes e públicas abertas e amplifica a geração de calor antropogênico. A temperatura no centro da cidade pode ser até 8° C mais alta em comparação 21 Superilla é uma proposição de desenho urbano sobre a malha já existente da cidade de Barcelona. Das quadras projetadas pelo Plano Cerdà (Plano urbano original para a 'extensão' da cidade de Barcelona, ou seja, o Eixample, do progressista planejador urbano catalão Ildelfons Cerdà do século 19, considerou as necessidades humanas de iluminação natural, ventilação, espaço aberto e vegetação, e uma rede de transporte que acomodasse bastante os pedestres, carruagens puxadas por cavalos e linhas de bonde público), cria-se uma quadra urbana de 400x400m incorporando projetos de compartilhamento viário, restrição à circulação de veículos particulares, criação de espaços de lazer e verde. 104 com áreas circunvizinhas menos urbanizadas devido ao efeito da ilha de calor urbana (Mueller, N. et al., 2019). O projeto das Superillas pretende mudar esse cenário, com uma previsão de que 503 superquadras sejam inseridas na malha urbana atual, melhorando a qualidade dos espaços públicos e da qualidade do ar, englobando a totalidade da cidade de Barcelona, com a implementação dos projetos em todos os 10 distritos da cidade (Figura 7.1). Figura 22. Mapa dos distritos de Barcelona. Fonte: Barcelona, 2021. Objetivos A Superilla propõe uma reestruturação do modelo típico da malha urbana de Barcelona, o qual tem se baseado majoritariamente na circulação dos carros. Esse novo modelo de urbanização pretende solucionar os principais problemas relativos à poluição do ar gerados pela circulação prioritária de veículos motorizados. Portanto uma nova lógica urbana será implementada, através da conversão dos espaços públicos ocupados pelos automóveis, dando prioridade aos modais ativos (a pé e bicicleta) e aumentando a qualidade do espaço urbano com a presença de novas áreas verdes (Figuras 7.2 e 7.3). Dessa forma, seus principais objetivos são (Joanneum Research & UNDP, s/d): 1. Melhorar a mobilidade urbana sustentável; 2. Revitalizar ruas e espaços públicos; 105 3. Preservar a biodiversidade na cidade; 4. Encorajar a coesão social e a colaboração; 5. Participação popular e novos modelos de governança; 6. Promover a produção e consumo de energia sustentável; 7. Reduzir o ruído, a poluição do ar e a pegada de carbono; 8. Adotar soluções flexíveis. Figura 23. Mapas do sistema viário dedicado aos carros: situação atual e cenário futuro das superquadras Fonte: Rueda, 2016. Figura 24. Hierarquia viária atual e futura (modelo Superilla) Fonte: Rueda, 2016. 106 Instrumentos e implementação O projeto das Superquadras não foi embasado em uma normativa oficial, e não há um documento que forneça parâmetros, ferramentas de projeto ou diretrizes administrativas, de monitoramento e gestão específicas. Ele foi lançado a partir das análises e diretrizes estabelecidas pelo Plano de Mobilidade (2013-2018). O projeto piloto da Superilla de Poblenou, em 2016, no bairro de San Martí, mostrou que sua viabilização foi possível a partir da participação dos residentes e de instituições públicas e privadas envolvidas no processo. As consultas públicas e o engajamento dos coletivos locais foram os precursores das ações projetuais e definições da intervenção, juntamente às proposições de agências locais e universidades de arquitetura. Tudo isto coordenado pela CPTA (confederação de oficinas de projetos de arquitetura), um grupo de professores das diferentes escolas de arquitetura de Barcelona, que tem como objetivo contrastar experiências e envolver-se na evolução urbana de Barcelona. Durante uma semana, foram realizados workshops (Figura 25) com um grande grupo de alunos com o objetivo de sugerir novas formas de ativar o espaço público, antes restrito ao tráfego de automóveis pela malha viária consolidada. Não se tratou, portanto, de um projeto construído no local, nem de um modelo de intervenção planejada ou permanente, mas sim de uma ação que permitiu canalizar o processo de apropriação do novo espaço compartilhado pelas intervenções dos cidadãos locais. A experiência do workshop contribuiu para o melhor entendimento do potencial do modelo e enfrentar com mais garantias os projetos que deverão ser executados no espaço público (La vanguardia, 2016). Figura 25. Superilla Poblenou: Diálogos com os habitantes, 2016. Fonte: Urban Living Lab, 2016. 107 O processo de implementação da superquadra de Poblenou ilustra a lógica de implementação dessa iniciativa, segundo com as etapas de projeto elencadas abaixo: • Etapa 1: apresentação do "urbanismo tático" pelo período de 15 dias, mostrando à comunidade local as potencialidades do projeto através de intervenções temporárias e reversíveis (mobiliário urbano, pintura de piso para de áreas de lazer, vegetação); • Etapa 2: com duração de 6 meses, é uma intervenção de média duração na qual o projeto e seu traçado já são lançados para usufruto dos habitantes locais, e sua avaliação de impactos da proposta; • Etapa 3: execução de obras e reformas estruturais consolidadas nas etapas previamente testadas e analisadas. Além das etapas, tem sido desenhado um modelo matricial para a organização de atores (stakeholders) em função de recursos, interesses, e outros, apresentados na tabela a seguir: Tabela 16. Organização dos atores envolvidos no desenvolvimento do projeto piloto da Superilla de Poblenou. Categoria Atores Instituições Agência de Gestão Ecologia Urbana públicas Câmara Municipal de Barcelona Conselho Provincial de Barcelona Região Metropolitana BCN Universitat Internacional de Catalunya (UIC) Institut de Arquitectura Avanzada de Cataluña (IAAC); Grupos de Coletivo Superilla Poblenou (Collectiu Superilla) Pressão Plataforma dos Afetados pela Superilla (Plataforma d’Afectats per la Superilla) Empresas Poblenou Urban District, privadas 22@ Network Beneficiários Associação de moradores de Poblenou Fonte: Sansão-Fontes,2019, pp.12. O plano piloto para a Superilla de Poblenou enfrentou desentendimentos e protestos da população local contra o projeto. Não foi um processo linear e de fácil articulação com os habitantes. Há nesse contexto forte interferência político partidária, causando divergências entre as opiniões e apropriação das agendas políticas diante das proposições das superquadras. Questões como a gentrificação do espaço urbano projetado e os interesses econômicos locais interferem enormemente na progressão do projeto. Não é apenas um projeto de desenho urbano, mas interfere no modo de vida e nas atividades econômicas dos 108 habitantes e proprietários de imóveis nas quadras objeto de intervenção. As decisões, apesar de contarem com intensa participação popular, ainda enfrentam problemas para conseguir a desejada transformação urbana. A constituição do Conselho Consultivo das Superillas de Barcelona ( Consell Assessor de la Superilla Barcelona), em janeiro de 2021, foi um passo institucional e administrativo importante para a permanência da discussão e apoio ao desenvolvimento de projetos urbanos de superquadras. A próxima ação será realizada no distrito central Eixample, com a expansão de uma rede de 21 eixos verdes e 21 praças - meta estabelecida pelo governo municipal para o distrito, almejando maior acesso aos espaços verdes. Esse projeto passará por consulta pública e os projetos serão contratados via concurso público. Os vencedores do concurso serão contratados para definir o modelo de "Rua do século 21" que será implantada gradativamente no restante da cidade. As obras estão previstas para serem iniciadas no primeiro trimestre de 2022. O governo municipal vai investir 37,8 milhões de euros nas primeiras transformações, dos quais 32,8 milhões serão para a execução dos quatro eixos verdes e 5 milhões para quatro praças. Será o início da implantação do programa de eixos verdes, que deve marcar um novo paradigma na forma de fazer cidade e que continuará a ser implantado e dotado de mais recursos no futuro. Serão organizadas equipes multidisciplinares a partir dos concursos públicos que irão trabalhar em conjunto e de forma coordenada aplicar o novo modelo de espaço público. Os projetos serão trabalhados em conjunto com o bairro, entidades, atores econômicos e associações profissionais, tanto a nível municipal como local da vizinhança. Cabe à Câmara Municipal de Barcelona acompanhar essa transformação com uma campanha de informação e comunicação aos cidadãos sobre os novos projetos que serão executados nos próximos anos. E todas as informações podem ser consultadas no site barcelona.cat/superilles (Adjuntament de Barcelona, 2020). Arranjo regulatório O projeto das Superilla foi introduzido no contexto de elaboração do novo Plano de Mobilidade Urbana para o período de 2013-2018 na cidade de Barcelona, na Espanha. A discussão em torno da escassez de espaços públicos e problemas relacionados à poluição do ar, resultantes de uma conformação urbana e viária densas, mostraram que a cidade apresenta altos índices de dióxido de nitrogênio (NO2) e de partículas poluentes PM (1,3 vezes mais elevadas do que o recomendado pela OMS), além de elevados índices de poluição sonora. Dessa forma temas 109 como tráfego, mobilidade e poluição, tornam-se centrais para o governo e população barcelonesa (Márquez, 2017 apud Sansão-Fortes, 2019, p.8). O projeto das Superilla de Barcelona não é um conceito novo. A cidade implementou restrições ao tráfego de veículos motorizados já em 1993, no distrito central de La Ribeira, seguidos por outros tantos entre 1990 e 2000, no qual o mais conhecido é o bairro da Gracia (2005). O projeto das superquadras esteve engavetado por anos pela prefeitura, até seu resgate em 2014 pelo prefeito Xavier Trias. A implementação do projeto está na agenda política da prefeita Ada Colau (2019-2023), com grande apoio da Agência de Ecologia Urbana de Barcelona (BCN) e de seu criador, Salvador Rueda. A atuação de Rueda (há 40 anos participando do planejamento urbano de Barcelona) e o desenvolvimento de estudos urbanos para a cidade desde 2000, são peças-chave para o encaminhamento do projeto das Superilla. Em 2020 houve a transição da BCN Ecologia para a Agência Regional de Desenvolvimento Urbano, e da saída de Rueda na liderança do projeto, ainda não se sabe os impactos políticos dessa mudança estrutural administrativa. Como citado anteriormente, a revisão do Plano de Mobilidade Urbana para o período de 2013- 2018, juntamente à uma mudança de gestão na prefeitura impulsionou a implantação do projeto piloto em 2016. Contudo não são identificadas políticas de incentivo diretamente relacionadas às Superilla para esse período. Abaixo são listadas em ordem cronológica alguns instrumentos regulatórios voltados às questões mobilizadas pela idealização das Superilla (políticas de mobilidade urbana e desenvolvimento sustentável), ver também Figura 26: • Lei 9/2003, lei de mobilidade da comunidade autônoma de Catalunha - Esta Lei, pioneira na Europa, teve como objetivos básicos a integração das políticas de crescimento urbano e econômico com as de mobilidade, dando prioridade aos transportes públicos e sistemas de transporte eficientes, promovendo a intermodalidade, adequando os sistemas de transporte à demanda em zonas de baixa densidade populacional, diminuindo o congestionamento em áreas urbanas, aumentando a segurança no trânsito e reduzindo o congestionamento e a poluição. Ela determina também a atualização do Plano de Mobilidade Urbana a cada 6 anos. • A Estratégia Temática sobre o Ambiente Urbano (2004) nasce como resultado do 6º Programa de Ação Ambiental da UE, também conhecido como “Ambiente 2010: o nosso futuro está nas nossas mãos”. Seu objetivo final era melhorar a qualidade do ambiente urbano, considerando fundamental o papel desempenhado pelos governos locais no planejamento do transporte com enfoque ao transporte público eficiente, mobilidade a pé e demais modais sustentáveis. 110 • Diretiva 2008/50 / CE sobre qualidade do ar e atmosfera mais limpos na Europa, reformula as Diretivas anteriores 96/62 / CE, 1999/30 / CE, 2000/69 / EC, 2002/3 / EC e Decisão 97/101 / EC relativas ao controle da qualidade do ar, alinhadas às diretrizes estabelecidas pela Organização Mundial da Saúde (OMS). • A Administração Geral do Estado espanhol refere-se pela primeira vez dentro dos planos de mobilidade urbana no âmbito do Plano Estratégico de Infraestrutura e Transporte (PEIT) 2005-2020, a elaboração de um Plano de Mobilidade Sustentável (PMS) à nível nacional. • O Plano Diretor de Mobilidade (PDM) desenvolve territorialmente as Diretrizes Nacionais de Mobilidade. Tem como objetivo planejar a mobilidade do âmbito do Sistema Integrado de Mobilidade Metropolitana de Barcelona (SIMMB) à nível municipal. • Primeiro Plano de Mobilidade Urbana (PMU) - 2006-2012. • Revisão do PMU - 2013-2018. Figura 26. Legislação e planejamento com determinações na PMU Barcelona Fonte: Ajuntament de Barcelona, 2014. 111 Em outubro de 2020, a Agência de Ecologia Urbana de Barcelona (BCN Ecologia) realizou a transferência de suas atividades para a Agência Regional de Desenvolvimento Urbano de Barcelona. Responsável pelo desenvolvimento dos projetos das Superillas de Barcelona, sua transferência pode impactar na continuidade do projeto, pois seu presidente, o urbanista e ecologista Salvador Rueda, foi responsável pela idealização das Superillas desde seu início, quando liderou a criação da BCN Ecologia no ano de 2000, até seu encerramento em 2019. Em janeiro de 2021 foi criado o Conselho Consultivo das Superillas de Barcelona (Consell Assessor de la Superilla Barcelona)22 , com o objetivo de monitorar e desenvolver os planos de ação para a implementação de novos projetos das Superquadras e sua progressão no tempo. Recursos, atores e investimentos O plano está estimado em 37.8 milhões de euros (US$44.6 milhões) para o horizonte de 2030, financiados pela municipalidade de Barcelona. Em agosto de 2020, o European Investment Bank (EIB) anunciou o investimento de 95 milhões de euros (US$112.4 milhões) para 40 projetos em Barcelona, dos quais 25% destinados às Superillas (aprox. US$28.1 milhões) (Cities Today, 2020). Não foram encontrados dados suficientes sobre os investimentos direcionados ao desenvolvimento atual do projeto. O valor investido para o projeto piloto da superquadra de Poblenou, entre 2016-17, foi de 430 mil euros (La vanguardia, 2017). Para a Superilla de Sant Antoní, no distrito do Eixample, foram investidos, em sua primeira fase de implementação, o total de 3,5 milhões de euros, numa área de recuperação de aproximadamente 5mil metros quadrados. Para a a segunda fase de implementação, está previsto o investimento de mais 8 milhões de euros. O financiamento do projeto e sua implementação fazem parte de um acordo entre o Município de Barcelona, com a colaboração da Agência de Ecologia Urbana de Barcelona (BCN), e o European Investment Bank (EIB). Não foram identificadas fontes de financiamento complementares vinculadas a impactos positivos nas áreas beneficiárias, seja por mudanças no uso e intensidades de aproveitamento Publicação da Prefeitura de Barcelona: 22 https://ajuntament.barcelona.cat/premsa/2021/01/27/constituit-el-consell-assessor-de-la-superilla- barcelona/ - consultado em ago/21 112 urbanístico, por maior valorização de áreas comerciais, seja por redução de impactos negativos associados ao tráfego veicular motorizado. Estratégias de comunicação As estratégias de comunicação adotadas no processo de implantação das Superquadras em Barcelona concentram-se em ações de participação popular, urbanismo tático, campanhas em mídias sociais e cobertura da imprensa (mídia espontânea). O urbanismo tático (transformação do espaço com materiais leves e baratos), primeira etapa do processo de implantação das Superillas, é uma oportunidade para testar o projeto e discuti- lo com a comunidade diretamente impactada. Dessa forma, a implantação das primeiras superquadras é por si só uma ação de comunicação. Além disso, o projeto passou por consulta pública e foi discutido em oficinas participativas e debates públicos. A Prefeitura de Barcelona elaborou um vídeo explicativo (Barcelona Adjuntament, 2020) do projeto em novembro de 2020. No mês seguinte, a prefeitura lançou uma campanha com três vídeos (Snoop, s/d.), cada um deles com uma mensagem principal: • intensificação da vida do bairro, com impacto positivo no comércio local; • criação de mais espaços de lazer para as crianças; • diminuição das velocidades máximas para 30 km/h, aumentando a segurança viária. Na mídia internacional, as Superillas tiveram uma ampla repercussão e o projeto foi muito elogiado. Barcelona é um grande destino turístico e se coloca internacionalmente como "vitrine" para projetos de grande impacto na escala urbana e na qualidade dos espaços públicos. Dessa forma, o marketing institucional impulsionado pela cidade repercute na mídia internacional, que apontou o projeto das Superquadras de Barcelona como modelo para implementação de políticas de desenvolvimento e de mobilidade urbana sustentável, zonas de baixa emissão de carbono e urbanismo voltado à escala do pedestre (Figuras 7.6 a 7.9). 113 Figura 27. Matéria em site internacional da cidade de Barcelona sobre a transformação da cidade em uma "grande superquadra". Fonte: Barcelona, 2020. Figura 28. Matéria no site da Bloomberg - CityLab: "Barcelona irá ampliar suas zonas de "zero-carros" - as Superillas". Fonte: City Lab Bloomberg, 2020. 114 Figura 29. Matéria da revista Vox "Plano radical de Barcelona para tomar as ruas dos carros". Fonte: Revista Vox, 2019. Figura 30. Matéria no jornal britânico The Guardian: "Superillas ao resgate: Plano de Barcelona para devolver as ruas aos seus habitantes" (tradução livre). Fonte: The Guardian, 2016. 115 No entanto, localmente o projeto é alvo de críticas e manifestações, principalmente de cunho político-partidário (Figura 31). As oposições sociais, políticas e econômicas em torno do projeto tendem a deslocar o tema ambiental e social do projeto para questões de embates ideológicos. “A cobertura da mídia local é mais sobre problemas de implementação, oposição ao projeto-piloto e seu impacto negativo na economia do que sobre os benefícios potenciais para a saúde pública, qualidade do ar ou mitigação das mudanças climáticas” (BCNUEJ, 2018). Figura 31. Manifestação contra a Superilla em 17 de março de 2017. Fonte: Superilla BCN, 2017. Resultados Desde o ano de 2014 até o presente (2021), a prefeitura aponta para a implementação de 9 projetos de superquadra (das 503 previstas). Entre as 9 Superillas apresentadas pela prefeitura de Barcelona, encontram-se concluídas ou parcialmente concluídos apenas 5 projetos: Poblenou, Sant Antoni, Horta, La Maternitat i Sant Ramon e Hostafrancs. Atualmente, pouco se tem documentado sobre as intervenções realizadas e seus impactos na cidade, ou seja, dados de recursos investidos, monitoramento e avaliação dos projetos. O projeto piloto de Poblenou (2016) foi um dos primeiros a ser implementado, com intervenções temporárias e muito embate político e popular para sua viabilização. Segue abaixo uma tabela da distribuição dos projetos de Superillas propostos, sua localização (distritos) e sua situação atual. Tabela 17. Organização das Superillas apresentadas pela prefeitura de Barcelona de acordo com sua data de início de projeto/lançamento da discussão, sua conclusão e situação atual. Local Ano (início – Situação atual conclusão) Distrito Eixample Superilla Sant Antoni* 2017 – em andamento Parte 1: concluída e Parte 2: em andamento 116 Local Ano (início – Situação atual conclusão) Superilla Consell de Cent- 2018 – em andamento Sem informação precisa Germanetes Superilla Girona 2017 – em andamento Sem informação precisa Distrito Sants-Montjuic Superilla Hostafrancs* 2014 – em andamento Reurbanização das praças Pérez Moya, Herenni e Joan Pelegrí. Outros trechos com início em 2021. Distrito Les Corts Superilla La Maternitat I Saint 2013 – s/d Concluído, com 6.000 metros Ramon* quadrados do espaço público reurbanizados. Distrito Sarrià-Sant Gervasi Superilla Sant Gervasi de Cassoles 2018 - s/d Sem informação precisa Distrito Horta-Guinardó Superilla D’Horta* 2016 - 2021 Concluído, com reurbanização e redesenho do espaço viário. Distrito de Sant Andreu Superilla de la Sagrera Sur-Navas Não iniciado Primeira sessão de discussão em Sur setembro de 2021. Distrito de Sant Martí Superilla de Poblenou* 2013 - 2017 Concluído * Projetos desenvolvidos a partir do conceito completo das Superillas (apresentado no item Objetivos). Fonte: Adjuntament de Barcelona, s/d. Superillas. O caso da Superilla de Sant Antoni (Figura 32) foi viabilizado apenas em 2019. Previsto como um dos projetos de transformação de cruzamentos de quadras, antes predominantemente destinado à circulação de carros, hoje consolida-se como praça unicamente com elementos reversíveis de mobiliário e pintura de piso, ainda sem obras de caráter permanente. O ISG (Barcelona Institute for Global Health) (Mueller, 2019) estima que a implementação do projeto das Superquadras em sua completude (503 intervenções) trará os seguintes benefícios e resultados para a cidade: • Prevenção de 667 mortes prematuras por ano (ver Figura 7.12); • Aumento da expectativa de vida em quase 200 dias por habitante; • Gerar uma economia de 1.7 bilhões de euros por ano; 117 • Redução de uma média de 24% das emissões de NO2 por ano (passando de uma concentração de 47 ug/m3 para 36 ug/m3 - diante de uma recomendação de 40 ug/m3); • Redução de 5.4% dos ruídos produzidos pelo tráfego de veículos (54 db para 51db); • Redução das viagens em veículos motorizados particulares, de 1.190.000 viagens para 230.000 (redução de 19% das viagens); Figura 32. Superillas Sant Antoní: antes e depois. Fonte: Archdaily, 2019. Figura 33. Mortes prematuras evitadas por ano com a implementação do modelo das Superquadras. Fonte: Barcelona Institute for Global Health, 2019. 118 Contudo, não foram identificados relatórios que façam medição de impactos do plano no estágio de implementação atual, muito provavelmente pelo fato de terem sido executadas apenas 3 intervenções das 503 previstas. Em pesquisa publicada no ano de 2019 (Mueller, N. et al.) foram realizadas prospecções do cenário atual da cidade, e previsões para um ideal possível caso houvesse a implementação do projeto das Superquadras em sua totalidade. Tabela 7.3: Comparação entre o cenário atual e a previsão para as Superquadras na prevenção de mortes prematuras causadas pela poluição do ar por veículos motorizados, e pelo aumento das temperaturas locais pela falta de espaços verdes-chamadas ilhas de calor. Exposição (ano) Cenário atual Superillas Mortes evitadas (95%CI) Mobilidade ativa Média 29.39 MET Transporte Público +16.78 36 (26 – 50) (2017) (h/semana) MET(h/semana) Bicicleta +23.99 MET(h/semana) Caminhada +5.99 MET(h/semana) NO² (2012) 47.18 µg/m 3 35.72 µg/m3 291 (0 – 838) Poluição sonora 54.18 dB Lden 51.26 dB Lden 163 (83 – 246) (2016) Espaços verdes 6.54 %GS 19.57 %GS 60 (0 – 119) (Eixample) (2010) Calor (2016) Pelo menos 132 dias Pelo menos 116 117 (101 – 137) por Superillas > 21.50 dias por Superillas > 21.50 ºC °C Total 667 (235 – 1098) Fonte: Mueller, N. et al., 2019. Legendas: dB = decibel; Lden = indicador de poluição sonora no cenário europeu [dia-tarde-noite], com medidas de 5dB e 10dB para os períodos de tarde e noite, respectivamente; MET = dado para medição de atividades metabólicas (metabolic equivalent of task), sendo 1 MET = 1kcal/ kg/h); %GS = porcentagem de espaços verdes (green spaces); 95% CI = 95% de intervalo de confiança (confidence interval). 119 Figura 34. Mapa da atualização do projeto das Superillas de Barcelona Fonte: Adjuntament de Barcelona, s/d. Superilla Barcelona. Em outubro de 2021, a prefeitura de Barcelona divulga uma atualização do projeto das Superillas. Através do desenvolvimento de um mapa (ver Figura 7.13) , foram identificados e geolocalizados os diversos projetos de transformação urbana que vêm ocorrendo na cidade. Para além dos projetos iniciais das Superillas foram incorporados todos os projetos urbanos antigos e atuais, concluídos e também aqueles em fase de implementação. Foram divididos em 5 categorias: • Transformação do espaço público; • Melhoria dos bairros e pontos de encontro; • Reativação dos tecidos urbanos econômicos e de pesquisa; • Incentivos à mobilidade sustentável; • Ampliação da oferta de habitações. Considerações finais As Superillas de Barcelona estão alinhadas aos conceitos de ruas compartilhadas. A conversão do espaço ocupado pelos automóveis em espaços dedicados aos pedestres, com incentivo à mobilidade ativa, foi identificada nos projetos implementados até o momento. Contudo, vale ressaltar que a realização de apenas 3 intervenções está muito longe do plano inicial, divulgado em 2014, com a proposição de 503 Superillas. Dessa forma, os impactos e 120 objetivos esperados, para redução da poluição do ar e sonora, não podem ser avaliados e mensurados diante da pouca efetividade na viabilização dos projetos. Apesar de o projeto fazer parte do Plano de Mobilidade Urbana (2013-2018), existe pouca articulação e regulamentação para o desenvolvimento das Superillas. Apenas em janeiro de 2021 foi criado um conselho municipal (Consell Assessor de la Superilla Barcelona) para o monitoramento, gestão e incentivo aos novos projetos vinculados às Superillas e outras intervenções urbanas com os mesmos objetivos – o caso dos eixos verdes, praças e os projetos de “rua do século 21”. Tabela 18. Disposições gerais Superillas – Barcelona, Espanha Item Valor Objetivo Melhorar a qualidade do ar, aumentar a qualidade urbana, criar espaços verdes e espaços dedicados aos pedestres. Reduzir a circulação de veículos motorizados. Localização Barcelona Área de abrangência Previsão para a totalidade da área da cidade. Infraestrutura Novo modelo de rua, mais espaço dedicado a modais ativos (pedestres e ciclistas), praças, espaços de lazer. Contexto da área na Central e periférico cidade Público-alvo Todos os habitantes Modal alvo Mobilidade a pé Relevo Plano Despesas Previsão de US$44.6 milhões em 10 anos Receitas Início em 2016, previsão para 2030, sem definição de um orçamento anual pré estabelecido. Para 2020, previsão de investimento de $28.1 milhões de euros Composição do Municipalidade (público) e European Investment Bank (EIB) financiamento (privado). Redução na Emissão de Sem dados disponíveis. CO2 Impacto central Impactos não quantificados. Elaboração própria. Referências Ajuntament de Barcelona (2020). Cap a la Superilla Barcelona. Disponível em: https://ajuntament.barcelona.cat/premsa/wp-content/uploads/2020/11/201111- DOSSIER-Superilla-BarcelonaVDEF.pdf. 121 Ajuntament de Barcelona (2014). Pla de Mobilitat Urbana de Barcelona 2013‐2018. Disponível em: https://www.barcelona.cat/mobilitat/sites/default/files/PMU2013- 2018_DocAprovInicial_Parte1_2.pdf. Ajuntament de Barcelona. The bicycle lane network. 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Disponível em: http://www.urbanlivinglab.net/superillas/. 124 125 Paris 15 minutes, Paris – França O programa Paris Ville du Quart d'heure, traduzido como Paris cidade dos 15 minutos, se destaca por ter sido uma das marcas para a reeleição da atual prefeita Anne Hidalgo, apesar de não ter sido lançado efetivamente como um projeto estruturado pela municipalidade. Apoiada pela população parisiense, a vontade de tornar a cidade 100% ciclável e caminhável parece uma forte premissa para o desenvolvimento da cidade, com engajamento voltado às políticas ambientais de redução da poluição e contenção do aumento da temperatura global. Tendo em vista que veículos movidos a combustíveis fósseis são fontes relevantes de emissão de poluentes, o programa Ville du quart d'heure visa reduzir a circulação de veículos motorizados por meio do incentivo à mobilidade ativa e aumento da acessibilidade. Contexto A cidade de proximidade idealizada pelo programa Ville du quart d'heure insere-se num contexto bastante favorável na cidade de Paris, capital da França. Com padrões elevados de densidade populacional (a mais densa da União Europeia – 21 mil hab/km2) e uma rede de transportes extensa e consolidada, a mobilidade dentro da cidade conta com uma rede cicloviária de 916,7 km, 16 linhas de metrô (216 km de extensão), 3 linhas de trens de superfície (34 km de extensão), 2 linhas de trens urbanos (117 km de extensão), 64 linhas de ônibus (64 linhas, 575 km de extensão, 1245 pontos de parada) – de acordo com o relatório anual de deslocamentos em Paris, de 2018 (OMNL, 2011). Dentro dessa configuração do sistema de transporte público, mais de 60% dos deslocamentos internos à Paris são realizados a pé, como mostram os dados da divisão entre modos fornecida pela prefeitura (Ville de Paris, 2018. Comment de déplace-t-on à Paris): • 61% a pé; • 27% transporte público; • 7% automóveis; • 5% outros modais (tais como bicicleta, motocicletas) Sendo assim, a capital francesa já apresenta uma urbanidade propícia para a instauração de uma lógica de mobilidade baseada na caminhabilidade e no deslocamento por bicicleta. Se integram ao programa, incentivos à construção de uma extensa rede cicloviária, políticas robustas de redução de circulação de carros em regiões centrais da cidade (principalmente veículos movidos a diesel e gasolina - estabelecendo zonas de baixa emissão), além de um plano de logística que reduz as taxas de congestionamento e a circulação de veículos não- 126 elétricos. A divulgação do programa, ainda sem previsão de implementação concreta, data do período eleitoral do ano de 2020 (Ville de Paris (2020). La ville du quart d'heure en images). Objetivos O programa Ville du quart d'heure pretende promover uma cidade em que os cidadãos consigam ter acesso a todos os serviços e necessidades primordiais (farmácias, mercados, padarias) a uma distância/tempo de 15 minutos a pé ou em bicicleta, melhorando a qualidade ambiental da cidade e a qualidade de vida de seus habitantes. A intenção é reduzir as distancias de deslocamento (que tendem a ser realizados em modos motorizados, gerando mais tráfego e superlotação nas linhas de transporte público centrais), aumentar a diversidade no uso do solo entre trabalho e residências em certas zonas isoladas (zonas “monofuncionais”) e tentar equilibrar o território na escala dos bairros, tornando acessível aos habitantes de todo o território da cidade infraestruturas como hospitais, escolas, parques, mercados, restaurantes, comércio e trabalho/escritório. O conceito foi exposto após o lançamento de candidatura para reeleição da prefeita Anne Hidalgo, em janeiro de 2020, no programa "Paris en commun", apoiado pelo pesquisador Carlos Moreno, da Université Paris 1-Panthéon Sorbonne. A pesquisa de Moreno aponta para o fato de que a política desenvolvimentista dos anos 90 está associada à resolução das questões de crescimento urbano e espacial das cidades através de grandes investimentos em infraestrutura para veículos motorizados particulares e para transportes de massa (metrôs e trens), resultando em uma cidade espraiada, de longas distâncias. “In cities, cars changed the dynamics of urban planning, opening doors for linear and perpendicular city grids and the devastating consequences of urban sprawl. The wide- ranging availability of cars flooding streets in cities, as noted by Gössling., has led to continuous negative impacts on both biodiversity and quality of life, linked to negative outcomes such as increased traffic congestions, which, besides psychological and social tolls, translate to time and economic loss. Such outcomes are also linked to low air quality as a result of increased emissions and the energy demand (fuel) to keep vehicles on the roads. Appleyard [3] interestingly notes that the availability of cars has also resulted in increasing financial burdens on different households, resulting from the lost time in traffic, the demand for fuel and the increasing cost of vehicle maintenance.” (Moreno, C., 2020) A proposta tem como premissa que numa cidade densificada como Paris, onde 72% dos deslocamentos diários na região metropolitana se dão em menos de 3 km (uma distância que em bicicleta demora em média 15 minutos) e 45% dos trajetos "domicílio-trabalho" são feitos em menos de 5 km, dos quais metade representam menos de 2km, considera-se que a cidade 127 já apresenta uma vocação para os princípios da "cidade dos 15 minutos" e para os deslocamentos a pé e em bicicleta Portanto, novas iniciativas de políticas orientadas a favorecer a proximidade entre as pessoas e as atividades têm excelentes condições de implementação. Instrumentos e implementação Na cidade de Paris, existe uma grande desigualdade na distribuição do espaço público, cenário em que são priorizados os veículos motorizados particulares. Ainda que aproximadamente 65% dos parisienses não possuem carro particular, 8% do espaço público da cidade é dedicado ao estacionamento de automóveis (carros e motos). As 135 mil vagas para carros e motos ocupam um total de 197 hectares, espaço que corresponde à área total dos 17 parques parisienses (sem considerar grandes bosques). Um dos principais instrumentos previstos para a viabilização da Ville du quart d'heure será o plano de redução de vagas de estacionamento na cidade. A campanha municipal prevê uma redução de quase 50% do número de vagas disponíveis nas ruas de Paris, uma supressão de 60 mil vagas, onde ainda restarão aproximadamente 70 mil vagas (Ville de Paris (2021). Réforme du stationnement). A democratização do espaço útil da cidade revelará o potencial do espaço público da cidade. O objetivo da reforma das regras de estacionamento em Paris é o de transformar a metade das vagas de estacionamento público (ocupam uma área de 60 hectares) para dar prioridade a outros usos, através da ampliação de calçadas, pistas cicláveis, praças e arborização. Após consulta pública, a reforma foi lançada em julho de 2021(Ville de Paris (2021). Paris réforme son stationnement ). Sua implementação será feita por meio de diversas medidas como a transferência das vagas de estacionamento público residenciais para estacionamentos subterrâneos públicos e privados, a introdução de sistema de cobrança e tarifas, sinalizações viárias, sistema de informações sobre disponibilidade de vagas em estacionamentos, suporte um quadro regulamentar bem definido e uma forte campanha de comunicação da cidade de Paris aos seus residentes (Ville de Paris (2021). Les États Généraux du Stationnement). O modo de implementação da Ville du Quart d'heure não está previsto em um plano de ação definido pela prefeitura. Através dos indicadores urbanos coletados pela agência local de urbanismo (APUR) estima-se que esta não será uma tarefa árdua para a cidade. O seguinte mapa (Figura 8.1) indica as zonas de acessibilidade a 5 minutos a pé para o acesso às 3 principais atividades comerciais do dia-a-dia: padaria, farmácia e banca de jornal. Em azul são 128 as zonas de 5 minutos aos três tipos de serviços, em rosa escuro estão as zonas de 5 minutos a dois tipos de serviços; e em rosa claro, um tipo de serviço. Apenas 4% da população da zona parisiense caminha mais de 5 minutos para acessar esses comércios (APUR Atelier Parisien d'Urbanisme, 2021). Figura 35. Mapa indicador do tempo de deslocamento para acesso a pé aos serviços de abastecimento cotidianos, como farmácias, padarias e mercados (2021). Fonte: APUR, 2021. São previstas as seguintes ações para viabilização do plano (Anne Hidalgo, 2020): • Conselhos municipais dos cidadãos serão priorizados ante o Conselho da cidade de Paris; • Favorecimento de criação de empregos para jovens e incentivo às atividades locais; • Disponibilização de 1 responsável por bairro para atendimento aos habitantes/moradores locais; • Estabelecimento de multas para infrações às regras estabelecidas pelo plano do bairro; • Plano de limpeza e higienização das ruas – “zero esgoto”; • 5000 policiais municipais farão a vigilância e o respeito às regras; • Estabelecimento de um “código da rua” – para tanto os cidadãos como policiais serem vigilantes23; • Incentivo à cultura e centros culturais; 23 Como mencionado anteriormente, a Lei n° 2014-58 de janeiro de 2014 - modernisation de l'action publique territoriale et d'affirmation des metrópoles - permite a simplificação administrativa e delegação de competências entre o Estado e a cidade, reforçando o papel das "subprefeituras" parisienses. 129 • Flexibilização dos espaços e edifícios públicos – multifuncionalidade e atividades variadas; • Incentivo aos esportes e equipamentos que favoreçam as atividades físicas; • Disponibilização de centros de acolhimento às pessoas em situação de vulnerabilidade em cada bairro; • Incentivo ao comércio local e produção local – associações, cooperativas e cozinhas solidárias. As informações disponíveis indicam que para desenvolver as ações específicas serão consideradas estratégias de desenho urbano e coleta de dados, indicadores socioeconômicos e pesquisas de necessidades da população para cada localidade. Segundo a pesquisa, enquadrada pelo professor Carlos Moreno, é possível cruzar dados e indicadores para mapear as potencialidades dos espaços urbanos e propor diretrizes de ação junto à coletividade e às administrações locais (escala municipal e do bairro). Isso seria uma aproximação aos conceitos de “Smart City”, considerando a associação entre disponibilidade de dados (de saúde, de trânsito, de serviços e comércios gerais) e oferecimento de infraestrutura correspondentes às demandas identificadas. Foram identificadas quatro dimensões essenciais para que se desenvolva uma cidade acessível a pé e em bicicleta nessa distância/tempo de 15 minutos: densidade, proximidade, diversidade e digitalização (Moreno, 2021). Estas foram identificadas após observações sobre os desafios que diferentes cidades em todo o mundo enfrentaram durante o auge dos casos generalizados de COVID-19 e as medidas e protocolos de saúde subsequentes que se seguiram para prevenir sua propagação. Os residentes enfrentaram desafios incontáveis, especialmente no acesso a itens essenciais que, na maioria das cidades, foram distribuídos de forma esparsa. Por exemplo, um bairro planejado de forma que todas as infraestruturas básicas possam estar ao alcance em 15 minutos ou menos, com uma oferta de espaços públicos que permitam às pessoas manter padrões de saúde e práticas ao ar livre (parques, praças, ciclovias), seriam de extrema relevância durante uma pandemia e provavelmente poderiam delimitar novos paradigmas para o planejamento futuro das cidades. Arranjo regulatório O programa de desenvolvimento urbano na capital francesa tem forte posicionamento diante das políticas de desenvolvimento sustentável e de transição ecológica. Não apenas em nível municipal, mas a França coloca-se no cenário mundial como um dos líderes nas ações em apoio às questões climáticas e ambientais. Esta pauta vem sendo fomentada com mais vigor desde a COP21 e o estabelecimento do Acordo de Paris, juntamente à Lei nacional de 130 transição energética pelo crescimento verde (Loi de transition énergétique pour la croissance verte (Ministère de La Transition Écologique, 2017), exigindo esforços para a redução das emissões de gases efeito estufa, de partículas poluentes e provisão de fontes de energia limpa e sustentável (redução de 40% das emissões em relação aos dados de 1990, no horizonte de 2030) (Ministère de La Transition Écologique, 2021). No aspecto da mobilidade urbana, o projeto Ville du quart d'heure faz parte das ações políticas para se atingir a meta estabelecida pelo Plano Climático para a cidade Paris (Plan Climat Ville de Paris), reduzindo a principal fonte de poluição da cidade - o transporte urbano, concretizando diretrizes para: 1. Eliminar a circulação de veículos a diesel até 2024. 2. Eliminar a circulação de veículos à gasolina até 2030. 3. Transformar Paris numa cidade 100% acessível às bicicletas (todas as ruas com infraestrutura para bicicletas). 4. Introduzir um plano de logística e transporte de mercadorias utilizando-se transportes de baixo impacto. Nesse contexto, o apoio às políticas de baixa emissão de gases poluentes se estende por todo o território francês. Valendo-se disso, em nível local e municipal, a campanha de reeleição da prefeita Anne Hidalgo, propôs uma progressão de ações inseridas nessa pauta de desenvolvimento com atuação em fóruns internacionais, tal como a rede de cidades C40 do qual a prefeita foi líder em 2019 (C40 Cities, 2019). Também é relevante a recente mudança nas competências dos atores municipais. Em fevereiro de 2017, a Assembleia Nacional instaurou uma reforma constitucional que permite maior independência das municipalidades através da Loi N° 2014-58 de 2014 de modernisation de l'action publique territoriale et d'affirmation des métropoles . Essa lei visa a simplificação administrativa e a delegação de competências entre o Estado e a cidade, reforçando o papel das "subprefeituras" parisienses. Recursos, atores e investimentos O programa Ville du Quart d'heure ocupou lugar de destaque na campanha eleitoral de reeleição de 2020 da prefeita Anne Hidalgo, apoiado por políticas urbanas e ambientais vigentes em todo território francês (ver item 4 - Arranjo Regulatório). Informações detalhadas sobre a fonte dos recursos e custos de investimento e operação do programa ainda não foram definidos ou não estão públicos. Ainda não há informações sobre as fontes de recursos de implementação e operação do projeto. 131 Dado o estágio inicial do programa, as informações abaixo são estimativas e previsões: • 1 bilhão de euros por ano para manutenção e limpeza de ruas, praças e jardins (Anne Hidalgo, 2020); • Direcionamento de 25% do programa de investimentos municipais para bairros populares; • Investimentos participativos de 25% - residentes propõem ideias e participam das votações para destinação dessa parcela dos investimentos a cada ano (atualmente é de 5%); • 350 milhões de euros para criar 100% de ruas com ciclovias no horizonte de 2024 (Le Parisien, 2020). Estratégias de comunicação O programa da Ville du Quart d'heure de Paris foi divulgado durante a campanha eleitoral de 2020 da prefeita eleita Anne Hidalgo. As peças de comunicação restringiram-se às ilustrações presentes em seu site de campanha "Paris en Commun" (Anne Hidalgo, 2020). Foram encontrados materiais e publicações em sua conta do Twitter e nos principais jornais franceses, tais como Le Parisien24, Le Figaro25 e Le Monde26 , e na mídia internacional também (The Guardian 27, Forbes28 ), principalmente divulgados no ano da campanha de 2020. Figura 36. A rua para convívio e lazer - Ilustrações “antes e depois” sobre as possibilidades projetuais para o programa Ville du Quart d'heure de Paris. 24 Le Parisien, 2020. 25 Le Figaro, 2020 26 Le Monde, 2020. 27 The Guardian, 2020. 28 Forbes, 2020. 132 Fonte: Ville de Paris, 2020. Figura 37. Publicação durante a campanha eleitoral de Anne Hidalgo na rede social Twitter. Fonte: Twitter, 2020. Figura 38. Escola como centralidade do bairro - Ilustrações “antes e depois” sobre as possibilidades projetuais para o programa Ville du Quart d'heure minutos de Paris. Fonte: Ville de Paris,2020. 133 Resultados Como foi mencionado, o Programa ainda não foi implementado. Contudo, a pandemia da Covid-19 apresentou uma oportunidade para testar o conceito da “hiper -proximidade” por modais ativos (bicicleta e a pé) e de redução de deslocamentos por veículos particulares. A partir de uma pesquisa realizada pela agência local de urbanismo parisiense (APUR - Atelier parisien d'urbanisme) no âmbito da crise sanitária do Covid19, foi possível se aproximar de como seria a cidade de Paris dentro de uma configuração de cidade idealizada pelo programa Ville du Quart d'heure, bem como suas repercussões e impactos no contexto urbano (APUR Atelier Parisien d'Urbanisme, 2020). Instauradas as restrições de deslocamentos e isolamento no contexto pandêmico, a partir de 11 de maio de 2020 a cidade de Paris reorganizou seu espaço urbano, promovendo mais espaço dedicado aos pedestres e aos ciclistas e utilizando metodologias de "urbanismo tático" para sua rápida instalação e funcionamento. Com uma limitação de deslocamento dentro de um raio de 1km em relação ao domicílio, o que corresponde ao tempo/deslocamento de 15 minutos a uma velocidade de 4 km/h de um deslocamento feito a pé, os habitantes de Paris sentiram como seria uma cidade de proximidades e o incentivo massivo no deslocamento a pé e em bicicletas. Figura 39. Registros fotográficos feitos pela APUR em eixos viários importantes da cidade de Paris – Notre Dame e Rue de Rivoli. Fonte: APUR, 2020. Nesse contexto foram criadas de forma temporária: • 70 km de ciclovias dentro de Paris (140 km na região metropolitana) - "Corona-pistes"; • Plano de implantação de uma rede de transporte cicloviário, permitindo a viabilização de 650 km de itinerários estruturados (com o apoio e financiamento pelas municipalidades locais); 134 • 56 ruas pedonais - zonas estritamente destinadas aos pedestres; • 20 zonas de convívio e lazer – abertas a partir da remoção vagas de estacionamento para alargamento de calçadas e espaços de convívio. Figura 40. Espaços de convívio e ampliação de calçadas promovidas durante o período de restrições causadas pela pandemia do Covid 19. Fonte: APUR, 2020. O período de confinamento e restrições de circulação veicular devido à pandemia da COVID- 19 resultou em diminuição do congestionamento e, consequentemente, de poluentes atmosféricos (APUR Atelier Parisien d'Urbanisme, 2020), tal como imagens apresentadas na Figura 8.7 e segundo dados abaixo: • redução de 72% do tráfego de Paris; • redução de 20 à 35% do poluente dióxido de nitrogênio (entre maio/20 à abril/21); • redução de 50% de partículas finas (20 nanômetros); • redução de 7% de micro-partículas PM10 135 Figura 41. Imagens de satélite extraídas do software Copernicus – cartografia da poluição do ar. Comparativo entre os registros de março de 2019 e março de 2020. Fonte: APUR, 2020. Segundo a agência local de urbanismo (APUR), apesar destes resultados terem sido obtidos em um contexto atípico, eles podem servir de ponto de partida para estimar impactos futuros de intervenções orientadas pelo programa Paris 15 minutos. De acordo com pesquisas realizadas após o desconfinamento (Ville de Paris, 2021. Bientôt de nouvelles pistes cyclables partout dans Paris): • dos 70 km de ciclovias criadas provisoriamente, 52 km serão mantidas e requalificadas; • 7% dos deslocamentos em Paris estão sendo feitos em bicicletas, contra menos de 5% antes da pandemia; • 45% das usuárias das ciclovias provisórias são mulheres. Considerações finais Paris Ville du Quart d'heure é um programa alinhado à agenda ambiental de redução de emissão de poluentes e do incentivo aos modos ativos de deslocamento que tira proveito da já densa e diversa urbanização parisiense. Ainda não se trata de um programa estruturado com diretrizes bem definidas, mas parte de uma política urbana e de transportes mais ampla, numa cidade que hoje sofre impactos com a superlotação dos transportes públicos, congestionamento das vias centrais e concentração de empregos e moradias em zonas segregadas. Dessa forma a gestão municipal utiliza o programa de proximidades da Ville du Quart d'heure como direcionamento – já existente de certa forma – para a ampliação de redes de transporte 136 cicloviário e ampliação do espaço dedicado ao pedestre e ao lazer/vegetação, por meio de medidas de desincentivo ao uso de automóveis particulares e veículos movidos à combustíveis fósseis e redução de espaços de estacionamento em vias públicas. Tabela 19. Disposições gerais Paris 15 minutes, Paris – França Item Valor Objetivo Acessibilidade urbana – criar proximidades com uso de modais ativos. Localização Paris Área de abrangência 105,4 Km2 Infraestrutura Calçadas, ciclovias, praças, equipamentos públicos Contexto da área na cidade Abrange toda a área urbana de Paris Público alvo Toda a população parisiense. Priorizando grupos de pessoas em situação vulnerável, crianças, pedestres e ciclistas. Modal alvo Bicicleta e à pé Relevo Majoritariamente plano Despesas $1.177.520.000,00 para manutenção do espaço público (previsão) Receitas Dados não encontrados. Composição do Recursos públicos provenientes da municipalidade. financiamento Redução na Emissão de Dados não encontrados. CO2 Impacto central Dados não concretos. Elaboração própria. Referências Anne Hidalgo (2020). Disponível em: https://annehidalgo2020.com/thematique/ville-du-1-4h/ (acesso em julho/2021) APUR Atelier Parisien d'Urbanisme (2020). La marche et le vélo - plébiscités en période de crise sanitaire, v.182. Paris. Disponível em: https://www.apur.org/fr/nos- travaux/marche-velo-plebiscites-periode-crise-sanitaire. APUR Atelier Parisien d'Urbanisme (2021). La ville du quart d'heure – Paris et petite couronne. Disponível em: https://www.apur.org/fr/geo-data/ville-quart-heure-paris-petite- couronne. C40 Cities (2019). Statement of Anne Hidalgo, Mayor of Paris and Chair of C40 Cities. 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O Metrominuto busca destacar o caminhar como uma opção atrativa de meio de transporte e fornecer informações relevantes na tomada de decisão do pedestre, principalmente os tempos de deslocamento e os tipos de percursos (se percursos arborizados ou em zonas exclusivamente pedonais, por exemplo). Seu nome brinca com a junção das palavras “metro” – remetendo ao metrô, meio de transporte associado ao deslocamento rápido e que inspira a iconografia do mapa – e “minuto”, relacionado à medida de tempo escolhida para informar a duração dos trajetos indicados. A ideia é destacar para a população que o metrô da cidade se encontra nos seus próprios pés, já que eles proporcionam uma alternativa rápida e cômoda de percorrer a cidade. Figura 42. Metrominuto de Pontevedra Fonte: Concello de Pontevedra (2016). 141 Idealizado em 2011 através de um laboratório de ideias sobre melhorias urbanas e de mobilidade, o Metrominuto foi construído conjuntamente entre os departamentos de comunicação e mobilidade da prefeitura de Pontevedra, contando com a colaboração da polícia local. Contexto O município de Pontevedra localiza-se na região noroeste da Espanha, na província da Galícia. Dentro de seu território de 118 km² (Concello de Pontevedra, s.d.) encontra-se uma população estimada de 83.260 habitantes (Instituto Nacional de Estadística, s.d.), que se concentra principalmente nos distritos centrais da cidade, com densidades populacionais superiores a 12.000 hab/km (Concello de Pontevedra). Desde o final da década de 1990, o governo eleito pela cidade de Pontevedra (1999) realiza ações de transformação massiva do espaço público urbano seguindo uma pauta política: o espaço público é um direito a ser garantido às pessoas. Observa-se uma campanha para sua redemocratização e qualificação da cidade como um todo. Tal recuperação partiu de uma mudança radical na priorização dos usos desse espaço público, voltando-se principalmente ao pedestre, com ações mitigadoras ao tráfego e circulação de veículos motorizados pela cidade, como por exemplo, a redução de velocidade em todas as vias municipais para 30km/h. A priorização da mobilidade ativa em Pontevedra foi uma decisão política implementada de forma rápida e de baixo custo – viabilizada através da instalação de placas e sinalização, com a conversão de todos os 300.000 m² do centro histórico em vias exclusivas aos pedestres, a fim de estimular os deslocamentos a pé e de bicicleta. Após a implementação da zona pedonal central, várias foram as iniciativas que retiraram o protagonismo do veículo motorizado e o passaram ao pedestre. Foram criados 40 km de caminhos para pedestre e bicicletas nas margens dos rios urbanos, espaços públicos antes destinados ao automóvel foram recuperados para a sociedade e transformados em calçadas e outros espaços públicos, expandiu-se a restrição da circulação de veículos para além do centro histórico e a velocidade máxima dos automóveis foi reduzida a 30 km/h em todo o município (Concello de Pontevedra, 2014). Ou seja, o sistema voltou-se para atender as prioridades das pessoas e seu bem-estar e segurança, retirando o protagonismo do transporte individual motorizado. Destacam as campanhas do Metrominuto (foco dessa pesquisa), Paraminuto, e o Caminho Escolar. 142 Figura 43. Transformação das ruas de Pontevedra (à esquerda anterior às renovações de 1999, e à direita foto mais atual, 2017). Fonte: Educating Cities Internacional Documents Databank, 2016. Apesar das resistências sofridas por alguns setores da sociedade no início do processo de priorização do pedestre, os resultados alcançados têm agradado mesmo aqueles que se mostravam reticentes, como os comerciantes das zonas centrais e os partidos políticos de oposição (El Confidencial, 2018). Um dos fatores que justifica esse sucesso é o apelo da cidade à integração intermodal, estimulando a combinação de modos numa mesma viagem, com a priorização dos modos ativos no centro da cidade. Ao redor da zona central foram criados estacionamentos públicos gratuitos que funcionam como áreas de integração carro-pedestre para as pessoas que procedem de fora da cidade. Para além dos estacionamentos gratuitos, todo o centro urbano se encontra rodeado de estacionamentos subterrâneos pagos, com mais de 13 mil vagas disponíveis. E mesmo dentro da própria zona pedonal são permitidas pequenas paradas para carga e descarga dos veículos que abastecem os serviços e comércios da região, com delimitações de espaço e fiscalização presente. 143 Figura 44. Rede de estacionamentos de Pontevedra Fonte: Concello de Pontevedra, s.d.. Objetivos O objetivo principal do Metrominuto é fornecer informação clara, confiável e útil que permita ao cidadão escolher a caminhada e assim contribuir para um novo tipo de mobilidade baseada no pedestre, substituindo o uso excessivo de transportes motorizados por deslocamentos a pé. Como objetivos específicos, esse projeto também procura: • Incentivar a atividade física e diminuir o estilo de vida sedentário, através da caminhada; 144 • Reduzir a poluição do ar e sonora no ambiente urbano; • Estimular modelos urbanos mais amigáveis, projetados em escala humana; • Difundir a responsabilidade com a saúde do planeta, e dos próprios indivíduos. Através de uma comunicação visual e divulgação clara, amigável e persuasiva, o Metrominuto pretende desmistificar o tempo que usualmente se gasta caminhando entre dois pontos, para que os cidadãos se sintam confortáveis em adotar o deslocamento a pé como principal forma de locomoção na cidade. Instrumentos e implementação O Metrominuto funciona essencialmente como um meio publicitário focado no estímulo ao andar a pé. Através do mapa semelhante aos expostos no metrô, ele busca solidificar no imaginário dos cidadãos o caminhar como um dos modos de transporte disponíveis. E para além disso, reforçar a ideia de que esse é na verdade o modo mais saudável, simples e democrático de se deslocar na cidade. Ao apresentar as distâncias e tempos de caminhada entre os diversos pontos de interesse do município, o Metrominuto também procura evidenciar a rapidez do deslocamento a pé, muitas vezes desconhecida pela população em geral. Esse mapa simplificado é disposto nos mais variados espaços públicos da cidade, mas concentrado especialmente nos pontos de ônibus e nos estacionamentos para automóveis, locais com grande potencial de integração entre modos, onde os usuários podem escolher realizar parte de suas viagens a pé. Assim, pode-se compreender essa política como uma ferramenta de incentivo à utilização de modos ativos através da comunicação clara e objetiva. Com o sucesso do Metrominuto de Pontevedra, o governo municipal e a organização Red de Ciudades que Caminan desenvolveram um manual que apresenta o passo a passo para a implementação dessa iniciativa (Concello de Pontevedra, 2016). O manual apresenta uma sequência de 15 passos para a implementação de uma cartografia simplificada proposta pelo Metrominuto, e como uma cidade pode desenvolver seu próprio modelo de mapa. De forma resumida, os passos seguem a seguinte lógica: • O primeiro passo consiste na seleção dos pontos de interesse do município, tendo em conta sua popularidade, distribuição territorial e que possuam uma distância viável entre eles. Dentre estes pontos, é recomendado escolher um ponto principal que servirá como referência central do mapa, um local de fácil reconhecimento pelos usuários e que os permitam se localizar na cidade. • Em seguida, deve-se selecionar um itinerário de conexão entre os pontos que seja o mais reto, direto e seguro possível para se realizar a pé. Neste momento, é indicado 145 que seja realizado um estudo de campo para testar as condições reais dessas rotas, a fim de repensar itinerários e dispor de medidas mais precisas de distâncias e tempos. • Com os pontos de interesse elencados e seus respectivos itinerários selecionados, o passo seguinte é a construção do mapa de maneira simples e clara, procurando se inspirar nos mapas de metrô. Além dos pontos e conexões – devidamente sinalizados com rótulos, cores e informações de distância e tempo de caminhada – o mapa também deve destacar, sem excesso, os principais pontos de transferência intermodal, como terminais de ônibus, estações de metrô e estacionamentos públicos. Recomenda-se que todos os locais dispostos no mapa sejam voltados ao reconhecimento dos cidadãos residentes, não sendo necessário realçar dados arquitetônicos, por exemplo, pois ele não se trata de um mapa turístico. • Tendo o mapa finalizado, o passo final é sua difusão através dos mais variados veículos de comunicação. Indica-se a sua divulgação tanto em meio físico quanto digital, mas com especial apreço a sua fixação em diversos espaços públicos da cidade. Quanto mais difundido ele for, maior será o seu alcance, e consequentemente, maior será seu potencial de convencimento a respeito do deslocamento a pé como importante forma de transporte. Arranjo regulatório O Metrominuto foi um projeto desenvolvido pelos departamentos de comunicação e de mobilidade da Prefeitura de Pontevedra, com o apoio da polícia municipal. Para sua viabilização, não se fez necessário a criação ou alteração de instrumentos regulatórios, pois se trata, basicamente, de uma ferramenta de informação do município. Já as outras políticas de incentivo ao caminhar, que proporcionaram as alterações na configuração urbana do município e nas formas de deslocamento observadas, necessitaram de relevantes alterações normativas. A primeira delas foi a declaração do centro histórico de Pontevedra como zona de absoluta preferência do pedestre, através de uma regulação municipal de 7 de agosto de 1999 (Concello de Pontevedra, s.d.). Baseada neste regulamento, a prefeitura transformou toda a região central do município em vias destinadas exclusivamente ao deslocamento a pé, construindo 300.000 m² de calçadões. Em 2002, por meio de outra norma aprovada pelo governo municipal, foi ampliada a zona de preferência ao pedestre, expandindo o projeto de priorização do caminhar como modo de transporte (Concello de Pontevedra, 2002). 146 Já em agosto de 2010, o Concello de Pontevedra 29 alterou a lei municipal que definia a velocidade máxima de circulação dos veículos nas vias urbanas, reduzindo seu limite para 30 km/h em todo o município (Boletín oficial de Pontevedra, 2010). Recursos, atores e investimentos Com relação aos custos direcionados à criação do Metrominuto, não foram encontrados os valores despendidos pela prefeitura de Pontevedra, que é a financiadora da política. No entanto, é possível elencar alguns dos principais processos descritos como necessários para a concretização da iniciativa que certamente implicaram em investimento de recursos técnicos, tecnológicos e de sinalização/publicidade. Dentre estes processos, destacam-se: • Definição e demarcação dos pontos de interesse apresentados no mapa, por meio de sistemas de informação geográfica; • Realização da análise de campo para avaliar os itinerários escolhidos para serem representados no mapa; • Elaboração gráfica do mapa e dos outros recursos utilizados na divulgação da iniciativa, como placas, cartazes e panfletos; • Impressão e fixação dos mapas em pontos estratégicos nos espaços públicos, como estacionamentos públicos, estações de trem, pontos e terminais de ônibus, entre outros; • Desenvolvimento de aplicativo para celular que contém as informações relativas à iniciativa. Os valores investidos especificamente neste projeto não foram encontrados, mas dadas as características da estratégia não se estima que seja uma ferramenta exigente do ponto de vista orçamentário. Estratégias de comunicação Visto como uma importante estratégia de divulgação de estratégias para a mobilidade a pé, o Metrominuto pode ser enxergado por si só como uma peça publicitária. De início, ele já possui uma vinculação com uma ação positiva: o caminhar. Essa atividade, que se relaciona com a vida cotidiana de grande parte das pessoas, é facilmente associada tanto à promoção da saúde pessoal, combatendo o sedentarismo, quanto à defesa do meio ambiente, por ser um modo 29 O Concello é composto pelo prefeito, o vice-prefeito e a assembleia de conselheiros. Prefeito e vice são escolhidos pela assembleia, e os membros da assembleia são eleitos por meio do voto universal. 147 de transporte sustentável. Os dois slogans do programa vão nessa direção: “Mova -se com sua própria energia” e “A pé vives mais”. Como forma de difusão dessa mensagem, diversos posters contendo o Metrominuto foram fixados nos painéis informativos do transporte público do município. Nestes painéis, além de informações sobre as linhas de ônibus, sobre o transporte de bicicleta, táxi e aeroportos mais próximos, são destacados os percursos em que se estimula o deslocamento a pé, estimulando a escolha por este modo. Figura 45. Metrominuto exposto em ponto de ônibus de Pontevedra Fonte: Concello de Pontevedra, s.d. Resultados O Metrominuto teve impactos amplos do ponto de vista de inovação em política pública. A iniciativa recebeu reconhecimento pelo prêmio Intermodes de 2013, oferecido pela agência de mesmo nome ligada à União Europeia. Ao destacar a simplicidade e engenhosidade da ideia que Pontevedra elaborou, o Intermodes apresentou para toda a Europa uma ferramenta possível para estimular a mobilidade ativa. A partir de então, 57 cidades se inspiraram na iniciativa e criaram seus próprios Metrominutos, estando 45 localizadas na Espanha, 11 no restante da Europa e uma no México (Diário de Pontevedra, 2019). Mesmo sem dados quantitativos, é possível afirmar que o Metrominuto gerou impactos importantes na caminhabilidade como modal além de suas fronteiras. 148 Figura 46. A difusão do Metrominuto Fonte: (Diário de Pontevedra, 2019). Não foram identificados estudos específicos de avaliação de impacto do Metrominuto em relação aos modos de deslocamento, incremento de caminhabilidade, redução de uso do automóvel, na saúde pública, ou socioeconômico, como a revitalização de bairros ou incremento do comércio local. Contudo, como mencionado, o Metrominuto se beneficiou das iniciativas de desestímulo aos modos de transporte motorizados e de incentivo ao deslocamento a pé iniciadas em 1999. Fruto desse conjunto de ações políticas para democratização do espaço público, com desdobramentos profundos na mobilidade urbana municipal, se observam mudanças muito importantes nos modos de deslocamento da cidade de Pontevedra. Em 2016, 67% das viagens na cidade foram realizadas a pé e 5% de bicicleta. No período de 1994 à 2006, o tráfego de veículos motorizados no município como um todo diminuiu em 30%, com uma redução de 70% somente na região central (Concello de Pontevedra, s.d.). Metrominuto evidencia a legitimidade política e social dessa escolha pública. A alteração na composição dos deslocamentos em Pontevedra se reflete claramente na qualidade de vida de seus habitantes. Do ponto de vista ambiental, a redução do consumo de combustíveis resultou em uma queda de 70% nas emissões de CO2, equivalente a meia tonelada por habitante ao ano (Concello de Pontevedra, s.d.). Do lado da segurança viária, a cidade viu a marca de 30 óbitos relacionados a sinistros de trânsito registrados entre 1996 e 2006, cair para apenas 3 nos dez anos seguintes (El diario, 2017). E para além da queda nas ocorrências de trânsito, a sensação de maior segurança na cidade também é percebida pela 149 apropriação do espaço público pelas crianças. Atualmente, 81% das crianças entre 7 e 12 anos chegam na escola caminhando, sendo que mais da metade delas vai sozinha (Concello de Pontevedra, s.d.). Considerações finais O Metrominuto se configura como uma ferramenta para o incentivo à mobilidade a pé, que resume de forma gráfica a lógica de circulação dos pedestres de uma cidade. Sendo uma peça gráfica simplificada de uma rede de transportes para o deslocamento a pé, foi um elemento importante na confirmação de ações políticas para o desenvolvimento urbano da cidade de Pontevedra e a construção de uma cidade acessível a pé, com o desincentivo ao uso do transporte individual motorizado. A elaboração desse mapa simplificado parte de uma avaliação dos deslocamentos a pé pela cidade em estudo, e sua qualificação urbana para tal, de forma que permita uma previsibilidade para os trajetos propostos pelo mapa. A formatação gráfica do mapa do Metrominuto e sua disposição em pontos de ônibus e em locais chave da cidade, permitem que os trajetos a pé sejam vistos pela população como um dos modos de deslocamento da cidade, em igualdade ao sistema de transporte público (ônibus, metrô, etc). Os benefícios resultantes do projeto vão para além da acessibilidade e mobilidade urbana voltada ao pedestre. A cidade de Pontevedra passou por profundas transformações urbanas pautadas pela proposta política de democratização do espaço público e preocupações com os benefícios da reforma urbana à grande maioria da população da cidade, tanto em termos de mobilidade, como também de saúde, social e econômica. A transformação da cidade não foi direcionada por um plano estratégico de mobilidade ou pelos aspectos técnicos de estratégias urbanas. As ações foram definidas a partir de um projeto político de defesa do espaço público como um direito da população e seu vínculo com a saúde, o transporte, o convívio social, e demais qualificações para o desenvolvimento da vida como sociedade. A cidade tornou-se palco de ações sociais, eventos e atividades voltadas aos interesses da população local, protagonizando sua participação na discussão da recuperação desse espaço público. Pode se afirmar que as ações desenvolvidas mudaram tanto as condições de vida no município como seu destino, ao ponto de ter passado de ser um município que sofria perda de população (finais da década de 1990) a um município vibrante, receptor de oportunidades e de população em busca de melhor qualidade de vida. Desde 2001 não há registros de mortes causadas por sinistro viário, com baixíssimos casos relacionados às lesões causadas pelo trânsito, isso devido à redução do tráfego de veículos e à redução de velocidade nas áreas centrais. Além disso, a cidade conta com uma qualidade 150 de ar alta e respeitando os limites mais exigentes estabelecidos pela OMS (Concello de Pontevedra, s.d.). Tabela 20. Disposições gerais Metrominuto, Pontevedra – Espanha Item Valor Objetivo Estímulo ao deslocamento a pé Localização Pontevedra, Espanha Área de abrangência 6 km² Infraestrutura Vias pedonais Contexto da área na cidade Área urbana Público-alvo Toda população do município Modal alvo Pedestres Relevo Predominantemente plano Despesas Não encontrado Receitas Não encontrado Composição do financiamento Público, municipal Redução na Emissão de CO2 Redução em 70% nas emissões de CO2 Impacto central Aumento das viagens a pé para 67%, e para 5% as de bicicleta Elaboração própria Referências Boletín oficial de Pontevedra. (18 de 08 de 2010). Ayuntamientos. Disponível em: https://sede.pontevedra.gal/dcsv/XOPJZSTNBKH5LE6H Beltrán, F. (2019). Primeiro, a cidade – A mobilidade em Pontevedra 1999-2019. Disponível em: https://www.pontevedra.gal/2019/10/28/primeiro-a-cidade/ Concello de Pontevedra. (s.d.). 01 Campaña de peonalización do casco histórico de Pontevedra. Acesso em 01 de 10 de 2021, disponível em Sede eletrônica: https://sede.pontevedra.gal/public/publications/list/municipalregulations/BANDO/detail s/7189603 Concello de Pontevedra. (24 de 07 de 2002). 02 Bando de mobilidade. Disponível em: Sede eletrônica: https://sede.pontevedra.gal/public/publications/list/municipalregulations/BANDO/detail s/7184424 Concello de Pontevedra. (13 de 12 de 2016). Metrominuto. Disponível em: https://www.pontevedra.gal/2016/12/13/metrominuto/ 151 Concello de Pontevedra. (01 de 10 de 2021). Faz o teu proprio Metrominuto. Disponível em: https://www.pontevedra.gal/publicacions/Metrominuto/por/files/assets/basic- html/index.html#1 Concello de Pontevedra. (s.d.). Algúns resultados da transformación. Acesso em 01 de 10 de 2021, disponível em Ok: https://ok.pontevedra.gal/alguns-resultados/ Concello de Pontevedra. (s.d.). Estrategia de desarrollo urbano sostenible e integrado de Pontevedra. Acesso em 01 de 10 de 2021, disponível em https://maismodelo.pontevedra.gal/wp-content/uploads/2019/03/Estratexia-urbana- definitiva-1.pdf Concello de Pontevedra. (s.d.). Imagenes. Acesso em 01 de 10 de 2021, disponível em https://ok.pontevedra.gal/es/imagenes/ Concello de Pontevedra. (s.d.). Urbanismo e território. Acesso em 01 de 10 de 2021, disponível em https://www.pontevedra.gal/areas/urbanismo-e-territorio/ Consello de Pontevedra. (2014). Un Modelo de Ciudad Centrado en las Personas: Candidatura de Pontevedra al Premio Internacional de Dubai a las Mejores Prácticas para Mejorar las Condiciones de Vida. Pontevedra. Acesso em 01 de 10 de 2021, disponível em Ok: https://ok.pontevedra.gal/onu-habitat-2014/ Diário de Pontevedra. (23 de 10 de 2019). Al menos 57 ciudades han copiado el Metrominuto pontevedrés. Disponível em: https://www.diariodepontevedra.es/articulo/pontevedra/menos-57-ciudades-han- copiado-metrominuto-pontevedres/201910231708221057680.html Educating Cities Internacional Documents Databank. (2016). Metrominute: a map for encouraging pedestrian mobility. Acesso em 01 de 10 de 2021, disponível em http://w10.bcn.es/APPS/edubidce/pubExperienciesAc.do?idexp=39165&accio=veure &idioma=3&pubididi=3 El Confidencial. (13 de 11 de 2018). Cerrar el centro iba a colapsar Pontevedra y Vitoria... Pero ahora nadie quiere volver atrás. Disponível em: El Confidencial: https://www.elconfidencial.com/espana/2018-11-13/pontevedra-vitoria- peatonalizacion-coches_1643725/ El diario. (15 de 07 de 2017). El sueño de la ciudad (casi) sin coches en Pontevedra. Disponível em: https://www.eldiario.es/sociedad/pontevedra-ciudad-coches_1_3278387.html Instituto Nacional de Estadística. (s.d.). Cifras oficiales de plobación resultantes de la revisión del padrón municipal a 1 de enero. Acesso em 01 de 10 de 2021, disponível em https://www.ine.es/jaxiT3/Datos.htm?t=2890 152 153 Manual de Desenho de Ruas, Nova Iorque – Estados Unidos O Manual de Desenho de Ruas da Cidade de Nova Iorque (New York City Street Design Manual) destaca-se por oferecer informação completa e articulada do ponto de vista da gestão aos diversos atores interessados em prover ou realizar manutenção nas ruas, incluindo estradas, calçadas e praças. O manual é um guia para funcionários públicos, profissionais da área (arquitetos, urbanistas, engenheiros e afins), grupos comunitários e outras entidades envolvidas no planejamento e design de ruas, bem como pelo departamento de transporte de Nova Iorque, que utiliza os parâmetros do Manual para avaliar a qualidade e consistência dos projetos apresentados. A elaboração do guia foi uma iniciativa dos departamentos de transporte e de planejamento de Nova Iorque para se criar uma ferramenta útil e acessível que facilitasse o planejamento das ruas da cidade, tanto em termos projetuais como em termos legais e institucionais, socializando as regras comuns e esclarecendo os procedimentos de aprovação e viabilização de intervenções urbanas nas escalas macro e micro. Contexto A Cidade de Nova Iorque é a cidade mais populosa dos Estados Unidos, com uma população de 8.336.817 de habitantes em 2019 (United States Census, s.d.), dentro de um território de 1.212,60 km², caracterizando uma altíssima densidade demográfica. A cidade é dividida em 5 distritos: Brooklyn, Queens, Manhattan, Bronx e Staten Island. Apesar de contar com uma extensa rede de transporte público, dados do Relatório de Mobilidade (DOT, 2018) mostram que o transporte em carros é majoritário na divisão entre modos na cidade, representando 32% dos deslocamentos, seguidos por 28% a pé, 23% via metrô, 8% via ônibus, 3% em bicicletas, 3% em táxis e 3% através de outros modais. O Manual de Desenho de Ruas de Nova Iorque é realizado pela prefeitura e pelo Departamento de Transportes da Cidade de Nova Iorque (Department of Transportation - DOT, sigla em inglês) como uma ferramenta de projeto para todos aqueles envolvidos no planejamento das ruas e espaços públicos da cidade. O Manual, cuja primeira edição foi lançada em 2009 e a mais recente em 2020 (terceira edição), fornece subsídios técnicos (desenhos geométricos), legais (processos de aprovação e regularização), administrativos (manutenção e organização dos espaços) e sociais (ferramentas para processos colaborativos e inclusivos) para o desenho de ruas. 154 Objetivos O Departamento de Transportes de NYC é responsável pelo gerenciamento da manutenção, segurança e funcionamento das ruas da cidade, principalmente em relação à sua operação, com o objetivo de tornar a rede de automóveis e suas viagens mais seguras (semáforos, manutenção das vias propriamente - buracos, pontes, tráfego). Com a introdução do Manual de Desenho de Ruas em 2009, foi possível estruturar o planejamento desse sistema complexo e ainda implementar ações referentes ao seu desenho, levando em conta a qualidade da paisagem urbana e dos espaços públicos (DOT, 2020) e abrindo a possibilidade para a melhor distribuição do espaço das ruas entre outros modos de transporte, para além do automóvel. Figura 47. Divisão percentual da área de Nova Iorque por uso. Fonte: Street Design Manual (2020) Ao longo dos mais de 10 anos de implementação do Manual, sua visão foi se adaptando e juntamente aos investimentos massivos na transformação das ruas, acabaram remodelando a forma como os nova-iorquinos vivenciam a cidade. A partir de 2014, com a instauração do programa Visão Zero de segurança viária, o DOT e seus parceiros redesenharam centenas de cruzamentos e vias para reduzir sinistros e mortes relacionadas ao tráfego viário. Os objetivos do Manual de Desenho de Ruas, produzido pelo DOT, resume-se a projetar ruas: 1. Seguras; 2. Equilibradas e inclusivas; 3. Vibrantes; 4. Adaptadas ao seu contexto; 5. Sustentáveis e resilientes; 155 6. Economicamente eficientes e perenes. O Manual não estabelece um único modo como alvo, pois inclui os impactos e o planejamento de todo o sistema de espaços públicos da cidade, incluindo ruas, calçadas, canteiros e praças. Apesar disso, suas diretrizes estabelecem a prioridade dos modos ativos sobre os motorizados e dos modos coletivos frente aos individuais (Figura 48). Figura 48. Transporte eficiente de pessoas, com priorização do pedestre. Fonte: https://www.nycstreetdesign.info/about/street-design-policy. Instrumentos e implementação O planejamento e desenvolvimento do sistema viário de Nova Iorque divide-se entre o governo local e a autoridade do transporte local (DOT). O Departamento de Transportes é o principal responsável pela avaliação dos custos e eficácia das ações, além de administrar as estratégias para as iniciativas futuras no planejamento das ruas. O Manual propriamente é o principal instrumento com parâmetros de desenho, execução e manutenção dos projetos de ruas. Ele define as linhas guias para que o Departamento de planejamento e desenho urbano consiga prever e estruturar a análise dos projetos, para que a fase de aprovação seja mais alinhada e dentro do que pode ser feito e aprovado. Segundo o diretor do Departamento de Planejamento Urbano, Neil Gagliardil, o tempo de revisões após a implementação do manual reduziu pela metade, devido à clareza dos processos e dos procedimentos para aprovação30. 30 Informações extraídas de entrevista realizada pela Vital Strategies, através de vídeo-chamada em agosto de 2021 com o diretor de Planejamento Urbano Neil Gagliardil, DOT NYC. 156 O DOT geralmente implementa dois tipos de projeto, são eles: Operational Projects e Capital Projects. Eles são classificados de acordo com sua escala e grau de impacto. O primeiro trata de infraestruturas menos complexas, de fácil implementação. Já no segundo caso são necessárias obras de maior impacto, como tratamento do subsolo e drenagem, exigindo a mobilização de outros departamentos de construção e planejamento. O projeto para as ruas de NYC inicia-se com a participação popular - moradores e comerciantes locais, oferecendo subsídios para a avaliação das necessidades de cada bairro no processo de desenvolvimento do projeto. Após esse processo, as etapas de projeto e revisão são as seguintes (vide Figura 49) (DOT, 2020): • Desenvolvimento do projeto: etapa típica de projeto: desenvolvido pelo DDC - Departamento de Projeto e Construção (conceptual design, final design, agency alignment & construction); • Revisão e aprovação do projeto pelos departamentos responsáveis: DOT - Departamento de Transportes e PDC - Comissão de Projetos Públicos; • Revisão pelo LPC - Departamento de Preservação da Paisagem. As funções e responsabilidades em torno das políticas viárias de NYC são distribuídas pelos seguintes setores (DOT, 2020): • Planejamento, desenho e construção de ruas; • Revisões, Aprovações e Permissões; • Operações e Manutenção; • Implementação e Execução. 157 Figura 49. Diagrama do processo de desenvolvimento e revisão de projetos do Manual de Desenho de Ruas de Nova Iorque. Fonte: Street Design Manual (2020). 158 Figura 50. Diagrama ilustrativo das funções e papéis desempenhados pelas agências e entidades ligadas aos projetos urbanos da cidade de Nova Iorque. Fonte: Imagem retirada do Manual, indicando todos os stakeholders para o projeto das ruas de NYC. Abaixo são listados alguns dos principais departamentos envolvidos nos projetos das ruas de Nova Iorque (lista completa em: https://www.nycstreetdesign.info/process/agency-roles-citys- streets ) : • DOT - Departamento de Transportes (iniciação, escopo, projeto conceitual) 159 • DEP - Departamento de Proteção Ambiental (iniciação, escopo) • EDC - Conselho de Desenvolvimento Econômico (iniciação, escopo, projeto conceitual, projeto final e construção) • DDC - Departamento de Projeto e Construção (conceptual design, final design, agency alignment & construction) • Parks - Departamento de Parques e Recreação (parks, greenstreets) • NYSDOT - Departamento de Transportes (state highways within New York City) • DCP - Departamento de Planejamento da Cidade (zoneamento, ruas privativas, estudos de transportes); • DOB - Dep. de Edifícios; • MOPD - Dep. de Pessoas com Deficiências; • DCAS - Dep. de Serviços Administrativos; • PDC: Comissão de Projetos Públicos (New York City Public Design Commission) • LPC: Dep. de Preservação da Paisagem (New York City Landmarks Preservation Commission); • Outras agências e autoridades municipais, estaduais e federais para projetos individuais, geralmente específicos para cada localidade. O conteúdo do Manual é constantemente revisado e atualizado pelas autoridades ao longo dos anos e são realizadas reuniões participativas interdepartamentais com certa frequência. Através da Comissão de Projetos Públicos são organizadas consultas periódicas com os agentes envolvidos no processo do desenho de ruas, garantindo que o Manual seja discutido e atualizado diante de possíveis novas demandas, seja pela equipe interna ao DOT ou pelas entidades envolvidas nos projetos (agências de arquitetura, construção, população, etc). Ele é disponibilizado tanto em versão impressa, quanto online, para sua maior acessibilidade. Vale ressaltar que a versão online foi considerada pelo DOT um grande avanço, pois esse instrumento permite ser atualizado com maior facilidade, além de permitir um acesso mais abrangente comparado à versão impressa. De acordo com publicação do próprio Manual, em sua versão online, a terceira edição do Street Design Manual renova o status do guia como um documento vivo e reforça seu papel como um recurso crítico para a manutenção dos direitos públicos nos projetos para a cidade de Nova York (DOT, 2020). Ele fornece uma atualização completa às versões anteriores e uma série de complementos importantes: um novo capítulo sobre o programa de desenho de ruas e espaços públicos; novos adendos aos capítulos de Processo, Geometria, Mobiliário e Paisagem, estendendo seu conteúdo a diversos tópicos essenciais como ciclovias, design inclusivo e seleção e gerenciamento de paisagem. 160 Arranjo regulatório O Manual tem apoio de diversas instâncias envolvidas na administração pública da cidade. Todas as etapas projetuais são avaliadas e revisadas pelas competências de cada departamento. Sua regulação e operação é estabelecida pelo DOT – vide Figura 10.3. À Comissão de Projetos Públicos (Public Design Commission31), cabe revisão e votação dos projetos apresentados pelos órgãos municipais, sob as premissas e parâmetros do Manual de Desenho de Ruas. Criada em 2008, quando a primeira edição do Manual estava em elaboração, essa comissão é responsável por avaliar os projetos considerando parâmetros de design, contexto histórico da área afetada, consistência do projeto (em termos de materiais usados e durabilidade), bem como seu impacto e atendimento ao público. São 11 servidores públicos responsáveis pela aprovação e revisão desses projetos (paisagistas, arquitetos, artistas, membros da sociedade civil, representante dos Museus de Nova Iorque e a Prefeitura), e pautados por suas diretrizes de avaliação, a Comissão tem a intenção de fornecer orientações para que o processo de revisão seja mais agilizado para os candidatos e seus respectivos projetos (NYC Design, s/d). Em 2013, a manutenção do Manual foi incluída no código administrativo da cidade de Nova Iorque: Lei de número 2013/127 - A Local Law to amend the administrative code of the city of New York, in relation to a street design manual and to repeal subdivision d of section 19-180 of the administrative code of the city of New York as added by local law number 23 of 2008 (The New York City Council, 2013). Essa lei exige que o Manual de Desenho Urbano seja revisado periodicamente, a cada 4 anos, garantindo dessa forma sua manutenção e continuidade ao longo dos anos. Recursos, atores e investimentos O Manual é um programa bastante abrangente e envolve diretrizes, projetos e intervenções em diversas escalas em todo o território da cidade de Nova Iorque. Para cada projeto existe uma especificidade de atores envolvidos e de fontes de financiamento. Como todos os projetos passam pelo Departamento de Transportes (DOT), seus recursos são distribuídos segundo sua avaliação e critérios. Geralmente a fonte de investimentos é provida pelo fundo da cidade 31 Como agência de revisão de design da cidade de Nova York, a Public Design Commission (PDC) tem jurisdição sobre estruturas permanentes, arquitetura paisagística e arte proposta em ou sobre propriedades de propriedade da cidade. A missão do PDC é defender um design inovador, sustentável e equitativo de espaços públicos e estruturas cívicas, com o objetivo de melhorar o domínio público e, portanto, os serviços relacionados para todos os nova-iorquinos nos cinco distritos. Fonte: https://www1.nyc.gov/site/designcommission/index.page 161 de NYC, contando também com o apoio dos recursos estaduais e federais, em alguns casos, recursos privados. Estratégias de comunicação As estratégias de divulgação do Street Design Manual estão diretamente relacionadas às publicações internas feitas pelo DOT e parceiros da Cidade de Nova Iorque, tais como o Center for Architecture e o American Institute of Architects New York (AIANY). Figura 51. Publicação no site do AIA New York - Instituto de arquitetos de Nova Iorque, sobre o lançamento da terceira edição do Manual. Fonte: AYA New York, 2020. Antes da versão online, o manual físico era distribuído para atores chaves do planejamento urbano, tais como escritórios de arquitetura, empresas de construção, departamentos dos distritos, etc. O manual em si configura-se como forma de engajar outros departamentos internos ao DOT e à administração pública, sendo peça essencial para a divulgação das práticas de planejamento e gestão da cidade. Resultados Os resultados e impactos obtidos pela implementação do Manual são apresentados em seu próprio conteúdo, dos quais pode-se destacar: • Criação de mais de 200 km de novas ciclovias exclusivas; • Incentivo à expansão do sistema de bicicletas compartilhadas (Citi Bike); • Aumento das vias exclusivas para ônibus (aumentando a velocidade no transporte por esse modal); • Priorização da caminhada, tornando-a um dos principais modos de deslocamento dos nova-iorquinos; • Transição para 100% de iluminação pública por LED; 162 • Aumento de 20% da cobertura vegetal da cidade (entre 2007-2015); • Implementação do Vision Zero (plano que pretende zerar o número de mortes e sinistros devido ao tráfego de veículos): desde sua implementação o número de mortes decresceu, como mostra o gráfico abaixo. Em números, de 382 mortes em 2000 para 202 mortes em 2018. Figura 52. Mortes no trânsito por 100 mil habitantes em NYC, 2010 a 2018. Fonte: Bloomberg CityLab, 2019. Estão presentes no Manual alguns projetos desenvolvidos a partir do seu conteúdo e diretrizes, que vão desde projetos de pequena escala – como mobiliário urbano, à projetos de infraestrutura e redesenho de vias – como projeto de praças, calçadas, travessias e iluminação pública. 163 Figura 53. Grand Course (Capital Project) - projeto de infraestrutura de calçadas, com o redesenho da travessia de pedestres. Fonte: Street Design Manual (2020) Figura 54. Diversity Plaza (Capital Project) - projeto de redesenho de rua, com a criação de um eixo de praça e áreas caminháveis de lazer e comércio. Fonte: Street Design Manual (2020) 164 Figura 55. Fifth avenue Street Seat (Operational Project) - projeto de mobiliário urbano de pequena escala. Fonte: Street Design Manual (2020) Considerações finais O Manual de Desenho de Ruas de Nova Iorque é uma referência para políticas de planejamento urbano e transportes. Sua configuração como guia – seja na versão impressa ou online – é uma importante ferramenta prática para a melhoria dos projetos das ruas – reunindo parâmetros técnicos e de gestão do espaço público. A partir da sua elaboração, desde 2009, houve mudanças significativas no processo de elaboração e aprovação de projetos e obras viárias em Nova Iorque, por meio do estabelecimento de parâmetros de desenho e procedimentos pelo próprio Manual, bem como da criação da Comissão de Projetos Públicos. A existência do Manual, firmada e estabelecida através de marcos legais, garante a sua manutenção e atualização constante. Como resultado, os projetos e obras viárias da cidade de Nova Iorque passaram a ter uma maior qualidade e o processo de aprovação de projetos tornou-se mais eficiente. 165 Tabela 21. Disposições gerais Manual de Desenho de Ruas, Nova Iorque – Estados Unidos Item Valor Objetivo Melhorar a qualidade e segurança das ruas, incluindo calçadas, vias e praças. Localização Cidade de Nova Iorque Área de abrangência 1 212,60 km² Infraestrutura Calçadas, ciclovias, viário, praças. Contexto da área na cidade Totalidade da cidade. Público alvo Prioriza a segurança no trânsito de pedestres, ciclistas, motoristas e passageiros. Modal alvo Todos Relevo Relevo variado, com áreas predominantemente planas nas zonas costeiras, e variações ao longo do território. Despesas Não foram encontrados dados específicos. Receitas Não foram encontrados dados específicos. Composição do Geralmente fundos provenientes da municipalidade (City financiamento Capital Budget) e de concessões estaduais, federais, e capital privado. Redução na Emissão de Sem dados específicos. CO2 Impacto central Redução do número de lesões e mortes no trânsito. Elaboração própria Referência AIA New York (2020). Street Design Manual 360°: The Next Edition for Designing NYC Streets. Disponível em: https://calendar.aiany.org/2020/12/17/street-design-manual-360-the- next-edition-for-designing-nyc-streets/ Bloomberg CityLab (2019). What Happens When a City Tries to End Traffic Deaths. Disponível em: https://www.bloomberg.com/news/articles/2019-11-21/vision-zero-are-cities- reducing-traffic-deaths New York City Department of Transportation DOT (2020). Street Design Manual Third Ed. Disponível em: https://www.nycstreetdesign.info/about/street-design-policy New York City Department of Transportation DOT (2018). NYC Mobility Report. Disponível em: https://www.nyc.gov/html/dot/downloads/pdf/mobility-report-2018-print.pdf (Consultado em 29/07/21) 166 NYC Design (s/d). Disponível em: https://www1.nyc.gov/site/designcommission/about/about.page (acesso em setembro de 2021). The New York City Council (2013). A street design manual and to repeal subdivision d of section 19-180 of the administrative code of the city of New York as added by local law number 23 of 2008. Disponível em: https://legistar.council.nyc.gov/LegislationDetail.aspx?ID=1458678&GUID=2041EBB4- 9E96-400D-A0DF- EFBA3462F247&Options=ID%7CText%7C&Search=street+design+manual United States Census (s/d). QuickFacts New York city, New York. Fonte: https://www.census.gov/quickfacts/newyorkcitynewyork (Consultado em 29/07/21) 167 168 Áreas de Velocidade Reduzida, São Paulo – Brasil As áreas de velocidade reduzidas são perímetros definidos na cidade de São Paulo onde o tráfego é acalmado por meio do controle de velocidade junto com mudanças no desenho urbano e na cultura do uso do espaço. Esse instrumento tem como objetivo principal aumentar a segurança viária, reduzindo as lesões e mortes no trânsito - principalmente de pedestres. A definição desses perímetros se dá pelo alto volume de pessoas circulando a pé, alta concentração de lesões e mortes no trânsito e por se caracterizarem como centralidades comerciais, com infraestruturas de transporte de alta capacidade. Com o tráfego acalmado, essas áreas aproximam-se dos princípios de ruas mais saudáveis, devido à maior segurança no trânsito e à criação de condições mais favoráveis e atrativas a quem se desloca por meios ativos e coletivos. Contexto As áreas de velocidade reduzida, também chamadas de Áreas Calmas ou Áreas 40, são perímetros onde a velocidade máxima permitida é até 40 km/h ou 30 km/h. Essas áreas começaram a ser implementadas em São Paulo em 2013, como parte do Programa de Proteção à Vida da Secretaria de Transportes e da Companhia de Engenharia de Tráfego de São Paulo (CETSP). A implantação de áreas de velocidade reduzida é uma estratégia que se insere em um plano mais amplo de gestão das velocidades nas vias paulistanas. As primeiras iniciativas de redução e padronização das velocidades ocorreram na gestão 2009-2012, quando as vias arteriais (avenidas) passaram de 70 km/h para 60 km/h. Na gestão 2013-2016, essas vias passaram de 60 km/h para 50 km/h. O caso da Av. Paulista é paradigmático e revela a atuação faseada da CETSP: a primeira redução ocorreu em 2011 e a segunda redução ocorreu em setembro de 2013 (G1, 2013). A padronização das velocidades continua sendo implementada, seguindo as diretrizes do Plano de Segurança Viária e de acordo com a hierarquia viária (revisada em 2019). Atualmente, as ações estão focadas na redução das velocidades em vias coletoras que passam a adotar 40 km/h (Prefeitura da capital, 2021). A cidade de São Paulo contém 13 áreas de velocidade reduzida, sendo 12 delas com limite de 40 km/h (Rótula Central, Ampliação do perímetro da Rótula Central, Lapa, Santana, Penha, Moema 1, Lapa 2, Brás, Moema 2, Consolação, São Miguel, Bela Vista - elencadas por ordem de implantação) e 1 delas com limite de 30 km/h (Lapa de Baixo) (Figura 56) (CETSP, s.d.). 169 Essas áreas foram selecionadas devido ao alto volume de pedestres e à alta concentração de atropelamentos e outros tipos de sinistros de trânsito 32 . Logo, “velocidades menores são necessárias para promover condições seguras e confortáveis de circulação a tais usuários, que ainda representam um número alarmante de vítimas no trânsito em São Paulo” (CETSP, 2016). A definição das áreas partiu da análise geoespacial dos atropelamentos da cidade e da sobreposição entre a concentração dessas lesões e mortes com regiões que se caracterizassem como centralidades, reunindo volume significativo de pedestres em função do uso do solo, da oferta de transportes e serviços (CETSP, 2016). Figura 56. Delimitação das Áreas 40 Fonte: CETSP, 2016. Objetivos As áreas de velocidade reduzida têm como principal objetivo reduzir as lesões e mortes no trânsito de pedestres. Como consequência da redução das velocidades, a segurança viária aumenta para os demais usuários da via (ciclistas, motociclistas, motoristas e passageiros). Além disso, a mobilidade a pé é estimulada, pois a caminhada se torna mais segura e confortável. Os meios para atingir esses objetivos são alcançados por meio da melhoria da sinalização (fase 1), da requalificação do ambiente construído, como melhoria de calçada, implantação de ilhas de refúgio e diminuição dos raios das esquinas (fase 2) e, por fim, a redução da velocidade máxima para 30 km/h (fase 3). 32 De acordo com a NBR 10697/2020, a expressão “sinistro de trânsito” foi substituída por “sinistro de trânsito”. 170 A medida visa beneficiar pedestres e demais usuários da via ao estabelecer limites de velocidades reduzidos para motoristas e motociclistas. As medidas de moderação de tráfego complementarmente também podem agir, mesmo que de forma mais pontual, como desincentivo ao uso do automóvel. Sem alvo específico do ponto de vista social. No entanto, a medida beneficia principalmente pessoas de renda mais baixa, que são as que mais se deslocam a pé (Metro, 2018). Instrumento e implementação As áreas de velocidade reduzida visam incrementar a segurança viária por meio de mudanças de comportamento dos usuários da via. Sua implementação exige sinalização, no caso vertical e horizontal. Além disso, cada área contém ao menos um equipamento de fiscalização de tráfego (radar). O processo de implantação das áreas de velocidade reduzida é constituído de três fases, de acordo com o planejamento da CETSP (Figura 57). Na fase 1, são criadas as áreas 40. Na fase 2 são realizados estudos técnicos detalhados de redesenho urbano e realização de obras. Na fase 3, novamente é requerida sinalização específica. A inobservância da velocidade implica em infração. As multas aplicadas dentro dos perímetros das áreas de velocidade reduzida têm os recursos destinados ao Fundo Municipal de Desenvolvimento de Trânsito (FMDT) sem destinação específica para alimentar o próprio programa de Áreas de velocidade reduzida (SMT, s.d.). Figura 57. Evolução das áreas de velocidade reduzidas Fonte: CETSP, 2016. A implementação apresenta resultados muito diversos. Na primeira fase, realizada entre 2013 e 2016, foram implantadas 13 áreas de velocidade reduzida por meio da alteração da 171 sinalização vertical e da implementação de um equipamento de fiscalização por área (Figura 58). Figura 58. Conjunto de sinalização horizontal e vertical que marca as entradas da Área 40 Fonte: CETSP, 2016. Após a criação das áreas, o passo seguinte é a intervenção no ambiente construído por meio da implantação de medidas de moderação de tráfego com obras, constituindo a fase 2. Até hoje, apenas as áreas de velocidade reduzida da Lapa e de Santana passaram por essa transformação em 2020/2021 (Figura 59). Figura 59. Antes e depois das intervenções com obras na área de velocidade reduzida de Santana - Rua Cruzeiro do Sul x Rua Olavo de Egídio Fonte: SMT, 2021. Crédito: CETSP, 2021. As áreas de velocidade reduzidas foram idealizadas, planejadas e implementadas (fase 1) exclusivamente pela CETSP, que possui atribuições de realizar intervenções de operação e sinalização viárias. Já a implantação da fase 2, que se refere à execução de obras de 172 moderação de tráfego, foi realizada em parceria com as subprefeituras. No entanto, apenas 2 de 13 áreas evoluíram para essa etapa (Santana e Lapa). A área de São Miguel Paulista possui um projeto finalizado desde 2017, mas a sua implementação tem enfrentado desafios (ou seja, não foi implantada a fase 2). O projeto é mais complexo do que os demais ao mesmo tempo em que as intervenções são pontuais, o que faz com que os custos de elaboração do projeto e de gestão da obra sejam proporcionalmente mais caros. Esse é um desafio que se aplica a esse tipo de intervenção, que é mais complexa do que uma alteração de sinalização, mas não tem o ganho de escala de uma obra como a de corredor de ônibus, por exemplo. A terceira fase, que ainda não foi iniciada, será a redução da velocidade máxima das áreas de velocidade reduzida para 30 km/h. Essa medida deverá ser adotada após a conclusão das obras em cada uma das áreas. Ou seja, Lapa e Santana já estão aptas a evoluírem para a fase 3 de acordo com o planejamento da CETSP. Arranjo regulatório A redução da velocidade em áreas específicas da cidade está prevista como diretriz do sistema viário, constituindo-se como ação estratégica da política de mobilidade municipal 33. Os passos para a criação das áreas de velocidade reduzida foram os seguintes: 1. Fase 1: a. Definição do perímetro da área de velocidade reduzida pela Gerência de Segurança no Trânsito da CETSP; b. Elaboração do projeto de sinalização vertical e horizontal pela CETSP e criação do número do projeto para controle interno (NUMENC); c. Implantação do projeto de sinalização viária pela CETSP. 2. Fase 2: a. Elaboração do projeto de redesenho urbano pela CETSP ou outro órgão da Prefeitura; b. Contratação das obras de redesenho pela Secretaria de Mobilidade e Transportes, ou pela SPObras. 3. Fase 3: a. Elaboração do projeto de sinalização vertical e horizontal pela CETSP; b. Implantação do projeto de sinalização viária pela CETSP. 33 De acordo com o estabelecido pelos artigos 27, XXIX; art. 228, art. 233, inciso X; art. 241, inciso IX do plano diretor (Lei municipal Nº 16.050/14); pelo plano de mobilidade (Decreto Municipal Nº 54.834/16), pelo Estatuto do Pedestre (Lei municipal Nº 16.673/17; Decreto Municipal Nº 59.670/20) e do plano de segurança viária (Decreto Municipal Nº 58.717/19). 173 Do ponto de vista institucional, uma medida central foi as alterações das competências da Secretaria de Mobilidade e Transportes e das Subprefeituras em 2019 no que se refere à execução de obras e serviços de engenharia, incluindo a possibilidade de elaboração de projetos e execução de licitações, antes restrita à Secretaria Municipal de Serviços e Obras (Decreto Municipal Nº 58.903/19; Decreto Municipal Nº 60.448/21). Recursos, atores e investimentos As fontes de financiamento para a implementação e manutenção das áreas de velocidade reduzida são o Fundo de Desenvolvimento Urbano (Fundurb) e o FMDT. O Fundurb destinou recursos para a implementação de obras nas áreas de velocidade reduzidas em 2020. Além disso, há R$9.628.945,00 reservados no Fundurb para a execução do projeto e das obras para implementar as medidas de moderação de tráfego em São Miguel Paulista (SMIT, 2021b). O Fundurb foi criado pelo plano diretor de São Paulo (Lei municipal Nº 16.050/14) e alimentado de recursos provenientes da arrecadação da Outorga Onerosa do Direito de Construir (OODC). Um 30% dos recursos eram destinados à implantação de sistemas de transporte coletivo, cicloviário e de circulação de pedestres. A regra, infelizmente, foi alterada em 2019 com o objetivo de incluir como critério de prioridade na destinação dos 30 % dos recursos a implantação e realização de melhorias nas vias estruturais (Lei municipal Nº 17.217/19). A mudança inverte a lógica original do plano diretor e autoriza a utilização dos recursos do Fundurb para tapar buracos, asfaltar e duplicar as vias utilizadas pelos automóveis. Os recursos do FMDT, arrecadados com multas de trânsito, são destinados para custeio e investimento da pasta de Transporte. As despesas relacionadas com as áreas de velocidade reduzida estão relacionadas a: Manutenção e Operação da Sinalização do Sistema Viário, Manutenção e Operação Semafórica, Manutenção e Operação do Controle e Fiscalização de Tráfego, Serviços de Engenharia de Tráfego, dentre outros. Estratégias de comunicação No processo de implantação da primeira fase de áreas de velocidades reduzidas, a Prefeitura de São Paulo não realizou processo participativo. A comunicação da alteração das velocidades 174 nas vias ocorreu por meio da publicação de matérias na imprensa34 e de nota no site da Prefeitura35 . Já no processo de desenvolvimento do projeto da segunda fase, que consiste no redesenho do ambiente construído por meio da implementação de medidas de moderação de tráfego, as estratégias de participação da Prefeitura contaram com o apoio de organizações como NACTO-GDCI, Vital Strategies, WRI e ITDP, no âmbito da Iniciativa Bloomberg para Segurança Global no Trânsito36. As atividades de engajamento da comunidade, que ocorreram em São Miguel e em Santana, foram realizadas por meio de oficinas participativas com diversos atores locais (moradores, comerciantes, taxistas, sociedade civil organizada, vereadores, etc.). Em São Miguel, foram realizadas atividades com os estudantes da escola pública da região e apresentações na Subprefeitura e na Associação Comercial. Em Santana, foi realizada uma apresentação à Associação Comercial e uma oficina participativa na Subprefeitura, que contou com a presença de diversos atores. O processo participativo nos dois locais culminou em intervenções de urbanismo tático de um dia de duração. Nesse período, foram feitas entrevistas de satisfação e contagens 37 . Os resultados das pesquisas (entrevistas de satisfação/percepção, contagens e medição de velocidade) realizadas antes e durante as intervenções temporárias estão resumidas nas Figuras 60, 61, 62 e 63. 34 Veja R7. https://noticias.r7.com/transito/area-40-e-implantada-nesta-segunda-feira-no-bras-em-sao- paulo-23022015 e Folha de S. Paulo. https://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/12/1560764-cet- vai-reduzir-em-mais-ruas-do-centro-a-velocidade-maxima-permitida.shtml. Acesso em :17 de agosto de 2021. 35 Prefeitura de Sâo Paulo. https://www.capital.sp.gov.br/noticia/cet-implanta-area-40-em-vias-de-sao- miguel. Acesso em 17 de agosto de 2021. 36 https://www.capital.sp.gov.br/noticia/parceria-com-a-iniciativa-bloomberg-e-renovada-por-mais-seis- anos 37 Informação referente às atividades pode ser consultada em: 1. https://www.archdaily.com.br/br/800701/sao-miguel-mais-humana-rua-para-todos-intervencao-urbana- temporaria-na-area-40-de-sao-miguel-paulista; 2. https://itdpbrasil.org/sao-miguel-paulista/; 3. https://itdpbrasil.org/santana2/; 4. https://itdpbrasil.org/relatorio-intervencao-temporaria-santana/; 5. https://itdpbrasil.org/intervencao-urbana-temporaria-em-santana-sera-apresentada-na-bienal-de- arquitetura/; 6. https://comoanda.org.br/wp-content/uploads/2020/08/comoanda-publicacao_andar-a- pe-eu-vou.pdf (páginas 104 a 119) 175 Figura 60. Resultados da intervenção temporária em São Miguel, realizada em novembro de 2016, na Praça Getúlio Vargas. Fonte: BIGRS, 2017. 176 Figura 61. Resultados da intervenção temporária em Santana, realizada em setembro de 2017, no cruzamento da Rua Dr. César com a Rua Salete. Fonte: ITDP, 2020. 177 Figura 62. Resultados da intervenção temporária em Santana, realizada em setembro de 2017, no cruzamento da Rua Dr. César com a Rua Voluntários da Pátria Fonte: ITDP, 2020. 178 Figura 63. Fotos antes e durante a intervenção temporária em São Miguel, realizada em novembro de 2016, na Praça Getúlio Vargas. Fonte: BIGRS, 2017. Resultados As 13 áreas de velocidade reduzida atingiram resultados de redução de mortes e lesões no trânsito, após a redução da velocidade máxima, transformação da sinalização viária e alocação de equipamento de fiscalização - transformações que constituem a fase 1 do planejamento da CETSP. É possível averiguar o aumento da segurança viária a partir de dados do Sistema de Sinistros de Trânsito (SAT) da CETSP, disponibilizados nas plataformas Geosampa e Vida Segura. Apesar disso, identificou-se apenas um estudo específico sobre a redução de lesões e mortes no trânsito nas áreas de velocidade reduzida - apresentado a seguir. Três anos após a implantação das primeiras áreas de velocidade reduzida, a CETSP analisou a variação (comparação dos 12 meses antes da intervenção com os 12 meses após a implantação em cada área) de atropelamentos e sinistros com vítimas nos veículos. Verificou- se redução do número total de mortes por atropelamento e de sinistros com vítimas nos veículos (CETSP, 2016). Essa análise foi realizada nas áreas Centro 1 e Lapa 1 (Tabelas 22 e 23). Como mencionado, apenas duas (Lapa e Santana) evoluíram para a fase 2 (obras de moderação de tráfego). É justamente nessa fase, com a transformação do ambiente construído, que as Áreas de Velocidade Reduzida se tornam mais confortáveis e ainda mais seguras para os pedestres. Em ambas as áreas, foram realizadas pesquisas de linha de base. Em Santana, foram realizadas entrevistas com pedestres, condutores e comerciantes (ITDP, 2020) - os resultados são apresentados mais adiante, nesta seção. 179 Tabela 22. Resultados da área de velocidade reduzida Centro 1, inaugurado em 21/10/2013 Tipo de 1 ano antes 1 ano depois Variação sinistro (21/10/12 a 20/10/2013) (21/10/13 a 20/10/2014) (12 meses) Nº de Nº de Nº de Nº de Nº de Nº de Nº de Nº de Nº de acidente feridos mortos acidente feridos mortos acidente feridos mortos s s s Atropelamento 72 75 6 79 85 2 7 10 -4 c/ vítima no 152 171 1 104 119 1 -48 -52 0 veículo Total 224 246 7 183 204 3 -41 -42 -4 Fonte: (CETSP, 2016). Tabela 23. Resultados da área de velocidade reduzida Lapa 1, inaugurado em 01/09/2014 Tipo de sinistro 1 ano antes 1 ano depois Variação (01/09/13 a 31/08/2014) (01/09/14 a 31/08/2015) (12 meses) Nº de Nº de Nº de Nº de Nº de Nº de Nº de Nº de Nº de acident feridos mortos acidente feridos mortos acidente feridos mortos es s s Atropelamento 23 26 0 11 15 0 -12 -11 0 c/ vítima no 30 41 0 20 23 0 -10 -18 0 veículo Total 53 67 0 31 38 0 -22 -29 0 Fonte: (CETSP, 2016). Na Lapa, foram coletados dados por meio de questionários com perguntas de percepção aplicados a moradores, pedestres e comerciantes (survey), além de contagens de veículos e pedestres (ITDP, 2019). A mesma metodologia também foi aplicada em São Miguel. Os resultados da pesquisa de linha de base estão compilados no relatório Projeto de Requalificação Urbana e Segurança Viária de São Miguel Paulista - Histórico de atividades e linha de base da avaliação de impacto da iniciativa, elaborado pelo ITDP (2019). Essa pesquisa visava compreender quais seriam os possíveis impactos dessas intervenções de redesenho urbano e segurança viária em uma das áreas de velocidade reduzida, de acordo com a metodologia diferenças em diferenças, nas seguintes dimensões: (i) redução no número de lesões e mortes no de trânsito local; (ii) mudança no padrão de deslocamento das pessoas e cargas dentro do bairro; (iii) melhoria na percepção de qualidade de vida por moradores e usuários do local em virtude da melhora das condições de tráfego e no uso de espaços públicos e, (iv) aumento das atividades de comércio, tais como restaurantes e varejo em geral. Em Santana, houve coleta de dados após a conclusão das intervenções de redesenho (fase 2). A pesquisa, realizada pela CETSP em 2018, foi publicada no relatório do ITDP (2020). Os principais resultados foram: 180 • 76% dos pedestres e 70% dos condutores notaram uma melhora após a intervenção. • 13,4% dos condutores e 3,8% dos pedestres acharam que o local piorou • Dentre os condutores, 39,5% acreditam que o tráfego melhorou e 14% que melhorou parcialmente. 23% acreditam que a intervenção piorou a situação do tráfego naquele local. • 89% dos pedestres e 72,5% dos condutores dizem que o projeto tornou o local mais seguro para eles. • 92,5% dos pedestres e 84% dos condutores concordam com a replicação do projeto em outros locais da cidade. Também foram realizadas contagens e observações sobre o comportamento dos pedestres e condutores. Com o novo desenho, a circulação dos veículos se tornou mais lenta e ordenada, mas o volume de veículos não sofreu alteração - as contagens realizadas mostram que a nova configuração viária não alterou o fluxo de veículos na interseção. Aumentou a quantidade de condutores dando preferência aos pedestres na travessia e diminuiu o número de pessoas correndo ao atravessar. Quadro 4. Entraves da implementação de Áreas de Velocidade Reduzida em São Paulo Entraves da implementação de Áreas de Velocidade Reduzida em São Paulo O programa de Áreas de Velocidades Reduzidas começou sua implementação em 2013 seguindo o movimento de governança da velocidade iniciado anteriormente. Dividido em três fases, apresenta o estado de implementação apresentado na figura 11.9. A implantação da fase 1 (2013-2016) ocorreu de forma ágil, enquanto a fase 2 apresenta baixa execução, e a fase 3 não tem sido implementada. Esses resultados ilustram importantes aspectos a serem considerados para ações futuras em prol da segurança viária e a mobilidade ativa e coletiva. A fase 1 implicou em decisões de redução de velocidade, fiscalização e imposição de multas e mudanças no comportamento; um conjunto de medidas nas quais é comum observar importante oposição inicial e política e, consequentemente, dificuldades de implementação e replicabilidade. Contudo, sob o comando da CETSP foi estabelecido um percurso técnico e administrativo que levou à implantação sequencial de 13 “áreas 40” na cidade de São Paulo. Essa fase foi exitosa mesmo sem um plano de comunicação estratégica forte. As pesquisas subsequentes mostraram não só a importância e efetividade das medidas para a melhoria da segurança viária, como o apoio social à replica dessa estratégia. 181 Figura 64. Evolução da implementação de áreas de velocidade reduzida em São Paulo 2. Ampliação Rótula Central 13. Lapa de Baixo* 1. Rótula Central Fase / Área 10. Consolação 11. São Miguel 12. Bela Vista 6. Moema 1 9. Moema 2 4. Santana 7. Lapa 2 5. Penha 3. Lapa 8. Brás Fase 1. Criação Área 40 (2013-2016) Fase 2. Consolidação urbana (2020- 2021) Fase 3. Avanço Área 30 Elaboração própria. Implantada Aptas, sem implantação * Fase 1 com velocidade 30 km/h Já a fase 2 apresenta o panorama oposto. A consolidação urbana, atingida por meio de mudanças urbanas, vem enfrentando importantes obstáculos. Entre 2016 e 2019 não foram completados processos de implantação dessa fase. Em 2020/2021 foram realizadas mudanças em apenas duas áreas. Em suma, a fase 2 apresenta uma performance muito inferior à fase 1, com gargalos tanto na elaboração do projeto quanto na contratação da obra pública vinculados a diversas questões. Institucionalmente, o espaço público viário encontra-se fragmentando entre diversos atores públicos e privados. Os projetos de melhoria urbana das áreas de velocidade reduzida implicam ações de manutenção, implantação e projeto que terminam por envolver um grande conjunto de atores (Figura 65). A fragmentação institucional na governança do espaço público já foi abordada pelo Grupo de Trabalho do Manual de Desenho Urbano e Obras Viárias (GT-MOV), instancia que propôs um conjunto de procedimentos coordenados entre órgãos públicos e concessionarias no espaço público dentro de um sistema único de aprovação de intervenções urbanas. O Manual de Desenho Urbano e Obras Viárias contempla a proposta completa. Não obstante a relevância da inciativa e seus potenciais efeitos positivos no espaço público da cidade, a minuta de decreto encontra-se suspensa desde 2018. 182 Figura 65. Compartilhamento de responsabilidades sobre o viário Fonte: SP Urbanismo, 2016. Vinculado ao anterior é o desencaixe entre as necessidades de melhoria do espaço público para moderar o tráfego e as restrições e limitações de intervenção no espaço público das entidades responsáveis pelo cuidado de determinados componentes do espaço público. Às Subprefeituras é permitida a contratação de obras de zeladoria -entendida como manutenção em sentido restrito- por meio de execução de serviços previstos em ata de registro de preço. Contudo, obras como o alargamento da calçada, ilha de refúgio, e a travessia elevada, corriqueiras e fundamentais para garantir infraestruturas seguras para os pedestres, são consideradas como melhorias e não como zeladoria. Nesse entendimento, mesmo que as obras sejam simples e de baixa escala, não podem ser contratadas pelas Subprefeituras pelo sistema de Ata, o que implica que devem ser contratadas seguindo o caminho das grandes obras. Finalmente, as ações requeridas para a moderação do tráfego são pequenas demais para serem submetidas a um processo licitatório. Sem escala -nem se fossem licitadas de forma conjunta- para tal, e sem espaço dentro da execução descentralizada de obras de pequeno porte a sua contratação se torna bastante problemática. As dificuldades apresentadas na fase 2 do programa de áreas de velocidade reduzida ilustra os diversos problemas enfrentados na mudança da política pública em direção a uma mobilidade saudável e segura. O caso reflete a fragmentação e, de alguma maneira, a invisibilizarão dos componentes da mobilidade que não se destinam especificamente aos modos motorizados individuais. Essa fragmentação inclui tanto o espaço físico -a rua- quanto sua governança institucional, procedimental, financeira e de intervenção. 183 Se a fase 1 foi exitosa devido à implementação integral por apenas uma entidade (a CETSP), a fase 2 tem sido frustrada pela fragmentação e ausência de mecanismos de coordenação com um objeto comum: a provisão do espaço público “caminhável” e seguro como um bem público. A Secretaria de Mobilidade e Transporte, responsável pelo projeto das Áreas de Velocidade Reduzida junto à CETSP, passou a incorporar em suas competências a execução de obras e serviços de engenharia, incluindo a possibilidade de elaboração de projetos e execução de licitações (Decreto Municipal Nº 58.903/19; Decreto Municipal Nº 60.448/21). A superação de tais obstáculos se vislumbra pela integração de competências. Considerações finais A implantação das áreas de velocidade reduzida faz parte de um planejamento mais amplo da CETSP de reduzir a velocidade máxima nas vias e, assim, reduzir as lesões e mortes no trânsito - de acordo com a meta do Plano de Segurança Viária que visa atingir menos de 3 mortes no trânsito por cem mil habitantes até 202838. Nesse sentido, as áreas de velocidade reduzida foram bem-sucedidas ao aumentar a segurança viária. Apesar disso, o incremento dessa segurança só se consolidará com a execução das fases 2 (transformação do ambiente construído) e 3 (redução do limite para 30 km/h). É na fase 2 que há redistribuição do espaço viário para modos ativos e coletivos. Logo, é apenas com a conclusão da fase 2 que espera- se observar a diminuição de automóveis e o aumento de pedestres transitando pela área de velocidade reduzida. Ou seja, ainda não é possível observar mudanças estruturais do ponto de vista de mobilidade - apenas do ponto de vista da segurança viária. Portanto, é fundamental que a Prefeitura de São Paulo avance na implantação da política completa. Observa-se que a implantação da fase 1 (2013-2015), ocorreu em um curto período de tempo, enquanto que a fase 2 ainda não foi concluída. Isso é reflexo das dificuldades que a Prefeitura de São Paulo e a CETSP vêm enfrentando para desenvolver o projeto e contratar as obras de moderação de tráfego - até hoje, apenas duas de um total de treze áreas passaram por intervenções de moderação de tráfego, ampliação das calçadas, etc.. Ou seja, apesar dessa política apresentar resultados positivos, não há um procedimento estabelecido para a contratação de obras desse porte. Em março de 2018, a Prefeitura de São Paulo realizou uma licitação para a contratação da obra de São Miguel (PMSP, 2018), mas o processo licitatório nunca foi concluído. Ocorreram novas tentativas de contratação dessa obra, mas nenhuma delas foi adiante. Portanto, há a necessidade de superar as dificuldades para tornar a execução de obras desse porte mais fáceis para que a política se efetive. 38 A taxa atual é de 6 mortes no trânsito por cem mil habitantes. 184 Tabela 24. Disposições gerais Áreas de Velocidade Reduzida, São Paulo – Brasil Item Valor Objetivo Reduzir lesões e mortes no trânsito e melhorar a infraestrutura para pedestres Localização 13 centralidades da Cidade de São Paulo Área de abrangência 17,3 Km² Infraestrutura Fase 1: sinalização vertical e horizontal Fase 2: obras de moderação de tráfego e requalificação da infraestrutura para pedestres Contexto da área na cidade Áreas com uso do solo misto (residencial e não residencial), majoritariamente comerciais. Público alvo Pedestres e demais usuários da via Modal alvo A redução de velocidade atinge todos os motoristas de veículos motorizados e beneficia todos os pedestres e demais usuários da via. Relevo As centralidades são em sua maioria planas. Despesas Não identificadas Receitas Não identificadas Composição do Público municipal. financiamento Redução na Emissão de CO2 Não há cálculos. Impacto central Vidas salvas. Elaboração própria Referências BIGRS, Iniciativa Bloomberg pela Segurança Global no Trânsito (2017). Redesenho Urbano e Segurança Viária em São Miguel. In: Projeto de Requalificação Urbana e Segurança Viária de São Miguel Paulista - Histórico de atividades e linha de base da avaliação de impacto da iniciativa. Anexo 5. ITDP, 2019. Disponível em: https://itdpbrasil.org/wp- content/uploads/2019/12/Relat%C3%B3rio_S%C3%A3oMiguelPaulista.pdf. Acesso em: 17 agosto 2021. CETSP, Companhia de Engenharia de Tráfego de São Paulo. (2016). Nota Técnica Nº 246: Área 40 - área de velocidade reduzida. Disponível em: http://www.cetsp.com.br/media/494779/nt-246.pdf. Acesso em: 17 agosto 2021. 185 CETSP, Companhia de Engenharia de Tráfego de São Paulo. (s.d.) Área 40. Disponível em: http://www.cetsp.com.br/consultas/seguranca-e-mobilidade/area-40.aspx. Acesso em: 17 agosto 2021. G1. (18/09/2013) Limite de velocidade na Avenida Paulista cairá de 60 km/h para 50 km/h. Disponível em: http://g1.globo.com/sao-paulo/noticia/2013/09/limite-de-velocidade-na- avenida-paulista-caira-de-60-kmh-para-50-kmh.html. Acesso em agosto/2021. Geosampa. Disponível em: http://geosampa.prefeitura.sp.gov.br/PaginasPublicas/_SBC.aspx. Acesso em: 17 agosto 2021. ITDP, Instituto de Políticas de Transporte e Desenvolvimento (2019). Projeto de Requalificação Urbana e Segurança Viária de São Miguel Paulista - Histórico de atividades e linha de base da avaliação de impacto da iniciativa. Disponível em: https://itdpbrasil.org/wp- content/uploads/2019/12/Relat%C3%B3rio_S%C3%A3oMiguelPaulista.pdf. Acesso em: 17 agosto 2021. ITDP, Instituto de Políticas de Transporte e Desenvolvimento (2020). Intervenção urbana temporária - (Re)pensando a rua em Santana. Disponível em: https://itdpbrasil.org/wp- content/uploads/2020/04/200401-ITDP-relatorio-santana.pdf. Acesso em: 17 agosto 2021. MARQUES, Rafaela. São Miguel mais humana: rua para todos. In: ITDP Brasil, 24 nov. 2016. 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Disponível em: https://vidasegura.cetsp.com.br/#!/login Acesso em: 17 de agosto de 2021. 187 188 Política do Espaço Público, Bogotá – Colômbia Bogotá destaca-se na América Latina pela recuperação (manutenção) e ampliação (provimento) dos espaços públicos e por sua gestão urbana inspirada no modelo proposto pelo Centro Ibero-americano de Desarrollo Estratégico Urbano (CIDEU) 39 que “valorizaram a realização de projetos de intervenção em detrimento de grandes planos de ordenamento e zoneamento urbano; a flexibilização normativa e a mistura de usos urbanos, em lugar da especialização funcional das áreas; a participação entre agentes públicos e privados na gestão urbana em oposição ao planejamento estatal ou à primazia dos grandes agentes privados; a revalorização e a densificação do espaço urbano construído no lugar da expansão suburbana; e a preferência pelo transporte público em detrimento ao automóvel privado”. (Pinto, 2015), Neste modelo, o espaço público é tratado como bem público e colocado em lugar central na agenda de políticas públicas. O conceito de espaço público em Bogotá abrange calçadas, ruas e vias para veículos, mobiliários, infraestruturas de serviços públicos, parques e ecossistemas naturais, fachadas e jardins exteriores dos prédios. Contexto Bogotá é a capital e maior cidade da Colômbia, com área urbana de 384,4 km² e aproximadamente 8 milhões de habitantes, onde grandes autopistas ligam o centro da capital com a região metropolitana. Seus quarteirões apresentam média regularidade e não existe uma divisão rígida de centro econômico produtivo com áreas residenciais. A mobilidade na cidade se estrutura a partir do sistema de transporte massivo (BRT), veículos motorizados (automóveis e motos), viagens de bicicleta (possui uma importante rede de ciclovias) e a pé (os pedestres foram responsáveis por 24% dos deslocamentos na cidade em 201940). Objetivos Destacam-se como objetivos do Plan Maestro de Espacio Público de Bogotá 41 (2005): 39 CIDEU é uma rede de cidades ibero-americanas, que compartilham e promovem a cultura do pensamento estratégico urbano. 40 Fonte: https://bogota.gov.co/mi-ciudad/movilidad/estrategias-para-la-movilidad-peatonal-en-bogota 41 O Plan Maestro de Espacio Público é um instrumento de planejamento de segundo nível na hierarquia normativa do planejamento na cidade, decorrente e em harmonia com o instrumento principal, o Plan de Ordenamiento Territorial (equiparável com o Plano Diretor brasileiro). O Plan Maestro é desenvolvido para a totalidade da área urbana na cidade. 189 1. Contribuir a la consolidación de la estructura urbana mediante el desarrollo de una red de espacios públicos, que garantice el equilibrio entre densidades poblacionales, actividades urbanas y condiciones medio ambientales, de manera que se integren los elementos del espacio público construido con los de la Estructura Ecológica Principal. (...) 3. Desarrollar procesos de generación, preservación, recuperación y adecuación de la Estructura Ecológica Principal y del Sistema de Espacio Público Construido, así como de su administración y gestión económica. 4. Velar por la protección de la integridad del espacio público y su destinación al uso común, el cual se hará prevalecer sobre el interés particular. En desarrollo de este objetivo, se eliminarán las ocupaciones indebidas del espacio público y se ejecutarán programas y proyectos encaminados a su recuperación.(...) 6. Regular las zonas objeto de aprovechamiento económico y definir los instrumentos para que los aprovechamientos sean equitativamente compensados y/o remunerados. (...) 10. Formular una política para la generación permanente de espacio público, con fundamento en el principio constitucional de la función social y ecológica de la propiedad privada. El Plan pretende solucionar, a más tardar en el año 2019, el déficit actual y las necesidades futuras en cuanto a disponibilidad de espacio público, hasta alcanzar el estándar de 10 m2 por habitante adoptado por el Plan de Ordenamiento Territorial, de los cuales, 6 m2 por habitante deberán estar representados en parques, plazas y plazoletas de todas las escalas, y los 4 m2 por habitante restantes, deberán corresponder al producto de la recuperación y la adecuación de las áreas pertenecientes a la Estructura Ecológica Principal. (...) (Alcaldía Mayor de Bogotá D.C., 2005) Deste modo, o principal objetivo desse Plan Maestro é o aumento dos espaços públicos e sua qualidade, sejam eles terrestres, aéreos ou subterrâneos, tanto para melhorar a mobilidade, quanto para o exercício da cidadania. A cidade tem investido desde 1998 na recuperação de espaços públicos ocupados por particulares ou em condições de deterioro. Em 2020, foi gerado o instrumento de política pública: Política Pública Distrital de Espaço Público, que tem como objetivo geral aumentar a quantidade e qualidade dos espaços públicos na cidade e os seguintes objetivos específicos 1. Aumentar el Espacio Público Total y Espacio Público Efectivo con condiciones adecuadas y equitativamente en todo el territorio distrital. 2. Restituir jurídica, físico- espacial, ambiental, social y culturalmente, los espacios públicos en condición inadecuada para su uso, goce y disfrute por parte de la ciudadanía, teniendo en cuenta el acceso universal y la igualdad de oportunidades. 3. Consolidar los lineamientos e instrumentos necesarios para la sostenibilidad del espacio público y la gestión e implementación del Sistema Distrital de Espacio Público. 190 Os três objetivos mencionados se materializam em programas e projetos com metas a serem atingidas conforme indicado na Figura 66. O modal alvo é a caminhabilidade (a pé), com foco nas calçadas, também áreas de acesso de diversos níveis no viário, parques e praças, áreas verdes contemplativas, áreas verdes de lazer, áreas objeto de aproveitamento econômico. Toda a população de Bogotá faz parte do público-alvo do Plano Maestro de Espacio Público (2005) e da Política Distrital (2020). No entanto existe o objetivo específico de beneficiar as classes mais vulneráveis com a democratização dos espaços públicos e dos transportes não privados, além de garantir sua acessibilidade para que também inclua pessoas com mobilidade reduzida. Figura 66. Resultados esperados da Política Pública Distrital de Espaço Público 191 Fonte: Política Pública de Espacio Público (2020). Instrumento e implementação No caso de áreas objeto de renovação urbana, o instrumento de planejamento territorial denominado Planes Parciales de Renovación Urbana estrutura o componente financeiro a partir das orientações do Guía para el reparto de cargas y beneficios en planes parciales de renovación urbana. Além das exigências ou cessões de solo destinadas a espaço público, existem ônus em dinheiro ou obras para sua adequação, melhoria etc. Na Colômbia, e de forma cotidiana em Bogotá, muitas obras viárias são financiadas por meio da contribución por valorización. Todas as obras financiadas por esse meio assim como obras de infraestrutura do BRT incluem a provisão, adequação e melhoria de calçadas e outros componentes do espaço público. Existem três grandes mecanismos para a geração e recuperação dos espaços públicos na cidade (Alcaldía Mayor de Bogotá D.C., 2017): • Geração - espacio público escriturado: O processo de transferência da propriedade se dá por meio da incorporação ao patrimônio da cidade daquelas áreas destinadas ao espaço público pelos instrumentos de planejamento territorial, por meio de ativos fiscais ou de doações. • Geração - espacio público recebido: Além da incorporação jurídica, o solo precisa ser entregue fisicamente à prefeitura de acordo com normas vigentes para prossecução de processos de urbanização. • Recuperação - espacio público recuperado/restituído: São as áreas de espaço público que perderam essa condição por diversos motivos. A Defensoría del espacio 192 público realiza ações de recuperação, que pode correr seguindo três tipos de processos: o entrega voluntária: Através de processo persuasivo e pactuado com a comunidade em ocupações irregulares. o operativos por hechos notórios: Recai sobre áreas ocupada de forma indevida em estradas, plataformas, parques, áreas de transbordo ocupadas por portões, gabinetes, cabines, postes de amarração etc (Resolução 034 de 2014 do DADEP) • Querellas y otras actuaciones administrativas: Resultado de processo administrativo contencioso ou oficioso que resulta na recuperação do espaço público. Não foi possível identificar de forma clara as responsabilidades administrativas na implementação da política de espaço público, mas é transparente do ponto de vista do ciclo de políticas públicas, com etapas bem definidas para a implementação dos projetos. Como é possível observar na Figura 67, o Sistema de Espacio Público concentra a gestão das atividades da política, mas diversos atores compartilham responsabilidades para a prossecução da mesma: • Instituto de Desarrollo Urbano (IDU): responsável pela construção e manutenção das ciclofaixas, calçadas, passarelas, alamedas, praças, guias, também mantém os monumentos e bens culturais. • Empresa de Renovación y Desarrollo Urbano (ERU): responsável por identificar, formular, gerenciar e executar projetos urbanos observando e incorporando objetivos de espaço público • Unidad Administrativa Especial de Servicios Públicos (Uaesp): responsável pela iluminação pública e coleta de lixo. • Instituto Distrital de Recreación y Deporte (IDRD): responsável pelo sistema distrital de Parques e cenário esportivo (e seu mobiliário) 193 Figura 67. Política Pública do Espaço Público: Implementação Fonte: Política Pública de Espacio Público (2020). Arranjo regulatório Para prossecução dos objetivos de ampliação e melhoria dos espaços públicos, Bogotá conta com aparato normativo e administrativo. Do ponto de vista normativo, destacam-se os Planes Maestros Estructurantes, em específico o Plan Maestro de Espacio Público42, decretado em 2005 assim como o componente de espaço público dentro de Planes Parciales de Renovación Urbana para áreas centrais da cidade 43 . Do ponto de vista administrativo, destacam-se a Defensoría del espacio público , que formulou a Política Distrital de Espacio Público (a primeira política de espaço público do país, em 2020) e mantém o Observatorio del Espacio Público, que monitora a conclusão dos objetivos da referida política. Também merece destaque o Guía para el reparto de cargas y beneficios en planes parciales de renovación urbana 44 , que estabelece critérios para a distribuição financeira dos ônus e benefícios em projetos de renovação urbana em áreas centrais, o instrumento de cessões de solo para espaço público junto com exigências urbanísticas de dotação de equipamento e mobiliário urbano. Recursos, atores e investimentos Segundo a Política Pública de Espacio Público (2020), os setores público e privado são co- responsáveis pelo financiamento da política. Na cidade existe uma antiga tradição no uso da 42 Disponível em: http://www.sdp.gov.co/gestion-territorial/planes-parciales-de-renovacion- urbana/planes 43 Disponível em: https://www.dadep.gov.co/ 44 Disponível em: http://www.sdp.gov.co/sites/default/files/guia_reparto_cargas_beneficios.pdf 194 Contribución por valorización45, para o financiamento de obras de infraestrutura, provimento e manutenção de equipamentos públicos, incluindo parques, praças, etc. Projetos financiados por esse mecanismo, por exemplo do viário, incluem as calçadas, espaço público, e outros elementos de mobiliário urbano do espaço público e garantir assim acessibilidade. Quando uma região ganha uma obra, equipamento, ou similar, ganha também melhor espaço público e calçadas. Estratégias de comunicação Não foram identificadas estratégias de comunicação sobre os projetos. Figura 68. Atores e interesses Fonte: Política Pública de Espacio Público (2020). Resultados O principal resultado da política de espaço público e das diversas ações desenvolvidas foi o incremento de espaço público na cidade. Dados do observatório do espaço público ilustram o A contribuicón por valorización é o nome dado em Bogotá ao que no Brasil chamamos de 45 Contribuição por Melhoria. 195 incremento, o qual inclui tanto novo espaço público como espaço público já existente recuperado graças a ações governamentais. Tabela 25. Distribuição do m² de espaço público por habitante entre 2016 – 2020 Espaço Meta em 2017 2018 2019 2020 Público 2015 Efetivo¹ 15m² por 4,41 m² por 4,57 m² por 4,62 m² por hab hab hab hab Total² 21,08 23,9 24,14 Recebido 1.069.412 m² 716.401 m² 3.919.761,15 52.130 m² m²* Escriturado 1.049.365 m² 399.416 m² 2.134.944 m²* Recuperado 591.113 m² 97.670 m² Fonte: Reporte Técnico de Indicadores de Espacio Público (2017, 2018, 2019, 2020) 1 Composto por parques, praças e zonas verdes.; 2 Espaço público efetivo + sistema vial + estrutura ecológica principal; * Dado acumulado para o período de 2016 a 2019. Os espaços públicos recuperados ou recebidos são majoritariamente calçadas. As imagens a seguir mostram o antes e depois de alguns projetos de intervenção urbana em Bogotá para geração (provimento e melhoria) de espaço público, com foco na mobilidade ativa. Figura 69. Provimento de espaços públicos: antes e depois Fonte: Defensoría del Espacio Público (2018) 196 Já a Figura 70 apresenta o resultado de intervenções para recuperação dos espaços públicos anteriormente ocupados por automóveis na forma de estacionamento. Como é possível observar nas imagens, antes dos projetos de recuperação de espaços públicos, os carros ocupavam o espaço das calçadas, consequentemente, dos pedestres. A intervenção para recuperação dos espaços públicos destinou áreas antes ocupadas por automóveis para os pedestres. Figura 70. Recuperação de espaços públicos: antes e depois Fonte: Defensoría del Espacio Público (2018) Quadro 5. Transmilênio O TransMilênio, inaugurado no ano 2000, destaca-se por ser considerado um dos melhores sistemas de transporte público metropolitano de veículo leve sobre pneus (VLP) do mundo. Com este sistema, os ônibus transitam por canaletas segregadas e exclusivas, sem cruzamentos em nível, com duas faixas em cada direção. O sistema começa com o transporte complementar (chamado de serviço alimentador que atende o last mile) fornecido por contratistas parceiros em veículos de menor tamanho e integração tarifária. O micro-ônibus circula em vias compartilhadas com outros modos, levando as pessoas das vias capilares até as artérias onde encontram-se os VLP. Aqui reside a primeira crítica ao sistema, pois a operação das linhas convencionais acabou operando majoritariamente em levar as pessoas até o ‘ponto” do Transmilenio, gerando mais lotação nessas vias capilares e aumentando o tempo de viagem de quem antes era atendido por uma linha só que até seu ponto final. Não só o sistema complementar sofre com superlotação, mas também o próprio Transmilenio (Mobilize, 2018), pois, apesar de ter uma grande frota, a complexidade da operação de suas 197 rotas resulta em lotação de alguns carros e esvaziamento de outros. O que nos leva ao terceiro problema do modelo que é de financiamento, visto que sai muito caro manter essa estrutura. Mesmo assim, no início, o Transmilênio melhorou as condições do serviço e reduziu o congestionamento, poluição e sinistros de trânsito (Echeverry, Ibañez, Moya, & Hillón, 2004). Além disso, circula mais rápido por suas vias duplas e subterrâneas do que os veículos automotores individuais (Mobilize, 2018). Considerações finais Um dos principais resultados alcançados em Bogotá foi o aumento dos espaços públicos majoritariamente de calçadas, através, principalmente, da diminuição do espaço para estacionamento de veículos particulares. Além disso, concomitante, a cidade aumentou a malha de transporte público propiciando o aumento da integração entre os modais ativos e o transporte público. O maior desafio enfrentado para a recuperação e provisão dos espaços públicos é convencer os particulares a devolverem as calçadas para a cidade. Além disso, para viabilizar os projetos de intervenção existe a cobrança da contribuição de melhoria, mecanismo sistematicamente utilizado para financiar custos de obra pública que incluem provisão, manutenção e melhoria desses espaços -os quais são objeto de controle social-, e a política de exploração econômica do espaço público. Tabela 26. Disposições gerais Política do Espaço Público, Bogotá- Colômbia Item Valor Objetivo Incentivar a mobilidade ativa e criar espaços públicos Localização Bogotá, Colômbia Área de abrangência Até 384,4 km² Infraestrutura Calçadas e mobiliário urbano Contexto da área na cidade Área urbana Público alvo População geral, população com mobilidade reduzida e população em áreas em vulnerabilidade Modal alvo Pedestres Relevo Não identificado Despesas Receitas Composição do Compartilhado financiamento Redução na Emissão de CO2 Impacto central Aumento e melhoria da área de espaço público da cidade Elaboração própria 198 Referências Alcaldía Mayor de Bogotá D.C. (2005). Plan Maestro de Espacio Público. Bogotá. Acesso em 29 de 07 de 2021, disponível em http://www.sdp.gov.co/gestion-territorial/planes- maestros/planes/plan-maestro-de-espacio-publico Alcaldía Mayor de Bogotá D.C. (2005). Plan Maestro de Movilidad. Bogotá. Acesso em 29 de 07 de 2021, disponível em http://www.sdp.gov.co/gestion-territorial/planes- maestros/planes/plan-maestro-de-movilidad Alcaldía Mayor de Bogotá D.C. (2016). Reporte técnico de indicadores de espacio público. Bogotá. Acesso em 29 de 07 de 2021, disponível em http://observatorio.dadep.gov.co/sites/default/files/2018/Reporte-tecnico-1-2016.pdf Alcaldía Mayor de Bogotá D.C. (2017). Segundo Reporte Técnico de Indicadores de Espacio Público. Bogotá. Acesso em 29 de 07 de 2021, disponível em http://observatorio.dadep.gov.co/sites/default/files/2018/Reporte-tecnico-2-2017.pdf Alcaldía Mayor de Bogotá D.C. (2018). Reporte Técnico de Indicadores. Bogotá. Acesso em 29 de 07 de 2021, disponível em http://observatorio.dadep.gov.co/sites/default/files/2018/Reporte-tecnico-1-2018.pdf Alcaldía Mayor de Bogotá D.C. (2019). Reporte Técnico de Indicadores de Espacio Público. Bogotá. Acesso em 29 de 07 de 2021, disponível em http://observatorio.dadep.gov.co/sites/default/files/2019/reporte_tecnico_de_indicador es_de_espacio_publico_2019_baja.pdf Alcaldía Mayor de Bogotá D.C. (2020). Política Pública de Espacio Público. Bogotá. Acesso em 29 de 07 de 2021, disponível em http://observatorio.dadep.gov.co/sites/default/files/2019/17.01.2020_minilibro_ppdep_ 2019_vdadep.pdf Alcaldía Mayor de Bogotá D.C. (2020). Reporte Técnico de Indicadores de Espacio Público. Bogotá. Acesso em 29 de 07 de 2021, disponível em http://observatorio.dadep.gov.co/sites/default/files/reporte_indicadores_2020.pdf Alcaldía Mayor de Bogotá D.C. (s.d.). Guía para el reparto de cargas y beneficios en planes parciales de renovación urbana. Bogotá. Acesso em 27 de 07 de 2021, disponível em http://www.sdp.gov.co/sites/default/files/guia_reparto_cargas_beneficios.pdf Echeverry, J., Ibañez, A., Moya, A., & Hillón, L. (2004). The Economics of TransMilenio, a Mass Transit System for Bogota. Journal of LACEA Economia. Disponível em: https://www.researchgate.net/publication/227351082_The_Economics_of_TransMileni o_a_Mass_Transit_System_for_Bogota 199 Pinto, A. M. (Novembro de 2015). Construção de espaços públicos em Bogotá e Rio de Janeiro: uma análise comparada dos projetos públicos durante a década de 1990. Caderno Metrópole. doi:http://dx.doi.org/10.1590/2236-9996.2015-3411 Transmilenio. (s.d.). Historia de TransMilenio. Bogotá. Disponível em: https://www.transmilenio.gov.co/publicaciones/146028/historia-de-transmilenio/ 200 201 Projeto Cidade da Gente, Fortaleza – Brasil A cidade de Fortaleza, estado do Ceará, no Brasil promoveu um conjunto de políticas de segurança no trânsito desde 2015 com apoio da Iniciativa Bloomberg Philanthropies que hoje é reconhecida internacionalmente pelos resultados de redução de mortalidade no trânsito. Dentro desse conjunto de políticas, destaca-se o Projeto Cidade da Gente. O projeto consiste em ações temporárias de acupuntura urbana em regiões de posterior implantação de Áreas de Trânsito Calmo46. O projeto Cidade da Gente implementou seu piloto em 2017 no bairro Cidade 2000. E, em 2019, no entorno do Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura, mais especificamente na rua Almirante Jaceguai, no trecho entre as avenidas Monsenhor Tabosa e Almirante Barroso, ao lado do Porto Iracema das Artes. Por fim, também foi implementado o projeto no Caminho da Escola Cristo Redentor (2019). “"O projeto 'Cidade da Gente' oferece essa nova visão, de que é possível oferecer mais área de lazer, mais segurança no trânsito e mais espaço para atividades comunitárias, ao invés de simplesmente de espaço pros carros. É uma oportunidade pra que as pessoas conheçam e avaliem a intervenção", afirmou o secretário-executivo de Conservação e Serviços Públicos de Fortaleza, Luiz Alberto Saboia.” (Diário do Nordeste, 2017) Contexto Fortaleza é a capital do Ceará, com 2.686.612 habitantes residentes em 312,353 km² de área urbana. O município detém a maior densidade demográfica do Brasil, com 7.786,4 hab/km². Neste contexto de adensamento, conjuntamente com o forte fluxo de turistas, a segurança viária tornou-se questão central na cidade com a quarta maior densidade de tráfego do país, onde nos horários de pico 48% das vias ficam congestionadas. Em 2013, a cidade possuía uma frota de 908 mil veículos motorizados, contava com 116,4 km de malha cicloviária, e 263 linhas de ônibus que circulam em pelo menos 122 km de faixas exclusivas. Objetivos O objetivo superior do Programa Cidade da Gente é aumentar a segurança no trânsito por meio do ações de urbanismo tático que incluem: conscientização, comunicação, educação, mobilização e engajamento do público-alvo dos projetos. A educação e envolvimento 46 Programa da prefeitura de Fortaleza, onde áreas estratégicas de alto fluxo de ciclistas e pedestres recebem sinalização adequada e os carros devem trafegar a velocidade de 30 km/h. 202 comunitário são componente central nos projetos de intervenção para o atingimento do seu objetivo. Pretende-se com o projeto controlar o tráfego de carros, não necessariamente para reduzir o uso do modal, mas sim, para que seu uso não se sobreponha ou coloque em risco os modais ativos, garantindo maior segurança aos pedestres. As ações de urbanismo tático visam aumentar e melhorar as condições do espaço público destinado aos pedestres como forma de promover segurança viária, mesmo que seja unicamente com ações temporárias sem desenvolvimento de obras estruturais de melhoria, alargamento ou requalificação das calçadas, que na verdade são as precursoras da transformação permanente dos espaços afetados pelas intervenções. Instrumento e implementação O Projeto Cidade da Gente foi gerido pela Secretaria Municipal de Conservação e Serviços Urbanos, e executado pela Autarquia Municipal de Trânsito e Cidadania, com apoio eventual de outras secretarias, como a de infraestrutura e meio ambiente (doação de mudas). Houve também apoio da Iniciativa Bloomberg. Fortaleza foi uma das 10 cidades selecionadas para fazer parte da rede Iniciativa Bloomberg para Segurança Global no Trânsito (BIGRS) em 201547 . As cidades selecionadas receberam (Global Designing Cities Initiative, 2017): • Equipe de nível sênior em tempo integral para trabalhar com os governos municipais em suas iniciativas de segurança rodoviária por até 5 anos; • Assistência técnica abrangente das principais organizações de segurança rodoviária do mundo; • Treinamento para policiais e outros funcionários municipais pertinentes; e • Suporte para criar campanhas contundentes de mídia de massa. As instituições envolvidas no projeto foram: Tabela 27. Atores envolvidos no BIGRS e respectivos recursos mobilizados. Ator Recurso NACTO - GDCI Apoio técnico, sessão de mobiliários urbanos, tintas e organização de algumas atividades. Elaboração dos projetos de desenho urbano. 47 As outras cidades selecionadas foram: Accra, em Gana; Addis Abeba, na Etiópia; Bandung, na Indonésia; Bangkok, na Tailândia; Bogotá, na Colômbia; Ho Chi Minh, no Vietnã; Mumbai, na Índia; São Paulo, no Brasil; e Shanghai, na China. 203 World Resources Institute Participou no Cidade 2000, com apoio técnico, sessão de Brasil (WRI) mobiliários urbanos, tintas e organização de algumas atividades. Vital Strategies Gerente da iniciativa Bloomberg na cidade, dos dados e da comunicação do projeto. UNIFOR Formulação dos questionários e disponibilização dos totens de pesquisa nos dias dos projetos. Fonte: (Global Designing Cities Initiative, 2017). Elaboração própria. A primeira intervenção dentro do projeto Cidade da Gente foi implementada no bairro Cidade 2000, pois a população reclamava há muito tempo das condições locais e houve uma janela de oportunidade para investimento na requalificação do bairro (havia possibilidade de licitar o projeto de requalificação já elaborado pela Secretaria da Região 2). Com apoio dos parceiros Vital Strategies, NACTO-GDCI e Blomberg, um forte plano de comunicação foi executado antes e depois da intervenção, incluindo audiências públicas com os moradores para apresentação do projeto original e rediscussão de seu desenho. Figura 71. Fortaleza, Bairro Cidade 2000: Audiência pública Fonte: (NACTO, 2021) A primeira fase foi uma intervenção de caráter temporário com duração de 15 dias com o objetivo de mostrar como seria a transformação ao requalificar a área e quais atividades poderiam ser feitas após sua conclusão. Após sua execução, a população (inclusive comerciantes) fez um abaixo assinado para que a intervenção se tornasse permanente, o que de fato aconteceu. A licitação foi liderada pelo Governo do Estado do Ceará dentro do programa Juntos for Fortaleza (Secretaria das Cidades, 2019) e financiou os bloquetes, drenagem, mobiliário, entre outros. 204 Figura 72. Fortaleza, Bairro Cidade 2000: intervenção definitiva antes e depois Fonte: (NACTO, 2021) A segunda intervenção registrada foi a do entorno do complexo artístico e cultural Dragão do Mar também com previsão inicial de duração de 15 dias. No entanto, atendendo ao pedido do Porto Iracema de Arte, escola de artes da região circunscrita no projeto, de estender a intervenção durante as atividades de aniversário da escola, as pinturas foram reforçadas. Posteriormente, a prefeitura tinha três cenários propostos pelos parceiros da iniciativa Bloomberg: a) promover reforma estrutural, próximo ao feito no Cidade 2000; b) Aumentar a calçada e pintar; c) só pintar com tinta definitiva. A prefeitura optou pelo cenário “c”. A terceira intervenção identificada dentro do projeto Cidade da Gente foi conhecida sob o codinome “caminhos da escola” para se referir aos trajetos mais utilizados pelas crianças da Escola Cristo Redentor no bairro Cristo Redentor. Sua implementação contou com envolvimento comunitário próximo ao da intervenção na Cidade 2000, com diversas atividades de sensibilização antes da intervenção. Figura 73. Intervenção “Caminhos da escola” Escola Cristo Redentor: Atividades de envolvimento comunitário 205 Fonte: (NACTO, 2021) As oficinas apontaram que 67% dos alunos vão a pé para escola e realizaram uma simulação dos trajetos com maior fluxo de crianças (NACTO-GDCI, 2021). Depois do diagnóstico, 6 interseções viárias e 13 travessias de pedestres receberam sinalização definitiva pela prefeitura. Figura 74. Intervenção “Caminhos da escola” Escola Cristo Redentor: Antes e depois Fonte: (NACTO, 2021) Além do tratamento nas vias, foi feita acupuntura urbana temporária em uma grande área próxima da escola, onde foi recuperada uma área de espaço público de mais de 1000 m² para os pedestres (Figura 75). Figura 75. Intervenção “Caminhos da escola” Escola Cristo Redentor: Antes e depois na Praça Fonte: (NACTO, 2021) Em 2019, ainda houve o Concurso de Ideias "Cidade da Gente" (O Povo, 2019), promovido pelo Instituto Iracema, que indica nos dias de hoje as áreas a receber novos projetos de 206 acupuntura urbana permanente em áreas indicadas pela própria população que também indica qual tipo de intervenção desejam. Depois dessas três grandes experiências (Cidade 2000, Dragão do Mar e Cristo Redentor), houve outras pequenas intervenções temporárias também e ramificações do projeto como o caso do Calçada Viva, que será abordado na seção Resultados. Arranjo regulatório O Programa de Segurança Viária faz parte do Plano Fortaleza 2040 48, que se apoia em três grandes Planos Municipais: Plano Mestre Urbanístico, Plano de Mobilidade e Plano de Desenvolvimento Econômico e Social. O Plano de Mobilidade 49 foi lançado em 2015 e prevê diversas ações de curto e longo prazo, onde já indica a parceria com a Iniciativa Bloomberg para Segurança Global no Trânsito (BIGRS). Como antecedente relevante se observa-se o Plano de Ações Imediatas de Transporte e Trânsito de Fortaleza (PAITT), lançado pela prefeitura em 2013. Dentro do plano encontra-se o Programa de Apoio aos Pedestres (Mobilidade Fortaleza, s.d.), o qual teve continuidade com o Programa de Segurança no Trânsito de 2015 (Diário do Nordeste, 2016). Pode-se dizer que são os precursores do movimento das shared streets - ruas compartilhadas - na cidade. Recursos, atores e investimentos Boa parte dos custos do projeto Cidade da Gente nas três intervenções citadas foram absorvidos por itens de despesas já orçados pela Secretaria Municipal de Conservação e Serviços Urbanos de Fortaleza para atividades recorrentes como a execução de sinalizações de trânsito e viária, faixas de estacionamentos, estrutura de evento, e outras. Os investimentos dos parceiros NACTO-GDCI e WRI chegaram a uma média de 40 mil reais por intervenção, principalmente para cessão de tinta e mobiliário urbano. Houve outros financiamentos pontuais nas intervenções acima apresentadas como: • Cidade 2000: o WRI financiou atividades como a banca e bike anjo. 48 O Plano Fortaleza 2040 é uma peça de planejamento de governo lançado pela prefeitura em 2016, para orientar as ações de curto, médio e logo prazo da prefeitura. Saiba mais em: https://fortaleza2040.fortaleza.ce.gov.br/site/ 49 Disponível em: http://fortaleza2040.fortaleza.ce.gov.br/site/assets/files/publications/fortaleza2040_plano_de_mobilidad e_urbana_17-08-2015.pdf 207 • Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura: as tintas foram patrocinadas pela Hidracor; o Porto Iracema de Artes realizou as atividades culturais durante os 15 dias da intervenção e também um pouco depois durante o período do aniversário da Escola. A NACTO-GDCI financiou parte do mobiliário urbano. • Caminhos da Escola Cristo Redentor: as jardineiras foram cedidas pela NACTO-GDCI e boa parte dos recursos investidos nas sinalizações advinham de licitações de pequenas obras já realizadas pela prefeitura. Importante notar que os parceiros NACTO-GDCI, WRI e Vital Strategies ofereceram apoio técnico aos projetos, com equipe inclusive dedicada nas intervenções citadas, apoiando as estratégias de comunicação e desenhos técnicos para as intervenções, contribuindo com o projeto das ruas para as intervenções. Estratégia de comunicação De forma abrangente pode se dizer que o projeto Cidade da Gente tem como principal objetivo divulgar e popularizar a ideia de que há alternativas ao modelo viário dominante, para que as pessoas tenham mais segurança, conforme estabelecido no Programa de Segurança Viária, inclusive pelo fato de as intervenções são basicamente demonstrativas com duração de 15 dias. “O projeto 'Cidade da Gente' oferece essa nova visão, de que é possível oferecer mais área de lazer, mais segurança no trânsito e mais espaço para atividades comunitárias, ao invés de simplesmente de espaço pros carros. É uma oportunidade para que as pessoas conheçam e avaliem a intervenção", afirmou o secretário-executivo de Conservação e Serviços Públicos de Fortaleza, Luiz Alberto Sabóia." (Diário do Nordeste, 2017) A divulgação se ancora principalmente nas intervenções. A intervenção é uma estratégia de convencimento para a população aderir a mudanças definitivas orientadas ao compartilhamento de ruas (shared streets) e para que esses projetos sejam avaliados e aprimorados no que couber após a intervenção. “Quando técnicos da Prefeitura de Fortaleza apresentaram pela primeira vez a proposta de implantação de uma Área de Trânsito Calmo no bairro de Cidade 2000, os moradores receberam a ideia com cautela. Muitos tinham medo que a intervenção pudesse causar congestionamentos, reduzir a oferta de estacionamento e causar transtornos durante as obras. Ao mesmo tempo, 78% das pessoas entrevistadas em uma pesquisa disseram 208 que se sentiam ‘inseguros’ ou ‘muito inseguros’ em relação ao trânsito motorizado. Algo precisava ser feito a respeito.” (Global Designing Cities Initiative, 2017) Antes da realização do projeto, a prefeitura realiza audiências públicas apresentando modelos de intervenção e escutando os moradores sobre os principais problemas e sugestões de melhorias para os mesmos. Durante a realização da intervenção, os moradores e transeuntes avaliam a mesma e também sugerem melhorias. E ao final, é aplicada a pesquisa de satisfação. Durante a intervenção em 2017 no bairro Cidade 2000, foram aplicados pesquisas e questionários aos transeuntes através de totens distribuídos pela Universidade de Fortaleza. Foram preenchidas de 246 avaliações da opinião dos moradores sobre as intervenções, delas 230 foram classificadas como “muito boa” ou “boa”, e 97% dos respondentes falaram que o pedestre deveria ser priorizado na cidade.” (UNIFOR, 2018) A prefeitura de Fortaleza também realiza ações de divulgação das intervenções em sua página web oficial, sublinhando as mensagens de segurança viária para o pedestre e sua convivência. Figura 76. Prefeitura divulga o projeto por meio de intervenções (antes-depois) Fonte: Página do facebook da Prefeitura de Fortaleza (2017). 209 Resultados O Projeto Cidade da Gente é uma ramificação do Programa de Segurança Viária de Fortaleza, criado para demonstrar à população alternativas de urbanismo viário que visam a redução de sinistros de trânsito. O projeto teve início em 2017 e perdurou até 2019. Entre os resultados das três intervenções do Projeto Cidade da Gente estão: • Ampliação da largura das calçadas com tinta; • aumento da quantidade de pedestres que circulam na área; • aumento de pessoas sentadas em bancos; • engajamento com atores do poder público e sociedade civil para transformação do espaço; Devido ao sucesso das intervenções temporárias (15 dias), o projeto tornou-se política pública permanente. Figura 77. Mudança na distribuição no uso do espaço: Compartilhamento das ruas Fonte: (Global Designing Cities, 2017) Antes do Projeto Cidade da Gente no bairro Cidade 2000, os carros ocupavam 79% do espaço público. Após a intervenção, os pedestres passaram a ocupar 73% do espaço público. Uma inversão quase direta da forma de uso e ocupação das vias. Mais de 1.200 m2 de estacionamento subutilizados foram recuperados como uma nova praça onde as pessoas passaram a podem caminhar, sentar e passar o tempo juntas. Uma faixa de rolamento estreita preserva o acesso de veículos ao local, permitindo entregas, embarque e desembarque e até algumas vagas de estacionamento. Três novas faixas de pedestres foram implantadas, dando clara prioridade ao pedestre. Juntas, estas medidas encorajam os carros a circular em velocidades moderadas e aumentam a segurança e o conforto de todos os usuários da via. (Global Designing Cities, 2017) 210 Figura 78. Percepção de segurança dos pedestres antes e depois do projeto Cidade 2000 Fonte: (Global Designing Cities, 2017) A Figura 78 apresenta o aumento de 69% na sensação de segurança, o que resultou no aumento de 350% no número de pedestres caminhando em espaços apropriados (Global Designing Cities, 2017). Já no projeto Cidade da Gente, implementado no Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura, foi identificado um aumento na circulação de pessoas na região de 34%, inclusive como forma de lazer. Figura 79. Resultados do projeto Cidade da Gente Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura Fonte: (Global Designing Cities, 2018) Com a redução do estacionamento nas ruas e aumento de vias caminháveis, houve uma redução de 91% de pessoas circulando na via dos carros e de 80% da distância para travessia entre as ruas Almirante Jaceguai e Rua Dragão do Mar. 211 Figura 80. Antes e depois Fonte: (Global Designing Cities, 2018) Em resumo, foram as intervenções permitiram a recuperação de (NACTO, 2021): • Cidade 200: 1200m² de espaço público • Dragão do mar: 4000m² de espaço público • Caminhos da Escola Cristo Redentor: 1000m² para pedestre. Além dos resultados diretos das três intervenções do Projeto Cidade da Gente, podemos citar o principal resultado indireto da repercussão de seus resultados, como o Programa Calçada Viva, de caráter permanente desde seu início, que promove o compartilhamento das ruas sem grande plano de comunicação e envolvimento comunitário como ocorrido nos projetos Cidades da Gente nas áreas com grande circulação de pedestres. O primeiro Calçada Viva foi implementado na Rua Barão do Rio Branco no Centro da cidade ainda em 2019, complementarmente financiado pela prefeitura. Antes da intervenção, o espaço público era 33% destinado aos pedestres e 60% para os carros, mesmo que a circulação fosse majoritariamente de pedestres, com 1984 pessoas por hora e 544 carros por hora. Com o programa, foram implantadas ou aprimoradas 32 faixas de pedestres, implantadas 3 faixas elevadas, aprimorados 8 cruzamentos, feitas 32 extensões de calçadas equivalente a 1 km de calçadas ampliadas (Global Designing Cities, 2020). 212 Figura 81. Antes e depois do Programa Calçada Vida Rua Barão do Rio Branco Fonte: (Global Designing Cities, 2020) Como fruto do conjunto de esforços de diferentes projetos e programas, a cidade de Fortaleza conseguiu ao longo de 5 anos reduzir o número de mortes anual em sinistros de trânsito de 377 (2014) para 198 (2019) (NACTO, 2021). O monitoramento do projeto Cidade da Gente foi feito pela prefeitura de Fortaleza e pela NACTO-GDCI. Considerações Finais Com o projeto Cidade da Gente houve um aumento significativo da ocupação das ruas por pedestres em detrimento da redução de circulação dos automóveis. Além disso, o projeto Cidade da Gente tornou os moradores mais receptivos a projetos de urbanismo tático, abrindo as portas para implementação de projetos definitivos desde sua origem, como é o caso do Programa Calçada Viva, um dos principais outcomes do Cidade da Gente. No entanto, o projeto não tem rastro regulatório, nenhuma normativa implicada, inclusive não apareceu nos Planos Plurianuais, o que o torna vulnerável a mudanças de governo, visto que inclusive o Plano Fortaleza 2040 é um programa de governo e não de Estado. 213 A legitimidade do projeto foi alcançada junto a população residente nas regiões de intervenção com a apresentação clara dos resultados possíveis, financiado com recursos de custeio gerais da prefeitura. Tabela 28. Disposições gerais Projeto Cidade da Gente, Fortaleza – Brasil Item Valor Objetivo Aumentar a segurança no trânsito Localização Fortaleza, Ceará, Brasil Área de abrangência Cidade 200: 1200m² de espaço público Dragão do mar: 4000m² de espaço público Caminhos da Escola Cristo Redentor: 1000m² para pedestre. Infraestrutura provida Espaço público para pedestres Contexto da área na cidade Cidade 2000: centro expandido Centro Dragão do Mar: centro Cristo Redentor: periferia Modal alvo Pedestres Despesas Não identificado Receitas Não identificado Composição do Municipal, 3º setor e governo estadual financiamento Redução na Emissão de CO2 Não identificado Impacto central Redução do número de mortes no trânsito e aumento do espaço público para pedestres Elaboração própria. Referências Diário do Nordeste. (24 de 01 de 2016). Novas estratégias procuram dar mais segurança a quem anda a pé. Disponível em: https://diariodonordeste.verdesmares.com.br/metro/novas-estrategias-procuram-dar- mais-seguranca-a-quem-anda-a-pe-1.1479157 Diário do Nordeste. (17 de 09 de 2017). Cidade 2000 recebe espaço para pedestres em intervenção temporária. Acesso em 12 de 08 de 2021, disponível em Diário do Nordeste: https://diariodonordeste.verdesmares.com.br/metro/cidade-2000-recebe- espaco-para-pedestres-em-intervencao-temporaria-1.1821912 214 Global Designing Cities. (14 de 12 de 2017). Reshape streets reconnect communities. Disponível em: https://globaldesigningcities.org/2017/12/14/reshape-streets- reconnect-communities-2/ Global Designing Cities. (20 de 09 de 2018). The power of painting. Disponível em: https://globaldesigningcities.org/2018/09/20/the-power-of-paint-bringing-life-to-the- streets-of-dragao-do-mar/ Global Designing Cities. (10 de 03 de 2020). Calçada viva: recuperando espaço para pedestre no centro de Fortaleza. Disponível em: https://globaldesigningcities.org/2020/03/10/calcada-viva-recuperando-espaco-para- pedestres-no-centro-de-fortaleza/ Global Designing Cities Initiative. (14 de 12 de 2017). Global Designing Cities Initiative. Disponível em: Global Designing Cities Initiative: https://globaldesigningcities.org/2017/12/14/reshape-streets-reconnect-communities- 2/ Mobilidade Fortaleza. (s.d.). Travessias elevadas para pedestres. Disponível em: Prefeitura Municipal de Fortaleza: https://mobilidade.fortaleza.ce.gov.br/menu- programas/travessias-elevadas-para-pedestres.html NACTO. (2021). Workshop de desenho com a NACTO-GDCI. A experiência de Fortaleza. O Povo. (30 de 12 de 2019). Projeto de intervenção urbana serão implantados em Fortaleza. Disponível em: O Povo: https://www.opovo.com.br/noticias/fortaleza/2019/12/30/projetos-de-intervencao- urbana-serao-implantados-em-fortaleza.html Prefeitura de Fortaleza. (26 de 09 de 2017). Página da Prefeitura de Fortaleza. Disponível em: Facebook: https://www.facebook.com/PrefeituradeFortaleza/photos/a.224800790908002/146042 7290678673/ Secretaria das Cidades. (21 de 08 de 2019). Cidade 2000 reforma da praça e delegacia beneficia moradores e frequentadores do bairro. Disponível em: Governo do Estado do Ceará: https://www.cidades.ce.gov.br/2019/08/21/cidade-2000-reforma-da-praca- e-delegacia-beneficia-moradores-e-frequentadores-do-bairro/ UNIFOR. (09 de 08 de 2018). Projeto Cidade da Gente revitaliza o entorno do Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura. Disponível em: UNIFOR: https://www.unifor.br/web/osv/projeto-cidade-da-gente-revitaliza-o-centro-dragao-do- mar-de-arte-e-cultura 215 216 Walking Action Plan, Londres – Inglaterra O Walking Action Plan (WAP), ou Plano de Ação de Caminhabilidade (em uma tradução literal), de Londres é um plano bastante abrangente alinhado às Estratégias do Transporte de Londres. Ele se configura como um exemplo interessante para definição de diretrizes e para o desdobramento de outros programas para o incentivo ao deslocamento a pé. Seu lançamento pela prefeitura de Londres conta com o apoio tanto da agência de transportes – TfL (responsável pelo financiamento dos programas), como da agência nacional de saúde - Public Health England (PHE), que desenvolve pesquisas e análises nas quais se embasa o Plano de Ação. Contexto Em 2018, a Prefeitura de Londres publicou as suas Estratégias de Transporte ( Mayor’s Transport Strategy), que estabelecem uma meta de que 80% das viagens sejam realizadas a pé, de bicicleta ou de transporte público até 2041 (TfL, 2018), reduzindo a dependência do uso de carros. Para que esse objetivo seja alcançado, há diversas medidas a serem adotadas, dentre as quais destacamos o Walking Action Plan - WAP, o primeiro plano de caminhabilidade elaborado em Londres. "Walking is good for us and a great way to discover all that London has to offer. London’s first Walking Action Plan along with our commitment to deliver Healthy Streets will encourage even more Londoners of all ages and backgrounds to make walking their first choice for short trips. This will help improve Londoners’ health, as well as air quality and traffic congestion, local businesses and the economy.” Lilli Matson, Diretora de Estratégias de Transporte no TfL. O WAP está relacionado a diversas ações políticas que vêm sendo elaboradas pelo governo de Londres para a redução do tráfego de veículos motorizados particulares, e o incentivo ao uso do transporte público e aos modais ativos. Desde 2003 com a implementação das zonas de cobrança urbana (Congestion Charge, em 2003; LEZ, em 2008; ULEZ, em 2019), a cidade tem observado um decréscimo significativo nos deslocamentos por automóveis e, com isso, uma transformação considerável nos modos de deslocamento na cidade, principalmente nas zonas centrais, onde estão inseridas as zonas de restrição de veículos. Abaixo são apresentados alguns dados do último relatório de análise do transporte em Londres e sua divisão modal de viagens diárias. 217 Figura 82. Fluxo do tráfego de veículos por área em Londres, no período de 2008/09 à 2020/21. Fonte: Relatório de viagens em Londres (2019) Figura 83. Divisão modal de viagens por tipo de transporte (2000-2009) Fonte: Relatório de viagens em Londres (2019) 218 Figura 84. Divisão modal das viagens diárias em Londres em 2019. Fonte: Relatório de viagens em Londres (2019) Objetivos A cidade de Londres desenvolve o primeiro Walking Action Plan em 2018, com o suporte do departamento de pesquisa e saúde Public Health England (PHE), visando o ambicioso plano de tornar Londres a cidade mais caminhável do mundo, com mais de um milhão de deslocamentos a pé por dia, até o ano de 2024 (de 6.4 milhões de viagens origem-destino/dia em 2018 para 7.6 milhões/dia em 2024) (Mayor of London, 2018). Figura 85. Divisão modal em 2015 e sua expectativa para 2041. Fonte: TfL – Transport of London (2018). O Walking Action Plan se apoia na abordagem de “Ruas Saudáveis” que coloca as pessoas e sua saúde no centro da tomada de decisões. Essa abordagem não é uma visão idealizada para 219 uma rua modelo, mas sim um plano de longo prazo para melhorar a experiência das pessoas na via, ajudando todos a serem mais ativos e a desfrutar dos benefícios de usar as ruas para seus deslocamentos diários a pé. A abordagem Ruas Saudáveis se concentra na criação de ruas que sejam agradáveis, seguras e atraentes, onde o ruído, a poluição do ar, a acessibilidade e a falta de lugares para sentar e abrigos não sejam barreiras que impeçam as pessoas - principalmente as mais vulneráveis - de sair de casa (Transport for London, s/d. Healthy Streets). Dentro desse conjunto de objetivos e estratégias para se promover um maior número de viagens a pé, existe uma preocupação especial com a saúde das crianças, com a pretensão de se aumentar a proporção de trajetos a pé às escolas para 57 por cento em 2024 (de 53 por cento em 2018) Mayor of London, 2018). Instrumentos e implementação O Plano de Caminhabilidade de Londres pode ser entendido como um conjunto de ações alinhadas às Estratégias de Transporte de Londres para a mitigação do deslocamento a pé e por bicicleta. Portanto sua implementação torna-se um projeto de longo prazo e que pretende superar certas barreiras que impedem os londrinos de caminharem mais, como preocupações ligadas à segurança viária (relacionada aos carros envolvendo possíveis sinistros) e suas condições físicas para se exercitar. A prefeitura e o departamento de transportes (TfL) de Londres propõe no plano de ação (Walking Action Plan, 2018) as seguintes iniciativas para que o projeto seja implementado gradativamente: • Projetar, construir e gerenciar vias para as pessoas que caminham, proporcionando melhores espaços públicos, mais percursos de pedestres e faixas de pedestres mais numerosas e mais largas; • Garantir que a caminhada seja priorizada em cada novo projeto de infraestrutura, por meio de novas ferramentas desenvolvidas como o Guia para o Conforto do Pedestre para Londres (Pedestrian Confort Guidance for London) e a City Planner Tool50, para garantir um suporte para que aos bairros desenvolvam suas próprias estratégias e projetos a nível local; 50 A City Planner Tool (CPT) é uma ferramenta GIS disponível online, desenvolvida pelo TfL. Ela contém uma variedade de dados de planejamento, incluindo o conjunto de dados descritos na Análise Estratégica de Caminhada (Strategic Walking Analysis), disponibilizado para os distritos de Londres e permitindo aos usuários o acesso a esses dados e ao uso da ferramenta: http://content.tfl.gov.uk/strategic-walking-analysis.pdf. 220 • Capacitar milhares de crianças a irem a pé para a escola, dobrando o número de escolas credenciadas que defendem rotas saudáveis e apoiando o fechamento de vias, estabelecendo dias sem carro e impondo limites de velocidade de 20 mph em torno das escolas; • Implementar uma nova tecnologia de sinalização de trânsito inovadora que torna mais seguro e fácil para os pedestres cruzarem as vias, ao mesmo tempo que minimiza o congestionamento; • Criar novos ‘Active Travel Hubs’, que consistem em ações no entorno das estações do metrô de Londres, tornando mais fácil caminhar como parte dos deslocamentos diários; • Realizar workshops e fóruns regulares com bairros e outros parceiros para compartilhar as melhores práticas e impulsionar a mudança e a inovação; • Continuar monitorando as melhores práticas internacionais, bem como avaliação das iniciativas criadas em Londres, e divulgação de resultados para bairros e outros parceiros; • Monitorar o progresso em direção às metas estabelecidas pelo plano, relatando-o anualmente no relatório Travel in London51, que analisa e compila os resultados e dados sobre o transporte e modos de deslocamento na cidade. Além destas iniciativas listadas anteriormente, o Walking Action Plan se complementa através de diversos projetos e para se atingir os objetivos de uma Londres mais caminhável, todas elas alinhadas aos objetivos estabelecidos pela Estratégia de Transportes. Os projetos de destaque destes desdobramentos são: Liveable Neighbourhoods O programa complementar chamado Liveable Neighbourhoods (Mayor of London, 2019), lançado em 2019, financia projetos pelos bairros de Londres, contribuindo para alcançarem os objetivos estabelecidos pelo WAP: incentivo à caminhada, ao uso de bicicletas e ao transporte público, desencorajando cada vez mais as viagens realizadas por carros. De acordo com o Guia lançado pelo programa, suas principais abordagens de implementação são as seguintes: • Adotar uma abordagem proativa e colaborativa para apoiar os distritos no desenvolvimento de licitações e entrega de projetos; • Garantir que a mudança de comportamento e as atividades não relacionadas com a infraestrutura sejam incluídas como parte dos projetos; 51 Disponível em: http://content.tfl.gov.uk/strategic-walking-analysis.pdf (pp.35). (Consultado em 28/07/21). 221 • Garantir o envolvimento, desde o princípio, com as comunidades no desenvolvimento de propostas, incluindo o uso de abordagens inovadoras, como testes e eventos de rua aberta; • O financiamento é fornecido aos bairros por meio de outros programas de financiamento do Plano de Implementação Local (LIP); • As orientações para o Programa devem estar alinhadas às estratégias da Prefeitura de Londres juntamente às coletividades locais dos bairros e seus representantes; • Um orçamento total de £ 139 milhões (incluindo subsídio de risco) ao longo dos cinco anos propostos (2018/19 - 2022/23). Vision Zero Incluído no Plano de Estratégias para o transporte de Londres, o programa Vision Zero 52 pretende eliminar as mortes e sinistros graves causados pelo trânsito, através de medidas robustas em relação: • Controle e limites de velocidades: reduzindo as velocidades nas vias urbanas, principalmente as mais adensadas e com grande circulação de pedestres; • Ruas mais seguras: através do desenho de ruas e projetos que priorizem a segurança do pedestre; • Veículos mais seguros: estabelecendo normas e padrões para os veículos em meio urbano; • Comportamento seguro: através de campanhas para conscientização e educação do comportamento no trânsito, para ciclistas, motoristas, motociclistas e pedestres; • Responsabilidade pós-colisão: desenvolvendo um sistema de informação e melhorando a interação entre a justiça e as vítimas de sinistros no trânsito. Healthy Streets Approach Para tornar a política pública contemplada pelo WAP em prática, a agência de transportes TFL contou com o apoio do governo da “Grande Londres” (Greater London Authority) juntamente ao departamento de saúde pública nacional (Public Heath England), desenvolvendo a abordagem de planejamento público conhecida como Ruas Saudáveis (Healthy Streets Approach). A partir dessa abordagem centenas de funcionários públicos envolvidos no planejamento da cidade de Londres foram treinados e capacitados para adotar essa nova prática, dando prioridade às pessoas na elaboração dos futuros projetos e políticas - colocando "as pessoas em primeiro lugar". Liderado pela diretora do Healthy Streets, Lucy Saunders, foi desenvolvido 52 Disponível em: https://tfl.gov.uk/corporate/safety-and-security/road-safety/vision-zero-for-london 222 um trabalho em colaboração com diversas equipes para a criação de ferramentas para alinhar os diversos projetos da TfL com a abordagem das Ruas Saudáveis, incluindo a verificação de projetos de ruas e avaliação de aplicativos de planejamento (Healthy Streets, s/d). Foi estabelecido um novo sistema de vigilância em toda a cidade para monitorar o desempenho dessa iniciativa. A atividade física diária e a mudança de modo de deslocamento foram incluídas como indicadores-chave de desempenho a serem monitorados após implementação dos projetos pela cidade. Resultado desse programa, foram lançados alguns guias de avaliação e implementação das ruas saudáveis. Figura 86. Publicações relacionadas à abordagem Healthy Streets. Fonte: Healthy Streets, s/d. Arranjo regulatório O planejamento e desenvolvimento do sistema de transporte de Londres divide-se entre o governo local (Mayor of London) e a autoridade do transporte local, a TfL (Transport for London), alinhados através da elaboração e implementação do Mayor's Transport Strategy. Essas estratégias têm relação direta com outras frentes de planejamento, tais como setores de saúde, economia, habitação, cultura e meio ambiente, que oferecem subsídios e contribuem para o estabelecimento de diretrizes para o transporte. Os processos administrativos que viabilizam a implementação das ações estabelecidas pelo Plano Estratégico de Transportes envolvem o planejamento em diversas instâncias responsáveis pelo transporte da cidade de Londres: • Planejamento local estratégico: relacionando as ações em nível municipal e em nível local distrital (LIP); 223 • Planejamento de negócios da autoridade de transportes; • Planejamento do sistema ferroviário atrelado à indústria e logística (Network Rail HLOS); • Planejamento da autoridade portuária (PLA); Tais autoridades se organizam em torno do Plano Estratégico e estabelecem suas diretrizes de atuação e monitoramento de atividades, prestando contas para o governo central da cidade. Segue abaixo o fluxograma esquemático de organização dos processos para as estratégias de transporte: Figura 87. Processo de implementação da Estratégia de Transportes de Londres. Fonte: Tfl – Transport of London. O Walking Action Plan foi lançado pelo departamento interno à prefeitura de Londres, com suporte e financiamento pela agência de transportes TfL, sob a chefia de Will Norman – Walking and Cycling Commissioner, o primeiro a ocupar este cargo em 2016 (Mayor of London, s/d). Recursos, atores e investimentos Foi direcionado pela agência de transportes de Londres (TfL) o investimento de £2.2 bilhões diretamente para o Walking Action Plan (Mayor of London, 2018), considerando o plano para 224 o desenvolvimento de ruas mais saudáveis e direcionando tais investimento à 4 ações principais: • Construir e administrar ruas para as pessoas caminharem: melhorando as rotas caminháveis, sua limpeza, atratividade e segurança; • Planejar os desenhos das rotas de pedestres: tornar as calçadas acessíveis e planejar ruas mais amigáveis para os pedestres (equalizar a hierarquia viária, diminuir a velocidade e promover o melhor compartilhamento das ruas entre os diversos modais); • Integrar o deslocamento a pé ao transporte público: promover acessibilidade e planejamento entre os modais, principalmente no entorno das estações de transporte público; • Liderar a transformação cultural: envolvimento e incentivo à população aos benefícios do deslocamento a pé, principalmente nos trajetos para o trabalho e escola. Além disso, serão investidos £115 milhões para o programa complementar chamado Liveable Neighbourhoods – esse projeto parte das iniciativas da prefeitura de Londres de trabalhar em parceria com os diversos distritos da capital e, por esse motivo, a TfL garante suporte financeiro para as gestões locais dos bairros implementarem projetos de ruas saudáveis e seguras (Mayor of London, 2018. London set to become the world’s most walkable city). Para atender todas as expectativas e necessidades levantadas pelo Plano Estratégico de Transportes, a capital londrina contará com um investimento de aproximadamente £3,3 bilhões/ano. O sistema de transporte de Londres deve ser financiado de forma adequada e justa segundo a prefeitura. Dessa forma, para adequar os níveis de investimentos de forma igualitária entre as diversas regiões da Grande Londres (central London, inner London e outer London) o GLA (Greater London Authority) e o Tfl (Transport for London) contam com um financiamento adicional propiciado a partir: • Medidas de cobrança em estradas; • Recuperação da valorização da terra para investimentos em transporte; • Concessão de poderes financeiros ao nível local. 225 Figura 88. Regiões da Grande Londres. Central London Inner London Outer London Fonte: Mayor of London, 2018. Walking action plan. Estratégias de comunicação As estratégias de divulgação do Walking Action Plan estão diretamente relacionadas às publicações internas feitas pelo TfL. Seus guias de ação e relatórios são os materiais de referência para as estratégias locais de desenvolvimento do programa, bem como os diversos programas iniciados pelos desdobramentos do plano de ação e pelas estratégias para o transporte de Londres. Figura 89. Publicação pela London Living Streets, principal entidade de divulgação da campanha. Fonte: London Living Streets, 2020. 226 Figura 90. Publicação do TfL sobre os benefícios econômicos dos programas de caminhabilidade e ciclabilidade. Fonte: Transport of London (s.d.). Walking & cycling: the economic benefits. Figura 91Principal canal para divulgação dos conteúdos produzidos pelo TfL. Fonte: Greater London Authority, Transport of London (2018). Mayor's Transport Strategy. 227 Resultados O Walking Plan Action é um plano bastante abrangente. Estabelece diretrizes de implementação a partir de um conjunto de 19 ações, entre projetos de incentivo às coletividades e eventos de divulgação, projetos gráficos através dos wayfinding (totens de sinalização espalhados pela cidade), projetos de mobiliário urbano, programas de ampliação de redes cicloviárias, monitoramento dos impactos, etc. Fica claro que a tomada de decisões e encaminhamento do projeto é de responsabilidade dos distritos da cidade, bem como uma certa dispersão dos recursos e financiamentos pelo território, centralizando apenas as decisões no TfL em conjunto com as governanças locais. Ainda não foram identificados resultados, já que o plano foi lançado em 2018 e vêm sendo discutido e complementado desde então, mas os principais resultados e impactos esperados bem como suas metas podem ser sumarizados em (Department for Transport, 2020; Transport of London, s.d.; Walking & cycling: the economic benefits): • Reduzir a inatividade física, a qual é responsável pela morte de 1 em cada 6 pessoas no Reino Unido e tem um custo para o sistema de saúde de 1£ bilhão de por ano; • Aumentar o comércio local em até 40% por meio de melhorias bem planejadas em projetos de caminhabilidade; • Reduzir os custos do tráfego e congestionamento em Londres, os quais custam £9.5bn/ano. • Incentivar o ciclismo, o qual pode contribuir em £5.4bn/ano para a economia. Considerações finais O Walking Action Plan de Londres é resultado de um conjunto de ações para o incentivo à mobilidade a pé, estabelecidas dentro de um plano maior definido pelas Estratégias do Transporte para a cidade. A partir de 2016, com a criação de uma comissão voltada exclusivamente à gestão de planos de caminhabilidade e cicloviário (liderada por Will Norman), atrelada à Mayor of London e financiada pela agência de transportes TfL, foram estabelecidos progressivamente projetos e diretrizes voltadas aos objetivos de tornar Londres a cidade mais caminhável do mundo. Com isso, entre os anos de 2016 e 2018, foram desenvolvidos inúmeros projetos com esse enfoque, como o Liveable Neighbourhoods e o Healthy Streets Approach, fornecendo ferramentas e subsídios para dar autonomia na implementação de projetos para a melhoria da caminhabilidade pelos distritos de Londres. 228 Tabela 29. Disposições gerais Walking Action Plan, Londres – Inglaterra Item Valor Objetivo Tornar Londres a cidade mais caminhável do mundo, adicionando mais de um milhão de deslocamentos a pé por dia, até 2024 (de 6.4 milhões de viagens origem-destino/dia em 2018 para 7.6 milhões/dia em 2024). Localização Londres Área de abrangência 1,572 km2 – Grande Londres Infraestrutura Diversas frentes e possibilidades diante das decisões locais. Contexto da área na cidade Centrais e periféricas Público-alvo Universal porém com ações específicas para crianças e jovens Modal alvo Deslocamento a pé Relevo Majoritariamente plano Despesas £2.2 bilhões total Receitas Sem dados concretos sobre as fontes Composição do Público (Governo de Londres e Agência de Transportes) e financiamento Privado (iniciativas locais). Redução na Emissão de Sem dados CO2 Impacto central Sem dados Elaboração própria. Referências Department for Transport (2020). Gear Change – A bold vision for cycling and walking. Disponível em: https://assets.publishing.service.gov.uk/government/uploads/system/uploads/attachm ent_data/file/904146/gear-change-a-bold-vision-for-cycling-and-walking.pdf Greater London Authority, Transport of London (2018). Mayor's Transport Strategy. Disponível em: https://www.london.gov.uk/sites/default/files/mayors-transport-strategy-2018.pdf Healthy Streets (s/d). London: Policy into Practice. Disponível em: https://www.healthystreets.com/case-studies/london-policy-into-practice London Living Streets (2020). Transport for London publishes Strategic Walking Analysis. Disponível em: https://londonlivingstreets.com/2020/04/16/transport-for-london- publishes-strategic-walking-analysis/ Mayor of London (s/d). Walking and Cycling Commissioner. Disponível em: https://www.london.gov.uk/people/mayoral/dr-will-norman 229 Mayor of London (2017). Guide to the Healthy Streets Indicators Delivering the Healthy Streets Approach. Disponível em: http://content.tfl.gov.uk/guide-to-the-healthy-streets- indicators.pdf Mayor of London (2017). Mayor’s Transport Strategy: Supporting Ev idence Challenges and Opportunities for London’s Transport Network to 2041. 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